Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 24/02/2014
Declarações do ministro Adams foram duramente contestadas por auditores e
procuradores. Deram a impressão de que a Controladoria-Geral da União
(CGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU) seriam transformados em
pizzarias da Lava-Jato
Uma das modalidades mais praticadas de pesca artesanal é a de tarrafa,
uma rede circular com pequenos pesos distribuídos em torno da malha.
Exige grande perícia do pescador, pois precisa se abrir completamente e
ser atirada no momento exato, para cair sobre o cardume com o máximo de
diâmetro e, assim, reter a maior quantidade possível de peixes.
Quando
o pescador puxa a tarrafa, a circunferência se fecha e prende os
peixes. Dependendo da largura da malha, aprisiona pescado de todo
tamanho, desde que o mesmo não tenha força suficiente para rompê-la,
como é o caso dos tubarões. Um marlim, por exemplo, que é robusto e
salta para a liberdade, jamais poderia ser pescado dessa forma. Em mãos
amadoras, se for lançada no local errado, uma tarrafa pode trazer toda
sorte de detritos.
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot,
está como o pescador que prepara uma tarrafa. Nos bastidores da Operação
Lava-Jato, comenta-se que pretende abrir inquérito contra 20 senadores e
80 deputados com mandato, a maioria já enrolada em outros processos em
tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF). Deve incluir nas suas
decisões a investigação de pelo menos três governadores em exercício do
cargo, ministros de Estado, além de políticos que perderam as eleições e
até dois que já morreram. Será uma tarrafada como nunca antes houve
neste país.
Somente os políticos com provas mais que suficientes para
uma condenação serão denunciados imediatamente, o que incluiria um
ex-presidente da República. Mais da sexta parte da Câmara e quase um
quarto do Senado seriam envolvidos nas investigações, o que deve
provocar uma grande confusão no Congresso, cujos caciques ficarão na
berlinda, inclusive alguns da oposição, e ampliar o espectro do
escândalo para gregos e baianos.
Como o mar não está pra peixe, os
presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ), se preparam para a pescaria. Houve mudanças na direção
das tevês das duas Casas e as comissões mais estratégicas para lidar com
eventuais pedidos de cassação serão comandadas por aliados de ambos. A
nova CPI da Petrobras precisa ser domada para não fugir ao controle,
como ocorreu com a dos Correios, que resultou no processo do mensalão.
Delação premiada
Nos
bastidores da Operação Lava-Jato, pressões e chantagens aumentaram de
intensidade às vésperas do carnaval. João Santana, novo presidente da
Constran, holding da UTC, é um dos inconformados com a situação das
empresas envolvidas no escândalo, que não estão recebendo dinheiro do
governo. Anda chutando o balde.
Entre as fornecedoras da Petrobras, a
Jaraguá Equipamentos e Alumini já pediram recuperação judicial à
Justiça. A OAS e Engevix vão pelo mesmo caminho. O Estaleiro Atlântico
Sul (EAS), das construtoras Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, rompeu o
contrato de construção de sete sondas do pré-sal com a Sete Brasil.
Desde novembro os cinco estaleiros responsáveis pela construção de 29
sondas estão sem receber. Esses contratos somam US$ 25 bilhões.
A
grande expectativa é em relação ao dono da UTC Engenharia, Ricardo
Pessoa, que está preso em Curitiba e é apontado como o coordenador das
empreiteiras envolvidas no escândalo da Petrobras. Ele teve duas
propostas de delações premiadas recusadas pelo Ministério Público
Federal. Seus advogados não são especialistas nesse tipo de acordo,
embora criminalistas muito experientes.
Pessoa está sendo
pressionado pela família a contar tudo o que sabe, mas os procuradores
acreditam que estaria omitindo informações sobre a Eletrobras e outros
políticos envolvidos no esquema, além dos já citados pelo ex-diretor da
Petrobras Paulo Roberto da Costa e pelo doleiro Alberto Yousseff. Até
agora, ele não envolveu ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Nos
meios jurídicos, comenta-se que a prisão dos 11 executivos esteve muito
perto de ser relaxada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), mas o
encontro de alguns advogados com o ministro da Justiça, José Eduardo
Cardozo, pôs tudo a perder. Daria a impressão de que o Supremo estaria
sob a influência do Palácio do Planalto. A imagem do STF tem como
paradigma o julgamento do mensalão, mesmo que os advogados dos réus
questionem a justeza de suas condenações, e os ministros prezam isso.
Outro
tiro no pé do Palácio do Planalto foi o vídeo gravado pelo
advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, defendendo os acordos de
leniência na esfera administrativa com as empresas envolvidas na
Lava-Jato. As declarações foram duramente contestadas por auditores e
procuradores. Deram a impressão de que a Controladoria-Geral da União
(CGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU) seriam transformados em
pizzarias da Lava-Jato.
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