Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 03/02/2015
Pressionados pela opinião
pública e pelos órgãos de controle, os políticos resolveram estabelecer
regras mais rigorosas para as doações de campanha
O Senado derrubou ontem o financiamento de empresas a partidos e a
candidatos. Os senadores alteraram o texto aprovado pela Câmara, que
previa um limite de R$ 20 milhões para as doações de empresas aos
partidos. O projeto volta para a Câmara onde deve causar grande
polêmica.
O financiamento eleitoral é o nervo exposto da política
nacional hoje — não a política dos cidadãos, que se exerce no dia a dia
da sociedade, mas a política dos políticos, principalmente em campanha
eleitoral. O fundo partidário, que tem financiamento público,
recentemente foi triplicado, mas serve para manter o funcionamento dos
partidos; quando nada, para manter seus dirigentes principais. É um
nervo exposto porque a Operação Lava-Jato colocou em xeque o modelo
atual, como veremos mais adiante.
Pressionados pela opinião
pública e pelos órgãos de controle, os políticos resolveram estabelecer
regras mais rigorosas para as doações, muito mais com a preocupação de
se protegerem do que de garantir mais transparência aos gastos de
campanha. A proposta aprovada pela Câmara, por exemplo, proíbe a doação
de empresas a candidatos, mas na prática são eles que farão a captação e
receberão o grosso dos recursos, como, aliás, já acontece. É uma
maneira de camuflar o lobby que fazem em benefício das empresas
doadoras.
A proposta também determina que cada partido possa
receber doações de até 0,5% da receita da empresa doadora, ou seja, caso
a empresa opte por doar o teto de 2% da receita, o valor deverá estar
diluído entre ao menos quatro siglas. Pelo texto, as pessoas físicas
podem fazer doações a candidatos ou partidos, de até 10% dos rendimentos
que obtiveram no ano anterior à eleição. Essas regras somente serão mantidas
se houver objeção ao fim do financiamento privado por parte da Câmara, para onde o projeto voltará
depois de concluída a votação no Senado.
Volta à pauta o financiamento público de campanha, uma bandeira
que o PT empunhou com ardor, em parte para se defender das acusações de
envolvimento no processo do “mensalão”, a famosa Ação Penal nº 470
julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), e no escândalo da
Petrobras. Foi sepultada na Câmara e, agora, ressuscitada pelo Senado, onde foi derrotada a
tese de que a proposta fortaleceria em demasia a cúpula dos partidos e
ainda provaria um desequilíbrio nas disputas eleitorais, pois
favoreceria os candidatos de riqueza pessoal elevada, em detrimento dos
demais.
Toda essa discussão, entretanto, tem por pano de fundo a
crise de financiamento das campanhas eleitorais, depois que a legislação
pôs na ilegalidade uma velha tradição da política brasileira: o “caixa
2” de campanha, geralmente formado a partir do superfaturamento de
contratos, desvios de verbas públicas e favorecimentos em licitações. O
que distinguia o político honesto do desonesto era uma linha sinuosa,
que apartava quem utilizava os recursos para a campanha propriamente
dita e aquele que se apropriava do dinheiro para formar patrimônio.
Essa
linha divisória, porém, nunca existiu para a opinião pública, muito
menos para os órgãos de controle e fiscalização — como o Tribunal
Superior Eleitoral (TSE), o Ministério Público e a Polícia Federal.
Doações
O
estouro da boiada ocorreu com o chamado “mensalão”, cuja existência o
PT nega até hoje. Consistiu num esquema de propina para financiamento da
base do governo Lula no Congresso. A tese de defesa do ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva e do PT, orientada pelo então ministro da
Justiça, Márcio Thomaz Bastos, um grande advogado e jurista, foi de que
de tudo não passou de “caixa 2” para a campanha eleitoral, que teria
sido financiada por um empréstimo bancário.
Escaldado pelo
mensalão, o PT optou por outro esquema mais sofisticado nas campanhas de
2010 e 2014, cuja execução ficou a cargo do ex-tesoureiro João Vaccari
Neto, que se encontra preso preventivamente, em razão da Operação
Lava-Jato. O escândalo da Petrobras revelou um bilionário esquema de
desvio de recursos da empresa e de outras estatais, a partir da formação
de um cartel entre as maiores empreiteiras do país e outras empresas,
que em alguns casos existem apenas para lavar dinheiro.
O PT
sustenta que todas as doações que recebeu na campanha foram legais e
declaradas ao TSE, assim como a maioria dos políticos envolvidos. Uma
parte dos recursos desviados foi movimentada através de contas no
exterior e foi parar na conta pessoal de muitos envolvidos, que estão no
sal. Mas o que foi parar na campanha como doação legal ensejará uma
grande polêmica jurídica, cujo desfecho pode marcar uma renovação dos
costumes políticos do país e promover um strike no Congresso e nos
partidos políticos.
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