Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 12/04/2015
Muitas das decisões de Dilma parecem não ter levado em conta as consequências políticas
Peter
Drucker é quase uma lenda. Misto de guru da administração pública e
ícone do mundo dos negócios, criou conceitos que revolucionaram a gestão
de empresas e influenciaram a administração pública moderna. Para ele, a
coisa mais importante em uma organização são as pessoas.
Comprometimento
é uma palavra-chave. Segundo ele, “uma decisão só se torna eficaz
quando os comprometimentos com a ação são incluídos na decisão desde o
início”. Uma avaliação dos primeiros 100 dias do segundo mandato da
presidente Dilma Rousseff poderia ter como explicação para o fracasso a
falta de comprometimento dos parceiros com as suas decisões.
Por exemplo, Dilma não teve o menor compromisso com o
discurso e as promessas de sua campanha eleitoral. No jargão político da
oposição, o nome disso é “estelionato eleitoral”.
Aumento dos
combustíveis, tarifaço de energia elétrica, desemprego, juros elevados,
aumento de impostos e corte nos direitos trabalhistas são, hoje,
bandeiras da oposição contra o governo. Na campanha eleitoral, porém,
foram apresentadas por Dilma como propostas dos adversários.
Não
é à toa que o senador Aécio Neves (PSDB-MG), derrotado nas urnas na
disputa ao Planalto, aparece hoje nas pesquisas de opinião com muito
mais prestígio do que a presidente da República.
Imperial,
monocrática e voluntarista, a presidente da República colheu, em três
meses e alguns dias, tudo o que plantou de errado ao longo dos quatro
primeiros anos de governo. Isso foi agravado por decisões políticas
intempestivas, de quem pensava que poderia tudo e deu com os burros
n’água.
A agenda do
Planalto, desde a posse no segundo mandato, é negativa, por mais que o
palácio tente inverter o jogo com entrevistas diárias e atos
administrativos. Dilma revelou dificuldades para lidar com a crise
econômica e as pressões políticas. Governa contra a opinião
pública.
A estratégia dela para o desenvolvimento do país, que
chamou de “nova matriz econômica”, revelou-se um fracasso. Seu pior
desempenho foi na área em que se dizia grande especialista: a energia.
O
escândalo da Petrobras, devido à Operação Lava-Jato, pôs à beira do
colapso a estratégia de restauração do capitalismo de Estado como modelo
de desenvolvimento.
A nomeação de Joaquim Levy, um economista
da Escola de Chicago, para ministro da Fazenda, com a missão de executar
um ajuste fiscal monetarista, foi a saída para evitar o colapso da
economia. O economista não só se tornou o principal fiador do governo
perante os empresários como passou a negociar diretamente os termos do
ajuste com os políticos.
Trapalhadas políticas
Muitas
das decisões de Dilma parecem não ter levado em conta as consequências
políticas, a começar pela montagem do seu estado-maior, formado pelos
ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil), Miguel Rossetto
(Secretaria-Geral da Presidência), Pepe Vargas (Relações Institucionais)
e Thomas Traumann (Comunicação Social), que implodiu. Os dois últimos
já nem são mais ministros. A intenção do grupo era minar a influência do
PMDB no Congresso e reduzir a participação do aliado principal no
governo. Deu tudo errado.
Os primeiros sinais do desastre foram a
derrota de Arlindo Chinaglia (PT-SP) na disputa pela Presidência da
Câmara. Eduardo Cunha (PMDB-RJ) impôs uma derrota acachapante ao governo
e agora dá as cartas na agenda legislativa. A ambiguidade no apoio à
reeleição de Renan Calheiros (PMDB-AL) também deixou sequelas, pois o
Palácio do Planalto perdeu o controle da pauta do Senado.
Na
verdade, Dilma fez uma aposta fracassada nos efeitos da Operação
Lava-Jato no Congresso. Faltou noção de que o parlamento tem fuso
horário diferente do Judiciário. Os políticos enrolados nas denúncias,
entres eles os presidentes das duas Casas, sentiram-se acuados e foram
para o tudo ou nada com governo. Já deixaram Dilma de joelhos.
Agora,
depois de uma rocambolesca operação política para substituir o ministro
das Relações Institucionais, Pepe Vargas, Dilma acabou por extinguir a
pasta e entregar a condução política das relações do governo com os
aliados ao vice-presidente Michel Temer, que é o presidente do PMDB e o
sucessor legal dela em caso de impedimento.
Temer passou a ser
tratado pelos políticos como uma espécie de primeiro-ministro. Ninguém
sabe o que vai ocorrer daqui para a frente. A primeira missão dele é
reacomodar os aliados nos segundo e terceiro escalões do governo e
pacificar o PMDB. Nada garante, porém, que a disputa entre os
peemedebistas e o PT arrefeça. Pelo contrário, os sinais exteriores são
de que o conflito aumentará.
A escolha de Temer também não
resolve o problema do governo com a opinião pública, porque o PMDB está
tão desgastado quanto o PT. Pode estabilizar a situação no Congresso
para garantir a aprovação do ajuste fiscal, porém não promove um
reencontro com as ruas. Os políticos torcem para que as manifestações de
hoje sejam menores do que as de 15 de março, que abalaram o país. Se
mais gente for às ruas, a crise política se agravará.
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