Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Cotrreio Braziliense - 18/06/2015
Dificilmente o
governo conseguirá explicar o que não tem explicação, a não ser como
evidente abuso de poder econômico na campanha eleitoral
A presidente Dilma Rousseff
recebeu prazo de 30 dias do Tribunal de Contas da União (TCU) para
explicar o que andou fazendo de errado como gestora dos recursos
públicos no ano da reeleição, uma decisão unânime e inédita da Corte,
que põe na berlinda a chefe do Executivo. Em seu parecer, o presidente
do TCU, o ministro Augusto Nardes, relata que técnicos do TCU indicaram
31 “achados”, ou irregularidades, nas contas de Dilma, dos quais o
tribunal pretende pedir esclarecimentos de 13, número cabalístico para
os petistas, diretamente à Dilma. À luz da Lei de Responsabilidade
Fiscal, cometeu “crime de responsabilidade”. Como se sabe, esse é um dos
motivos previstos na Constituição para o impeachment do presidente da
República.
Dilma se elegeu graças às “pedaladas fiscais” feitas
pelo governo durante o ano passado, deduz-se das contas da União.
Algumas são flagrantes violações da legislação vigente: omissão de
dívidas da União com o Banco do Brasil, BNDES e FGTS nas estatísticas da
dívida pública de 2014; adiantamentos concedidos pela Caixa Econômica
Federal à União para despesas dos programas Bolsa Família,
Seguro-Desemprego e Abono Salarial nos exercícios de 2013 e 2014;
adiantamentos concedidos pelo FGTS à União para despesas do Programa
Minha Casa, Minha Vida nos exercícios de 2010 a 2014; adiantamentos
concedidos pelo BNDES à União para despesas do Programa de Sustentação
do Investimento (PSI) nos exercícios de 2010 a 2014; pagamento de dívida
contratual junto ao FGTS sem a devida autorização orçamentária no
exercício de 2014.
Estatais também gastaram mais do estava
previsto no Orçamento de Investimento. Entre elas, a Telebrás; a
Transmissora Sul Litorânea de Energia S.A. (TSLE) e Furnas-Centrais
Elétricas S.A, que executaram recursos acima do limite autorizado para a
fonte de financiamento, sejam recursos próprios, recursos para aumento
do patrimônio líquido e operações de crédito. Três estatais
ultrapassaram o limite global de dotação, considerando a soma de todas
as fontes de financiamento. São elas: Araucária Nitrogenados S.A.,
Energética Camaçari Muricy I S.A. (ECM I) e Transmissora Sul Litorânea
de Energia S.A. (TSLE).
Além disso, a União deixou de cortar
despesas conforme previsto no Decreto 8.367/2014. A economia deveria ter
sido de pelo menos R$ 28,54 bilhões. Outra denúncia grave é a acusação
de que o governo liberou recursos (na execução orçamentária de 2014)
para influir na votação do PLN 36/2014, que mudou a meta fiscal prevista
para o ano passado, exatamente para impedir que Dilma fosse enquadrada
em crime de responsabilidade antes da posse. Com as contas no vermelho, o
governo enviou ao Congresso um projeto de lei para reduzir a meta de
superávit primário (a economia feita para pagar parte dos juros da
dívida pública), que passou de R$ 116 bilhões para R$ 10,1 bilhões.
Manobras
Também
foi feita uma inscrição irregular em restos a pagar (os valores já
empenhados de anos anteriores e que não foram executados) de R$ 1,367
bilhão no programa Minha Casa, Minha Vida no exercício de 2014 e houve
omissão de pagamentos da União para o Banco do Brasil, o BNDES e o FGTS
nas estatísticas dos resultados fiscais de 2014. Ou seja, as “pedaladas
fiscais” foram feitas para fraudar os resultados do superávit primário
naquele ano. Além disso, o TCU critica também a existência de distorções
em parte significativa das informações sobre indicadores e metas
previstos no Plano Plurianual 2012-2015. Durma-se com o barulho.
Tradicionalmente,
os ministros do TCU lidam com esses assuntos de forma política, mas
desta vez os erros e maquiagens na prestação de contas são tão
grosseiros que não dá para simplesmente ignorar o relatório técnico e o
pedido de rejeição das contas feito pelo procurador da República Júlio
Cesar de Marcelo. A decisão de ontem, convocando Dilma a se explicar,
foi salomônica, mas nem por isso menos desmoralizante. Dificilmente o
governo conseguirá explicar o que não tem explicação, a não ser como
evidente abuso de poder econômico na campanha eleitoral.
Se as
contas serão rejeitadas ou não pelo TCU é outra história. Caso fossem
votadas ontem, com certeza, o seriam; depois das explicações, é melhor
deixar acontecer do que tentar adivinhar a nova posição dos ministros. O
fato é que Dilma novamente tornou-se refém do PMDB, que comanda o
Senado e a Câmara. Suas relações com os presidentes das duas Casas,
Renan Calheiros (PMDB-AL) e Eduardo Cunha (PMDB-RJ), vão de mal a pior.
As contas precisam ser aprovadas pelo Congresso, o que não acontece desde 2002, mas não existem precedentes de o TCU tê-las previamente rejeitado.
É aí que o tombo da bicicleta pode resultar numa tremenda crise
política.
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