Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 11/12/2014
Como
naquela velha propaganda de vodca, nada impede que alguns dos que
votaram pela cassação de André Vargas possam ir para a guilhotina
amanhã
Sem dó nem piedade a Câmara
dos Deputados cassou o mandato do deputado federal André Vargas (sem
partido-PR) por quebra de decoro parlamentar. No placar eletrônico do
plenário, foram 359 votos favoráveis e somente um contrário, do deputado
José Airton (PT-CE), além de seis abstenções. O líder do PT, Vicente
Paulo da Silva (SP), o Vicentinho, encaminhou a votação a favor da
cassação do ex-petista, depois de meses de manobras da sua bancada e dos
aliados para evitar esse desfecho.
Vargas era o vice-presidente
da Câmara, primeiro na linha de sucessão do deputado Henrique Eduardo
Alves (PMDB-RN) no comando da Casa, mas meteu os pés pelas mãos e teve
que renunciar ao cargo. Notabilizou-se ao posar de punho fechado e braço
erguido ao lado do então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF),
ministro Joaquim Barbosa, num protesto contra a condenação dos líderes
petistas José Dirceu, José Genoino e João Paulo Cunha no processo do
mensalão. De símbolo do inconformismo petista com o julgamento da Ação Penal 470 pelo
STF, tornou-se um renegado político da própria legenda, após o escândalo
da Petrobras.
O ex-petista é suspeito de envolvimento com o
doleiro Alberto Youssef, acusado de comandar o esquema de corrupção que
atuava na Petrobras. A votação que cassou o mandato do parlamentar foi
aberta. Eram necessários apenas 257 votos a favor da cassação; tentou-se
uma manobra regimental para evitar a decisão, mas a oposição pôs a boca
no trombone e o presidente da Câmara deu sequência à sessão.
A
cabeça de Vargas rolou para purgar os pecados da Câmara, num ritual que
se repete a cada legislatura, desde 1993, quando houve o escândalo dos
Anões do Orçamento. À época, foram cassados seis parlamentares, entre os quais o
então presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro (PMDB-RS). Quatro
congressistas renunciaram, inclusive o poderoso líder do PMDB, Genebaldo
Corrêa (BA), para evitar a própria cassação. Oito deputados foram
absolvidos.
O escândalo do Orçamento nem chega perto do
desnudado pela Operação Lava-Jato, cujo montante de desvios chega a R$
20 bilhões. Os envolvidos roubaram cerca de R$ 100 milhões, com esquemas
de propina, para favorecer governadores, ministros, senadores e
deputados. Em 2000, o Supremo Tribunal Federal arquivou o processo
contra Ibsen Pinheiro, que retornou à política em 2004, ao
eleger-se vereador em Porto Alegre. Em 2006, conquistou uma vaga para a
Câmara dos Deputados, na qual foi recebido como grande injustiçado, pois
nada foi provado contra ele.
Sem mandato, Vargas poderá ser
enquadrado na Lei da Ficha Limpa, ficando inelegível por oito anos. Como
não se reelegeu, Vargas deixaria a Câmara no fim de janeiro, mas a
maioria dos líderes resolveu orientar as bancadas a votar pela perda do
mandato. Somente o PMN e o PEN liberaram seus parlamentares . Vargas não
compareceu à sessão. Estava licenciado até ontem e acreditava piamente
que não haveria a votação.
Efeito Orloff
Como
naquela velha propaganda de vodca, nada impede que alguns dos que
votaram pela cassação de André Vargas possam ir para a guilhotina
amanhã. É assim que as coisas funcionam na Câmara dos Deputados, onde
não existe cadeira vazia, pois há uma fila de suplentes à espera de um
lugar no plenário e o maior interessado na cassação quase sempre é um
colega do próprio partido.
Ontem, o relator da CPI mista da
Petrobras, deputado Marco Maia (PT-RS), apresentou o relatório final. É
um documento pautado pelo cinismo, pois não recomenda o indiciamento de
nenhum dos envolvidos nas denúncias de corrupção. Sugere somente o
“aprofundamento” das investigações na Operação Lava-Jato, que foram
obstruídas pela bancada governista na própria comissão. Com 903 páginas,
o relatório deverá ser votado no próximo dia 17. O prazo de
funcionamento da comissão termina no dia 22, o último antes do recesso
da atual legislatura. A oposição pretende apresentar um relatório
paralelo para marcar posição.
Como prêmio pelo desempenho na
tarefa, o presidente da CPI mista da Petrobras, senador Vital do Rêgo
(PMDB-PB), foi indicado para o Tribunal de Contas da União (TCU). O
escândalo parece assunto morto e enterrado no Congresso, mas isso é um
autoengano dos envolvidos. O procurador-geral da República, Rodrigo
Janot, recebeu ontem o conteúdo da delação premiada do doleiro Alberto
Youssef, apontado pela Polícia Federal como um dos chefes do esquema de
corrupção investigado na Operação Lava-Jato.
Com a delação em
mãos, Janot solicitará ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de
inquérito para investigar políticos citados por delatores do esquema de
corrupção que atuava na Petrobras. O que se comenta nos bastidores do
Congresso é de que a maioria já frequenta o rol de processos no STF sob
sigilo de Justiça. Quando os nomes se tornarem públicos, novos processos
por quebra de decoro serão abertos na Câmara e no Senado.
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