Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 21/03/2014
As
razões da tensa relação entre a presidente Dilma Rousseff e o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva são cada vez mais difíceis de
serem diagnosticadas, inclusive dentro do PT. O estresse aumentou com o
imbróglio da Petrobras
Para a psicanálise, o complexo de Édipo é universal e, portanto,
característico de todos os seres humanos. São sentimentos contraditórios
de amor e hostilidade. Metaforicamente, o conceito é visto como amor à
mãe e ódio ao pai. Como o ser humano não pode ser concebido sem um pai
ou uma mãe (ainda que nunca venha a conhecer uma dessas partes ou as
duas), essa relação é a síntese do conflito humano. Em resumo, o
complexo aparece quando a criança percebe que os pais pertencem a uma
realidade cultural e não podem dedicar-se apenas a ela. A figura do pai
representa a inserção da criança na ordem cultural. Ela começa a
perceber que a mãe pertence ao pai e, por isso, dirige sentimentos
hostis em relação a este.
Na política, o velho conflito bíblico
entre a criatura e o Criador surge toda vez que um apadrinhado político
se insurge contra o seu protetor. Quase sempre, decorre de frustradas
tentativas de tutela política, muito mais do que de reações de natureza
psicológica. As razões da tensa relação entre a presidente Dilma
Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, porém, são cada
vez mais difíceis de serem diagnosticadas, inclusive dentro do PT.
Publicamente, Lula apoia a reeleição de Dilma; nos bastidores,
entretanto, Dilma contraria o ex-presidente em assuntos de toda
natureza. Não dá ainda pra afirmar se o caso é de divã ou de uma disputa
surda pelo poder.
O estresse aumentou por causa do imbróglio da
refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, comprada pela Petrobras, uma
operação considerada desastrosa pelo Tribunal de Contas da União (TCU),
mas que sempre foi defendida pela direção da estatal. Ex-presidente do
conselho de administração da estatal, Dilma resolveu responsabilizar o
ex-presidente da empresa Sérgio Gabrielli e o ex-diretor da área
internacional Nestor Cerveró pela decisão. Em nota oficial da
Presidência, levantou suspeitas de que houve fraude nas informações
técnicas que subsidiaram a aprovação da compra pelo conselho. Ou seja,
jogou o problema no colo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que
endossou a compra e nomeou os dois. O negócio custou U$ 1,19 bilhão à
Petrobras.
Bumerangue
A atitude de Dilma
voltou-se contra ela própria. Além de irritar o ex-presidente Lula,
levou água para o moinho da oposição. O senador Aécio Neves (PSDB-MG),
candidato tucano a presidente da República, foi à tribuna cobrar
esclarecimentos e questionou a competência de Dilma na área de sua
especialidade: energia. Ontem, os senadores Pedro Simon (PMDB-RS),
Randolfe Rodrigues (PSol-AP), Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), Cristovam
Buarque (PDT-DF) e Ana Amélia Lemos (PP-RS) decidiram representar contra
Dilma Rousseff na Procuradoria-Geral da República. A intenção é
solicitar esclarecimentos sobre a compra da refinaria.
Na
Câmara, a pedido do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, o líder
do PT, Vicente Paulo da Silva (SP), foi à tribuna para dar explicações
sobre o assunto, na mesma linha adotada pelo Palácio do Planalto. A
parceria estratégica entre a Petrobras e a empresa Astra na refinaria de
Pasadena estaria alinhada com o Plano de Negócios 2004-2010 e no Plano
Estratégico 2015. Tais documentos recomendavam que a empresa buscasse
expandir sua atuação no refino internacional, em especial no setor
americano do Golfo do México e no oeste da África, e que buscasse
agregar valor à produção de óleo pesado da Petrobras.
Esse
sempre foi o discurso da Petrobras, desde fevereiro de 2006, quando
aprovou a parceria estratégica com a Astra, na qual o risco do negócio
seria compartilhado pelas duas companhias, por meio da aquisição de 50%
da refinaria. A Astra havia gasto 126 milhões de dólares (42 milhões de
dólares pela aquisição e mais 84 milhões de dólares em investimentos). A
Petrobras investiu 190 milhões de dólares na aquisição — os outros 170
milhões de dólares do negócio se referem à compra de 50% do estoque de
petróleo que a refinaria possuía naquele momento.
Vicentinho,
porém, reafirmou que o resumo executivo da decisão não fazia qualquer
referência a duas importantes cláusulas do contrato: a Marlim, que
assegurava uma rentabilidade mínima de 6,9% à Astra, independente das
condições do mercado, caso fossem realizados os investimentos para a
expansão da refinaria; e a Put Option, que obrigava a Petrobras a
adquirir a participação da Astra, caso houvesse divergência na condução
da sociedade. “Se tais cláusulas fossem conhecidas pelo conselho, a
deliberação ocorreria em outros termos, sendo provável que o negócio nem
sequer fosse aprovado”, garantiu, de mando, o líder do PT. É ou não é
mais gasolina no fogaréu?
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