sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Olha o PIB aí, gente!

O presidente Lula acredita numa bala de prata contra
a crise: a redução da taxa de juros. Para alguns analistas,
não existe risco de alta da inflação.


Por Luiz Carlos Azedo

Na semana passada, o alto índice de aprovação do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva numa pesquisa
do instituto Datafolha supreendeu a todos: 70%
de bom e ótimo. Não faltaram análises para explicar
o fenômeno, ora atribuído ao recall das políticas sociais
do governo, ora à capacidade de comunicação do
presidente Lula. Ontem, veio a explicação: o Produto Interno
Bruto (PIB) brasileiro, divulgado pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), cresceu 6,8% no
terceiro trimestre deste ano na comparação com o mesmo
período do ano passado. Em relação ao trimestre anterior,
a alta foi de 1,8%. Foi por essa razão que o presidente Lula
desafiou os mais pessimistas e anunciou o melhor Natal
de todos os anos de seu governo.

No coqueiro
O PIB é a soma das riquezas produzidas pelo país. Teve alta
de 6,3% nos últimos 12 meses terminados em setembro
e de 6,4% , somente em 2008. É o melhor índice desde o
começo da série em 1996. Seu valor chegou a R$ 747,3 bilhões.
Os números parecem dar razão ao presidente Lula
de que vivemos num outro mundo. A indústria cresceu
7,1%; a agropecuária, 6,4%; o setor de serviços, 5,9%. O
destaque na indústria foi a construção civil, com alta de
11,7%. Motivo: o aumento de 32% de crédito para habitação.
Também houve forte expansão dos investimentos:
19,7%. O consumo das famílias continuou ascendente,
com alta de 7,3%. E os gastos do setor público subiram
6,4%, ou seja, ligeiramente acima do PIB.

Onze entre 10 economistas avaliam que esse PIB subiu
no coqueiro, pois não reflete o impacto da crise mundial e
deve desabar. Os sinais estariam trocados em relação ao
desempenho real da economianas últimas semanas,com notícias de que
as montadoras, siderúrgicase mineradoras suspendemsuas atividades,
concedem férias coletivasou demitem. Nas lojas de
eletrodomésticos e concessionáriasde automóveis,os sinais de que o
crédito está empoçado são gritantes. Os preçosdesabam,
quase ninguém compra. Os juros estão altos,o consumidor pôs as
barbas de molho. O presidente Lula, porém, apostana força
de inércia do “espetáculo” do PIB, mesmocom o apagão financeiro
mundial. Avalia queo Brasil pode resistir graças
aos gastos do governo e ao pensamento positivo
de empresários e trabalhadores.Essa é a lógica do
espantoso discurso do “sifu”, no qualcompara a economia
a um doente no hospital. O povão entenderia o espírito da metáfora.

Bala de prata
O Brasil tem uma trajetória histórica de expansão anticíclica.
Graças a isso houve a nossa industrialização. A receita foi
câmbio favorável às exportações, investimentos públicos
na atividade produtiva e discurso político otimista,
motivador da nação. O populismo de Getúlio Vargas
cumpriu esse papel. O modernismo bossa-nova de Juscelino
Kubitschek também. Até o “Pra Frente Brasil” do
regime militar, num terceiro e bem-sucedido de ciclo de
substituição das importações, teve esse efeito durante o
“milagre econômico”. Será que o Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC), menina-dos-olhos do segundo
mandato, cumprirá esse papel ? É uma aposta de alto risco,
mas está sendo feita pelo Palácio do Planalto.

O presidente Lula acredita numa bala de prata contra
a crise: a redução da taxa de juros. Para alguns analistas,
não existe risco de alta da inflação. A economia mundial
está entrando em recessão, alguns países estão em deflação
(recessão com queda de preços). Aqui os preços também
deverão cair. Nosso problema seria outro: o desemprego
bate à porta das fábricas, lojas e escritórios.No fundo,
Lula acredita que o novo presidente dos Estados, Barack
Obama, prepara um pacote trilionário para tirar seu
país da recessão, o que pode reaquecer a economia mundial.
E avalia que terá atravessado o Rubicão da crise se
impedir uma onda de desemprego. Para isso, precisa
manter e baratear o crédito, convencer empresários a
não demitir e investir e estimular os trabalhadores a continuar
comprando. Tudo isso pode ser uma grande ilusão,
mas não terá a menor chance de evitar uma recessão
por aqui se o próprio presidente de República não acreditar
nele mesmo. Com perdão para a inversão da metáfora
“desenvolvimentista”, é melhor voar como a galinha
do que virar uma minhoca na crise.

Publicado na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense em 10 de dezembro

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