Correio Braziliense - 04/11/2014
Dilma tem dificuldades para dialogar com o Congresso, mais ainda com a oposição, que poderia funcionar como uma espécie de contrapeso em certas ocasiões pautadas pelo fisiologismo governista
A estratégia de jogar o desgaste dos partidos e dos políticos perante a opinião pública exclusivamente nas costas do Congresso pode ser conveniente para a presidente Dilma Rousseff ganhar tempo. Existe a possibilidade de um strike no mundo político em decorrência das denúncias da Operação Lava-Jato, que apura os escândalos da Petrobras, no qual estariam envolvidos 80 parlamentares, ligados principalmente ao PT, ao PMDB e ao PP. Mais isso é uma espécie de quanto pior, melhor que não condiz com a condição de liderança principal do país.
Por falar nisso, quanto pior, pior mesmo. Na pauta da Câmara, estão propostas que comprometem ainda mais o equilíbrio fiscal do país: o fim da contribuição de inativos; a equiparação de salários de presidente da República, vice, ministros de Estado, senadores, deputados federais, ministros do Supremo Tribunal Federal; Orçamento Impositivo; aumento do Fundo de Participação dos Municípios, entre outros. No Senado, consta o projeto que muda o indexador da dívida de estados e municípios com a União.
Acontece que a presidente Dilma, durante a campanha, escondeu o maior rombo das contas públicas desde o Plano Real, revelado alguns dias após a eleição. Não pode brincar com isso, sob pena de provocar um colapso na economia.
À compulsória
Tem ainda na pauta do Congresso demandas quentes do Judiciário, como a que pleiteia aumentos de 22%, muito acima dos 5% propostos no Orçamento. Mas a proposta mais cabeluda é outra: a chamada PEC da Bengala, que amplia de 70 para 75 anos a data-limite de aposentadoria de ministros do STF. É como tirar um doce da mão de uma criança, pois a presidente Dilma deixaria de indicar mais cinco ministros, totalizando assim 10 ministros indicados pelos governos petistas.
O último dos moicanos será o ministro Gilmar Mendes, indicado no governo Fernando Henrique Cardoso, que ontem deu entrevista à Folha de S.Paulo. Ele adverte que o PT poderia subjugar a Corte com essas nomeações, transformando-a numa espécie de tribunal bolivariano. A tese parece até antipática aos seus pares, mas serve para legitimar a mudança de prazo para a compulsória dos ministros por um Congresso insatisfeito com o governo.
A oposição
Dilma tem dificuldades para dialogar com o Congresso, mais ainda com a oposição, que poderia funcionar como uma espécie de contrapeso em certas ocasiões pautadas pelo fisiologismo governista. Essa dificuldade é ampliada pelo fato de que é comum ouvir entre as lideranças do Congresso que a presidente da República não costuma cumprir os acordos feitos sob pressão. Nem da base, quem dirá da oposição.
Os acenos feitos pela presidente da República à oposição caíram num vazio, quando nada porque ela não fez nenhuma referência aos adversários, principalmente Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (PSB). O senador Aloysio Nunes Ferreira, líder do PSDB e vice na chapa de Aécio, chegou a dizer que Dilma “não tem autoridade moral” para pedir diálogo, numa alusão aos duros ataques que fez durante a campanha contra Marina, no primeiro turno, e Aécio, no segundo.
O comportamento da oposição é ainda uma incógnita. O PSB não sabe ainda o que fará. Uma manifestação convocada pelo PSDB no sábado serviu de palco para grupos de extrema direita, que pediram o impeachment de Dilma. Quem está chocando esse ovo da serpente? A corrupção no governo, o discurso esquerdista e bolivariano do PT ou a retórica udenista da oposição? O quanto pior, melhor, seja lá de quem for, levará mais água para esse moinho.
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