Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 23/06/2015
A boataria de domingo
preocupou os meios políticos porque a semana que passou foi um desastre
para o governo. Culminou com uma pesquisa de opinião na qual Dilma amarga os piores índices de aprovação
A presidente Dilma Rousseff deu uma
demonstração de que tudo vai muito bem, obrigado, com ela: ontem, saiu
bem cedo para mais uma de suas pedaladas nas imediações do Palácio da
Alvorada. Não confundir com as “pedaladas fiscais”, que continuaram no
primeiro trimestre deste ano, apesar das advertências do Tribunal de
Contas da União (TCU) de que são uma ilegalidade.
A volta de bicicleta
seria uma resposta suficiente para a onda de boatos que inundou as redes
sociais e agitou os bastidores da política nacional no domingo. Com
duas versões fantasiosas, uma de que a presidente da República havia
renunciado e outra de que tentara o suicídio com consumo de remédios. A
imprensa ignorou o boato, mas Dilma não se deu por satisfeita e resolveu
comentar o assunto publicamente pela manhã.
Foi ao final da cerimônia
de lançamento do Plano Safra da Agricultura Familiar: “Eu vim falar com
vocês hoje, apesar de não ter tempo. Disseram há pouco que havia um
boato de que eu estava internada. Vocês acham que eu estava?”, indagou a
presidente. Em seguida, sorriu e mandou um beijo para os jornalistas.
Na sequência, deixou o recinto e se dirigiu para o gabinete.
Tem
alguma coisa de estranha no comportamento da presidente da República. A
bicicleta é um veículo que, simplesmente, não para em pé sozinho. Seu
equilíbrio somente é alcançado quando está em movimento. A regra para
aprender a andar de bicicleta é “olhe para frente e não para o chão”. As
crianças aprendem a andar de bicicleta, andando. Algumas coisas também
são assim, para que aconteçam é preciso que o processo esteja em pleno
funcionamento.
Os mestres em administração de empresas gostam do exemplo
para discutir mudanças em uma organização. A empresa não vai parar,
absorver a mudança e reiniciar a operação. Ela precisa ser implementada
com os negócios fluindo e as pessoas trabalhando. É mais ou menos o que
precisa ser feito pelo atual governo, mas parece que Dilma resolveu
levar o princípio da bicicleta ao pé da letra. É mais fácil andar de
bike.
Terreno pedregoso
A boataria de domingo
preocupou os meios políticos porque a semana que passou foi um desastre
para o governo. Culminou com uma pesquisa de opinião que confirmou o
que todo mundo já sabia: Dilma amarga os piores índices de aprovação de
um presidente da República desde a campanha do impeachment contra Collor
de Mello, que o levou à renúncia. No sábado à noite, acompanhada do
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, Dilma compareceu ao casamento
da filha do líder do PMDB, Eunício de Oliveira (CE), uma festa que
reuniu toda a corte de Brasília.
O vestido da noiva não era o assunto
mais comentado. Só se falava da pesquisa DataFolha, na qual Dilma tinha
10% de bom e ótimo, 24% de regular e 65% de ruim e péssimo, e das
declarações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que o
prestígio de Dilma estava igual ao “volume morto” da Cantareira. E da
prisão do presidente da Odebrecht. Marcelo Odebrecht, que ameaçara
implodir a República. Os mais gaiatos comparavam a festa de casamento ao
baile da Ilha Fiscal, o último grande evento do Império.
O
vice-presidente Michel Temer deixou a festa junto com Dilma Rousseff.
Passara o sábado preocupado com situação política do país, segundo
revelou a correligionários. A semana havia começado com a expectativa de
rejeição das contas do governo de 2014 pelo Tribunal de Contas da
União.
Na Câmara, a aprovação da revisão da desoneração da folha de
pagamento para alguns setores da economia foi novamente adiada. Os
números da economia também vão de mal a pior: a recessão pode chegar a
menos 2% do PIB brasileiro neste ano, a inflação rondará os 9%, e o
desemprego superará 10% da população que trabalha.
Dilma tenta criar uma
agenda positiva. Sua grande cartada para reverter as expectativas
negativas dos investidores será o encontro com o presidente dos Estados
Unidos, Barack Obama, no próximo dia 29, mas a realidade é cruel. O
ajuste fiscal é meia-boca, pouco pode se fazer quanto isso, por causa da
fraqueza do governo, que não tem como bancar a meta de superavit
fiscal.
E tem a Operação Lava Jato, que parece um trem fantasma, no qual
Dilma leva um susto a cada estação por causa do envolvimento do PT. É
uma variável completamente fora de controle do Palácio do Planalto.
Dilma pedala num terreno pedregoso, à beira de um precipício.
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