Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 26/05/2015
Eduardo Cunha não está nem
aí para a pressa de Joaquim Levy quanto ao ajuste fiscal, sua prioridade no momento é a aprovação da
reforma política, que ameaçava naufragar na Câmara
O presidente da Câmara dos
Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), tem a sua própria agenda. Ontem,
descartou as pressões dos ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e da Casa
Civil, Aloízio Mercadante, para pôr em votação o projeto de lei que
acaba com as desonerações sobre a folha de pagamento das empresas.
Depois de se reunir com os dois ministros e o vice-presidente Michel
Temer, ontem, no Palácio do Planalto, anunciou que somente porá o
projeto em votação a partir de 10 de junho. Nesta semana, Cunha pretende
votar a toque de caixa a reforma política
Peça importante do
ajuste fiscal proposto pelo governo para reduzir gastos e reequilibrar
as contas públicas, o projeto da desoneração é que deveria ser votado
nesta semana. Mas o líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), relator do
projeto, resolveu criar uma regra de exceção para as desonerações e
forçou o adiamento. Segundo ele, em relação ao setor de transportes, o
aumento dos tributos trabalhistas e previdenciários pode reajustar
passagens de ônibus e de trem. Outros setores que seriam beneficiados
são os de comunicação e de tecnologia da informação, que têm margens
estreitas e são empregadores intensivos. Os produtores da cesta básica e
outros setores da indústria beneficiados pelas desonerações também
fazem lobby no Congresso para serem incluídos na regra de exceção.
Picciani
alega que sua equipe está fazendo cálculos, com base em números da
Receita Federal, para definir quais setores poderiam continuar com o
benefício, mas nos bastidores da Câmara a movimentação dos que serão
atingidos pelo fim das desonerações é grande. A Meca da peregrinação é o
gabinete de Eduardo Cunha, que estaria por trás do posicionamento do
líder do PMDB. Ao lado de outras medidas que sofreram mudanças na
Câmara, como o da Previdência, o fim das desonerações trabalhistas é um
dos assuntos que tiram o sono do ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Desde
quanto classificou de “brincadeira” sua adoção pelo ex-ministro Guido
Mantega, o que gerou mal-estar no governo, Levy defende o fim das desonerações.
Na cúpula do PMDB, porém, muitos avaliam que o governo deveria mudar de
paradigma e, em vez de voltar à cobrança sobre a folha de pagamentos,
fazê-lo sobre o faturamento, ainda mais depois da regulamentação da
terceirização. Ontem, Levy declarou que as “delongas” em torno do ajuste
fiscal não favorecem a retomada do crescimento da economia brasileira.
Segundo ele, as empresas aguardam a aprovação do ajuste para fazer
investimentos.
A fórceps
Cunha não está nem
aí para a pressa de Levy, sua prioridade no momento é a aprovação da
reforma política, que ameaçava naufragar por falta de entendimento entre
os membros da comissão especial encarregados de apreciar o projeto.
Ontem, durante almoço com aliados na residência oficial, Cunha cancelou a
reunião da comissão e detonou de vez o relatório do deputado Marcelo
Castro (PMDB-PI), contrário à aprovação do chamado “distritão”, pelo
qual são eleitos os mais votados em cada estado ou município, sem levar
em conta os votos para o partido ou a coligação. O presidente da
comissão, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), foi designado como um relator
ad doc.
A fórceps, Cunha quer aprovar a coincidência de mandatos
(mantendo 4 anos para deputados e 8 para senadores), o fim da reeleição,
a fidelidade partidária e o “distritão”. Também quer manter a forma de
financiamento tanto pública quanto privada, com um teto para as doações.
Não existe uma maioria clara sobre o conjunto da obra, mas Cunha
acredita que aprovará a reforma assim mesmo. O problema é que ninguém é
capaz de prever o mostrengo político que resultará das votações.
Os
assuntos mais polêmicos são o “distritão”, o fim da reeleição e a
coincidência de mandatos, que muitos interpretam como uma tentativa de
engessar o quadro político-partidário e favorecer o PMDB. A conjuntura
do país, com o surgimento de uma oposição de massas independente dos
partidos políticos, fortaleceu a posição da cúpula do PMDB na condução
da reforma política. O partido seria o mais beneficiado pela sua aprovação. A vitória eleitoral de partidos surgidos de movimentos
independentes, como o Siriza, na Grécia, e o Podemos, na Espanha,
reforça a tentativa de engessar o sistema político brasileiro.
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