Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Brazilinse - 28/06/2015
O ex-presidente Lula joga como quem pretende sacrificar a rainha
para salvar a própria pele. É um tipo de manobra que exige mais do que a
excelência do jogador, pressupõe uma situação na qual isso valha a pena
No jogo de xadrez, a peça mais
valiosa depois do rei é a rainha. Mesmo assim, seu valor é relativo,
pois pode ser compensador sacrificar a rainha se houver ganho nisso.
Jogadores de xadrez costumam antecipar mentalmente as jogadas seguintes,
alguns até 15, 20 lances, e sabem quando uma posição estratégica é
robusta o suficiente para decidir o jogo antes mesmo de um xeque-mate.
Por essa razão, entre os grandes mestres, é comum o derrotado não
esperar o desenlace da partida para se retirar da disputa.
É
comum ouvir os petistas compararem a presidente Dilma a um jogador de
damas, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao de xadrez. A
primeira se movimenta de maneira diagonal; o segundo, de forma muito
mais complexa. Com os últimos acontecimentos da Operação Lava-Jato, o
jogo político está mais para o xadrez, sem trocadilho.
Vamos
supor, então, que Lula seja o rei. O ex-presidente da República, nas
últimas semanas, joga como quem pretende sacrificar a rainha
para salvar a própria pele. É um tipo de manobra que exige mais do que a
excelência do jogador, pressupõe uma situação no tabuleiro que valha
realmente a pena.
Grosso modo, há quatro jogadas de sacrifício da
rainha: para forçar um xeque-mate no adversário; capturar a rainha
adversária numa troca vantajosa; limpar o caminho para um “peão passado”
que substitua a rainha sacrificada; ou forçar uma sequência que ofereça
real vantagem estratégica no tabuleiro. Aparentemente, nenhuma dessas
situações se apresenta para que Lula possa entregar Dilma aos
adversários e se safar de um xeque-mate.
Vejamos: o Palácio do
Planalto foi pego completamente de surpresa pela aceitação da “delação
premiada” do empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da UTC, pelo ministro
Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF). Ao contrário do que
se imaginava, a denúncia chegou à presidente Dilma, acusada de receber
R$ 7,5 milhões provenientes do esquema de propina da Petrobras, e
envolveu os ministros da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e da
Comunicação Social, Edinho Silva, seu tesoureiro de campanha, além de
ex-ministros, parlamentares da base aliada e até da oposição.
O sacrifício
Dilma
viajou ontem para o encontro com o presidente dos Estados Unidos,
Barack Obama. Joaquim Levy seguiu em voo comercial, contra recomendação
médica devido à embolia pulmonar que o levou a ser hospitalizado de
véspera, sinal de que já não dá conta das pressões que sofre. A situação
da economia é desastrosa, o ajuste fiscal está sendo sabotado pela
própria base e cresce no PMDB a tese de afastamento do PT, cujo desgaste
com a Lava-Jato só aumenta.
É nesse cenário que o ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, que também foi citado na delação como
beneficiário de R$ 2,5 milhões do esquema, desembarcará amanhã em
Brasília. Vem se reunir com senadores e deputados petistas. Lula faz
críticas à Dilma, ao governo e ao PT de forma sistemática, às vezes para
que se tornem públicas. Aparentemente, desistiu de mandar na
presidente, que chama de cabeça dura. Ultimamente, convoca os ministros
petistas para reuniões no Instituto Lula e conversa com os aliados à
revelia da presidente da República.
O objetivo de Lula é fazer o
PT retomar a iniciativa no Congresso, onde a legenda está cada vez mais
isolada. Para Lula, as bancadas petistas estão à matroca, desde a
convocação de seu fiel escudeiro Paulo Okamotto pela CPI da Petrobras.
As reações de Lula são de quem está antevendo um xeque-mate, para voltar
à linguagem do xadrez.
Além do petardo disparado por Ricardo
Pessoa contra o governo Dilma e ele próprio, Lula sabe que o
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, está prestes a fazer a
denúncia contra os políticos citados nas “delações premiadas” do
ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto da Costa e do doleiro Alberto
Youssef. Candidato à reeleição, Janot tem duas opções: apresentar a
denúncia amanhã ou terça-feira, antes do recesso do Judiciário, ou
somente em agosto.
Caso os presidentes do Senado, Renan Calheiros
(PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sejam denunciados,
como tudo leva a crer, dificilmente ambos deixarão de atribuir o fato a
uma articulação do próprio Palácio do Planalto para empatar o jogo e
bloquear a possibilidade de um impeachment da presidente da República.
Seria uma tentativa de virada de mesa, derrubando o tabuleiro. Esse
recrudescimento da crise que abala a República pode resultar no
sacrifício da rainha. Qual será a jogada de Lula para evitar o
xeque-mate?
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