Diante do colapso do mercado financeiro internacional, da perplexidade do mundo empresarial e das incertezas nas principais economias do mundo, o Brasil seria uma espécie de “elo fraco” da globalização?
Por Luiz Carlos Azedo
Alguma coisa está fora da ordem no projeto Dilma 2010. No plano eleitoral, a estratégia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para sua sucessão pode ser bem-sucedida, depende das circunstâncias e da ajuda dos candidatos de oposição. A questão é outra. O projeto econômico que emerge com a candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, lembra o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) do governo Geisel, na década de 1970, que foi volatilizado pela crise do petróleo, a incapacidade de financiamento do setor público e o esgotamento do processo de substituição de importações.
O colapso
Há muitas polêmicas sobre as causas da queda do Muro de Berlim e do fim da União Soviética e a subsequente hegemonia do neoliberalismo, mas algumas são aceitas por todos. Por exemplo, o fato de que o avanço tecnológico do Ocidente, com a informática, as telecomunicações, os novos materiais, a miniaturização, a biogenética e os sistemas de produção flexíveis, colocou em xeque modelos baseados fundamentalmente na grande indústria mecanizada e no planejamento estatal centralizado. Essa foi a base objetiva do colapso do “socialismo real”, que não acompanhou uma economia na qual os capitais circulavam cada vez mais rápido e os mercados estavam sincronizados pela desregulamentação financeira. A China sobreviveu porque se adaptou ao processo e endureceu a repressão aos que contestam o Partido Comunista.
Agora, estamos vendo o desfecho desse processo nas economias capitalistas. As inovações tecnológicas proporcionaram aumento da produtividade, mas a massa salarial não acompanhou a superprodução, sobretudo na China. O consumo, principalmente nos Estados Unidos, foi financiado pelo crédito ilimitado, que alavancou as principais instituições financeiras. Foi a vez de Wall Street entrar em colapso, dando início a essa crise sem precedentes desde a Grande Depressão de 1929. No plano político, uma surpresa: os falcões do complexo militar industrial norte-americano e os lobbies petrolíferos, que mandaram e desmandaram no governo Bush, foram derrotados por Barack Obama. Um cenário diferente daquele que havia durante e após a II Guerra Mundial.
O projeto
A ministra Dilma Rousseff conquistou a posição de principal integrante da equipe ministerial e candidata à sucessão de Lula . Se qualificou, durante seis anos de governo, como melhor gerente dos negócios do Estado junto aos interesses públicos e privados. Numa linha de ampliação do dirigismo estatal na economia, Dilma travou uma luta surda contra a equipe econômica para que a política do “mais do mesmo” — juros altos, câmbio flutuante e superávit fiscal — fosse flexibilizada. No lugar da meta de inflação, a de crescimento. Na verdade, essa contradição foi mitigada pela expansão da economia mundial. Mas a crise chegou por aqui justamente quando o Brasil ultrapassava taxas de 5% de crescimento do PIB.
É nessa conjuntura nova que emerge com força o projeto protagonizado pela Casa Civil. Que modelo é esse? A grosso modo, se inspira no velho processo de substituição de importações e no planejamento governamental da Era Vargas. Para garantir os investimentos, mais atuação dos bancos oficiais, dos fundos de pensão e das agências reguladoras junto às grandes empresas do país. Para assegurar a demanda, ampliação das políticas sociais para a população de baixa renda, expansão dos gastos públicos e da massa salarial do funcionalismo. Tudo sob comando de uma nova burocracia federal, engajada partidariamente, menos liberal que a tradicional. Uma espécie de novo “capitalismo de Estado”, que ainda é visto com ingenuidade pela esquerda petista como uma suposta antessala do socialismo.
Diante do colapso do mercado financeiro internacional, da perplexidade do mundo empresarial e das incertezas nas principais economias do mundo, o Brasil seria uma espécie de “elo fraco” do globalização? Não acredito. Sem entrar no mérito da qualidade dos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), tal modelo é meio “asiático”, sem sustentação a longo prazo. É prisioneiro da velha economia do petróleo, da exploração mineral, das velhas plantas industriais e da monocultura de exportação, enquanto os países centrais, justamente os mais atingidos pela crise, buscarão construir saídas mais sustentáveis, com base em novas fontes de energia, novas tecnologias, novos materiais, etc. Enfim, explorar as fronteiras do conhecimento e uma nova relação com meio ambiente para se desenvolver e melhorar a qualidade de vida.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
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