Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 21/10/2015
A
possibilidade de responderem ao processo em liberdade, mesmo
com as medidas cautelares, poria fim à proliferação de “delações
premiadas” entre os réus considerados “homens-bomba”
Um dos
executivos presos na Operação Lava-Jato costuma dizer aos colegas que a
ficha demora a cair quando se entra em cana: “A gente só aceita a dura
realidade quando a alma entra na cela”. Ele faz parte de uma elite de
diretores de empreiteiras que não aceitou fazer delação premiada, porque
teve garantia de seus acionistas majoritários de que teria bons
advogados, a família protegida e a participação garantida no que restar
do patrimônio das empresas.
Esse também é o
pacto feito pelo empresário Marcelo Odebrecht e os executivos de sua
empresa que continuam presos. Segundo o Ministério Público Federal,
Rogério Araújo, era representante da Odebrecht nos contatos com a
Petrobras e o responsável direto pelo pagamento das propinas; e Márcio
Faria da Silva, no cartel das empreiteiras e envolvido diretamente na
negociação e pagamento das propinas.
Mas parece
que a alma do executivo finalmente entrou na cela. É dramático o pedido
de habeas corpus apresentado ontem pela sua defesa: “O requerente pede
socorro! A higidez do sistema pede socorro! O Estado Democrático de
Direito pede socorro! Os direitos humanos pedem socorro! E do Supremo
Tribunal Federal espera-se a concessão de habeas corpus de ofício, no
ponto, para cassar-se o terceiro teratológico decreto de prisão
preventiva”.
Marcelo Bahia Odebrecht e seus
executivos tiveram na segunda-feira um novo e terceiro decreto de prisão
preventiva, expedido na última pelo juiz Sérgio Moro, que
conduz os processos do caso na primeira instância da Justiça Federal.
Por considerar risco à ordem pública e à aplicação da lei penal, também
foi decretada nova prisão preventiva contra Renato Duque, ex-diretor de
Serviços da Petrobras.
Na avaliação da defesa,
“houve extrema violência e com completa falta de isenção ao impor nova
prisão preventiva ao requerente” pelos mesmos fatos do primeiro decreto
de prisão. O quadro é verdadeiramente grave e assustador. “A prosperar
medidas dessa natureza no contexto da denominada Operação Lava Jato
ter-se-á permitido a instauração entre nós de um verdadeiro sistema de
supressão episódica de direitos e garantias constitucionais.”
O
Ministério Público acusa o grupo de pagar propina de R$ 137 milhões,
entre 2006 e 2014, em contratos de terraplenagem em diversas obras da
Petrobras. Em nota, a Odebrecht disse que “chama atenção” o fato de a
nova denúncia ter sido aceita pela Justiça “horas após o Supremo
Tribunal Federal conceder habeas corpus a um dos ex-executivos da
empresa — e sem que tenham sido apresentados fatos novos em relação à
denúncia anterior.”
Batalha jurídica
A
nova prisão preventiva veio num momento em que os meios jurídicos
apostavam em mais uma invertida do ministro Teori Zavascki do Supremo
Tribunal Federal (STF) no juiz federal Sérgio Moro, depois do fatiamento
da Operação Lava-Jato, que tirou da jurisdição de Curitiba as
investigações não diretamente relacionadas aos contratos da Petrobras,
como o caso da Eletronuclear.
A expectativa foi
criada pelo habeas corpus concedido por Teori ao ex-executivo da
Odebrecht Alexandrino Alencar, na sexta-feira passada, sob o fundamento
de que, assim como outros executivos de empreiteiras que saíram da
cadeia, a prisão preventiva pode ser substituída por medidas cautelares,
como o comparecimento mensal em juízo, vedação de manter contato com
outros investigados e proibição de deixar o país. Alexandrino também
precisou entregar o passaporte em até 48 horas.
Em
razão dessa decisão, Moro tomou a iniciativa de revogar a prisão
preventiva de César Rocha, outro executivo ligado à Odebrecht, que
estaria envolvido diretamente na forma de repasse dos valores utilizados
para pagamento das propinas, segundo a denúncia contra ele. No
despacho, Moro diz que a decisão é uma extensão do benefício concedido a
Alexandrino na liminar de Teori.
O pedido de
habeas corpus de Marcelo Odebrecht tem o mesmo fundamento do impetrado
por Alexandrino, assim como os anteriormente também apresentados por
Rogério Araújo e Márcio Faria. Para os advogados dos réus, a revogação
da prisão preventiva de Marcelo e dos dois executivos pelo STF será uma
mudança de rota na Operação Lava-Jato.
A
possibilidade desses réus de responderem ao processo em liberdade, mesmo
com as medidas cautelares, poria fim à proliferação de “delações
premiadas” entre os acusados considerados “homens-bomba”, como o ex-diretor
da Petrobras Renato Duque e o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto.
Seria também uma espécie de alto lá na atuação do juiz Sérgio Moro, que é
acusado de parcialidade pelos advogados dos réus, embora a maioria dos
recursos impetrados contra suas decisões, até agora, tenham sido
rejeitados em segunda e terceira instâncias.
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