O principal acerto do presidente Lula no seu segundo mandato, aquele que possibilitou o desempenho mais positivo do governo em 2008, foi mudar a composição de sua equipe
Por Luiz Carlos Azedo
Tomo emprestado o título do livro de estréia de Marcelo Rubem Paiva para a última coluna do ano por uma razão que nada tem a ver com a obra do seu autor, mas apenas porque resume em três palavras o melhor ano do governo Lula: 2008. Nada de mensalão, nada de cartões corporativos, nenhuma crise grave na Câmara ou no Senado, a economia bombando, a oposição acuada. Foi um período em que a vida do povo melhorou e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ostentou os maiores índices de aprovação.
O acerto
O principal acerto do presidente Lula no seu segundo mandato, aquele que possibilitou o desempenho mais positivo do governo em 2008, foi mudar a composição de sua equipe. Basta comparar o ministério do primeiro mandato com o do segundo, a começar pela cozinha do Palácio do Planalto. No primeiro mandato, todas as decisões políticas do governo pareciam tuteladas por dois atores: os ex-ministros da Fazenda Antonio Palocci e da Casa Civil José Dirceu. Ambos eram figuras poderosas, um era protagonista do governo no campo das relações políticas; o outro, a uma espécie de porta-voz do mercado, que antes da crise mundial, sabemos, ditava o rumo da política econômica. Ambos aspiravam suceder o presidente da República em 2010.
A saída dos dois ministros, num processo de sucessivas crises de governo, com forte repercussão no Congresso, alterou o quadro. Coube ao presidente Lula assumir integralmente o comando, recompor a equipe e partir para a reeleição. O discurso eleitoral já apontava para a mudança de rumo do segundo mandato. A polarização ocorrida na eleição, quando Lula passou a combater um suposto “programa de privatizações” da oposição, foi uma esperteza de campanha. Mas legitimou a elevação do gasto público e maior intervenção do Estado na economia no segundo mandato. Houve uma mudança de eixo da política monetária, cujo foco deixou de ser o combate à inflação já domada e passou a ser a retomada do crescimento. Os fatos subseqüentes, com a crise mundial, acabaram corroborando a necessidade do novo posicionamento.
Lula deixou de ser prisioneiro da luta interna do PT, montou um governo de ampla coalizão com a participação do PMDB, o maior partido do país. A cozinha do Palácio do Planalto é mais autônoma em relação aos partidos. O governo tem em primeiro plano a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, a preferida de Lula para a sucessão em 2010; os demais ministros, vêm em segundo. Mas quem de fato manda é o presidente da República. O resultado foi uma gestão mais eficiente. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), menina dos olhos do governo, ganhou mais importância: é considerado a tábua de salvação para o país atravessar a crise mundial com menos sofrimento. Até recentemente, o governo navegava com a corrente a seu favor, mas basta olhar para os nossos vizinhos — a Argentina, por exemplo — para verificar que o mesmo cenário poderia levar a resultados diferentes.
O resultado
O sucesso do governo Lula em 2008 continuou alavancado por programas sociais para a população de baixa renda e a retomada do crescimento, que veio num a escala sem precedentes nas últimas décadas. Foi graças a isso que a vida do povo melhorou. O crescimento também amorteceu velhos conflitos na área econômica, que envolvem agricultura, desenvolvimento econômico, comércio exterior e meio ambiente. Em segundo lugar, houve uma gestão mais produtiva nas áreas da Educação e da Saúde, com ministros com um perfil mais técnico do que político, o que certamente livrou as duas pastas de novos escândalos. Em contrapartida, o Ministério da Justiça e a área de informações do governo viveram uma confusão atrás da outra, envolvendo as relações do Executivo com o Congresso e o Judiciário.
Talvez a maior omissão do governo Lula seja a ausência de um projeto vigoroso de reforma urbana, que enfrente três problemas. Uma política habitacional de baixa renda de envergadura (1), articulada a um programa de transportes de massas capaz de reorientar a expansão de nossas cidades (2) e um plano de segurança que verticalizasse efetivamente o combate ao tráfico de drogas, de armas e o contrabando, cujos pontos de convergências são corrupção policial, de um lado, e a lavagem de dinheiro, de outro (3). São áreas onde a situação só se agrava. Porém, o governo federal, por causa da repartição constitucional de tarefas entre a União e demais entes federados, prefere tirar o corpo fora ou jogar para a arquibancada.
Publicada hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
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