Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 30/07/2015
Todo mundo sabe que a maior oposição
ao ajuste fiscal partiu da cozinha do Palácio do Planalto e das bancadas
do PT na Câmara e no Senado
A
presidente Dilma Rousseff ensaia um discurso para responsabilizar a
Operação Lava-Jato e o Congresso Nacional pelo agravamento da crise
econômica. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que anda prometendo mais
do que pode cumprir, repete a toada, com o argumento de que o fracasso
do ajuste fiscal será fruto da irresponsabilidade dos políticos.
Dilma
tenta atrair o apoio dos governadores para a reconstituição de sua base
de sustentação no Congresso. Promete sancionar o projeto que trata da
reindexação da dívida de estados e municípios. A matéria é reivindicada
por cidades como São Paulo, cuja dívida triplicou na gestão do petista
Fernando Haddad, e Rio de Janeiro, que reclamam do atual indexador.A
proposta do senador José Serra (PSDB-SP) de uso dos depósitos judiciais e
administrativos pelos estados, que depende da sanção presidencial, é a
cenoura para a celebração de um pacto de governabilidade. Mais difícil
de colar é a proposta de unificação do ICMS para acabar com a guerra
fiscal.
O cálculo do governo é criar um ambiente político novo,
que tem duas faces: a simpática é a cooperação administrativa com os
estados e municípios, que o governo promete e não tem condições de
cumprir; a cruel são as denúncias contra os políticos, pelo Ministério
Público Federal, aguardadas para o começo de agosto, que o Palácio do
Planalto acredita que conteria o ímpeto oposicionista dos caciques
rebeldes do PMDB.
Eis uma equação que não fecha. A crise ética,
que avança em direção ao coração do esquema de propina nas estatais, até
agora tem funcionado na direção contrária. Ameaçados pelas denúncias,
os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan
Calheiros (PMDB-AL), são compelidos a jogar para a arquibancada.
Dilma
quer apoio dos governadores para barrar os projetos que aumentam os
gastos públicos. Exemplos: manutenção dos vetos ao reajuste dos
servidores do Judiciário e à mudança no fator previdenciário. Também
quer evitar a aprovação da nova alíquota de correção do FGTS, que
passaria de 3% para 6%. Alega que a medida atinge o programa Minha Casa,
Minha Vida. Não será fácil domar a própria base.
Sem perdão
Governadores
e prefeitos, pela natureza dos cargos que exercem, não apostam no
quanto pior, melhor. Seria uma espécie de haraquiri administrativo
e político. Mas isso não significa que absolvam a presidente Dilma
Rousseff de seus pecados à frente da economia. A sucessão de erros na
condução do país, principalmente durante a campanha eleitoral passada, é
que fez de Dilma uma presidente impopular, rejeitada pelos políticos e
sem credibilidade perante os agentes econômicos.
O ex-deputado
Delfim Netto, que já foi conselheiro de Dilma, resumiu assim as
consequências da “vontade” política da petista para se reeleger a
qualquer custo: um deficit fiscal de 6,2% do PIB (contra 3,1% em 2013);
uma taxa de inflação de 6,4%, mas que escondeu os efeitos de preços
controlados da ordem de 3% a 4%; a relação dívida bruta/ PIB aumentou em
6% do PIB; um deficit em conta corrente de US$ 104 bilhões (4,4% do
PIB) e, por fim, uma queda de 0,7% do PIB per capita.
Segundo
ele, houve “subestimação dos efeitos deletérios dessa estratégia”. Em
nível federal, o diferencial de crescimento entre a receita primária
(que depende fundamentalmente do crescimento do PIB) e a despesa
primária (que cresce endogenamente pelos “direitos adquiridos” pelos
beneficiários do poder) provocou um deficit estrutural, avalia Delfim.
Dilma
agora faz o misancene de quem não se sente culpada e responsabiliza a
oposição e os aliados do PMDB, mas todo mundo sabe que a maior oposição
ao ajuste fiscal partiu da cozinha do Palácio do Planalto e das bancadas
do PT na Câmara e no Senado. Em circunstâncias normais, o ajuste
proposto por Joaquim Levy seria aprovado até mesmo com os votos da
oposição, principalmente do PSDB. Tal não ocorreu porque o ambiente
político está completamente empesteado, e a presidente da República,
divorciada de sua própria base parlamentar.
O vice-presidente
Michel Temer, cujas articulações garantiram o que foi salvo do ajuste
original, acabou fragilizado por causa do histórico litigioso de Dilma
Rousseff e seus principais assessores no trato com a bancada do PMDB.
Esse cenário não será revertido com a reunião dos governadores, que
estão sendo mobilizados para enquadrar deputados de seus respectivos
estados. O Congresso vai pegar fogo em agosto.
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