Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 20/01/2016
A Operação Lava-Jato, ao desnudar os
meandros patrimonialistas de um modelo econômico que entrou em colapso,
pôs em discussão as relações entre o Estado, a economia e a sociedade
Grosso
modo, a ciência política e a economia hierarquizam os fatos sociais de
acordo com o seu tempo de duração: os de curto prazo são acontecimentos
limitados a um determinado momento e local; os de média duração são
conjunturais e transbordam ao local e ao momento; os de longa duração,
estruturais e projetam-se para uma ou mais gerações, regiões ou países. A
dialética do tempo, porém, pode ser mais complicada. É a desconstrução
do tempo como pura continuidade de pontos, uma série infinita ou a linha
que se estende do passado ao futuro, ou seja, a noção
passado-presente-futuro. Mas o agora (“passado-presente”) é a verdade do
tempo, o tempo real.
Nesse caso, o futuro é
infinito e negativo, pois resulta da oposição entre passado e presente.
Por isso, podemos dizer que a retórica do “nunca antes neste país”, como se fosse
possível apartar o passado do momento em que estamos vivendo, chegou ao
esgotamento. O país mergulhou numa incrível espiral negativa, um
redemoinho diabólico, difícil de sair. E precisa fazer escolhas muito
difíceis, que não dependem apenas do governo federal, do Congresso ou da
Justiça, embora um desses poderes tenha que apontar a verdadeira
saída.
O tempo passa de forma diferenciada na
economia e na política. Ontem, o FMI divulgou relatório no qual anunciou
que Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil deve sofrer queda de 3,5%
este ano — em outubro, a projeção era de contração de 1%. Isso, depois
de ter encolhido 3,8% em 2015, em estimativa também revisada para baixo
(a queda prevista antes era de 3%), segundo o relatório Perspectiva
Econômica Global, divulgado ontem. Em 2017, o FMI aponta que o Brasil
deve registrar estagnação econômica, com crescimento zero, em vez da
expansão de 2,3% esperada antes.O desempenho da economia brasileira
ficará bem aquém da região de América Latina e Caribe como um todo,
cujas expectativas são de recuo de 0,3% do PIB em 2016, e crescimento de
1,6% no próximo ano.
Não se pode esperar um
cenário externo muito favorável, em razão dos preços mais baixos do
petróleo e da expectativa de estabilização dos Estados Unidos em vez de
recuperação da força. Os mercados emergentes e economias em
desenvolvimento, para os quais estão voltadas hoje as exportações
brasileiras, estão enfrentando uma nova realidade de crescimento mais
baixo, com forças cíclicas e estruturais afetando o tradicional
paradigma de crescimento. Ou seja, o tempo necessário para o Brasil sair
da recessão e retomar o crescimento será maior do que aquele que o
governo vem anunciando. Pagamos o preço dos erros cometidos por um
governo cuja prioridade é preservar o poder, ainda que isso signifique
desorganizar as atividades econômicas e sacrificar a população. Não
existe saída de curto prazo para a economia.
Prisioneiro do passado
O
tempo na política tem um calendário eleitoral fixo, alternando eleições
municipais com as estaduais e nacionais a cada dois anos. Entramos num
ano de disputas municipais, mas os problemas locais são agravados pela
situação nacional. A crise econômica leva ao colapso os serviços
públicos e as administrações locais. As eleições não resolverão a
situação local nem a nacional. A crise pode até se agudizar depois
delas. A opção, seria aguardar 2018, quando acaba o mandato da
presidente Dilma Rousseff. O que acontecerá até lá? Ninguém sabe.
Essa
é uma visão linear do tempo na política, como uma sucessão de pontos ou
uma linha reta. No momento, digamos assim, o passado e o presente se
digladiam em busca de uma saída, que pode ser o impeachment de Dilma,
como defende uma parte da oposição, ou a realização de novas eleições,
como prega a outra. Ocorre que essa opção, por uma série de razões, está
bloqueada. Os grandes partidos são favorecidos pelo atual sistema
eleitoral; pequenos partidos de aluguel servem de válvulas de escape
para as contradições na base do governo. As intervenções do Judiciário
no processo eleitoral, erráticas e intempestivas, ao contrário de
reformar o sistema eleitoral e partidário, complicaram ainda mais o
cenário. Ou seja, na política, o presente ainda está aprisionado pelo
passado.
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