Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 10/07/2014
Faltou combinar com Müller, Klose (2), Kroos, Khedira e
Schürrle (2), como diria Mané Garrincha. Felipão ficou perplexo diante
da ofensiva alemã, sem entender o que estava acontecendo.
Ninguém
imaginava o que aconteceu no Mineirão, nem há explicação satisfatória
para o vexame da Seleção Brasileira na semifinal contra a Alemanha. A
derrota deprimente por 7 x 1 será estudada nos mínimos detalhes por
técnicos de futebol pelos próximos 50 anos, pelo menos aqui no Brasil,
como já aconteceu com a derrota na Copa de 1950, para o Uruguai. A
diferença é que não dependeu de uma jogada fortuita, como a de Ghiggia
no Maracanazo, que virou o placar para 2 x 1 contra nós. Foi uma goleada
definida em seis minutos mágicos de futebol, nos quais foram marcados
quatro dos cinco gols alemães do primeiro tempo. O de honra do Brasil só
saiu nos minutos finais, quando o placar já estava praticamente
definido por mais dois gols alemães, num lampejo individual e isolado de
Oscar.
O jogo ainda não havia terminado, porém, já circulava na internet uma
piada infame: um gaiato dizia que nem na Segunda Guerra Mundial
(1939-1945) um povo sofrera tanto como os brasileiros, o que é uma
rematada tolice, diante do morticínio que houve. Basta lembrar apenas os
6 milhões de judeus mortos no Holocausto, 10% do total. Mas essa
comparação sem sentido vem a calhar porque o esquema tático armado pelo
técnico Luiz Felipe Scolari — para substituir Neymar e Thiago Silva —
parecia uma espécie de Linha Maginot, o sistema de fortificações
construído pelos franceses para barrar a invasão alemã.
André Maginot, um ex-combatente da Primeira Guerra Mundial
(1914-1918), era o ministro da Guerra em 1927 e tinha certeza de que a
Alemanha e a Itália, por causa do Tratado de Versalhes, entrariam em
confronto com a França. Ele morreu de uma overdose de ostras estragadas,
em 1932, sem ver seu plano executado. Ao preço de 5 bilhões de francos,
porém, foi construída uma espécie de muralha da China subterrânea,
entre 1930 e 1936, com 100km de extensão, paralela à fronteira
franco-germânica. Com suprimentos próprios de energia, munição e
alimentos, tinha 108 edificações principais (fortes), a 15km de
distância umas das outras, mais construções menores e casamatas
interligadas por ferrovia.
Virou um case militar de erro de conceito: os franceses se prepararam
para uma “guerra de posições”, nas quais a infantaria e a artilharia
combateriam entrincheiradas, como na Primeira Guerra Mundial. Mas a
invasão alemã, em 1940, apesar de previsível, surpreendeu o Exército
francês porque as divisões blindadas contornaram as fortificações pela
extremidade oeste, na fronteira com a Bélgica, que declarara
neutralidade, e na região de Sedan, próxima a Luxemburgo, onde as
fortificações não foram concluídas por falta de recursos. O Exército
francês foi cortado ao meio e se rendeu. O mundo assistiu com espanto à
queda de Paris e à dramática retirada de ingleses, belgas e franceses
encurralados nas praias de Dunquerque.
Ataques-relâmpago
A comparação com o que
aconteceu no Mineirão, porém, faz mais sentido por causa dos mortíferos
ataques alemães no primeiro tempo, uma blitzkrieg na grande área
brasileira, executada aos 10, aos 22, aos 23, aos 24 e aos 29 minutos de
jogo. No conceito de “guerra de movimento”, a palavra alemã significa
guerra relâmpago, para evitar que as forças inimigas tenham tempo de
organizar a defesa. Os elementos essenciais são o efeito surpresa, a
rapidez das manobras e a brutalidade do ataque, com objetivo de
desmoralizar o inimigo e desorganizar suas forças, paralisando os
centros de controle. O criador dessa tática militar foi o marechal
alemão Eric von Manstein, que foi condenado em Nuremberg por crimes de
guerra, mas teve a pena reduzida durante a Guerra Fria e ajudou a
Alemanha Ocidental a reorganizar o seu Exército.
Parece que Luiz Felipe Scolari adotou a tática da “guerra de posições”,
como os franceses. Escalou o time e disse onde cada jogador deveria
jogar contra a seleção alemã, como se fosse possível, num jogo de Copa
do Mundo, decidir na prancheta como impor o medíocre padrão de jogo da
nossa Seleção. Faltou combinar com Müller, Klose (2), Kroos, Khedira e
Schürrle (2), como diria Mané Garrincha. Felipão ficou perplexo diante
da ofensiva alemã, sem entender o que estava acontecendo. A defesa
brasileira, desorientada, perdeu qualquer capacidade de reação. Era o
ponto forte do Brasil até a saída de Thiago Silva. O ataque brasileiro,
que já era fraco, simplesmente havia deixado de existir, antes mesmo do
jogo começar, com a saída de Neymar.
Ao explicar o que aconteceu, Luiz Felipe Scolari preferiu dar destaque
ao fato de a Seleção ter chegado a uma semifinal de Mundial pela
primeira vez desde 2002. Em 2006 e em 2010, fomos eliminados pela França
e, depois, pela Holanda, respectivamente, nas quartas de final.
Minimizou a derrota: “O normal era vitória nossa ou deles. São duas
grandes equipes. Pelo resultado ser por esse número de gols, ficará para
a história”, disse. “Tivemos seis minutos em que deu pane geral. Isso
não é o que imaginávamos. Vamos trabalhar para montar o time do jogo de
sábado, que passa a ser importante e um outro sonho.” Que venha a
seleção da Holanda!
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