quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Pediu pra sair, Levy?

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 17/12/2015

O líder do governo faz uma emenda ao Orçamento da União, a presidente da República acolhe a proposta e o ministro da Fazenda se desmoraliza de vez
 
 
Neófito na política, ainda mais numa conjuntura mórbida como a que o país atravessa, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, chega a ser patético ao comentar o anúncio do rebaixamento da nota de crédito do Brasil pela agência de classificação de risco Fitch: “Nós temos que partir em defesa do Brasil”, disse, ao sair de um encontro com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
 
A retórica nacionalista é um velho expediente de governos enfraquecidos, alguns costumam até arranjar um clima de guerra com os vizinhos, como a Venezuela, por exemplo. Mas não se encaixa no figurino do atual ministro da Fazenda, que está sendo derrubado do cargo pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, o grande ideólogo da nova “matriz econômica”, que não perde uma chance de fazer um contraponto ao colega que deveria liderar a equipe econômica.

Deveria é a expressão mais correta, porque Levy não lidera mais nada. Foi desautorizado pelo líder do governo na Comissão Mista do Orçamento, Paulo Pimenta (PT-RS), que apresentou uma emenda reduzindo a meta de superavit fiscal de 2016 de 0,7% para 0,5% do Orçamento da União. A rigor, isso também não quer dizer muita coisa, uma vez que o Palácio do Planalto está mais preocupado em gastar do que em economizar recursos.

Em tempos idos, o então ministro da Fazenda do governo Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, na implantação do Plano Real, mirando o superavit fiscal, se opôs ao aumento real do salário mínimo, posição defendida publicamente pelo líder do governo na Câmara, Roberto Freire, com apoio do presidente da República. O ministro da Fazenda bateu o pé, Itamar recuou e não restou a Freire a não ser alternativa de pedir demissão da liderança. O deputado Luís Carlos Santos (PMDB-SP) assumiu o seu lugar.


No governo Dilma Rousseff, o líder do governo faz uma emenda sob encomenda do Planejamento, a presidente da República acolhe a proposta e o ministro da Fazenda se desmoraliza de vez. Deveria pegar o boné e ir pra casa na hora, pois o mercado já não acredita no que fala. Ainda mais depois de um ano que começou com uma meta ambiciosa de R$ 56 bilhões de superavit fiscal e terminou com um rombo de R$ 120 bilhões.


A presidente da República propôs aos parlamentares a redução da meta de superavit primário das contas públicas para R$ 30,58 bilhões — o equivalente a 0,5% do PIB — com uma regra de abatimento até o montante desse mesmo valor, que funcionará como uma banda de flutuação de 0% a 0,5% do PIB. Levy defendia a todo custo a manutenção da meta em 0,7% do PIB (R$ 43,8 bilhões), compromisso feito a ele pela própria presidente Dilma depois que o Brasil perdeu o grau de investimento pela Standard & Poor’s.

Guinada à esquerda


O ministro da Fazenda havia ameaçado deixar o governo caso sua proposta não fosse aceita, mas até agora não saiu. Faz o mesmo papel ridículo do ex-ministro Guido Mantega, que permaneceu no cargo esperando o sucessor durante meses a fio. Na verdade, Dilma sinaliza uma guinada à esquerda na política econômica, em razão dos acordos que fez com os movimentos sociais para que a defendam contra o impeachment.


O mecanismo aprovado indica que o governo vai gastar mais do que arrecada, já que o superavit poderá ser zerado para pagamento de restos a pagar processados de investimentos (despesas contratadas em um ano e pagas no seguinte), ações de vigilância sanitária, combate a endemias e reforço do SUS, ações de combate à seca, segurança hídrica e mitigação dos efeitos e recuperação de áreas afetadas por desastres.


Ou seja, as obras do PAC, o combate à epidemia de Zika, o Bolsa Família e a ajuda aos atingidos pelo desastre ambiental de Mariana servirão de pretexto para quebrar o país. Se o orçamento já larga sem compromisso com o superavit, o resultado previsível ao final do próximo ano é mais deficit fiscal e aumento da dívida pública. Tanto que ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, já canta de galo: “É preciso dispor de espaço para acomodar oscilações não previstas de despesas e, sobretudo, de receitas”, explicou.

Segundo ele, o exemplo mais eloquente da necessidade de flexibilizar metas é a queda de arrecadação. “O gasto previsto está sendo cumprido, mas as receitas ficaram muito aquém das estimativas”, diz ele. Por que será? O governo já pôs a culpa na recessão, na inflação e do desemprego na crise mundial; agora, responsabiliza a Operação Lava-Jato e a proposta de impeachment de Dilma defendida pela oposição. É muita cara de pau essa inversão entre causa e efeito, mas faz parte do jogo.


Como se sabe, uma sucessão de intervenções desastradas de Dilma na economia, desde que assumiu o cargo, provocou a crise que o país atravessa, num cenário internacional que já não era o de expansão do mercado de commodities agrícolas e minerais. Além disso, certas mudanças demográficas que ajudaram o governo a combater a miséria, agora atuam no sentido contrário, por seu impacto na Previdência Social.


Erros desestruturadores da economia, em países continentais, costumam ter consequências catastróficas. Se o governo insistir em voltar à chamada “nova matriz econômica”, como parece ser a intenção de Dilma Rousseff, o país correrá o risco de entrar num longo período de depressão com inflação ascendente, que já é o cenário de 2016.

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