Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 27/10/2014
Há uma grande expectativa da população e dos
agentes econômicos em relação aos próximos passos da presidente reeleita,
principalmente em relação à economia
Chovia em Brasília na noite
de ontem quando o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE),
ministro José Antônio Dias Toffoli, anunciou que a presidente Dilma
Rousseff (PT) fora reeleita presidente do Brasil. Foi uma vitória
relativamente apertada, numa campanha radicalizada, que dividiu o país e
deixou sequelas, pelo clima odiento criado na sociedade, até mesmo em
âmbito familiar. Mas foi também uma grande vitória da democracia, e isso
é mais importante, pois as eleições transcorreram em clima de
normalidade e ninguém contesta o seu resultado, devido à lisura de
pleito, o que não seria possível se não tivéssemos um sistema eleitoral
democrático, robusto, à prova de fraudes.
Dilma Rousseff foi
confirmada no cargo pela inequívoca vontade popular. Está, porém, diante
de grandes desafios: o baixo crescimento da economia, a inflação
rompendo o teto da meta, a desorganização das contas públicas e a
insatisfação de quase a metade da população — a maioria nas regiões
meridionais do país — exigem respostas imediatas. A faxina que ensaiou
fazer no começo de seu primeiro mandato agora urge, ainda mais, diante
da sucessão de escândalos que quase inviabilizou a reeleição. Enfrenta
uma situação nebulosa por causa da Operação Lava-Jato, na qual algumas
dezenas de políticos e autoridades estariam envolvidos em desvios de
recursos da Petrobras.
A oposição emerge das urnas fortalecida,
seja pela expressiva votação de seu candidato no segundo turno, o
senador Aécio Neves (PSDB), seja pela vitória eleitoral de seus
candidatos a governador em estados importantes da Federação. Diante da
realidade das urnas, cabe à oposição dar um crédito de confiança à
presidente eleita, sem abdicar do papel de criticar e fiscalizar o
governo. Dilma foi reeleita sem anunciar um novo programa, apenas com
base nos 12 anos de administração petista e de ideias e propostas
balizadas pelo marketing eleitoral. Há dois caminhos a seguir: reiterar a
estratégia que vem adotando no governo, a qual dividiu o país, ou
corrigir os rumos ao montar uma nova equipe ministerial e promover a
reconciliação da sociedade.
A retórica da “luta de classes” que
norteou a campanha petista é de natureza ideológica e não resolve os
problemas do país, embora tenha mobilizado a militância do PT.
Prosseguir nessa rota seria o caminho para dividir ainda mais a
sociedade e nos levaria à situação semelhante a dos nossos vizinhos da
Argentina e da Venezuela. A agenda nacional é objetiva, exige o controle
da inflação e um ajuste nas contas públicas para a retomada do
crescimento; a melhoria da qualidade do ensino e investimentos em
infraestrutura para aumentar a produtividade e a competitividade da
nossa economia; melhores serviços à população nas áreas de saúde,
transportes e segurança pública; e o combate à corrupção na
administração direta e nas empresas estatais, sobretudo a Petrobras.
Divisor de águas
Muito
se falou na campanha eleitoral sobre tudo isso, mas é preciso pôr as
propostas em prática. Há uma grande expectativa da população e dos
agentes econômicos em relação aos próximos passos da presidente eleita,
principalmente em relação à economia. O atual ministro da Fazenda, Guido
Mantega, foi “demitido” no exercício das próprias funções. Ninguém sabe
ainda quem ocupará seu lugar na Esplanada. A definição em relação ao
futuro ocupante desse cargo será um divisor de águas. É uma das grandes
expectativas sobre o novo mandato. Hoje mesmo, na Bolsa de Valores,
teremos os sinais do mercado em relação ao resultado da eleição.
Uma
das interrogações do resultado das urnas é em relação ao Congresso,
devido à mudança de composição do Senado e da Câmara. Na primeira Casa,
estarão alguns dos principais lideres da oposição, entre eles Aécio
Neves (PSDB-MG) e José Serra (PSDB-SP), ambos derrotados por Dilma. Com
José Sarney fora do Senado, o esteio governista será o senador Renan
Calheiros (PMDB-AL), que tentará a reeleição para o comando da Casa. Na
Câmara, a sucessão de Henrique Alves (PMDB-RN), o atual presidente, que
perdeu as eleições para o governo no Rio Grande do Norte, já acirra os
ânimos entre as duas principais forças da base de Dilma: o PT e o PMDB.
Durante
a campanha, Dilma reiteradas vezes defendeu a ideia de uma reforma
política, por meio de um plebiscito, cujos contornos não são claros. Eis
outro ponto de interrogação. Logo após ser eleita, Dilma disse que não
acredita na divisão do país e que a energia positiva da disputa
eleitoral servirá de base para o país avançar. “Algumas vezes,
resultados apertados produziram mudanças mais rápidas”, disse, ao
agradecer aos eleitores e aliados pela vitória nas urnas. Fez um
chamamento ao diálogo com a oposição em torno dessa reforma, mas não
esclareceu os termos das mudanças que propõe.
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