Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 21/02/2014
Os
caciques do PMDB não vão subordinar seus próprios interesses eleitorais
aos do PT nos estados em troca de ministérios
O companheiro de viagem (Editora Cosac Naify), livro do húngaro Gyula
Krúdi, um dos mais populares de seu país, cunhou uma expressão muito
usada pela esquerda para justificar alianças estranhas ou incômodas.
Escrito em 1918, em meio ao baixo astral que se seguiu à Primeira Guerra
Mundial e ao colapso do Império Austro-Húngaro, o romance narra a
conversa entre dois passageiros de um trem, entremeada por divagações
sobre o passado e incidentes de percurso. A expressão “companheiro de
viagem” define o tipo de relação que a presidente Dilma Rousseff mantém
com o PMDB e outros aliados.
Não deixa de ser uma certa ingenuidade, porém, tratar o PMDB como mero
companheiro de viagem. Essa não é uma aliança da qual a presidente Dilma
possa abrir mão, a esta altura do campeonato, sem pôr em risco a
própria candidatura à reeleição. O maior partido do país, ao contrário
do PT, que surgiu dos movimentos sociais, construiu sua trajetória a
partir do Congresso, onde está encastelado. Sua estratégia eleitoral é
focada no poder local e na preservação do comando do Senado e da Câmara.
A ocupação dos espaços na Esplanada dos Ministérios é consequência
dessa estratégia, não é o seu objetivo central nas eleições. Ou seja, os
caciques do PMDB não vão subordinar seus próprios interesses eleitorais
aos do PT nos estados em troca de ministérios.
O melhor exemplo de como isso se passa vem do Ceará, onde o senador
Eunício de Oliveira (PMDB) pleiteia o apoio do PT à sua candidatura a
governador e não aceita abrir mão da candidatura à sucessão de Cid Gomes
(Pros) para ser ministro da Integração Nacional, um dos cargos mais
cobiçados pelos políticos nordestinos. Líder do PMDB no Senado, Eunício é
tratado como companheiro de viagem. Era um aliado tão bom que chegou a
ministro das Comunicações do governo Lula, mas não serve para ser
governador do Ceará, onde o PT prioriza a aliança com os irmãos Cid e
Ciro Gomes.
Outro companheiro de viagem é o governador do Rio de Janeiro, Sérgio
Cabral (PMDB), principal esteio da eleição de Dilma Rousseff no estado
em 2010. Seu candidato à sucessão é o vice-governador Luiz Fernando
Pezão, que sempre teve boa relação com o Palácio do Planalto. O PT tem
um candidato competitivo ao governo fluminense, o senador Lindberg Faria
(PT), e dele não pretende abrir mão, enquanto a dupla Cabral e Pezão
está em apuros eleitorais. O embate do líder do PMDB na Câmara, Eduardo
Cunha (RJ), com a presidente Dilma Rousseff tem esse por pano de fundo.
Caso fosse apenas uma frustração devido à ocupação de um ministério,
certamente Cunha já teria sido isolado.
Eduardo e Marina
Esse tipo de relação, porém, não é um privilégio da coalizão governista.
Também ocorre entre o PSB do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, e
a Rede, de Marina Silva. A aliança entre os dois não foi um ponto de
chegada, é apenas um ponto de partida. A ex-senadora era a candidata de
oposição com mais densidade eleitoral, mas rompeu com o PV — pelo qual
disputou as eleições passadas e teve 19 milhões de votos — e resolveu
fundar o seu próprio partido. Como não conseguiu registrá-lo em tempo
hábil, ficou sem legenda. Entre se filiar a outro partido para ser
candidata ou apoiar um dos candidatos de oposição, preferiu se aliar ao
governador Eduardo Campos, que foi seu colega de Esplanada no governo
Lula.
Marina Silva não desistiu de ter o seu próprio partido, nem de ser
presidente da República. A Rede trata Eduardo Campos como companheiro de
viagem e faz exigências para Marina compor a sua chapa como vice. Uma
delas é acabar com a reeleição; outra, indicar os candidatos a
governador onde tem aliados ligados à Rede. São os casos de Miro
Teixeira (Pros) no Rio de Janeiro; José Antônio Reguffe (PDT), em
Brasília; e Ricardo Young (PPS), em São Paulo.
Aécio e Agripino
Podemos comparar a aliança do PSDB com o DEM a uma viagem pela
Transiberiana, com seus 9,2 mil quilômetros de Moscou a Vladivostok. A
aliança começou no governo Itamar Franco, tecida pelo então ministro da
Fazenda, Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e pelo falecido deputado Luiz
Eduardo Magalhães, filho do então governador da Bahia, Antônio Carlos
Magalhães, ambos do antigo PFL. Agora, anda meio congelada por causa do
enfraquecimento do DEM e de algumas disputas regionais. Na terça-feira, o
senador Aécio Neves, pré-candidato do PSDB à Presidência da República,
teve uma conversa com o presidente da legenda, senador José Agripino
Maia (RN). A razão do gelo entre as duas agremiações são o vice de Aécio
e o apoio aos candidatos do DEM nos estados. O ex-prefeito César Maia,
no Rio de Janeiro; e o deputado Ronaldo Caiado, em Goiás, não querem ser
apenas companheiros de viagem.
Um comentário:
Fico imensamente contente e feliz de ter a certeza de que o meu irmão Raul, seu pai, onde estiver, está igualmente muito feliz e contente pela pessoa e profissional que você é,meu "sobrinho" Azedo. Cada comentário seu, e os leio diariamente, são verdadeiras aulas de conhecimento político e histórico. o acervo cultural que você acumulou é de fazer inveja aos ditos
"intelectuais." Parabéns
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