O acordo feito pela presidente Dilma Rousseff com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para barrar a chamada pauta-bomba do Congresso — que nada mais é do que a aprovação de projetos que atendem aos lobbies da alta burocracia federal e de grupos empresariais, detonando o ajuste fiscal —, tirou o Palácio do Planalto das cordas.
Dilma voltou ao centro do ringue para lutar contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), cuja oposição ao governo desarticulou completamente a base governista. Como se sabe, Cunha tenta limpar a pauta da Câmara para que as contas de Dilma Rousseff de 2014 sejam apreciadas e rejeitadas, por causa das chamadas “pedaladas fiscais”. Seria o caminho aberto para o impeachment de Dilma por crime de responsabilidade.
Ao mesmo tempo, o vice-presidente Michel Temer, como prova de lealdade, tenta evitar que o Tribunal de Contas da União (TCU) rejeite as contas de Dilma de 2014, o que é considerado tecnicamente difícil. A gravidade das ilegalidades cometidas nas chamadas “pedaladas fiscais” é inequívoca, mas há uma manobra possível: poupar Dilma e responsabilizar o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega e outros integrantes da sua antiga equipe econômica, como o ex-secretário do Tesouro Arno Augustin. Dilma ganhou mais 15 dias de prazo do TCU para se defender.
Com a ajuda do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva — que ontem desembarcou em Brasília e conversou com Michel Temer e demais integrantes da cúpula do PMDB —, Dilma tenta retomar a iniciativa política. Na verdade, porém, quem está dando as cartas no jogo é Renan Calheiros, que se reposicionou em relação ao governo de forma programática.
Enquanto o Palácio do Planalto procurava reagrupar forças oferecendo cargos nos estados e liberando verbas das emendas parlamentares, o tradicional “toma lá dá cá”, Renan preparou um pacote de medidas econômicas — nas áreas tributária, de infraestrutura, fiscal e ambiental — intitulado “Agenda para o Brasil”. Passou a pautar as negociações do governo com o Congresso com foco na superação da crise econômica.
Renan captou as preocupações dos grandes grupos empresariais do país com o agravamento da recessão e a desorganização da economia, na eventualidade de a crise política evoluir na direção do impeachment de Dilma. Também foi capaz de perceber que esses setores interpretaram a condução dada à Câmara por Eduardo Cunha como uma espécie de política do “quanto pior, melhor”, exatamente por causa da pauta-bomba.
A tese do impeachment da presidente Dilma, que vinha sendo urdida nos bastidores do Congresso pelos caciques do PMDB, foi abortada quando Michel Temer, numa declaração ambígua, mas assim interpretada pela maioria, colocou-se como alternativa de saída para a crise. A reação contrária dos grandes grupos econômicos do país, já abalados pela Operação Lava-Jato, foi imediata. Parecia haver um jogo combinado entre Temer e Cunha.
O desgaste de Temer com o episódio foi explorado por Renan, que passou a ocupar o centro da rearticulação das condições de governabilidade. Se antes o vice-presidente da República era o grande fiador da estabilidade do governo, agora é o presidente do Senado que transformou Dilma Rousseff em refém política da Casa. Sem apoio do Senado, que tem a atribuição de julgar os pedidos de impeachment, Dilma não sobreviveria no poder.
Poder instalado
Tudo isso significa que a crise passou e que a situação do governo está resolvida? Nem de longe, pois a Agenda Brasil aprofunda as contradições entre o PMDB e o PT, a começar pela proposta de redução do número de ministérios, que Renan vem defendendo desde o começo do governo Dilma. A propósito, ao contrário do que muitos imaginam, o peemedebista, como presidente do Senado, adotou duras medidas de austeridade.
Como sinal de boa vontade para com Dilma, o presidente do Senado defendeu a aprovação sem emendas do projeto de lei que acaba com as desonerações fiscais — com exclusão de alguns setores. Ou seja, não quer que o projeto volte para a Câmara, onde as mudanças feitas no Senado poderiam ser derrubadas.
Mas há outros pontos de atrito que não foram resolvidos, inclusive na questão tributária, uma vez que o Senado acena com mais recursos para estados e municípios. É bom lembrar que o governador de Alagoas, Renan Filho, filho do presidente do Senado, vive o maior sufoco financeiro, como a maioria dos governadores.
Na briga com Cunha, Dilma conta também com uma reação do poder instalado, particularmente do Ministério Público Federal, do Tribunal Superior Eleitoral e do Supremo Tribunal Federal. A forma como o presidente da Câmara conduz os assuntos com o Poder Judiciário também tem fricções.
Numa corrida contra o relógio, aguarda-se a hora em que o procurador-geral da República Rodrigo Janot, cuja indicação para recondução ao cargo já encaminhou ao Senado, apresentará sua denúncia contra o presidente da Câmara e outros políticos. Não será surpresa se a investigação que abriu contra Renan for arquivada por falta de provas.
Um comentário:
Acabo de descobrir que nada é tão ruim que não possa piorar...
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