quarta-feira, 2 de julho de 2014

Um debate inevitável

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 02/06/2014

De todas as variáveis negativas que atrapalham a reeleição da presidente Dilma Rousseff, a baixa expansão da economia é a mais importante, pois, de fato, tornou a eleição uma disputa aberta
 

Vinte anos após o Plano Real, cuja paternidade divide com o presidente Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso volta à ribalta do processo eleitoral, em plena Copa do Mundo e na largada da campanha. O ex-presidente aproveita a efeméride para subir o tom das críticas à presidente Dilma Rousseff, acusando-a de leniência com a inflação, e busca resgatar seu legado na condução da economia. Como o PT agarra com as duas mãos a comparação entre os governos de FHC e do ex-presidente Luiz Inácio lula da Silva, o debate sobre a inflação ocupa cada vez mais espaço na disputa eleitoral.

A presença de Pérsio Arida, ex-presidente do Banco Central (BC) no segundo mandato de FHC, no centro da campanha do candidato do PSDB à Presidência da República, senador Aécio Neves, acirra a polêmica. Tanto FHC como o candidato tucano advertem o risco de descontrole de preços num momento em que o próprio BC admite que o dragão fugirá da gaiola nos próximos meses, com a inflação ultrapassando o teto da meta de 6,5%. As previsões são de que serão necessários dois anos para trazer a inflação de volta ao centro da meta, de 4,5%, mantidos os parâmetros que hoje o governo adota para gerir a economia.

Para FHC, o governo menospreza a busca pela redução da inflação, limita-se a não ultrapassar o teto da meta inflacionária, mas, como há muitos preços represados por decisão governamental, esse risco aumenta. “Não creio que seja iminente nem que estejamos diante do que aconteceu no passado, mas é preciso mudar a atitude leniente e estar sempre de olho no que já está indexado”, adverte. Essa é a outra face da moeda da estratégia adotada ainda no governo Lula para enfrentar a crise mundial: mais crédito público e mais consumo. Como não foi dada a devida atenção à produtividade e à atração de investimentos produtivos, a conta está ficando alta. E todos os indicadores da economia, inclusive o superavit fiscal, preocupam os analistas.

Em campanha para a reeleição, a presidente Dilma Rousseff rebate as críticas meio na defensiva, mas atirando pra cima do governo de Fernando Henrique Cardoso. Afirma que as críticas tucanas, traduzidas em ações governamentais, resultariam em redução do salário real e aumento do desemprego. Aproveita as oportunidades para ressaltar que o governo Lula, cujos louros tenta capitalizar, enfrentou a crise com mais empregos e transferência de renda e não com privatizações de empresas públicas. Dilma foi eleita graças a essa política, com o Brasil crescendo, em 2010, a uma taxa de 7,5% do PIB, ao contrário do que acontece neste ano, em que ela disputa a reeleição, pois a previsão do PIB para 2014, segundo o BC, não passará de 1,6%.

Efeito Copa
De todas as variáveis negativas que atrapalham a reeleição da presidente Dilma Rousseff, a baixa expansão da economia é a mais importante, pois, de fato, tornou a eleição uma disputa aberta, na qual, porém, a política propriamente dita ganha mais centralidade. Não é à toa que a candidata petista é obrigada a fazer acordos humilhantes com pequenos partidos da base, como foi o caso da substituição do ministro dos Transportes, para ganhar mais tempo de propaganda na televisão. Enquanto isso, o principal candidato de oposição, Aécio Neves, nada de braçada nas articulações dos palanques regionais, minando as bases eleitorais da candidata governista em grandes colégios eleitorais, como o Rio de Janeiro e o Ceará, onde, na eleição passada, Dilma esteve absoluta.

O ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, candidato do PSB, ao lado da ex-senadora Marina Silva, também busca sair do confinamento eleitoral, aproveitando-se do debate sobre a inflação. Dá uma no cravo e outra na ferradura, ou seja, encampa tanto as críticas dos tucanos ao atual governo, como a dos petistas ao governo de FHC. É pura política também o esforço feito pelo Palácio do Planalto para capitalizar a Copa do Mundo, evento esportivo e turístico internacional cujo sucesso é indiscutível. Fala-se até que a presidente Dilma decidiu comparecer à partida final no Maracanã, que vaia até minuto de silêncio, para entregar o troféu ao vencedor, como reza o protocolo do evento.

Cada vez mais eletrizante, com disputas duríssimas, nas quais as seleções favoritas — Brasil, Alemanha, Argentina,  Bélgica, Colômbia, Costa Rica, França e Holanda — prosseguem com dificuldades crescentes, a Copa do Mundo apaixona o país, encantado com a invasão de torcedores estrangeiros. Ninguém sabe, a rigor, qual será o impacto da Copa no processo eleitoral, mas pesquisas para aferir o que está acontecendo já foram para a rua. Assim como havia um cenário pessimista antes da Copa, depois da euforia atual, teremos uma espécie de volta à calma, reflexivo, quando será feito o devido balanço do que foi efêmero e do que é permanente em tudo isso. É aí que entram gastos com estádios, as obras dos aeroportos, os investimentos em mobilidade urbana e o tema da violência cotidiana. Nessa hora, a inflação será uma espécie de tara da balança. 

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