Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 26/06/2016
Sarney
revelou-se um dos mais sagazes líderes políticos do país, capaz de se
adaptar às circunstâncias e se antecipar aos fatos. Como agora, ao
anunciar a aposentadoria, para evitar uma provável derrota eleitoral no
Amapá
Dois dos principais
remanescentes da geração de políticos que comandou no Congresso a
transição à democracia estão saindo de cena nestas eleições. O
ex-governador do Rio Grande do Sul Pedro Simon (PMDB), que resolveu pendurar
as chuteiras desde o ano passado, é uma espécie de guardião da ética no
Senado, onde tornou-se um Dom Quixote a investir contra os acordos e
práticas políticas fisiológicas, inclusive de seu próprio partido. A
surpresa foi a decisão do ex-presidente José Sarney (PMDB-MA), que é o grande patriarca do chamado “presidencialismo de coalizão”. Nesta
semana, desistiu de disputar mais um mandato. Sai de cena depois de
receber uma vaia ao lado da presidente Dilma Rousseff, no Amapá, estado
que por três vezes o elegeu ao Senado. Dos dois políticos, porém, é o
que ainda preserva poder de fato na União, com influência real no
Congresso, no Executivo e até mesmo no Judiciário.
O pregador
Simon foi eleito senador na leva de 1978,
depois de três mandatos de deputado estadual no antigo MDB. De origem
trabalhista, tornou-se grande amigo de Ulysses Guimarães, o líder da
oposição legal ao regime militar. Por outro lado, virou adversário de
Leonel Brizola, que havia voltado do exílio, a quem atribuiu a
responsabilidade por sua derrota ao governo do estado nas eleições de
1982, que perdeu para o candidato do PDS, a antiga Arena, Jair Soares.
Coordenou a campanha das Diretas Já e apoiou a eleição de Tancredo Neves
à Presidência.
Com a morte do político mineiro, foi confirmado
no cargo de ministro da Agricultura por José Sarney, que assumira a
Presidência na condição de vice eleito no colégio eleitoral. Fora a
testemunha da negociação política entre o general Walter Pires, ministro
do Exército do último presidente militar, João Batista Figueiredo, e o
presidente do PMDB, Ulysses Guimarães, que garantiu a posse de José
Sarney e o fim do regime.No ano seguinte, elegeu-se governador do Rio Grande do Sul, na onda
eleitoral gerada pelo Plano Cruzado.
Voltou ao Senado nas eleições de
1990 e foi um dos principais articuladores da campanha do impeachment de
Fernando Collor, que renunciou ao mandato por causa das denúncias de
corrupção no seu governo e das articulações para apeá-lo do poder. Líder
do governo Itamar Franco, que assumira a Presidência, desde então
destacou-se como um pregador da ética na política e derrubou vários
ministros sob suspeita de corrupção, inclusive do seu próprio partido.
Tornou-se adversário de Sarney e desafeto do atual presidente do Senado,
Renan Calheiros (PMDB-AL).
O patriarca
Mais longevo político brasileiro ainda
em atividade, José Sarney controla o estado do Maranhão desde quando se
elegeu governador pela primeira vez, em 1966, dois anos após o golpe
militar, que apoiou. Ex-integrante da chamada UDN Bossa Nova, Sarney
revelou-se um dos mais sagazes líderes políticos do país, capaz de se
adaptar às circunstâncias e se antecipar aos fatos. Como agora, ao
anunciar a aposentadoria, para evitar uma provável derrota eleitoral no
Amapá, estado que adotou como uma espécie de “santuário eleitoral”, mas
que hoje é governado por um adversário, João Capiberibe (PSB).
Em
1985, na crise governista provocada pela escolha do ex-prefeito de São
Paulo Paulo Maluf como candidato do PDS à Presidência da República, com o
então governador do Rio Grande do Norte, José Agripino, e o governador
da Bahia, Antônio Carlos Magalhães, liderou a dissidência que apoiou
Tancredo Neves. Porém, não se filiou PFL, mas ao PMDB, para ser o vice
na chapa de oposição. Acabou assumindo a Presidência da República, com
apoio dos militares e de Ulysses Guimarães.
Desafeto de Fernando Henrique Cardoso, em cujo governo foi
marginalizado, tornou-se aliado de primeira hora do ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, já na campanha eleitoral de 2002. Apoiou o governo
Lula em todos os momentos, inclusive na crise do mensalão. Mantém boa
relação com a presidente Dilma Rousseff, cuja reeleição apoia, e tem
aliados em postos estratégicos da administração federal.
Manteve seu
prestígio no governo, mesmo depois que deixou a Presidência do Senado,
com aliados em postos influentes, como é o caso do senador Edison Lobão
(PMDB-MA), atual ministro de Minas e Energia. A governadora do Maranhão,
Roseana Sarney (PMDB), é sua principal herdeira política, uma vez que o
filho Zequinha Sarney (PV-MA) tem uma atuação mais focada em temas
alternativos do que no jogo pesado do poder. Membro da Academia
Brasileira de Letras, o patriarca sempre disse que gostaria de se
dedicar mais aos romances.
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