terça-feira, 30 de junho de 2015

Mentiras & verdades

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 30/06/2015

As declarações de Dilma podem ter a conotação de que Pessoa foi obrigado a confessar suas atividades criminosas, depois de pressionado por delegados, por procuradores e pelo juiz federal Sérgio Moro


 A presidente Dilma Rousseff não conseguiu se livrar do assunto político do momento e acabou falando mais do que seria prudente sobre a Operação Lava-Jato, ainda mais em visita aos Estados Unidos, na qual se reuniu com investidores e jantou com o presidente Barack Obama. Durante entrevista coletiva, desqualificou a “delação premiada” do empresário Ricardo Pessoa, dono da UTC e chefe assumido do cartel de empreiteiras investigado pela Lava-Jato, que apura o escândalo da Petrobras.

 “Eu não respeito um delator, até porque eu estive presa na ditadura e sei o que é. Tentaram me transformar em delatora, a ditadura fazia isso com as pessoas. Eu garanto para vocês: eu resisti bravamente e, até em alguns momentos, fui mal interpretada quando disse que, em tortura, a gente tem de resistir porque, senão, você entrega. Não respeito nenhum, nenhuma fala”, disse aos repórteres em Nova York.

A referência à tortura e à prisão é recorrente quando a presidente da República se vê em apuros, diante de questionamentos de adversários, uma espécie de atestado de idoneidade moral e de coragem. Certa vez, questionada pelo presidente do DEM, senador José Agripino (RN), no Senado, Dilma chegou a dizer que mentira “adoidado” durante a tortura para proteger seus companheiros das consequências de uma delação caso falasse a verdade.

No contexto do regime militar, mentir nos interrogatórios era uma forma legítima de autodefesa. O episódio foi decisivo para a consolidação de sua candidatura à Presidência. Na campanha de reeleição, fundamentou a imagem de “Dilma, coração valente”, que acabou usada no segundo turno para conquistar o apoio de setores de esquerda que haviam apoiado Marina Silva (PSB) ou Luciana Genro (PSol) no primeiro.

A tese de que “os fins justificam os meios”, atribuída ao pensador italiano Nicolau Maquiavel, norteou a narrativa eleitoral petista. Dilma Rousseff usou e abusou de mentiras para derrotar seus principais adversários Marina Silva e Aécio Neves. Fez campanha anunciando “mais mudança”, vendeu um país em forte expansão da economia e contínua elevação dos níveis de emprego e renda.

Prometeu mundos e fundos, mesmo sabendo que nada disso era possível. Escondeu os verdadeiros dados da economia, com manobras contábeis que agora estão sendo julgadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), as chamadas “pedaladas fiscais”. Caso suas contas sejam rejeitadas, Dilma pode ser enquadrada em crime de responsabilidade, passível até de impeachment.

Delação premiada

Dilma garante que “nunca” se encontrou com Ricardo Pessoa desde que assumiu a Presidência. Ao explicar que as doações da UTC foram legais, a presidente ressaltou que não aceita e “jamais” aceitará qualquer irregularidade sobre ela ou sobre sua campanha. “Se insinuam, têm interesses políticos”, protestou.

Destacou que o seu adversário no segundo turno da corrida presidencial de 2014, também recebeu contribuições da construtora UTC. “A minha campanha recebeu dinheiro legal, registrado, de R$ 7,5 milhões. Na mesma época que eu recebi os recursos, pelo menos uma das vezes, o candidato que concorreu comigo recebeu também, com uma diferença muito pequena de valores. Eu estou falando do Aécio Neves.”

Dilma pode estar falando a verdade, mas nada impede que esteja mentindo outra vez. Ricardo Pessoa teve a sua “delação premiada” aceita pelo relator do processo que investiga a participação de políticos na Operação Lava-Jato, ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki. Um dos integrantes da Corte nomeados por ela, nem de longe pode ser acusado de fazer o jogo da oposição.

Como se sabe, o delator precisa apresentar robustas comprovações de que suas informações são verdadeiras para esse tipo de delação ser aceita. Mas as declarações de Dilma podem ter a conotação de que Pessoa foi obrigado a confessar suas atividades criminosas, depois de pressionado por delegados, por procuradores e pelo juiz federal Sérgio Moro, responsável pelas investigações.

Estaria Dilma insinuando que Ricardo Pessoa sofreu “tortura psicológica”, como argumentam os advogados? Pouco importa. A presidente da República sinaliza para outros envolvidos no escândalo da Petrobras, como o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, que está preso e supostamente à beira de fazer outra “delação premiada”, que não estão sós. Nesse sentido, cede às pressões do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que a acusava de nada fazer para defendê-los.

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