terça-feira, 5 de agosto de 2014

Trapalhadas oficiais

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 05/08/2014

A equipe de governo não pode agir como “tropa de assalto” na eleição. É mais ou menos o que teria acontecido na CPI da Petrobras, em cujos trabalhos funcionários do Palácio do Planalto e da direção da empresa teriam interferido.


É tênue e sinuosa a linha que separa o permitido do proibido em matéria de participação de autoridades e funcionários públicos em campanhas eleitorais. O que torna a situação mais ambígua e complexa é o fato de candidatos à reeleição ao Executivo — como a presidente Dilma Rousseff e alguns governadores — concorrerem a um novo mandato no pleno exercício do cargo. Isso torna a disputa evidentemente desigual e facilita o envolvimento indevido da máquina pública na campanha eleitoral.

 Talvez seja esse o fator mais perverso do instituto da reeleição, que muitos defendem por garantir a continuidade administrativa, enquanto outros criticam porque avaliam que dois mandatos contíguos obstruem a renovação política e favorecem a formação de oligarquias.

Com os instrumentos de poder à mão e o marketing eleitoral, quem governa goza de favoritismo nas eleições. Mesmo assim, a reeleição da presidente Dilma Rousseff subiu no telhado por causa do fracasso da política econômica e do mau desempenho do governo em áreas como saúde, segurança e educação, além de transportes e energia.

O marqueteiro João Santana, porém, avalia que nada disso terá a importância que a oposição imagina porque Dilma disporá de muito mais tempo de televisão do que os adversários. Ou seja, a partir do próximo dia 19, quando começa a campanha eleitoral de rádio e tevê, a presidente da República passaria a ter duas grandes vantagens estratégicas: o exercício do cargo e o horário eleitoral gratuito. 

Autopromoção
Mas voltemos ao divisor de águas. Na semana passada, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu multar em R$ 7,5 mil o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, por propaganda eleitoral antecipada. Em 15 de junho, no Palácio do Planalto, o ministro convocou uma coletiva para fazer comparações entre as administrações anteriores dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso, o discurso oficial para mascarar os resultados negativos do governo.

Na véspera, havia ocorrido a convenção nacional do PSDB, que oficializou a candidatura de Aécio Neves à Presidência da República, ocasião em que os integrantes do partido fizeram críticas à presidente Dilma. “O representado não se limitou a rebater críticas ao governo federal. Ao meu ver, ele transbordou conteúdos desconectados da convocação da entrevista”, declarou a ministra Maria Tereza, relatora do caso.

Os ministros Henrique Neves e Luciana Lóssio chegaram a defender que Mercadante fosse penalizado também por conduta vedada, mas esse não foi o entendimento majoritário. No mesmo dia, porém, o TSE manteve a decisão de não punir a presidente Dilma Rousseff por propaganda eleitoral antecipada devido ao pronunciamento em cadeia de rádio e televisão no Dia Internacional da Mulher. 

Nesse caso, a ministra Maria Teresa alegou que não houve autopromoção. Entretanto, o ministro Teori Zavascki corroborou a tese de que o exercício do cargo já é vantagem estratégica na eleição: “O próprio fato de aparecer na mídia sem mesmo fazer um pronunciamento já significa uma vantagem. O fato de a presidenta fazer um pronunciamento no Dia da Mulher já significa uma vantagem eleitoral, o que não quer dizer propaganda institucional”.

 Responsabilidades
A equipe de governo não pode agir como “tropa de assalto” na eleição. É mais ou menos o que teria acontecido na CPI da Petrobras, em cujos trabalhos funcionários do Palácio do Planalto e da direção da empresa supostamente interferiram para proteger os investigados. É uma situação recorrente para quem acompanha os bastidores do Congresso, mas, dessa vez, parece que ficaram as impressões digitais.

Não chega a ser um caso de Código Penal, a não ser que se aceite a inquinação de advocacia administrativa quanto aos servidores envolvidos (Art. 321 — Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário). Há, porém, fortes indícios de que houve improbidade administrativa, que é um ilícito de natureza civil. Um assessor direto do ministro das Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, é citado no vídeo. Haveria, assim, interferência indevida e vedada do Poder Executivo e da Petrobras sobre o Legislativo.

Além disso, caso os fatos se confirmem, não se pode descartar a eventual imputação de crime de responsabilidade para ministros eventualmente envolvidos. Até a presidente Dilma correria esse risco, caso estivesse envolvida, pois a Constituição entende, no art. 85, que “são crimes de responsabilidade os atos do presidente da República que atentem contra a Constituição e, especialmente, contra: (…) o livre exercício do Poder Legislativo”. 

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