quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

À siciliana

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 03/12/2014 

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, porém, está com um tijolo quente nas mãos: o que fazer com as empreiteiras envolvidas na Operação Lava-Jato, se elas forem denunciadas por seus executivos?


A palavra máfia, de origem siciliana, mafiusu, tem suas raízes no árabe mahyas, que significa alarde agressivo, jactância ou marfud, que significa rejeitado. Mafiusu, no século XIX, significava alguém ambíguo, arrogante, mas destemido; empreendedor; orgulhoso.

Em 1863, com a peça I mafiusi di la Vicaria, Giuseppe Rizzotto e Gaetano Mosca, que trata de gangues criminosas na prisão de Palermo, houve a primeira associação com gangues criminosas. O termo máfia apareceu oficialmente pela primeira vez em 1865 em um relatório do prefeito de Palermo, Filippo Antonio Gualterio.

Com o tempo, mafiosos, empresários, políticos formaram um sistema poderoso na Itália, contra o qual era perigoso resistir. Mas a máfia conquistou fama e poder quando passou a atuar nos Estados Unidos, para onde migraram integrantes da família Cordopatri, que disseminou os métodos da organização pelo país, até ser quase exterminada em 1980 numa “guerra” entre famílias.

Na Itália, o poder da máfia somente foi contido depois de dura repressão. Durante a Operação Mãos Limpas, centenas de mafiosos foram presos, levados a julgamento e condenados. O primeiro-ministro Giulio Andreotti foi acusado de envolvimento com mafiosos, mas acabou absolvido em 1995. A investigação, porém, custou a vida de 24 juízes e promotores.

Formada pelas famílias Basso, Bortoletto, Cicca, Camolese, Corleone, Gattone, Gava, Giorlanno, Peruzzo, Nadai, Rosolen, entretanto, a Cosa Nostra ainda é muito poderosa. Tem ramificações nos seguintes países: Albânia, Alemanha, Argentina, Áustria, Bélgica, Bósnia e Herzegovina, Brasil, Bulgária, Chile, Croácia, Eslováquia, Eslovénia, Espanha, Estados Unidos, França, Grécia, Holanda, Hungria, Kosovo, Macedónia, México, Monte Negro, Paraguai, Polônia, Portugal, República Checa, Roménia, Sérvia, Suíça, Uruguai.

Lava-Jato

O escândalo da Petrobras tem todos os ingredientes do que seria a formação de uma grande organização mafiosa, menos dois até agora: a queima de arquivo e o envolvimento de uma das famílias no escândalo. No mais, tem todas as características de uma máfia envolvendo políticos, empresários, executivos e achacadores.

A formação de cartéis era o método adotado pelos mafiosos para atividades econômicas que dependem dos recursos do Estado. Ontem, na CPI mista da Petrobras, Paulo Roberto Costa, ex-diretor de abastecimento da estatal, disse que o esquema de desvios na Petrobras repete-se no Brasil inteiro. Costa foi submetido a uma acareação com Nestor Cerveró, ex-diretor da área internacional da empresa.

Segundo Costa, todas as indicações de diretores da Petrobras, desde o governo de José Sarney (1985-89) até a gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), foram políticas: “Isso aconteceu em todos os governos. Todos! Com todos os diretores da Petrobras. Se não tivesse apoio político, não chegava a diretor”. Disse, ainda, que há esquemas semelhantes ao da Petrobras: “Não se iludam. Isso que acontece na Petrobras acontece no Brasil inteiro. Em ferrovias, portos, aeroportos. Tudo.”

Costa prestou cerca de 80 depoimentos sob juramento, disse que provas estão aparecendo e que, na época oportuna, outros envolvidos no esquema serão conhecidos. Costa e o doleiro Alberto Youssef, que também reivindica a delação premiada, afirmaram que o esquema de desvios na Petrobras beneficiava partidos da base aliada, como PT, PMDB e PP, e as maiores empreiteiras do país, que montaram um cartel para controlar as licitações. Os desvios chegavam a 3% dos contratos, segundo ambos.

Já foram presos 24 diretores e executivos de empreiteiras e um agente da Polícia Federal. Parlamentares e governadores de vários partidos estão sendo investigados pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, porém, está com um tijolo quente nas mãos: o que fazer com as empreiteiras, se elas forem denunciadas por seus executivos?

A turma do deixa disso está em campo para evitar que as grandes empresas sejam declaradas inidôneas, o que poderia paralisar as grandes obras do país. Ontem, o presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Vinícius de Carvalho, deu um chega pra lá na tese com cheiro de orégano. Segundo ele, as empresas envolvidas merecem ser severamente punidas. Ou seja, Janot está numa saia justa.

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