O plano da Casa Branca previa o apoio militar a um governo provisório e o desembarque de tropas se houvesse intervenção cubana ou soviética em apoio a João Goulart. Foi aprovado pelo presidente Kennedy
Um dos temas mais controversos sobre 1964 é a ameaça de um desembarque
de tropas norte-americanas no Brasil, caso o presidente João Goulart
decidisse resistir ao golpe de Estado que o derrubou. Como se sabe, o
golpe foi deflagrado pelo general Mourão Filho, que deslocou tropas de
Juiz de Fora (MG) para o Rio de Janeiro, em 31 de março, ação que
surpreendeu os próprios conspiradores, com exceção do governador de
Minas, Magalhães Pinto, que estava em linha direta com o embaixador
norte-americano Lincoln Gordon. A divulgação dos documentos relativos
aos governos Kennedy e Johnson pela Casa Branca, ao longo dos anos,
reforçou a tese de que a causa principal do golpe foi a Guerra Fria e
não, necessariamente, fatores políticos internos, como a crise
econômica, a quebra de hierarquia nas Forças Armadas e as eleições
presidenciais marcadas para 1965.
O que foi a Guerra Fria? Uma
corrida armamentista protagonizada pelos Estados Unidos e pela União
Soviética. Os soviéticos acreditavam que o equilíbrio
estratégico-militar permitiria o avanço dos comunistas e seus aliados
nos países da América Latina, da África e da Ásia, que se libertavam do
colonialismo. Os Estados Unidos apostavam em intervenções militares para
deter esse avanço, mas dependiam de apoio interno para serem
bem-sucedidos. A tentativa de instalação de mísseis soviéticos em Cuba,
em 1962, a pedido de Fidel Castro, após a fracassada invasão da Baía dos
Porcos por exilados cubanos, deixara o mundo à beira de um conflito
nuclear.
Milhões de dólares
A Operação
Brother Sam foi concebida nesse contexto, a partir de uma reunião entre o
presidente John Kennedy e o embaixador norte-americano no Brasil,
Lincoln Gordon, da qual também participou o secretário assistente de
Estado Richard Goodwin. Gordon defendeu a tese de que os Estados Unidos
deveriam deixar claro para a oposição a Jango que não eram contra um
golpe militar. Deu-se, a seguir, o seguinte diálogo:
Gordon — Ele (Goulart) está entregando o maldito país aos…
Kennedy — Aos comunistas.
Goodwin — (…) Nós podemos muito bem querer que eles (a oposição) assumam o poder até o fim do ano, se puderem.
Conta
o historiador Carlos Fico, no pequeno grande livro O Golpe de 1964 (FGV
Editora) que Kennedy autorizou a remessa de US$ 5 milhões para
financiar a campanha da oposição a Goulart em 1962. Não foi suficiente
para desestabilizar o governo. Depois, cancelou uma viagem ao Brasil e
despachou em seu lugar Robert Kennedy, secretário de Justiça, em outubro
de 1962, para pressionar Jango a demitir assessores e controlar os
gastos públicos.
Não foi preciso
Jango
havia assumido o poder depois de um acordo com as forças políticas que
elegeram Jânio Quadros e tentaram impedir sua posse, após a renúncia do
presidente da República. Depois do triunfo eleitoral de 1962, convocou
um plebiscito para restabelecer o presidencialismo. Sua vitória foi
esmagadora, mas deixou-o em minoria no Congresso. Diante disso, Kennedy
determinou a elaboração de um “plano de contingência” para a
eventualidade de Jango instalar uma “república sindicalista” e perder o
controle do país para os comunistas, como sugeria o embaixador Lincoln
Gordon, que estava em contato com os conspiradores brasileiros.
O
plano da Casa Branca previa o apoio militar a um governo provisório e o
desembarque de tropas se houvesse intervenção cubana ou soviética em
apoio a João Goulart. Foi aprovado pelo presidente Kennedy antes de ser
assassinado, em 1963. Mas serviu de base para o presidente Lindon
Johnson mobilizar um porta-aviões, um porta-helicópteros, seis
contratorpedeiros e quatro petroleiros para eventual apoio ao governador
de Minas, Magalhães Pinto, e ao general Mourão Filho, em 31 de março de
1964. Como João Goulart não reagiu ao golpe, a operação foi abortada
pelo general Castello Branco, que disse a Gordon que o apoio militar
norte-americano era dispensável.
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