Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 09/06/2015
O que acontece no país, em decorrência do ajuste fiscal e da recessão, é uma onda de desemprego,
cujas consequências sociais e políticas complicam a vida da
presidente Dilma Rousseff e abalam a liderança sindical petista
A presidente Dilma Rousseff lança hoje o Plano de Concessões em
Infraestrutura e Logística com a esperança de virar o jogo e oferecer
aos agentes econômicos uma agenda positiva. Na verdade, o Palácio do
Planalto corre atrás do prejuízo. Desde a aprovação da lei das parcerias
público-privadas, que passou a vigorar em dezembro de 2004, o maior
obstáculo à realização de investimentos em infra-estrutura no país foi a
teimosia da presidente da República, que insistia em estabelecer taxas
de retorno para os negócios com as quais as empresas interessadas não
concordavam.
Circulava até uma piada entre os executivos,
comparando o comportamento do cariocas, do paulista e do gaúcho em
conversas sobre negócios: o primeiro indagaria: Quanto é que nós vamos
ganhar? O segundo: Quanto é que eu vou ganhar? E o terceiro: Quanto é
que tu vais ganhar? Dilma, apesar de mineira, pensaria como os gaúchos. E
foi ao gaúcho Arno Augustin, então secretrário de Tesouro, que
encarregou de fazer as contas de quanto as empresas e o governo
ganhariam nas concessões. O resultado foram sucessivas licitações e
leilões sem interessados no negócio, principalmente no caso das
ferrovias.
Dilma acabou mudando a legislação para tentar
viabilizar seu programa de investimentos em infraestrutura. Em dezembro
de 2014, ou após dez anos perdidos, a Lei 12.766, precedida pela MP 575,
introduziu alterações importantes nas parcerias público-privadas. A
principal diz respeito à redução do prazo mínimo para o acionamento pelo
parceiro privado do Fundo Garantidor. Também foram flexibilizadas as
exigências quanto aos estudos de engenharia. Espera-se que as mudanças
atraiam mais investimentos em rodovias, portos, aeroportos e,
principalmente, ferrovias, que ontem corriam o risco de ficar fora do
pacote de hoje pelos motivos de sempre.
De acordo com o ministro
do Planejamento, Nelson Barbosa, a ideia é manter leilões sistemáticos
das concessões, à semelhança do que é feito hoje nas licitações de
blocos de exploração de petróleo e de fornecimento de energia elétrica
para o mercado regulado. O BNDES deverá participar como financiador do
pacote, estimado entre R$ 100 e 120 bilhões, o que seria o bastante para
alavancar a economia. Vem daí a esperança da presidente Dilma Rousseff
de que o país sairá da recessão até o final do ano.
Pacto rompido
Esse
é o otimismo de Brasília. O que acontece no país, porém, em decorrência do ajuste fiscal e da recessão, é uma onda de desemprego,
cujas consequências sociais e políticas complicam a vida da
presidente Dilma Rousseff e abalam a liderança sindical petista. O setor
mais atingido é o automotivo. Rompeu-se o “pacto” iniciado durante o
governo Itamar Franco, que pavimentou a ascensão política do PT a partir
de uma forte estrutura sindical. O acordo automotivo entre montadoras,
sindicatos e governo garantia desonerações tributárias e financiamentos
para as empresas, estabilidade no emprego e aumentos reais de salário
para os metalúrgicos, mais poder para os sindicatos e tranquilidade
social para o Palácio do Planalto.
O que começou com a volta do
“fusca”, o que parecia um capricho do presidente Itamar, virou um eixo
do modelo macroeconômico brasileiro, que trocou o transporte coletivo
pelo “carro popular” como política de mobilidade urbana, que inundou de
veículos as cidades do país. Mantido no governo de Fernando Henrique
Cardoso, o ”acordo automotivo” foi ampliado ainda mais no governo Lula,
chegando ao ápice com as medidas anticíclicas adotadas pelo ex-ministro
Guido Mantega. Agora, a festa acabou.
A produção de veículos no
Brasil caiu 25,3% em maio, na comparação com o mesmo mês de 2014. Foram
montadas 210,1 mil unidades, entre automóveis, comerciais leves,
caminhões e ônibus. Em abril, o montante chegou a 217,6 mil, o que
resulta em uma queda de 3,4%. A produção retornou ao ano de 2005, sendo
que a de caminhões a maio de 1999. Somente de janeiro a maio, o
encolhimento foi de 19,1%, com 1,09 milhão de unidades produzidas, ante
1,35 milhão no mesmo período do ano passado.
Esse cenário
desolador, principalmente no ABC, tem forte impacto na base petista, que
questiona o ajuste fiscal e pede a cabeça do ministro da Fazenda,
Joaquim Levy. Ele está sendo tratado como bode expiatório da crise pelos
militantes do PT, que realizará seu congresso no final de semana e
ameaça condenar a atual política econômica. No domingo, a presidente
Dilma foi obrigada a defender Levy, ao dizer que o seu ministro da
Fazenda não pode ser tratado como um “judas”. Ontem, foi a vez do
vice-presidente Michel Temer defender Levy, comparando-o a Jesus Cristo.
Exagerou.
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