O principal acerto do presidente Lula no seu segundo mandato, aquele que possibilitou o desempenho mais positivo do governo em 2008, foi mudar a composição de sua equipe
Por Luiz Carlos Azedo
Tomo emprestado o título do livro de estréia de Marcelo Rubem Paiva para a última coluna do ano por uma razão que nada tem a ver com a obra do seu autor, mas apenas porque resume em três palavras o melhor ano do governo Lula: 2008. Nada de mensalão, nada de cartões corporativos, nenhuma crise grave na Câmara ou no Senado, a economia bombando, a oposição acuada. Foi um período em que a vida do povo melhorou e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ostentou os maiores índices de aprovação.
O acerto
O principal acerto do presidente Lula no seu segundo mandato, aquele que possibilitou o desempenho mais positivo do governo em 2008, foi mudar a composição de sua equipe. Basta comparar o ministério do primeiro mandato com o do segundo, a começar pela cozinha do Palácio do Planalto. No primeiro mandato, todas as decisões políticas do governo pareciam tuteladas por dois atores: os ex-ministros da Fazenda Antonio Palocci e da Casa Civil José Dirceu. Ambos eram figuras poderosas, um era protagonista do governo no campo das relações políticas; o outro, a uma espécie de porta-voz do mercado, que antes da crise mundial, sabemos, ditava o rumo da política econômica. Ambos aspiravam suceder o presidente da República em 2010.
A saída dos dois ministros, num processo de sucessivas crises de governo, com forte repercussão no Congresso, alterou o quadro. Coube ao presidente Lula assumir integralmente o comando, recompor a equipe e partir para a reeleição. O discurso eleitoral já apontava para a mudança de rumo do segundo mandato. A polarização ocorrida na eleição, quando Lula passou a combater um suposto “programa de privatizações” da oposição, foi uma esperteza de campanha. Mas legitimou a elevação do gasto público e maior intervenção do Estado na economia no segundo mandato. Houve uma mudança de eixo da política monetária, cujo foco deixou de ser o combate à inflação já domada e passou a ser a retomada do crescimento. Os fatos subseqüentes, com a crise mundial, acabaram corroborando a necessidade do novo posicionamento.
Lula deixou de ser prisioneiro da luta interna do PT, montou um governo de ampla coalizão com a participação do PMDB, o maior partido do país. A cozinha do Palácio do Planalto é mais autônoma em relação aos partidos. O governo tem em primeiro plano a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, a preferida de Lula para a sucessão em 2010; os demais ministros, vêm em segundo. Mas quem de fato manda é o presidente da República. O resultado foi uma gestão mais eficiente. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), menina dos olhos do governo, ganhou mais importância: é considerado a tábua de salvação para o país atravessar a crise mundial com menos sofrimento. Até recentemente, o governo navegava com a corrente a seu favor, mas basta olhar para os nossos vizinhos — a Argentina, por exemplo — para verificar que o mesmo cenário poderia levar a resultados diferentes.
O resultado
O sucesso do governo Lula em 2008 continuou alavancado por programas sociais para a população de baixa renda e a retomada do crescimento, que veio num a escala sem precedentes nas últimas décadas. Foi graças a isso que a vida do povo melhorou. O crescimento também amorteceu velhos conflitos na área econômica, que envolvem agricultura, desenvolvimento econômico, comércio exterior e meio ambiente. Em segundo lugar, houve uma gestão mais produtiva nas áreas da Educação e da Saúde, com ministros com um perfil mais técnico do que político, o que certamente livrou as duas pastas de novos escândalos. Em contrapartida, o Ministério da Justiça e a área de informações do governo viveram uma confusão atrás da outra, envolvendo as relações do Executivo com o Congresso e o Judiciário.
Talvez a maior omissão do governo Lula seja a ausência de um projeto vigoroso de reforma urbana, que enfrente três problemas. Uma política habitacional de baixa renda de envergadura (1), articulada a um programa de transportes de massas capaz de reorientar a expansão de nossas cidades (2) e um plano de segurança que verticalizasse efetivamente o combate ao tráfico de drogas, de armas e o contrabando, cujos pontos de convergências são corrupção policial, de um lado, e a lavagem de dinheiro, de outro (3). São áreas onde a situação só se agrava. Porém, o governo federal, por causa da repartição constitucional de tarefas entre a União e demais entes federados, prefere tirar o corpo fora ou jogar para a arquibancada.
Publicada hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
quarta-feira, 31 de dezembro de 2008
domingo, 21 de dezembro de 2008
Do céu, só cai chuva
Toda vez que ocorre uma tragédia, a desculpa é a mesma: nunca choveu tanto no local. Na verdade, o país não tem um eficiente sistema de defesa civil
Por Luiz Carlos Azedo
Uma das vantagens estratégicas do Brasil são as condições climáticas. Mesmo onde a natureza é menos favorável, como o sertão nordestino, é possível desenvolver atividades produtivas, com até duas colheitas por ano, principalmente na fruticultura. Nós não temos tragédias naturais, como terremotos, tsunamis, vulcões e nevascas. Desse ponto de vista, o Brasil é um país abençoado. Mas as chuvas por aqui começam a causar grandes tragédias humanas, por causa das mudanças climáticas e do descaso de autoridades.
Clima
As projeções de mudanças climáticas no Brasil levam em consideração dois fatores: a temperatura e as chuvas. Na Amazônia, Nordeste e Sul do Brasil, os modelos prevêem um aumento sistemático dos extremos da temperatura do ar, embora essa também seja uma tendência para o restante do país. Em relação às chuvas, a previsão é dramática: choverá menos na Amazônia e no Nordeste; nas demais regiões, as chuvas intensas serão mais freqüentes.
O El Niño, que resulta do aquecimento das águas do Oceano Pacífico na altura da costa do Peru, sempre foi apontado como o culpado por esses fenômenos severos. Por exemplo, a grande estiagem provocada pelo El Niño de 1998 reduziu consideravelmente as chuvas na Amazônia e tornou as florestas inflamáveis. Naquele ano, 1,3 milhão de hectares de floresta em pé queimaram no estado de Roraima. Outros 4 milhões foram atingidos pelo fogo no sul do estado do Pará e norte do Mato Grosso. Agora, contudo, o culpado pode ser outro: o aquecimento do Oceano Atlântico. Estudos sugerem que a seca nessa parte da Amazônia é resultado do aquecimento na Costa da África e, provavelmente, no Golfo do México.
Previsões
Inundações estão previstas para os vales dos rios e a Ilha de Marajó, na foz do Rio Amazonas. No Pantanal, os modelos apontam para um aquecimento que tende a se intensificar até 2080, mas não se sabe se haverá mais chuvas ou estiagem. No Nordeste, manguezais serão afetados pelas cheias. Problemas mais sérios aparecerão em cidades costeiras, como Recife, Aracaju e Maceió, onde a urbanização se expandiu para áreas baixas. O clima mais quente e seco poderá castigar ainda mais a população do sertão. Estão surgindo os “refugiados ambientais”, para aumentar os problemas sociais já existentes nos grandes centros urbanos. Essas mudanças climáticas não têm causas apenas naturais, mas também “antropogênicas”, aquelas atribuídas pelos cientistas à atividade humana, como a emissão de gás carbônico e o desmatamento. No Brasil, segundo os relatórios do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), com os desmatamentos e queimadas, predominam as causas “antropogênicas”.
Esse não é um problema apenas do ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc. É um novo e grave problema nacional, que envolve prefeitos, governadores e quase todo o governo federal. Não podemos encarar o que aconteceu em Santa Catarina, Vila Velha (ES) e Campos (RJ), e agora em regiões de Minas e Rio de Janeiro, como simples fatalidades. A discussão sobre as mudanças climáticas não é nova, nosso sistema de monitoramento do clima é bastante satisfatório. Não faltam estudos e projetos para evitar que as chuvas se transformem em tragédias. Mas, apesar disso, elas acontecem.
Mobilização
Toda vez que ocorre uma tragédia, a desculpa é a mesma: nunca choveu tanto no local. Na verdade, o país não tem um eficiente sistema de defesa civil, que articule a sociedade e os poderes públicos para monitorar as áreas de risco, rapidamente socorrer as vítimas de inundações e minimizar os prejuízos materiais. Não há planos de contingência para mobilizar as Forças Armadas e os órgãos ligados à Defesa Civil com a escala e a eficiência que a nova situação exige. Ninguém sabe onde a tragédia ocorrerá, mas as áreas de risco são conhecidas. O fato é que as chuvas vão aumentar e o os governos precisam se preparar melhor para isso.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
Por Luiz Carlos Azedo
Uma das vantagens estratégicas do Brasil são as condições climáticas. Mesmo onde a natureza é menos favorável, como o sertão nordestino, é possível desenvolver atividades produtivas, com até duas colheitas por ano, principalmente na fruticultura. Nós não temos tragédias naturais, como terremotos, tsunamis, vulcões e nevascas. Desse ponto de vista, o Brasil é um país abençoado. Mas as chuvas por aqui começam a causar grandes tragédias humanas, por causa das mudanças climáticas e do descaso de autoridades.
Clima
As projeções de mudanças climáticas no Brasil levam em consideração dois fatores: a temperatura e as chuvas. Na Amazônia, Nordeste e Sul do Brasil, os modelos prevêem um aumento sistemático dos extremos da temperatura do ar, embora essa também seja uma tendência para o restante do país. Em relação às chuvas, a previsão é dramática: choverá menos na Amazônia e no Nordeste; nas demais regiões, as chuvas intensas serão mais freqüentes.
O El Niño, que resulta do aquecimento das águas do Oceano Pacífico na altura da costa do Peru, sempre foi apontado como o culpado por esses fenômenos severos. Por exemplo, a grande estiagem provocada pelo El Niño de 1998 reduziu consideravelmente as chuvas na Amazônia e tornou as florestas inflamáveis. Naquele ano, 1,3 milhão de hectares de floresta em pé queimaram no estado de Roraima. Outros 4 milhões foram atingidos pelo fogo no sul do estado do Pará e norte do Mato Grosso. Agora, contudo, o culpado pode ser outro: o aquecimento do Oceano Atlântico. Estudos sugerem que a seca nessa parte da Amazônia é resultado do aquecimento na Costa da África e, provavelmente, no Golfo do México.
Previsões
Inundações estão previstas para os vales dos rios e a Ilha de Marajó, na foz do Rio Amazonas. No Pantanal, os modelos apontam para um aquecimento que tende a se intensificar até 2080, mas não se sabe se haverá mais chuvas ou estiagem. No Nordeste, manguezais serão afetados pelas cheias. Problemas mais sérios aparecerão em cidades costeiras, como Recife, Aracaju e Maceió, onde a urbanização se expandiu para áreas baixas. O clima mais quente e seco poderá castigar ainda mais a população do sertão. Estão surgindo os “refugiados ambientais”, para aumentar os problemas sociais já existentes nos grandes centros urbanos. Essas mudanças climáticas não têm causas apenas naturais, mas também “antropogênicas”, aquelas atribuídas pelos cientistas à atividade humana, como a emissão de gás carbônico e o desmatamento. No Brasil, segundo os relatórios do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), com os desmatamentos e queimadas, predominam as causas “antropogênicas”.
Esse não é um problema apenas do ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc. É um novo e grave problema nacional, que envolve prefeitos, governadores e quase todo o governo federal. Não podemos encarar o que aconteceu em Santa Catarina, Vila Velha (ES) e Campos (RJ), e agora em regiões de Minas e Rio de Janeiro, como simples fatalidades. A discussão sobre as mudanças climáticas não é nova, nosso sistema de monitoramento do clima é bastante satisfatório. Não faltam estudos e projetos para evitar que as chuvas se transformem em tragédias. Mas, apesar disso, elas acontecem.
Mobilização
Toda vez que ocorre uma tragédia, a desculpa é a mesma: nunca choveu tanto no local. Na verdade, o país não tem um eficiente sistema de defesa civil, que articule a sociedade e os poderes públicos para monitorar as áreas de risco, rapidamente socorrer as vítimas de inundações e minimizar os prejuízos materiais. Não há planos de contingência para mobilizar as Forças Armadas e os órgãos ligados à Defesa Civil com a escala e a eficiência que a nova situação exige. Ninguém sabe onde a tragédia ocorrerá, mas as áreas de risco são conhecidas. O fato é que as chuvas vão aumentar e o os governos precisam se preparar melhor para isso.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
quinta-feira, 18 de dezembro de 2008
Caminho de tormentas
Neste ambiente de incertezas econômicas, o PT começou a manobrar na Câmara para mudar as regras do jogo da sucessão presidencial
Por Luiz Carlos Azedo
O Brasil fecha o ano navegando em mar de incertezas. A crise mundial atormenta o governo, os empresários e a oposição, mas a maior indefinição — por causa das projeções econômicas — é a sucessão presidencial. Como dizia o poeta lusitano, tudo é incerto e derradeiro, tudo é disperso, nada é inteiro. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, segundo as pesquisas, ostenta os melhores índices de sua avaliação, mas a do governo e a confiança na economia já são arranhadas pela crise. Como Lula não pleiteia um terceiro mandato, a sucessão presidencial é apenas uma linha no horizonte, para usar a imagem de Fernando Pessoa.
A pirâmide
Todas as medidas adotadas pelo governo dos Estados Unidos e pela União Européia não foram suficientes para evitar a recessão mundial. A crise do mercado financeiro continua sendo um baú de surpresas desagradáveis. O espanto da semana foi a falência dos fundos geridos pelo ex-presidente da Nasdaq Bernard Madoff, calculados em US$50 bilhões. As bolsas dos Estados Unidos e da Europa foram atingidas, bem como investidores brasileiros que aplicavam em fundos geridos pelo Santander e HSBC. O fundo era uma pirâmide “Ponze”, uma operação financeira que pagava altos rendimentos aos seus investidores com dinheiro de novos clientes, como se fossem lucros reais. Ou seja, puro estelionato. Ontem, o Goldman Sachs anunciou prejuízo líquido de US$ 2,12 bilhões. Entre os emergentes, dois gigantes, Índia e Rússia, estão sentindo fortemente o baque; a China também, porém é mais robusta. O Brasil aparece em melhor situação, mas também sente o tranco.
O enigma
Todos os economistas que falam sobre a crise (alguns permanecem na muda) defendem categoricamente a redução da taxa de juros. Até agora, a única justificativa para mantê-la no patamar atual é a preservação da autoridade do Banco Central, a chamada credibilidade da autoridade monetária. É uma razão subjetiva demais para uma situação onde todos os fatores objetivos apontam em direção contrária. A expansão da economia atingiu seu ponto máximo em outubro. A arrecadação de novembro caiu. As projeções para o primeiro trimestre do ano apontam para a forte redução da atividade econômica, apesar do otimismo do discurso do presidente Lula. É que a demanda de bens de consumo desabou, principalmente de bens duráveis, como automóveis, e o crédito ficou mais curto e caro. A inflação está domada, mas o Banco Central argumenta que não baixa os juros porque ainda há muitas incertezas na economia. Ou seja, para preservar a credibilidade, promove a insegurança.
A manobra
Nesse ambiente de incertezas econômicas, o PT começou a manobrar na Câmara para mudar as regras do jogo da sucessão presidencial. O relatório do deputado João Paulo Cunha que propõe o fim da reeleição e mandatos de cinco anos foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça. A proposta abre espaço para a reapresentação do projeto de plebiscito que permitiria ao presidente Lula disputar o terceiro mandato. A reforma eleitoral também ameaça acabar com as coligações, restabelecer a cláusula de barreira e abrir a janela para o troca-troca partidário um ano antes da eleição. É um atalho para o golpismo continuísta. Lula não embarcou na aventura, mas o “queremismo” pode ganhar força com a crise. Enquanto isso, os governadores tucanos José Serra e Aécio Neves afiam os floretes.
A terceira via
Quando a candidatura do Michel Temer parecia consolidada, com a adesão do bloco de oposição PSDDB-DEM-PPS ao acordo PMDB-PT, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) se lançou candidato a presidente da Câmara com apoio do bloquinho PSB-PDT-PCdoB. Ambos são ex-presidentes da Casa e enfrentarão Ciro Nogueira (PP-PI) e Milton Monti (PR-PR). Essa eleição promete um segundo turno imprevisível. Na Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN) tenta uma estranha reeleição, mais um sinal de que o candidato petista Tião Viana (AC) não consegue o apoio da bancada do PMDB para ocupar a Presidência da Casa. Por incrível que pareça, os dois movimentos são mais sincronizados do que se imagina. Sinalizam que a candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), ainda não empolgou os aliados de Lula.
Publicado em 17 de dezembro na coluna Nas Entrelnhas do Correio Braziliense
Por Luiz Carlos Azedo
O Brasil fecha o ano navegando em mar de incertezas. A crise mundial atormenta o governo, os empresários e a oposição, mas a maior indefinição — por causa das projeções econômicas — é a sucessão presidencial. Como dizia o poeta lusitano, tudo é incerto e derradeiro, tudo é disperso, nada é inteiro. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, segundo as pesquisas, ostenta os melhores índices de sua avaliação, mas a do governo e a confiança na economia já são arranhadas pela crise. Como Lula não pleiteia um terceiro mandato, a sucessão presidencial é apenas uma linha no horizonte, para usar a imagem de Fernando Pessoa.
A pirâmide
Todas as medidas adotadas pelo governo dos Estados Unidos e pela União Européia não foram suficientes para evitar a recessão mundial. A crise do mercado financeiro continua sendo um baú de surpresas desagradáveis. O espanto da semana foi a falência dos fundos geridos pelo ex-presidente da Nasdaq Bernard Madoff, calculados em US$50 bilhões. As bolsas dos Estados Unidos e da Europa foram atingidas, bem como investidores brasileiros que aplicavam em fundos geridos pelo Santander e HSBC. O fundo era uma pirâmide “Ponze”, uma operação financeira que pagava altos rendimentos aos seus investidores com dinheiro de novos clientes, como se fossem lucros reais. Ou seja, puro estelionato. Ontem, o Goldman Sachs anunciou prejuízo líquido de US$ 2,12 bilhões. Entre os emergentes, dois gigantes, Índia e Rússia, estão sentindo fortemente o baque; a China também, porém é mais robusta. O Brasil aparece em melhor situação, mas também sente o tranco.
O enigma
Todos os economistas que falam sobre a crise (alguns permanecem na muda) defendem categoricamente a redução da taxa de juros. Até agora, a única justificativa para mantê-la no patamar atual é a preservação da autoridade do Banco Central, a chamada credibilidade da autoridade monetária. É uma razão subjetiva demais para uma situação onde todos os fatores objetivos apontam em direção contrária. A expansão da economia atingiu seu ponto máximo em outubro. A arrecadação de novembro caiu. As projeções para o primeiro trimestre do ano apontam para a forte redução da atividade econômica, apesar do otimismo do discurso do presidente Lula. É que a demanda de bens de consumo desabou, principalmente de bens duráveis, como automóveis, e o crédito ficou mais curto e caro. A inflação está domada, mas o Banco Central argumenta que não baixa os juros porque ainda há muitas incertezas na economia. Ou seja, para preservar a credibilidade, promove a insegurança.
A manobra
Nesse ambiente de incertezas econômicas, o PT começou a manobrar na Câmara para mudar as regras do jogo da sucessão presidencial. O relatório do deputado João Paulo Cunha que propõe o fim da reeleição e mandatos de cinco anos foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça. A proposta abre espaço para a reapresentação do projeto de plebiscito que permitiria ao presidente Lula disputar o terceiro mandato. A reforma eleitoral também ameaça acabar com as coligações, restabelecer a cláusula de barreira e abrir a janela para o troca-troca partidário um ano antes da eleição. É um atalho para o golpismo continuísta. Lula não embarcou na aventura, mas o “queremismo” pode ganhar força com a crise. Enquanto isso, os governadores tucanos José Serra e Aécio Neves afiam os floretes.
A terceira via
Quando a candidatura do Michel Temer parecia consolidada, com a adesão do bloco de oposição PSDDB-DEM-PPS ao acordo PMDB-PT, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) se lançou candidato a presidente da Câmara com apoio do bloquinho PSB-PDT-PCdoB. Ambos são ex-presidentes da Casa e enfrentarão Ciro Nogueira (PP-PI) e Milton Monti (PR-PR). Essa eleição promete um segundo turno imprevisível. Na Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN) tenta uma estranha reeleição, mais um sinal de que o candidato petista Tião Viana (AC) não consegue o apoio da bancada do PMDB para ocupar a Presidência da Casa. Por incrível que pareça, os dois movimentos são mais sincronizados do que se imagina. Sinalizam que a candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), ainda não empolgou os aliados de Lula.
Publicado em 17 de dezembro na coluna Nas Entrelnhas do Correio Braziliense
domingo, 14 de dezembro de 2008
Cabeças-cortadas
Só agora, com o ministro Nelson Jobim e o atual Alto Comando, surge uma nova Política de Defesa, cujo eixo é a efetiva proteção da Amazônia e da plataforma continental
Por Luiz Carlos Azedo
A questão militar no Brasil ainda é um assunto aberto, embora esteja submerso num mar de idéias fora de lugar, preconceitos e ressentimentos. O noticiário sobre os 40 anos do Ato Institucional nº 5 não deixa margem a dúvidas. A sociedade ainda cobra o esclarecimento dos fatos do passado. A antiga oposição ao regime militar mantém abertas as chagas das torturas. Os militares preferem o silêncio sobre o assunto. Mas o passado ressurge quando menos se espera, como aconteceu no depoimento macabro do tenente Vargas sobre a execução e esquartejamento de guerrilheiros do Araguaia.
Cortar cabeças e esquartejar adversários no Brasil foi uma prática corrente nos conflitos. São inúmeros os exemplos, a começar pelo massacre dos paulistas por portugueses e baianos no Capão da Traição, nas proximidades de Tiradentes. O próprio alferes Joaquim José da Silva Xavier, nosso mártir da Independência, foi enforcado e esquartejado. Muitas cabeças rolaram na Balaiada (MA) e na Cabanagem (PA). Ninguém sabe direito o que aconteceu a Solano Lopes e seus últimos combatentes em Cerro Corá. A ira do Conde D\`Eu foi implacável. Em Canudos, o coronel Moreira Cesar, herói da guerra do Paraguai, foi esquartejado pelos jagunços e seus pedaços pendurados nos galhos. Euclides da Cunha relata no Os Sertões o destino dado a Antônio Conselheiro e aos que o acompanharam até a liquidação do arraial baiano. “Ao entardecer, quando caíram os últimos defensores, que todos morreram. Eram apenas quatro: um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil soldados.”
A obra euclidiana teve tamanho impacto no Exército que virou o livro de cabeceira dos tenentes, a começar pelo capitão Luiz Carlos Prestes, cuja coluna atravessou os sertões do país por 25 mil quilômetros, até se internar na Bolívia. Para confundir as tropas legais, Siqueira Campos deu cobertura à retirada e percorreu 9 mil quilômetros a uma velocidade de 20 léguas por dia. Até então, a jovem oficialidade se rebelava contra iniqüidade social, as fraudes eleitorais e o despreparo das Forças Armadas, movimento que resultou na Revolução de 30. Mas veio o levante comunista de 1935, liderado por Prestes, com a participação de dirigentes estrangeiros da III Internacional, e tudo mudou. A doutrina de segurança nacional passou a considerar os comunistas como “inimigos internos”. A experiência de formação do Exército brasileiro, desde o Império, com seu séquito de cabeças-cortadas, corroborava a doutrina.
A potência
Com a deposição de João Goulart, em 1964, os militares assumiram o poder com o propósito de transformar o Brasil na maior potência da América do Sul. Nacionalistas e entreguistas superaram suas divergências, com a linha dura militar batendo para valer na oposição, em todos os sentidos. A Escola Superior de Guerra, inspirada na guerra da Argélia, desenvolveu a doutrina da “guerra psicológica, subversiva, adversa e permanente” para legitimar como “combate ao terrorismo” a brutal repressão à oposição ao regime. A tese se encaixou como uma luva por causa dos focos guerrilheiros no Caparaó (RJ), no Vale da Ribeira (SP) e no Araguaia (PA), além das ações de guerrilha urbana (seqüestros de diplomatas, assaltos a banco e ataques a sentinelas).
Apesar da liquidação da luta armada, a doutrina da ESG só foi para o espaço com a Guerra das Malvinas, já em plena abertura do governo Figueiredo. O Exército argentino entrou em combate contra a Inglaterra, no Atlântico Sul. Os Estados Unidos mandaram às favas a “Doutrina Monroe” e deram apoio logístico aos ingleses. O Brasil assistiu de camarote, mas caiu a ficha de que o país não tinha uma política de defesa nacional de verdade. O que havia era apenas a repressão à oposição, antipatia aos argentinos e cooperação militar com os Estados Unidos. Com a democratização, os militares ficaram mesmo sem rumo.
Só agora, com o ministro Nelson Jobim e o atual Alto Comando, se consolida uma nova Política de Defesa, cujo eixo é a efetiva proteção da Amazônia e da plataforma continental. Isso implica gastos com o reaparelhamento das Forças Armadas e o reposicionamento de seus efetivos para construir certo poder de dissuasão em relação aos vizinhos e às potências do planeta. Por que são necessários? Por causa da presença das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia — FARC — na nossa fronteira com a Colômbia, da reativação da 4ª Frota da Marinha dos EUA no Atlântico Sul, dos crescentes problemas com o Paraguai (brasiguaios e Itapu), Bolívia (fornecimento de gás natural) e Equador (expulsão de empresas e calote de dívidas), além da agressiva militarização do regime de Chávez na Venezuela, com apoio de Cuba e da Rússia. Isso só interessa aos militares? Não, quem vai pagar a conta é a sociedade.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
Por Luiz Carlos Azedo
A questão militar no Brasil ainda é um assunto aberto, embora esteja submerso num mar de idéias fora de lugar, preconceitos e ressentimentos. O noticiário sobre os 40 anos do Ato Institucional nº 5 não deixa margem a dúvidas. A sociedade ainda cobra o esclarecimento dos fatos do passado. A antiga oposição ao regime militar mantém abertas as chagas das torturas. Os militares preferem o silêncio sobre o assunto. Mas o passado ressurge quando menos se espera, como aconteceu no depoimento macabro do tenente Vargas sobre a execução e esquartejamento de guerrilheiros do Araguaia.
Cortar cabeças e esquartejar adversários no Brasil foi uma prática corrente nos conflitos. São inúmeros os exemplos, a começar pelo massacre dos paulistas por portugueses e baianos no Capão da Traição, nas proximidades de Tiradentes. O próprio alferes Joaquim José da Silva Xavier, nosso mártir da Independência, foi enforcado e esquartejado. Muitas cabeças rolaram na Balaiada (MA) e na Cabanagem (PA). Ninguém sabe direito o que aconteceu a Solano Lopes e seus últimos combatentes em Cerro Corá. A ira do Conde D\`Eu foi implacável. Em Canudos, o coronel Moreira Cesar, herói da guerra do Paraguai, foi esquartejado pelos jagunços e seus pedaços pendurados nos galhos. Euclides da Cunha relata no Os Sertões o destino dado a Antônio Conselheiro e aos que o acompanharam até a liquidação do arraial baiano. “Ao entardecer, quando caíram os últimos defensores, que todos morreram. Eram apenas quatro: um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil soldados.”
A obra euclidiana teve tamanho impacto no Exército que virou o livro de cabeceira dos tenentes, a começar pelo capitão Luiz Carlos Prestes, cuja coluna atravessou os sertões do país por 25 mil quilômetros, até se internar na Bolívia. Para confundir as tropas legais, Siqueira Campos deu cobertura à retirada e percorreu 9 mil quilômetros a uma velocidade de 20 léguas por dia. Até então, a jovem oficialidade se rebelava contra iniqüidade social, as fraudes eleitorais e o despreparo das Forças Armadas, movimento que resultou na Revolução de 30. Mas veio o levante comunista de 1935, liderado por Prestes, com a participação de dirigentes estrangeiros da III Internacional, e tudo mudou. A doutrina de segurança nacional passou a considerar os comunistas como “inimigos internos”. A experiência de formação do Exército brasileiro, desde o Império, com seu séquito de cabeças-cortadas, corroborava a doutrina.
A potência
Com a deposição de João Goulart, em 1964, os militares assumiram o poder com o propósito de transformar o Brasil na maior potência da América do Sul. Nacionalistas e entreguistas superaram suas divergências, com a linha dura militar batendo para valer na oposição, em todos os sentidos. A Escola Superior de Guerra, inspirada na guerra da Argélia, desenvolveu a doutrina da “guerra psicológica, subversiva, adversa e permanente” para legitimar como “combate ao terrorismo” a brutal repressão à oposição ao regime. A tese se encaixou como uma luva por causa dos focos guerrilheiros no Caparaó (RJ), no Vale da Ribeira (SP) e no Araguaia (PA), além das ações de guerrilha urbana (seqüestros de diplomatas, assaltos a banco e ataques a sentinelas).
Apesar da liquidação da luta armada, a doutrina da ESG só foi para o espaço com a Guerra das Malvinas, já em plena abertura do governo Figueiredo. O Exército argentino entrou em combate contra a Inglaterra, no Atlântico Sul. Os Estados Unidos mandaram às favas a “Doutrina Monroe” e deram apoio logístico aos ingleses. O Brasil assistiu de camarote, mas caiu a ficha de que o país não tinha uma política de defesa nacional de verdade. O que havia era apenas a repressão à oposição, antipatia aos argentinos e cooperação militar com os Estados Unidos. Com a democratização, os militares ficaram mesmo sem rumo.
Só agora, com o ministro Nelson Jobim e o atual Alto Comando, se consolida uma nova Política de Defesa, cujo eixo é a efetiva proteção da Amazônia e da plataforma continental. Isso implica gastos com o reaparelhamento das Forças Armadas e o reposicionamento de seus efetivos para construir certo poder de dissuasão em relação aos vizinhos e às potências do planeta. Por que são necessários? Por causa da presença das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia — FARC — na nossa fronteira com a Colômbia, da reativação da 4ª Frota da Marinha dos EUA no Atlântico Sul, dos crescentes problemas com o Paraguai (brasiguaios e Itapu), Bolívia (fornecimento de gás natural) e Equador (expulsão de empresas e calote de dívidas), além da agressiva militarização do regime de Chávez na Venezuela, com apoio de Cuba e da Rússia. Isso só interessa aos militares? Não, quem vai pagar a conta é a sociedade.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
sexta-feira, 12 de dezembro de 2008
Olha o PIB aí, gente!
O presidente Lula acredita numa bala de prata contra
a crise: a redução da taxa de juros. Para alguns analistas,
não existe risco de alta da inflação.
Por Luiz Carlos Azedo
Na semana passada, o alto índice de aprovação do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva numa pesquisa
do instituto Datafolha supreendeu a todos: 70%
de bom e ótimo. Não faltaram análises para explicar
o fenômeno, ora atribuído ao recall das políticas sociais
do governo, ora à capacidade de comunicação do
presidente Lula. Ontem, veio a explicação: o Produto Interno
Bruto (PIB) brasileiro, divulgado pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), cresceu 6,8% no
terceiro trimestre deste ano na comparação com o mesmo
período do ano passado. Em relação ao trimestre anterior,
a alta foi de 1,8%. Foi por essa razão que o presidente Lula
desafiou os mais pessimistas e anunciou o melhor Natal
de todos os anos de seu governo.
No coqueiro
O PIB é a soma das riquezas produzidas pelo país. Teve alta
de 6,3% nos últimos 12 meses terminados em setembro
e de 6,4% , somente em 2008. É o melhor índice desde o
começo da série em 1996. Seu valor chegou a R$ 747,3 bilhões.
Os números parecem dar razão ao presidente Lula
de que vivemos num outro mundo. A indústria cresceu
7,1%; a agropecuária, 6,4%; o setor de serviços, 5,9%. O
destaque na indústria foi a construção civil, com alta de
11,7%. Motivo: o aumento de 32% de crédito para habitação.
Também houve forte expansão dos investimentos:
19,7%. O consumo das famílias continuou ascendente,
com alta de 7,3%. E os gastos do setor público subiram
6,4%, ou seja, ligeiramente acima do PIB.
Onze entre 10 economistas avaliam que esse PIB subiu
no coqueiro, pois não reflete o impacto da crise mundial e
deve desabar. Os sinais estariam trocados em relação ao
desempenho real da economianas últimas semanas,com notícias de que
as montadoras, siderúrgicase mineradoras suspendemsuas atividades,
concedem férias coletivasou demitem. Nas lojas de
eletrodomésticos e concessionáriasde automóveis,os sinais de que o
crédito está empoçado são gritantes. Os preçosdesabam,
quase ninguém compra. Os juros estão altos,o consumidor pôs as
barbas de molho. O presidente Lula, porém, apostana força
de inércia do “espetáculo” do PIB, mesmocom o apagão financeiro
mundial. Avalia queo Brasil pode resistir graças
aos gastos do governo e ao pensamento positivo
de empresários e trabalhadores.Essa é a lógica do
espantoso discurso do “sifu”, no qualcompara a economia
a um doente no hospital. O povão entenderia o espírito da metáfora.
Bala de prata
O Brasil tem uma trajetória histórica de expansão anticíclica.
Graças a isso houve a nossa industrialização. A receita foi
câmbio favorável às exportações, investimentos públicos
na atividade produtiva e discurso político otimista,
motivador da nação. O populismo de Getúlio Vargas
cumpriu esse papel. O modernismo bossa-nova de Juscelino
Kubitschek também. Até o “Pra Frente Brasil” do
regime militar, num terceiro e bem-sucedido de ciclo de
substituição das importações, teve esse efeito durante o
“milagre econômico”. Será que o Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC), menina-dos-olhos do segundo
mandato, cumprirá esse papel ? É uma aposta de alto risco,
mas está sendo feita pelo Palácio do Planalto.
O presidente Lula acredita numa bala de prata contra
a crise: a redução da taxa de juros. Para alguns analistas,
não existe risco de alta da inflação. A economia mundial
está entrando em recessão, alguns países estão em deflação
(recessão com queda de preços). Aqui os preços também
deverão cair. Nosso problema seria outro: o desemprego
bate à porta das fábricas, lojas e escritórios.No fundo,
Lula acredita que o novo presidente dos Estados, Barack
Obama, prepara um pacote trilionário para tirar seu
país da recessão, o que pode reaquecer a economia mundial.
E avalia que terá atravessado o Rubicão da crise se
impedir uma onda de desemprego. Para isso, precisa
manter e baratear o crédito, convencer empresários a
não demitir e investir e estimular os trabalhadores a continuar
comprando. Tudo isso pode ser uma grande ilusão,
mas não terá a menor chance de evitar uma recessão
por aqui se o próprio presidente de República não acreditar
nele mesmo. Com perdão para a inversão da metáfora
“desenvolvimentista”, é melhor voar como a galinha
do que virar uma minhoca na crise.
Publicado na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense em 10 de dezembro
a crise: a redução da taxa de juros. Para alguns analistas,
não existe risco de alta da inflação.
Por Luiz Carlos Azedo
Na semana passada, o alto índice de aprovação do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva numa pesquisa
do instituto Datafolha supreendeu a todos: 70%
de bom e ótimo. Não faltaram análises para explicar
o fenômeno, ora atribuído ao recall das políticas sociais
do governo, ora à capacidade de comunicação do
presidente Lula. Ontem, veio a explicação: o Produto Interno
Bruto (PIB) brasileiro, divulgado pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), cresceu 6,8% no
terceiro trimestre deste ano na comparação com o mesmo
período do ano passado. Em relação ao trimestre anterior,
a alta foi de 1,8%. Foi por essa razão que o presidente Lula
desafiou os mais pessimistas e anunciou o melhor Natal
de todos os anos de seu governo.
No coqueiro
O PIB é a soma das riquezas produzidas pelo país. Teve alta
de 6,3% nos últimos 12 meses terminados em setembro
e de 6,4% , somente em 2008. É o melhor índice desde o
começo da série em 1996. Seu valor chegou a R$ 747,3 bilhões.
Os números parecem dar razão ao presidente Lula
de que vivemos num outro mundo. A indústria cresceu
7,1%; a agropecuária, 6,4%; o setor de serviços, 5,9%. O
destaque na indústria foi a construção civil, com alta de
11,7%. Motivo: o aumento de 32% de crédito para habitação.
Também houve forte expansão dos investimentos:
19,7%. O consumo das famílias continuou ascendente,
com alta de 7,3%. E os gastos do setor público subiram
6,4%, ou seja, ligeiramente acima do PIB.
Onze entre 10 economistas avaliam que esse PIB subiu
no coqueiro, pois não reflete o impacto da crise mundial e
deve desabar. Os sinais estariam trocados em relação ao
desempenho real da economianas últimas semanas,com notícias de que
as montadoras, siderúrgicase mineradoras suspendemsuas atividades,
concedem férias coletivasou demitem. Nas lojas de
eletrodomésticos e concessionáriasde automóveis,os sinais de que o
crédito está empoçado são gritantes. Os preçosdesabam,
quase ninguém compra. Os juros estão altos,o consumidor pôs as
barbas de molho. O presidente Lula, porém, apostana força
de inércia do “espetáculo” do PIB, mesmocom o apagão financeiro
mundial. Avalia queo Brasil pode resistir graças
aos gastos do governo e ao pensamento positivo
de empresários e trabalhadores.Essa é a lógica do
espantoso discurso do “sifu”, no qualcompara a economia
a um doente no hospital. O povão entenderia o espírito da metáfora.
Bala de prata
O Brasil tem uma trajetória histórica de expansão anticíclica.
Graças a isso houve a nossa industrialização. A receita foi
câmbio favorável às exportações, investimentos públicos
na atividade produtiva e discurso político otimista,
motivador da nação. O populismo de Getúlio Vargas
cumpriu esse papel. O modernismo bossa-nova de Juscelino
Kubitschek também. Até o “Pra Frente Brasil” do
regime militar, num terceiro e bem-sucedido de ciclo de
substituição das importações, teve esse efeito durante o
“milagre econômico”. Será que o Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC), menina-dos-olhos do segundo
mandato, cumprirá esse papel ? É uma aposta de alto risco,
mas está sendo feita pelo Palácio do Planalto.
O presidente Lula acredita numa bala de prata contra
a crise: a redução da taxa de juros. Para alguns analistas,
não existe risco de alta da inflação. A economia mundial
está entrando em recessão, alguns países estão em deflação
(recessão com queda de preços). Aqui os preços também
deverão cair. Nosso problema seria outro: o desemprego
bate à porta das fábricas, lojas e escritórios.No fundo,
Lula acredita que o novo presidente dos Estados, Barack
Obama, prepara um pacote trilionário para tirar seu
país da recessão, o que pode reaquecer a economia mundial.
E avalia que terá atravessado o Rubicão da crise se
impedir uma onda de desemprego. Para isso, precisa
manter e baratear o crédito, convencer empresários a
não demitir e investir e estimular os trabalhadores a continuar
comprando. Tudo isso pode ser uma grande ilusão,
mas não terá a menor chance de evitar uma recessão
por aqui se o próprio presidente de República não acreditar
nele mesmo. Com perdão para a inversão da metáfora
“desenvolvimentista”, é melhor voar como a galinha
do que virar uma minhoca na crise.
Publicado na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense em 10 de dezembro
domingo, 7 de dezembro de 2008
Reforma e contra-reforma
Não há no Brasil dois estados iguais, mesmo assim é possível avaliar a atuação de suas elites. Basta, por exemplo, comparar o Ceará com o Maranhão ou Pernambuco com a Bahia nos últimos 50 anos
Por Luiz Carlos Azedo
Um artigo do secretário de Desenvolvimento do Espírito Santo, Guilherme Dias, ex-ministro do Planejamento do governo FHC, intitulado “A anti-reforma” (Folha de S.Paulo, 04/12), tirou do sério o relator da reforma tributária, deputado Sandro Mabel (PR-GO). Ontem, o parlamentar replicou com outro artigo contra os “anti-reforma”, no qual gasta mais tinta ao acusar o economista de teleguiado do governador paulista José Serra do que esgrimindo argumentos técnicos. Por que esse assunto exalta os ânimos? É por causa da ruptura do pacto federativo.
Desigualdades
A reforma tributária proposta pelo governo Lula mexe num vespeiro ao propor a mudança radical do sistema de arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que passaria a ser unificado, com cinco alíquotas. Até aí, tudo bem. O problema é que muda o sistema de cobrança do imposto, que passaria a ser feito no destino (estados consumidores). Na origem (estados produtores), ficariam apenas 2% do valor arrecadado. Para viabilizar a mudança, Mabel teceu acordos com empresários, secretários estaduais de Fazenda e prefeitos. Objetivo: isolar São Paulo, o estado mais penalizado pelo caráter Robin Hood do projeto. Supostamente, a reforma tiraria dos estados ricos (SP, MG, RJ, ES, RS, DF, GO e MS são contra) para dar aos mais pobres. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende passar à História como o líder político que acabou com relação desigual entre o “Sul Maravilha” e os estados do Norte e Nordeste.
Mas o relatório de Mabel desagrada gregos e baianos. Com a crise mundial, a reforma tributária seria como pular do trampolim sem saber se tem água na piscina. Por exemplo, estima-se em R$ 24 bilhões as perdas da Previdência. O IVA(Imposto Sobre Valor Agregado) federal concentra recursos na União. A mudança abre espaço para milhares de contestações judiciais, anistia fraudes fiscais e favorece lobbies empresariais, principalmente da indústria alimentícia e bancos.
“A quem interessa a desorganização das finanças estaduais e municipais, depois do longo e custoso processo de saneamento das contas, a partir da consolidação e do refinanciamento das dívidas com o Tesouro Nacional e da implantação da Lei de Responsabilidade Fiscal? Será que os defensores dessa proposta de reforma tributária querem ainda mais concentração de recursos e poder no governo central?”, indaga Dias. A primeira pergunta se baseia numa hipótese; a segunda, na certeza.
Patrimonialismo
São várias as causas do desenvolvimento desigual no Brasil. Algumas são naturais, como o preço cobrado pelo cristalino da Serra da Borborema ao desviar os ventos alísios do Nordeste, que levam as chuvas para longe do semi-árido. Ou as bençãos dos olhos d’água na Chapada da Ibiapaba, das cheias do Pantanal e do Amazonas, da larva vulcânica que rompeu o cristalino da Serra do Mar e deu origem às “terras roxas.” Outras, são econômicas, como os ciclos da cana-de-açúcar, do cacau, da borracha, do algodão, do café, do ouro e diamantes, com seus esplendores e decadências, congelando no tempo a iniquidade social herdada da escravidão nas atividades ainda hoje remanescentes. Há, ainda, as conseqüências históricas das insurreições das províncias no Império, sufocadas a ferro e fogo, como a Confederação do Equador, que transformou Pernambuco num estado periférico, e a Cabanagem, no qual dois terços da população masculina do Pará foram dizimados, dentre outros episódios sangrentos.
A principal causa das nossas desigualdades, porém, é o patrimonialismo. Ainda hoje as oligarquias são as que mais se beneficiam dos investimentos públicos nos estados, graças ao apoio que emprestam à União para que esta imponha sua centralidade (normatizar, coagir e arrecadar) aos estados mais populosos e dinâmicos. Um exercício de motivação comum nas empresas é a simulação de uma guerra mundial, na qual as nações envolvidas dispõem de recursos financeiros, alimentos, minerais e armas em condições desiguais. Ao final da guerra, a relação se inverte completamente. No jogo, sempre há duas nações com recursos exatamente iguais e que acabam em situações muito diferentes, por causa da atuação de seus governantes. Não há no Brasil dois estados iguais. Assim mesmo, é possível avaliar historicamente a atuação de suas elites. Basta, por exemplo, comparar as trajetórias do Ceará com o Maranhão ou de Pernambuco com a Bahia nos últimos 50 anos.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
Por Luiz Carlos Azedo
Um artigo do secretário de Desenvolvimento do Espírito Santo, Guilherme Dias, ex-ministro do Planejamento do governo FHC, intitulado “A anti-reforma” (Folha de S.Paulo, 04/12), tirou do sério o relator da reforma tributária, deputado Sandro Mabel (PR-GO). Ontem, o parlamentar replicou com outro artigo contra os “anti-reforma”, no qual gasta mais tinta ao acusar o economista de teleguiado do governador paulista José Serra do que esgrimindo argumentos técnicos. Por que esse assunto exalta os ânimos? É por causa da ruptura do pacto federativo.
Desigualdades
A reforma tributária proposta pelo governo Lula mexe num vespeiro ao propor a mudança radical do sistema de arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que passaria a ser unificado, com cinco alíquotas. Até aí, tudo bem. O problema é que muda o sistema de cobrança do imposto, que passaria a ser feito no destino (estados consumidores). Na origem (estados produtores), ficariam apenas 2% do valor arrecadado. Para viabilizar a mudança, Mabel teceu acordos com empresários, secretários estaduais de Fazenda e prefeitos. Objetivo: isolar São Paulo, o estado mais penalizado pelo caráter Robin Hood do projeto. Supostamente, a reforma tiraria dos estados ricos (SP, MG, RJ, ES, RS, DF, GO e MS são contra) para dar aos mais pobres. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende passar à História como o líder político que acabou com relação desigual entre o “Sul Maravilha” e os estados do Norte e Nordeste.
Mas o relatório de Mabel desagrada gregos e baianos. Com a crise mundial, a reforma tributária seria como pular do trampolim sem saber se tem água na piscina. Por exemplo, estima-se em R$ 24 bilhões as perdas da Previdência. O IVA(Imposto Sobre Valor Agregado) federal concentra recursos na União. A mudança abre espaço para milhares de contestações judiciais, anistia fraudes fiscais e favorece lobbies empresariais, principalmente da indústria alimentícia e bancos.
“A quem interessa a desorganização das finanças estaduais e municipais, depois do longo e custoso processo de saneamento das contas, a partir da consolidação e do refinanciamento das dívidas com o Tesouro Nacional e da implantação da Lei de Responsabilidade Fiscal? Será que os defensores dessa proposta de reforma tributária querem ainda mais concentração de recursos e poder no governo central?”, indaga Dias. A primeira pergunta se baseia numa hipótese; a segunda, na certeza.
Patrimonialismo
São várias as causas do desenvolvimento desigual no Brasil. Algumas são naturais, como o preço cobrado pelo cristalino da Serra da Borborema ao desviar os ventos alísios do Nordeste, que levam as chuvas para longe do semi-árido. Ou as bençãos dos olhos d’água na Chapada da Ibiapaba, das cheias do Pantanal e do Amazonas, da larva vulcânica que rompeu o cristalino da Serra do Mar e deu origem às “terras roxas.” Outras, são econômicas, como os ciclos da cana-de-açúcar, do cacau, da borracha, do algodão, do café, do ouro e diamantes, com seus esplendores e decadências, congelando no tempo a iniquidade social herdada da escravidão nas atividades ainda hoje remanescentes. Há, ainda, as conseqüências históricas das insurreições das províncias no Império, sufocadas a ferro e fogo, como a Confederação do Equador, que transformou Pernambuco num estado periférico, e a Cabanagem, no qual dois terços da população masculina do Pará foram dizimados, dentre outros episódios sangrentos.
A principal causa das nossas desigualdades, porém, é o patrimonialismo. Ainda hoje as oligarquias são as que mais se beneficiam dos investimentos públicos nos estados, graças ao apoio que emprestam à União para que esta imponha sua centralidade (normatizar, coagir e arrecadar) aos estados mais populosos e dinâmicos. Um exercício de motivação comum nas empresas é a simulação de uma guerra mundial, na qual as nações envolvidas dispõem de recursos financeiros, alimentos, minerais e armas em condições desiguais. Ao final da guerra, a relação se inverte completamente. No jogo, sempre há duas nações com recursos exatamente iguais e que acabam em situações muito diferentes, por causa da atuação de seus governantes. Não há no Brasil dois estados iguais. Assim mesmo, é possível avaliar historicamente a atuação de suas elites. Basta, por exemplo, comparar as trajetórias do Ceará com o Maranhão ou de Pernambuco com a Bahia nos últimos 50 anos.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
sexta-feira, 5 de dezembro de 2008
Militar acusado de ser torturador
Tenente admite, em comissão da Câmara, ter cortado cabeças e mãos de três guerrilheiros no Araguaia. “Uma guerra é assim”, justificou
Luiz Carlos Azedo
Da equipe do Correio
O presidente da Comissão Especial da Lei de Anistia, deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA), vai pedir ao Ministério Público federal que processe por prática de tortura e assassinato o tenente da reserva José Vargas Jiménez, que admitiu ter cortado cabeças e mãos de três guerrilheiros do Araguaia durante as operações de combate do Exército na área. A confissão do militar reformado foi feita durante depoimento na comissão, na última quarta-feira, na Câmara dos Deputados. “Eu estive na guerrilha e uma guerra é assim”, justificou Jimenez, que era segundo-sargento do Exército por ocasião dos combates com os guerrilheiros ligados ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB).
Ao se justificar perante os deputados, Jiménez disse que não considerava a tortura como um crime hediondo quando estava no Araguaia. “Hoje em dia, que eu tenho estudo, sou bacharel em direito, sou politizado, eu vejo que realmente nós fizemos muito mais, mas é hipocrisia dizer que não tem que ser feito, porque senão ninguém conta”, observou. O ex-militar lançou um livro recentemente sobre a guerrilha do Araguaia e considera “revanchismo” as críticas à Lei de Anistia e às Forças Armadas.
O depoimento chocou os participantes da reunião. Jiménez, ex-chefe de grupo do Exército no confronto contra os comunistas, confirmou que tem em seu poder documentos secretos sobre as operações militares realizadas à época. Disse que recebeu ordens para matar todos os guerrilheiros. Jimenez assumiu a prática de torturas. Revelou que os corpos dos guerrilheiros mortos foram largados na selva “para os bichos comerem” e que as cabeças e mãos de três guerrilheiros foram cortadas e levadas a Marabá (PA), onde seriam identificadas. “Não dava para carregar os corpos no meio da selva”, justificou.
Amuleto
“Ali ficou configurada uma confissão”, avalia Almeida, que resolveu antecipar o envio do depoimento ao Ministério Público e não esperar a conclusão do relatório final da comissão. Os três guerrilheiros decapitados seriam os militantes do PCdoB André Grabois, João Gualberto Calatroni e Antônio Alfredo de Lima, mortos por uma patrulha do Exército no sítio de Oneide. O episódio teria sido horripilante. Um dos soldados utilizou os ossos descarnados dos dedos de um dos guerrilheiros como amuleto, num colar pendurado no pescoço. Considerava-o um troféu de guerra.
Segundo Jiménez, o Centro de Informações do Exército (Ciex) deu ordens, em 1975, para que documentos sobre a Guerrilha do Araguaia fossem destruídos, mas ele os conservou. O relator da comissão, deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), avalia que Jiménez não levou em consideração que “o crime de tortura é imprescritível”. A comissão pretende encaminhar a gravação do depoimento na íntegra para o Ministério Público Federal. “Assim ele não poderá alegar que houve manipulação. O tenente é um fanfarrão. Ele assume crimes, e, se assume crimes, tem que responder por eles”, afirmou o parlamentar. “Ele pensa que os crimes são prescritos. Só que tortura não se prescreve”, afirma Faria de Sá.
Publicado hoje no Correio Braziliense
Luiz Carlos Azedo
Da equipe do Correio
O presidente da Comissão Especial da Lei de Anistia, deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA), vai pedir ao Ministério Público federal que processe por prática de tortura e assassinato o tenente da reserva José Vargas Jiménez, que admitiu ter cortado cabeças e mãos de três guerrilheiros do Araguaia durante as operações de combate do Exército na área. A confissão do militar reformado foi feita durante depoimento na comissão, na última quarta-feira, na Câmara dos Deputados. “Eu estive na guerrilha e uma guerra é assim”, justificou Jimenez, que era segundo-sargento do Exército por ocasião dos combates com os guerrilheiros ligados ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB).
Ao se justificar perante os deputados, Jiménez disse que não considerava a tortura como um crime hediondo quando estava no Araguaia. “Hoje em dia, que eu tenho estudo, sou bacharel em direito, sou politizado, eu vejo que realmente nós fizemos muito mais, mas é hipocrisia dizer que não tem que ser feito, porque senão ninguém conta”, observou. O ex-militar lançou um livro recentemente sobre a guerrilha do Araguaia e considera “revanchismo” as críticas à Lei de Anistia e às Forças Armadas.
O depoimento chocou os participantes da reunião. Jiménez, ex-chefe de grupo do Exército no confronto contra os comunistas, confirmou que tem em seu poder documentos secretos sobre as operações militares realizadas à época. Disse que recebeu ordens para matar todos os guerrilheiros. Jimenez assumiu a prática de torturas. Revelou que os corpos dos guerrilheiros mortos foram largados na selva “para os bichos comerem” e que as cabeças e mãos de três guerrilheiros foram cortadas e levadas a Marabá (PA), onde seriam identificadas. “Não dava para carregar os corpos no meio da selva”, justificou.
Amuleto
“Ali ficou configurada uma confissão”, avalia Almeida, que resolveu antecipar o envio do depoimento ao Ministério Público e não esperar a conclusão do relatório final da comissão. Os três guerrilheiros decapitados seriam os militantes do PCdoB André Grabois, João Gualberto Calatroni e Antônio Alfredo de Lima, mortos por uma patrulha do Exército no sítio de Oneide. O episódio teria sido horripilante. Um dos soldados utilizou os ossos descarnados dos dedos de um dos guerrilheiros como amuleto, num colar pendurado no pescoço. Considerava-o um troféu de guerra.
Segundo Jiménez, o Centro de Informações do Exército (Ciex) deu ordens, em 1975, para que documentos sobre a Guerrilha do Araguaia fossem destruídos, mas ele os conservou. O relator da comissão, deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), avalia que Jiménez não levou em consideração que “o crime de tortura é imprescritível”. A comissão pretende encaminhar a gravação do depoimento na íntegra para o Ministério Público Federal. “Assim ele não poderá alegar que houve manipulação. O tenente é um fanfarrão. Ele assume crimes, e, se assume crimes, tem que responder por eles”, afirmou o parlamentar. “Ele pensa que os crimes são prescritos. Só que tortura não se prescreve”, afirma Faria de Sá.
Publicado hoje no Correio Braziliense
quarta-feira, 3 de dezembro de 2008
A porta principal
O diabo no meio do redemoinho, porém, é a proposta de acabar com a reeleição e aumentar todos os mandatos para cinco anos, com exceção dos do Senado, que seriam reduzidos
Por Luiz Carlos Azedo
Por mais que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esbraveje contra os agourentos da crise, os fatos são teimosos: a realidade mudou. De um lado, a crise mundial já provocou recessão nos Estados Unidos, Itália, Alemanha e Japão, entre outros países, e as nossas indústrias estão com atividade reduzida, algumas até parando. De outro, começou a contagem regressiva para a sucessão presidencial de 2010 e todas as ações políticas miram esse objetivo, o que acaba por absorver a energia do próprio governo federal. Manda o bom senso, portanto, fazer o possível e esquecer os projetos mirabolantes.
Final da linha
Nos últimos 18 anos, o Brasil transitou do modelo autárquico de substituição das importações para o projeto de integração à economia globalizada. Esse processo foi iniciado pelo presidente Collor de Mello, com a abertura para as importações, e avançou durante os governos FHC e Lula. Com o Plano Real, o presidente Fernando Henrique Cardoso aproveitou a poupança externa e o estímulo fiscal para estabilizar a moeda. Mas capotou na crise cambial de 1999, quando o estímulo fiscal chegou ao limite, pressionando a taxa de juros e a carga tributária. O governo Lula deu seqüência ao mesmo projeto de integração, na base do “mais do mesmo”: juros altos, câmbio flutuante e superávit fiscal. Graças à grande liquidez global e à elevação dos preços das commodities agrícolas e minerais, usou a poupança externa para ampliar o mercado interno. Crédito direto, gastos públicos, crescimento da massa salarial e programas sociais como o Bolsa Família garantiram o sucesso da empreitada.
Agora, o tempo fechou. Acabou o crédito mundial abundante, as taxas de juros do mercado internacional estão subindo. A partir dos Estados Unidos, instalou-se uma crise financeira nos países desenvolvidos que atinge a periferia emergente. China, Rússia, Índia e Brasil, em diferentes escalas, estão sentindo o tranco. Pior: a China replica para o Brasil e outros países o impacto que sofre com a redução do consumo nos Estados Unidos. O setor siderúrgico brasileiro, por exemplo, está em retração. A crise mundial será longa; não estamos fora disso.
Nova agenda
A taxa de crescimento do PIB brasileiro, que está prevista para 5,2% este ano, deverá cair a 2% em 2009, apesar da retórica oficial otimista de que cresceremos 4%. O governo Lula enfrenta a borrasca. Mas ela é como a chuva em Santa Catarina, não tem dó nem piedade. É maior do que as medidas anticrise adotadas. Não só aqui, é maior no mundo inteiro. Alavancado pela liquidez internacional, com elevadas taxas de juros domésticas, o nosso atual modelo econômico não é capaz de viabilizar os investimentos e o consumo. O Brasil precisa reinventar sua economia; o governo Lula não tem tempo para isso.
A crise mudou o eixo do debate político. A aposta do governo Lula para consolidar a hegemonia do bloco PT-PMDB e eleger seu sucessor é o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), um misto de fomento da atividade produtiva e plataforma eleitoral. O objetivo é consolidar a candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Esse esquema funcionou com sucesso no primeiro turno das eleições municipais. No segundo turno, engasgou. Pode ser a salvação da lavoura para enfrentar a crise, mas já não exerce o mesmo fascínio de antes junto aos aliados. Apenas empata o jogo.
Entretanto, o governo desengavetou duas reformas. Uma é a tributária, que especialistas consideram temerária por causa crise, mas que possibilita a construção de um discurso contra o “Sul Maravilha”, principalmente São Paulo. O risco desse embate no Congresso é consolidar um conflito entre os estados meridionais e o resto do país, divisão com raízes históricas, que a União sempre combateu, mas agora quer alimentar. A outra é a política, cujas intenções são obscuras. Aparentemente, o fim das coligações e a janela para o troca-troca partidário abririam caminho para consolidação de dois blocos partidários, um governista e outro de oposição. O diabo no meio do redemoinho, porém, é a proposta de acabar com a reeleição e aumentar todos os mandatos para cinco anos, com exceção dos do Senado, que seriam reduzidos. É uma espécie de saída pela porta dos fundos. A porta da frente é discutir tudo isso e o novo modelo econômico na campanha eleitoral de 2010, sem mudar as regras do jogo.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
Por Luiz Carlos Azedo
Por mais que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esbraveje contra os agourentos da crise, os fatos são teimosos: a realidade mudou. De um lado, a crise mundial já provocou recessão nos Estados Unidos, Itália, Alemanha e Japão, entre outros países, e as nossas indústrias estão com atividade reduzida, algumas até parando. De outro, começou a contagem regressiva para a sucessão presidencial de 2010 e todas as ações políticas miram esse objetivo, o que acaba por absorver a energia do próprio governo federal. Manda o bom senso, portanto, fazer o possível e esquecer os projetos mirabolantes.
Final da linha
Nos últimos 18 anos, o Brasil transitou do modelo autárquico de substituição das importações para o projeto de integração à economia globalizada. Esse processo foi iniciado pelo presidente Collor de Mello, com a abertura para as importações, e avançou durante os governos FHC e Lula. Com o Plano Real, o presidente Fernando Henrique Cardoso aproveitou a poupança externa e o estímulo fiscal para estabilizar a moeda. Mas capotou na crise cambial de 1999, quando o estímulo fiscal chegou ao limite, pressionando a taxa de juros e a carga tributária. O governo Lula deu seqüência ao mesmo projeto de integração, na base do “mais do mesmo”: juros altos, câmbio flutuante e superávit fiscal. Graças à grande liquidez global e à elevação dos preços das commodities agrícolas e minerais, usou a poupança externa para ampliar o mercado interno. Crédito direto, gastos públicos, crescimento da massa salarial e programas sociais como o Bolsa Família garantiram o sucesso da empreitada.
Agora, o tempo fechou. Acabou o crédito mundial abundante, as taxas de juros do mercado internacional estão subindo. A partir dos Estados Unidos, instalou-se uma crise financeira nos países desenvolvidos que atinge a periferia emergente. China, Rússia, Índia e Brasil, em diferentes escalas, estão sentindo o tranco. Pior: a China replica para o Brasil e outros países o impacto que sofre com a redução do consumo nos Estados Unidos. O setor siderúrgico brasileiro, por exemplo, está em retração. A crise mundial será longa; não estamos fora disso.
Nova agenda
A taxa de crescimento do PIB brasileiro, que está prevista para 5,2% este ano, deverá cair a 2% em 2009, apesar da retórica oficial otimista de que cresceremos 4%. O governo Lula enfrenta a borrasca. Mas ela é como a chuva em Santa Catarina, não tem dó nem piedade. É maior do que as medidas anticrise adotadas. Não só aqui, é maior no mundo inteiro. Alavancado pela liquidez internacional, com elevadas taxas de juros domésticas, o nosso atual modelo econômico não é capaz de viabilizar os investimentos e o consumo. O Brasil precisa reinventar sua economia; o governo Lula não tem tempo para isso.
A crise mudou o eixo do debate político. A aposta do governo Lula para consolidar a hegemonia do bloco PT-PMDB e eleger seu sucessor é o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), um misto de fomento da atividade produtiva e plataforma eleitoral. O objetivo é consolidar a candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Esse esquema funcionou com sucesso no primeiro turno das eleições municipais. No segundo turno, engasgou. Pode ser a salvação da lavoura para enfrentar a crise, mas já não exerce o mesmo fascínio de antes junto aos aliados. Apenas empata o jogo.
Entretanto, o governo desengavetou duas reformas. Uma é a tributária, que especialistas consideram temerária por causa crise, mas que possibilita a construção de um discurso contra o “Sul Maravilha”, principalmente São Paulo. O risco desse embate no Congresso é consolidar um conflito entre os estados meridionais e o resto do país, divisão com raízes históricas, que a União sempre combateu, mas agora quer alimentar. A outra é a política, cujas intenções são obscuras. Aparentemente, o fim das coligações e a janela para o troca-troca partidário abririam caminho para consolidação de dois blocos partidários, um governista e outro de oposição. O diabo no meio do redemoinho, porém, é a proposta de acabar com a reeleição e aumentar todos os mandatos para cinco anos, com exceção dos do Senado, que seriam reduzidos. É uma espécie de saída pela porta dos fundos. A porta da frente é discutir tudo isso e o novo modelo econômico na campanha eleitoral de 2010, sem mudar as regras do jogo.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
terça-feira, 2 de dezembro de 2008
Entrevista com Diego Hipólito
O 3 a 1, programa de entrevistas e debates da TV Brasil, do qual sou o apresentador, recebe nesta quarta, às 22 h, o ginasta Diego Hypólito, que fala de sua vida, dos desafios que os atletas enfrentam e explica como é a superação dos fracassos. Diego fala, ainda, como lidou com a derrota nas Olimpíadas de Pequim 2008, quando ele era um dos favoritos para ganhar a medalha de ouro na ginástica olímpica e caiu num salto que executava com perfeição desde os 14 anos.
Também participa do programa o presidente da Sociedade de Psicologia do Esporte do Estado do Rio de Janeiro, João Alberto Barreto, psicólogo especializado em atletas de alto desempenho. Ele acompanhou a equipe feminina de ginástica olímpica nas Olimpíadas de Los Angeles, em 1984.
Outro convidado é o treinador e professor de Educação Física Geraldo Bernardes, que dirigiu a equipe nacional em quatro Olimpíadas (Sydney/2000, Atlanta/1996, Barcelona/1992 e Seul/1988), cinco Mundiais (1999,97,95,93,91 e 87), seis Jogos Pan-Americanos (1999,97,93,87 e 83), dez campeonatos Sul-Americanos e quatro Jogos Sul-Americanos. Além disso, colocou nas diversas Seleções Brasileiras (Juvenil, Junior e Sênior) 12 atletas, culminando com Flávio Canto. Atualmente, ele tem uma escolinha de judô que atende mais de 700 crianças carentes na cidade do Rio de Janeiro.
Também participa do programa o presidente da Sociedade de Psicologia do Esporte do Estado do Rio de Janeiro, João Alberto Barreto, psicólogo especializado em atletas de alto desempenho. Ele acompanhou a equipe feminina de ginástica olímpica nas Olimpíadas de Los Angeles, em 1984.
Outro convidado é o treinador e professor de Educação Física Geraldo Bernardes, que dirigiu a equipe nacional em quatro Olimpíadas (Sydney/2000, Atlanta/1996, Barcelona/1992 e Seul/1988), cinco Mundiais (1999,97,95,93,91 e 87), seis Jogos Pan-Americanos (1999,97,93,87 e 83), dez campeonatos Sul-Americanos e quatro Jogos Sul-Americanos. Além disso, colocou nas diversas Seleções Brasileiras (Juvenil, Junior e Sênior) 12 atletas, culminando com Flávio Canto. Atualmente, ele tem uma escolinha de judô que atende mais de 700 crianças carentes na cidade do Rio de Janeiro.
Combate à sombra
O mandato de cinco anos permitiria um acerto entre Serra e e o governador de Minas, Aécio Neves, que também pleiteia a candidatura do PSDB. Mas pode ser um presente de grego.
O famoso general chinês Sun Tzu, diferentemente de
seus colegas gregos e romanos, não levava em conta
apenas a superioridade numérica ou o terreno na
hora de avaliar as batalhas. Ele compreendia a guerra
levando em conta, também, outros fatores, dos valores
morais às condições econômicas. Para ele, a verdadeira arte
da guerra era aquela capaz de subjugar o exército inimigo
sem lutar contra ele, invadir cidades sem sitiá-las, derrubar
governos sem o uso das espadas.
A conquista
Sun Tzu não via a guerra com objetivo da destruição. Para ele,
a verdadeira conquista era deixar tudo intacto e sob controle.
Por isso, foi o primeiro grande estrategista militar a atribuir
papel decisivo aos serviços de inteligência. Classificava os espiões
em cinco categorias: nativos (gente do povo), internos
(oficiais inimigos), sacrificáveis (agentes de contra-informação),
vivos (os eficientes e leais) e, finalmente, os agentes duplos
(espiões inimigos deliberadamente usados para troca de
informações). Sem o bom emprego de agentes duplos, segundo
o general chinês, era impossível ganhar a guerra.
Com o governo Lula assediado pela crise econômica mundial,
o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), opera como
um veterano general chinês. Resolveu combater à sombra
e conduzir sua candidatura a presidente da República como
quem pretende tomar o poder sem o uso das espadas. Não
pretende sitiar o Palácio do Planalto, evita qualquer confronto
com o presidente da República. Opera no terreno governista
de todas as formas, pois o que não falta entre os aliados do governo
e seus próprios aliados é gente fazendo jogo duplo.
A mais bem-sucedida operação desse tipo, até agora, foi a
venda da Nossa Caixa ao Banco do Brasil, na qual o governo
paulista vai embolsar R$ 5,3 bilhões. Num momento em que a
crise econômica ameaçava abater a indústria de São Paulo e
deixar completamente descapitalizada a sua administração,
Serra conseguiu socorrer as montadoras de automóveis e fazer
caixa para investimentos. Os petistas de São Paulo sentiram
o golpe e espernearam, mas o presidente Lula não deu
bola. Aparentemente, entregou a grana com uma das
mãos, mas quer tirar com a outra, por meio da reforma
tributária, que transfere a arrecadação do ICMS do estado
de origem para os estadosde destino. Os governadores
do Norte e Nordeste apóiama proposta, enquanto os do
Sudeste resistem. Bom cabrito,Serra diz que apóia a
reforma e manda a bancada paulista obstruir sua aprovação
no Congresso.
O desespero
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou até
agora, em todos os momentos de dificuldade, que não é de
cair com o barulho da bala. Insiste na candidatura da ministra-
chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, que andava meio desidratada,
à sucessão em 2010. Lula pretende fazer da crise
mundial uma oportunidade para a “mãe do PAC” (Programa
de Aceleração do Crescimento) se fortalecer. Suas medidas
anticíclicas estão garantindo aos brasileiros um Natal quase
igual aos de outros anos, apesar das incertezas. Mesmo assim,
o consumidor anda desconfiado. O crédito não está tão
fácil como foi anunciado. Sabe-se, agora, que boa parte da
grana da Caixa Econômica Federal reservada para os pequenos
e médios empresários foi abocanhada pela Petrobras,
que tomou emprestado R$ 2 bilhões para garantir o pagamento
de impostos e, portanto, a arrecadação federal.
Sem o sangue-frio de Lula, a bancada petista no Congresso
começa a dar sinais de desespero com a movimentação de
Serra e a situação de Dilma. Estava tudo combinado para a
entrega da Presidência da Câmara ao deputado Michel Temer,
presidente do PMDB, partido onde a turma do jogo duplo
é maioria. Aliado do governo Lula em nível federal e de
Serra no plano estadual, Temer sofre bombardeios sistemáticos
de governistas que não vêem com bons olhos a aliança, a
começar pelo ex-ministro da Articulação Política Aldo Rebelo
(PCdoB-SP). No Senado, o PT não abre mão da candidatura
de Tião Viana (AC), mas a bancada do PMDB não fecha o
acordo e ameaça lançar uma candidatura própria. Se prevalecer
o jogo duplo, o petista corre risco de perder a eleição.
É nesse contexto que surge um presente de grego para
Serra: o deputado João Paulo Cunha (PT-SP), ex-presidente
da Câmara, relator da reforma política, pretende apresentar
um substitutivo que acaba com a reeleição e estabelece o
mandato de cinco anos, sem reeleição, para presidente da
República, governadores e prefeitos. É uma mudança de regra
no meio do jogo. Supostamente, o mandato de cinco
anos permitiria um acerto entre Serra e o governador de Minas,
Aécio Neves, que também pleiteia a candidatura do
PSDB. Mas pode ser o “Cavalo de Tróia” para a velha proposta
do deputado Devanir Ribeiro (PT-SP): o plebiscito no qual
o povo decidiria se o presidente Lula deve ou não disputar
um novo mandato de cinco anos. Ou seja, o terceiro.
Publicado em 30 de novembro, na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
O famoso general chinês Sun Tzu, diferentemente de
seus colegas gregos e romanos, não levava em conta
apenas a superioridade numérica ou o terreno na
hora de avaliar as batalhas. Ele compreendia a guerra
levando em conta, também, outros fatores, dos valores
morais às condições econômicas. Para ele, a verdadeira arte
da guerra era aquela capaz de subjugar o exército inimigo
sem lutar contra ele, invadir cidades sem sitiá-las, derrubar
governos sem o uso das espadas.
A conquista
Sun Tzu não via a guerra com objetivo da destruição. Para ele,
a verdadeira conquista era deixar tudo intacto e sob controle.
Por isso, foi o primeiro grande estrategista militar a atribuir
papel decisivo aos serviços de inteligência. Classificava os espiões
em cinco categorias: nativos (gente do povo), internos
(oficiais inimigos), sacrificáveis (agentes de contra-informação),
vivos (os eficientes e leais) e, finalmente, os agentes duplos
(espiões inimigos deliberadamente usados para troca de
informações). Sem o bom emprego de agentes duplos, segundo
o general chinês, era impossível ganhar a guerra.
Com o governo Lula assediado pela crise econômica mundial,
o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), opera como
um veterano general chinês. Resolveu combater à sombra
e conduzir sua candidatura a presidente da República como
quem pretende tomar o poder sem o uso das espadas. Não
pretende sitiar o Palácio do Planalto, evita qualquer confronto
com o presidente da República. Opera no terreno governista
de todas as formas, pois o que não falta entre os aliados do governo
e seus próprios aliados é gente fazendo jogo duplo.
A mais bem-sucedida operação desse tipo, até agora, foi a
venda da Nossa Caixa ao Banco do Brasil, na qual o governo
paulista vai embolsar R$ 5,3 bilhões. Num momento em que a
crise econômica ameaçava abater a indústria de São Paulo e
deixar completamente descapitalizada a sua administração,
Serra conseguiu socorrer as montadoras de automóveis e fazer
caixa para investimentos. Os petistas de São Paulo sentiram
o golpe e espernearam, mas o presidente Lula não deu
bola. Aparentemente, entregou a grana com uma das
mãos, mas quer tirar com a outra, por meio da reforma
tributária, que transfere a arrecadação do ICMS do estado
de origem para os estadosde destino. Os governadores
do Norte e Nordeste apóiama proposta, enquanto os do
Sudeste resistem. Bom cabrito,Serra diz que apóia a
reforma e manda a bancada paulista obstruir sua aprovação
no Congresso.
O desespero
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou até
agora, em todos os momentos de dificuldade, que não é de
cair com o barulho da bala. Insiste na candidatura da ministra-
chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, que andava meio desidratada,
à sucessão em 2010. Lula pretende fazer da crise
mundial uma oportunidade para a “mãe do PAC” (Programa
de Aceleração do Crescimento) se fortalecer. Suas medidas
anticíclicas estão garantindo aos brasileiros um Natal quase
igual aos de outros anos, apesar das incertezas. Mesmo assim,
o consumidor anda desconfiado. O crédito não está tão
fácil como foi anunciado. Sabe-se, agora, que boa parte da
grana da Caixa Econômica Federal reservada para os pequenos
e médios empresários foi abocanhada pela Petrobras,
que tomou emprestado R$ 2 bilhões para garantir o pagamento
de impostos e, portanto, a arrecadação federal.
Sem o sangue-frio de Lula, a bancada petista no Congresso
começa a dar sinais de desespero com a movimentação de
Serra e a situação de Dilma. Estava tudo combinado para a
entrega da Presidência da Câmara ao deputado Michel Temer,
presidente do PMDB, partido onde a turma do jogo duplo
é maioria. Aliado do governo Lula em nível federal e de
Serra no plano estadual, Temer sofre bombardeios sistemáticos
de governistas que não vêem com bons olhos a aliança, a
começar pelo ex-ministro da Articulação Política Aldo Rebelo
(PCdoB-SP). No Senado, o PT não abre mão da candidatura
de Tião Viana (AC), mas a bancada do PMDB não fecha o
acordo e ameaça lançar uma candidatura própria. Se prevalecer
o jogo duplo, o petista corre risco de perder a eleição.
É nesse contexto que surge um presente de grego para
Serra: o deputado João Paulo Cunha (PT-SP), ex-presidente
da Câmara, relator da reforma política, pretende apresentar
um substitutivo que acaba com a reeleição e estabelece o
mandato de cinco anos, sem reeleição, para presidente da
República, governadores e prefeitos. É uma mudança de regra
no meio do jogo. Supostamente, o mandato de cinco
anos permitiria um acerto entre Serra e o governador de Minas,
Aécio Neves, que também pleiteia a candidatura do
PSDB. Mas pode ser o “Cavalo de Tróia” para a velha proposta
do deputado Devanir Ribeiro (PT-SP): o plebiscito no qual
o povo decidiria se o presidente Lula deve ou não disputar
um novo mandato de cinco anos. Ou seja, o terceiro.
Publicado em 30 de novembro, na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
quinta-feira, 27 de novembro de 2008
Eleição na Câmara
O presidente do PMDB, deputado Michel Temer (SP), deu uma cartada decisiva para estabilizar a aliança da bancada do PMDB com a do PT em torno de sua candidatura a presidente da Câmara: ofereceu o comando da legenda ao líder do governo no Senado, Romero Jucá (RR), em troca do apoio dos senadores peemedebistas à candidatura de Tião Viana (PT-AC) a presidente do Senado.
A proposta de Temer tem por objetivo isolar o senador Renan Calheiros (PMDB-AC), que articula uma candidatura própria contra o petista Tião Viana (AC), candidato do Palácio do Planalto à Presidência do Senado (leia nota abaixo).
Se a candidatura de Viana naufragar por causa do PMDB no Senado, a de Temer corre o risco de ir a pique no dia seguinte, por uma retaliação do PT na Cãmara.
A proposta de Temer tem por objetivo isolar o senador Renan Calheiros (PMDB-AC), que articula uma candidatura própria contra o petista Tião Viana (AC), candidato do Palácio do Planalto à Presidência do Senado (leia nota abaixo).
Se a candidatura de Viana naufragar por causa do PMDB no Senado, a de Temer corre o risco de ir a pique no dia seguinte, por uma retaliação do PT na Cãmara.
Eleição no Senado
A eleição para presidente do Senado é a mais requintada disputa de poder do Congresso. O xadrez tem 81 peças, algumas sem um voto sequer, mas a maioria com muita experiência política. A principal é o expresidente José Sarney (PMDB-AP), que declara não ser candidato.
Um dos mandatários da Casa diz que é despiste, pois Sarney não aceitou a proposta do presidente Luiz Inácio lula da Silva para coordenar a campanha do petista Tião Viana(AC), o candidato oficial do Palácio do Planalto. Se fosse verdade, aceitaria.
Porque? Das duas, uma: ou Sarney é candidato e espera a hora de ser aclamado por consenso;ou avalia que Viana será derrotado por um candidato de última hora.
Um dos mandatários da Casa diz que é despiste, pois Sarney não aceitou a proposta do presidente Luiz Inácio lula da Silva para coordenar a campanha do petista Tião Viana(AC), o candidato oficial do Palácio do Planalto. Se fosse verdade, aceitaria.
Porque? Das duas, uma: ou Sarney é candidato e espera a hora de ser aclamado por consenso;ou avalia que Viana será derrotado por um candidato de última hora.
quarta-feira, 26 de novembro de 2008
Saída à francesa
É por causa do satélite de comunicações e do submarino nuclear que o presidente Lula prefere a parceria com a França, em detrimento dos Estados Unidos e da Rússia.
Por Luiz Carlos Azedo
Não existe nada que deixe um russo mais satisfeito com a hospitalidade brasileira do que um bom rodízio de churrasco regado a caipirinha. O risco é o convidado passar mal de tanto comer e beber. Nada mais natural, portanto, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ofereça um banquete à gaúcha ao jovem presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, sob a guarda do Cristo Redentor, no Palácio Guanabara, no Rio, tendo como co-anfitrião o governador Sérgio Cabral Filho (PMDB).
Rússia
Por trás da gastronomia, porém, há dois recados: o Brasil pretende comprar os “soviéticos” helicópteros de ataque MI-35, verdadeiros tanques voadores, mas quer que os russos ampliem as cotas de exportação para os produtos brasileiros, principalmente a carne. Ou seja, a cooperação militar com a Rússia depende da ampliação das relações comerciais de US$ 5 bilhões para US$ 10 bilhões e, principalmente, de uma política de transferência de tecnologia na área militar, à qual os russos são reticentes. Eles argumentam que isso exigiria uma escala de compras de armamentos semelhante às da China e da Índia, o que não é o caso brasileiro.
Oficialmente, no Ministério da Defesa, essa é a razão de o Brasil ter desclassificado os mais versáteis aviões de caça da atualidade, o Sukhoi SU-35, na licitação para renovação da esquadrilha de ataque da Força Aérea Brasileira. Os helicópteros russos, porém, são eficientes e robustos, têm tecnologia menos sofisticada e servirão de pau para toda obra na Amazônia. Além disso, os russos topam produzir no Brasil as peças de reposição. A compra dos aviões russos, diga-se de passagem, foi uma das causas da queda do ex-ministro da Defesa José Viegas Filho.
O governo brasileiro acendeu uma vela para Deus e outra para o diabo. Ao rejeitar os Sukhoi na habilitação para a licitação, sinalizou aos norte-americanos que vai manter a cooperação com os russos em termos moderados, ao contrário da Venezuela de Hugo Chávez ; ao mesmo tempo, abriu a porta para a compra de novos caças franceses Rafaele F 3 em substituição aos velhos Mirages. O problema é que os pilotos brasileiros preferem os F-18 E norte-americanos. Aliás, recentemente, com os F-5 recauchutados da FAB, deram um baile nos pilotos franceses durante exercícios aéreos conjuntos da Cruzex IV em que derrubaram os Mirage2000 baseados na Guiana Francesa. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, por razões geopolíticas, não esconde a torcida pelo Rafaele; o comandante da Aeronáutica, Junit Saito, por razões militares, prefere os aviões ianques.
França
No governo, quem defende maior cooperação com a Rússia é o ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger, por causa do futuro da Amazônia, da qual os russos estão mais distantes. Mas o que avança mesmo é a cooperação militar com a França (que tem um pedaço do território no subcontinente), na qual Jobim aposta todas as suas fichas. Haveria de parte dos franceses mais disposição para a transferência de tecnologias do que revelam norte-americanos e russos. Além dos aviões, os franceses querem nos vender um novo satélite de comunicações, que deixaria o Brasil livre da dependência em relação aos norte-americanos nessa área. Em tempos de “guerra eletrônica”, durante visita à França, Jobim se encantou com o projeto de “soldado do futuro” (infantaria com comunicação e equipamentos integrados), utilizando veículos blindados leves de transportes de tropas como ponto de apoio para “guerra em rede”.
Porém, a menina dos olhos da cooperação militar Brasil-França é a transferência de tecnologia para a construção do submarino nuclear que está sendo desenvolvido pela Marinha brasileira. Em termos doutrinários, para os militares, nosso país não terá “poder de dissuasão” para defender a plataforma continental e a chamada “Amazônia Azul” sem esse submarino, capaz de submergir por longos períodos e atacar de surpresa à longa distância da costa. Os ciclos de construção do seu reator nuclear e do combustível (urânio enriquecido) estão dominados, mas falta o principal em qualquer embarcação: o casco. O Brasil precisa construir os enormes anéis do casco e soldá-los; a França se dispõe a fazer isso por aqui, num estaleiro preparado para transferir tecnologia. É por causa do satélite e do submarino nuclear que o presidente Lula prefere a parceria com a França, em detrimento dos Estados Unidos e da Rússia. De quebra, deixaria o Brasil de fora da histórica rivalidade entre os dois protagonistas da antiga Guerra Fria. Tudo isso, é claro, se uma recessão mundial não atrapalhar.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
Por Luiz Carlos Azedo
Não existe nada que deixe um russo mais satisfeito com a hospitalidade brasileira do que um bom rodízio de churrasco regado a caipirinha. O risco é o convidado passar mal de tanto comer e beber. Nada mais natural, portanto, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ofereça um banquete à gaúcha ao jovem presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, sob a guarda do Cristo Redentor, no Palácio Guanabara, no Rio, tendo como co-anfitrião o governador Sérgio Cabral Filho (PMDB).
Rússia
Por trás da gastronomia, porém, há dois recados: o Brasil pretende comprar os “soviéticos” helicópteros de ataque MI-35, verdadeiros tanques voadores, mas quer que os russos ampliem as cotas de exportação para os produtos brasileiros, principalmente a carne. Ou seja, a cooperação militar com a Rússia depende da ampliação das relações comerciais de US$ 5 bilhões para US$ 10 bilhões e, principalmente, de uma política de transferência de tecnologia na área militar, à qual os russos são reticentes. Eles argumentam que isso exigiria uma escala de compras de armamentos semelhante às da China e da Índia, o que não é o caso brasileiro.
Oficialmente, no Ministério da Defesa, essa é a razão de o Brasil ter desclassificado os mais versáteis aviões de caça da atualidade, o Sukhoi SU-35, na licitação para renovação da esquadrilha de ataque da Força Aérea Brasileira. Os helicópteros russos, porém, são eficientes e robustos, têm tecnologia menos sofisticada e servirão de pau para toda obra na Amazônia. Além disso, os russos topam produzir no Brasil as peças de reposição. A compra dos aviões russos, diga-se de passagem, foi uma das causas da queda do ex-ministro da Defesa José Viegas Filho.
O governo brasileiro acendeu uma vela para Deus e outra para o diabo. Ao rejeitar os Sukhoi na habilitação para a licitação, sinalizou aos norte-americanos que vai manter a cooperação com os russos em termos moderados, ao contrário da Venezuela de Hugo Chávez ; ao mesmo tempo, abriu a porta para a compra de novos caças franceses Rafaele F 3 em substituição aos velhos Mirages. O problema é que os pilotos brasileiros preferem os F-18 E norte-americanos. Aliás, recentemente, com os F-5 recauchutados da FAB, deram um baile nos pilotos franceses durante exercícios aéreos conjuntos da Cruzex IV em que derrubaram os Mirage2000 baseados na Guiana Francesa. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, por razões geopolíticas, não esconde a torcida pelo Rafaele; o comandante da Aeronáutica, Junit Saito, por razões militares, prefere os aviões ianques.
França
No governo, quem defende maior cooperação com a Rússia é o ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger, por causa do futuro da Amazônia, da qual os russos estão mais distantes. Mas o que avança mesmo é a cooperação militar com a França (que tem um pedaço do território no subcontinente), na qual Jobim aposta todas as suas fichas. Haveria de parte dos franceses mais disposição para a transferência de tecnologias do que revelam norte-americanos e russos. Além dos aviões, os franceses querem nos vender um novo satélite de comunicações, que deixaria o Brasil livre da dependência em relação aos norte-americanos nessa área. Em tempos de “guerra eletrônica”, durante visita à França, Jobim se encantou com o projeto de “soldado do futuro” (infantaria com comunicação e equipamentos integrados), utilizando veículos blindados leves de transportes de tropas como ponto de apoio para “guerra em rede”.
Porém, a menina dos olhos da cooperação militar Brasil-França é a transferência de tecnologia para a construção do submarino nuclear que está sendo desenvolvido pela Marinha brasileira. Em termos doutrinários, para os militares, nosso país não terá “poder de dissuasão” para defender a plataforma continental e a chamada “Amazônia Azul” sem esse submarino, capaz de submergir por longos períodos e atacar de surpresa à longa distância da costa. Os ciclos de construção do seu reator nuclear e do combustível (urânio enriquecido) estão dominados, mas falta o principal em qualquer embarcação: o casco. O Brasil precisa construir os enormes anéis do casco e soldá-los; a França se dispõe a fazer isso por aqui, num estaleiro preparado para transferir tecnologia. É por causa do satélite e do submarino nuclear que o presidente Lula prefere a parceria com a França, em detrimento dos Estados Unidos e da Rússia. De quebra, deixaria o Brasil de fora da histórica rivalidade entre os dois protagonistas da antiga Guerra Fria. Tudo isso, é claro, se uma recessão mundial não atrapalhar.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense
terça-feira, 25 de novembro de 2008
Deu no Estadão
O calote do Equador
O presidente Rafael Correa, do Equador, padece de uma forma particularmente virulenta da doença infantil do populismo - aquela que leva seu portador a considerar ilegais e ilegítimos todos os empréstimos tomados por seu país, nos tempos em que ele ainda não havia assumido o poder para redimir o seu rebanho. No Brasil, durante mais de duas décadas, o PT e alguns partidos de esquerda pregaram o calote, a pretexto de sanear finanças viciadas e moralizar costumes degradados pela dívida externa. Felizmente, quando o PT chegou ao poder pelas mãos do presidente Lula, prevaleceu o bom senso deste e o assunto foi prudentemente esquecido. Com o presidente Rafael Correa foi diferente. Candidato, ele satanizou a forma como o Equador se endividou. Presidente, constituiu uma comissão para auditar a dívida externa, contraída entre 1976 e 2006, tomando o cuidado de escolher pessoas politicamente comprometidas para examinar uma questão eminentemente técnica, dos pontos de vista financeiro e jurídico.
O resultado, como não poderia deixar de ser, foi que a comissão descobriu ter havido uma imensa conspiração entre organismos multilaterais, bancos com atuação internacional e autoridades equatorianas - de todos os governos, destes últimos 30 anos - para afogar o país numa dívida que hoje chega a US$ 10 bilhões.De posse do relatório da comissão, Rafael Correa mandou formar uma rede de rádio e televisão e anunciou, primeiro, uma moratória técnica de 30 dias, suspendendo o pagamento dos juros dos bônus Global 2012, no valor de US$ 30,6 milhões, enquanto decide que medidas legais tomará em relação ao restante da dívida. A ameaça é estender a moratória a toda a dívida. Em segundo lugar, anunciou que estava recorrendo à Corte de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional para não pagar um empréstimo de US$ 286,8 milhões contraído pela estatal equatoriana de energia com o BNDES para que a Odebrecht pudesse construir a Hidrelétrica de San Francisco.
Já afirmamos nesta página que, ao expulsar a Odebrecht e Furnas do Equador, ameaçando, ao mesmo tempo, não pagar o BNDES, Rafael Correa queria fazer o melhor negócio do mundo: ficar com a usina - que, depois de feitos os consertos necessários, funciona a plena carga - sem pagar o saldo do financiamento, que não é pequeno. Na verdade, ele quer mais. Pretende dar o calote em todos os credores do Equador. E, assim como pouco se abalou com a reação do governo brasileiro, que tardou, mas veio na forma da chamada a Brasília do seu embaixador em Quito, não teme a reação da comunidade financeira internacional, pois, como altos funcionários equatorianos disseram, a Venezuela do caudilho Hugo Chávez está aí, para fornecer os dólares que os bancos internacionais deixarão de enviar ao país.
Rafael Correa especializa-se em armações. Criou, no caso da Usina de San Francisco, que hoje fornece cerca de 10% da eletricidade consumida no país, um incidente que poderia ser resolvido - como de fato foi - por meio de negociação, sem que fosse transformado em dissídio diplomático. Agora, acusa a comunidade financeira internacional das piores vilanias, como se não soubesse que em 2000, com o Equador mergulhado na recessão e com uma inflação estratosférica, os bancos aceitaram trocar títulos Brady e eurobônus no valor de US$ 6,964 bilhões por títulos do Tesouro, no valor de US$ 3,750 bilhões, espichando o vencimento em até 30 anos.
O feitiço pode se voltar contra o aprendiz de feiticeiro. Se ampliar a moratória, Rafael Correa deve se preparar para a reação dos credores lesados, que podem arrestar os depósitos no exterior do Banco Central do Equador e os carregamentos de petróleo que constituem a maior receita do país. Verá como custa caro a aventura da moratória.Com o Brasil, o insulto também não sairá barato. As relações diplomáticas estão comprometidas e podem eventualmente ser rompidas. Quando a Odebrecht foi expulsa, o presidente Lula mandou cancelar a ida a Quito de uma missão ministerial que negociaria projetos de integração regional, inclusive uma estrada ligando Manaus a Manta, no Pacífico. Agora, o governo brasileiro revê todos os itens do relacionamento bilateral, que inclui cooperação nas áreas de saúde, educação, meio ambiente e energia. Brasília finalmente parece ter compreendido que não se pode ter sócios dessa espécie.
O presidente Rafael Correa, do Equador, padece de uma forma particularmente virulenta da doença infantil do populismo - aquela que leva seu portador a considerar ilegais e ilegítimos todos os empréstimos tomados por seu país, nos tempos em que ele ainda não havia assumido o poder para redimir o seu rebanho. No Brasil, durante mais de duas décadas, o PT e alguns partidos de esquerda pregaram o calote, a pretexto de sanear finanças viciadas e moralizar costumes degradados pela dívida externa. Felizmente, quando o PT chegou ao poder pelas mãos do presidente Lula, prevaleceu o bom senso deste e o assunto foi prudentemente esquecido. Com o presidente Rafael Correa foi diferente. Candidato, ele satanizou a forma como o Equador se endividou. Presidente, constituiu uma comissão para auditar a dívida externa, contraída entre 1976 e 2006, tomando o cuidado de escolher pessoas politicamente comprometidas para examinar uma questão eminentemente técnica, dos pontos de vista financeiro e jurídico.
O resultado, como não poderia deixar de ser, foi que a comissão descobriu ter havido uma imensa conspiração entre organismos multilaterais, bancos com atuação internacional e autoridades equatorianas - de todos os governos, destes últimos 30 anos - para afogar o país numa dívida que hoje chega a US$ 10 bilhões.De posse do relatório da comissão, Rafael Correa mandou formar uma rede de rádio e televisão e anunciou, primeiro, uma moratória técnica de 30 dias, suspendendo o pagamento dos juros dos bônus Global 2012, no valor de US$ 30,6 milhões, enquanto decide que medidas legais tomará em relação ao restante da dívida. A ameaça é estender a moratória a toda a dívida. Em segundo lugar, anunciou que estava recorrendo à Corte de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional para não pagar um empréstimo de US$ 286,8 milhões contraído pela estatal equatoriana de energia com o BNDES para que a Odebrecht pudesse construir a Hidrelétrica de San Francisco.
Já afirmamos nesta página que, ao expulsar a Odebrecht e Furnas do Equador, ameaçando, ao mesmo tempo, não pagar o BNDES, Rafael Correa queria fazer o melhor negócio do mundo: ficar com a usina - que, depois de feitos os consertos necessários, funciona a plena carga - sem pagar o saldo do financiamento, que não é pequeno. Na verdade, ele quer mais. Pretende dar o calote em todos os credores do Equador. E, assim como pouco se abalou com a reação do governo brasileiro, que tardou, mas veio na forma da chamada a Brasília do seu embaixador em Quito, não teme a reação da comunidade financeira internacional, pois, como altos funcionários equatorianos disseram, a Venezuela do caudilho Hugo Chávez está aí, para fornecer os dólares que os bancos internacionais deixarão de enviar ao país.
Rafael Correa especializa-se em armações. Criou, no caso da Usina de San Francisco, que hoje fornece cerca de 10% da eletricidade consumida no país, um incidente que poderia ser resolvido - como de fato foi - por meio de negociação, sem que fosse transformado em dissídio diplomático. Agora, acusa a comunidade financeira internacional das piores vilanias, como se não soubesse que em 2000, com o Equador mergulhado na recessão e com uma inflação estratosférica, os bancos aceitaram trocar títulos Brady e eurobônus no valor de US$ 6,964 bilhões por títulos do Tesouro, no valor de US$ 3,750 bilhões, espichando o vencimento em até 30 anos.
O feitiço pode se voltar contra o aprendiz de feiticeiro. Se ampliar a moratória, Rafael Correa deve se preparar para a reação dos credores lesados, que podem arrestar os depósitos no exterior do Banco Central do Equador e os carregamentos de petróleo que constituem a maior receita do país. Verá como custa caro a aventura da moratória.Com o Brasil, o insulto também não sairá barato. As relações diplomáticas estão comprometidas e podem eventualmente ser rompidas. Quando a Odebrecht foi expulsa, o presidente Lula mandou cancelar a ida a Quito de uma missão ministerial que negociaria projetos de integração regional, inclusive uma estrada ligando Manaus a Manta, no Pacífico. Agora, o governo brasileiro revê todos os itens do relacionamento bilateral, que inclui cooperação nas áreas de saúde, educação, meio ambiente e energia. Brasília finalmente parece ter compreendido que não se pode ter sócios dessa espécie.
domingo, 23 de novembro de 2008
As veias abertas
Nos Estados Unidos, a integração racial começou para valer com a doutrina Sullivan, que obrigou as empresas norte-americanas a ter um diretor negro na África do Sul e implodiu o apartheid
Por Luiz Carlos Azedo
Acabo de ler, emocionado, um artigo do escritor moçambicano Mia Couto intitulado “Se Obama fosse africano”. O tema desta coluna é correlato, mas optei por um título inspirado em Eduardo Galeano, estudioso do colonialismo e da dependência na América Latina. Vamos, pois, ao sarapatel histórico-político-antropológico.
Africanos
O que disse Mia Couto? Fez uma reflexão sobre a repercussão da eleição de Barack Obama na África, intensamente comemorada, seja em manifestações espontâneas do povo africano, seja em pronunciamentos e atos oficiais. Passada a euforia, da qual Mia Couto fez parte (diz que chorou tanto quanto na posse de Nelson Mandela na Presidência da África do Sul), pôs-se o escritor a imaginar o que aconteceria com Obama na África.
Primeiro, teria que esperar muito, porque os governantes costumam prorrogar seus mandatos e se reeleger seguidamente, em eleições fraudulentas. Seriam 41 anos no Gabão, 39 na Líbia, 28 no Zimbabwe, 28 na Guiné Equatorial, 28 em Angola, 27 no Egito, 26 em Camarões. Robert Mugabe, no Zimbabwe, terá 90 ao terminar o atual mandato. Segundo, na oposição, não teria espaço para fazer campanha. Com sorte, não seria assassinado. Terceiro, poderia ter a nacionalidade contestada, pois é filho de norte-americana. É o que acontece com Keneth Kauda, líder na independência da Zâmbia, país que já governou (ops!) por 25 anos. Quarto, Obama só é negro no Ocidente; se fosse africano, seria mulato, representante de “outra raça”, a do colonizador. Seria vilipendiado por sua condição racial. Quinto, segundo ainda Mia Couto, as posições de Obama em relação às mulheres e ao homossexualismo jamais seriam aceitas pela “pureza africana”.
Brasileiros
O Brasil é um país continental por causa da esperteza da nossa antiga elite branca escravocrata. O direito à propriedade privada — um dogma liberal — foi introduzido por D. Pedro I na Constituição de 1824, outorgada por ele, depois de fechar a Constituição de 1823, para salvaguardar os proprietários de escravos. Na Independência, para proteger o tráfico negreiro, tentou anexar Angola ao Brasil Imperial, mas os ingleses não deixaram. A então colônia africana, após a expulsão dos holandeses do Nordeste, foi recuperada muito antes de Moçambique, pela esquadra armada por proprietários fluminenses sob comando de Salvador de Sá.
Havia — e ainda há em alguns lugares — escravidão doméstica na África, por causa das guerras, desequilíbrios demográficos e fome. O que os portugueses fizerem no Brasil foi resgatar a velha escravidão romana e transformá-la na forma mais abjeta e brutal de acumulação pré-capitalista do mercantilismo. O Estado brasileiro consolidou nossas fronteiras graças ao extrativismo e à pecuária, mas foi com a escravatura que se sustentou durante o Império. Com a América espanhola esquartejada pelo manto libertador em repúblicas instáveis, dominadas por suas elites “crioulas”, nenhum país da América do Sul foi páreo para o Brasil, nem mesmo a aristocrática Argentina. O Paraguai bem que tentou, com Solano Lopes, ao ensaiar uma revolução industrial. Mas ameaçou interesses da Inglaterra e foi massacrada pela Tríplice Aliança (Argentina, Brasil e Uruguai). A consolidação de nossas fronteiras por Rio Branco pode ser considerada juridicamente perfeita, porém, deixou ressentimentos. Que o digam o Paraguai, a Bolívia e, agora, para nosso espanto, o Equador, com o qual não temos fronteiras.
Somos um país de mestiços, apesar de “embranquiçado” por D. Pedro II na segunda metade do século 19. A imigração européia sedimentou uma divisão geopolítica que às vezes opõe o Brasil meridional ao setentrional. É mais fácil a política oficial de cotas raciais — com a qual não concordo, apesar de ser pardo – agravar essa divisão do que acabar com a discriminação. Ainda mais porque não vai ao fundo da questão: a desigualdade social. Restringe-se às decadentes universidades públicas, dominadas pela classe média, enquanto a “elite branca” manda os filhos estudarem nas melhores universidades norte-americanas e européias. Nos Estados Unidos, a integração racial começou para valer com a doutrina Sullivan, que obrigou as empresas norte-americanas a ter um diretor negro na África do Sul e implodiu o apartheid. O resto foi conseqüência. Hoje, Obama é o presidente eleito e a política de cotas nas escolas norte-americanas está sendo revista pela Suprema Corte.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense.
Por Luiz Carlos Azedo
Acabo de ler, emocionado, um artigo do escritor moçambicano Mia Couto intitulado “Se Obama fosse africano”. O tema desta coluna é correlato, mas optei por um título inspirado em Eduardo Galeano, estudioso do colonialismo e da dependência na América Latina. Vamos, pois, ao sarapatel histórico-político-antropológico.
Africanos
O que disse Mia Couto? Fez uma reflexão sobre a repercussão da eleição de Barack Obama na África, intensamente comemorada, seja em manifestações espontâneas do povo africano, seja em pronunciamentos e atos oficiais. Passada a euforia, da qual Mia Couto fez parte (diz que chorou tanto quanto na posse de Nelson Mandela na Presidência da África do Sul), pôs-se o escritor a imaginar o que aconteceria com Obama na África.
Primeiro, teria que esperar muito, porque os governantes costumam prorrogar seus mandatos e se reeleger seguidamente, em eleições fraudulentas. Seriam 41 anos no Gabão, 39 na Líbia, 28 no Zimbabwe, 28 na Guiné Equatorial, 28 em Angola, 27 no Egito, 26 em Camarões. Robert Mugabe, no Zimbabwe, terá 90 ao terminar o atual mandato. Segundo, na oposição, não teria espaço para fazer campanha. Com sorte, não seria assassinado. Terceiro, poderia ter a nacionalidade contestada, pois é filho de norte-americana. É o que acontece com Keneth Kauda, líder na independência da Zâmbia, país que já governou (ops!) por 25 anos. Quarto, Obama só é negro no Ocidente; se fosse africano, seria mulato, representante de “outra raça”, a do colonizador. Seria vilipendiado por sua condição racial. Quinto, segundo ainda Mia Couto, as posições de Obama em relação às mulheres e ao homossexualismo jamais seriam aceitas pela “pureza africana”.
Brasileiros
O Brasil é um país continental por causa da esperteza da nossa antiga elite branca escravocrata. O direito à propriedade privada — um dogma liberal — foi introduzido por D. Pedro I na Constituição de 1824, outorgada por ele, depois de fechar a Constituição de 1823, para salvaguardar os proprietários de escravos. Na Independência, para proteger o tráfico negreiro, tentou anexar Angola ao Brasil Imperial, mas os ingleses não deixaram. A então colônia africana, após a expulsão dos holandeses do Nordeste, foi recuperada muito antes de Moçambique, pela esquadra armada por proprietários fluminenses sob comando de Salvador de Sá.
Havia — e ainda há em alguns lugares — escravidão doméstica na África, por causa das guerras, desequilíbrios demográficos e fome. O que os portugueses fizerem no Brasil foi resgatar a velha escravidão romana e transformá-la na forma mais abjeta e brutal de acumulação pré-capitalista do mercantilismo. O Estado brasileiro consolidou nossas fronteiras graças ao extrativismo e à pecuária, mas foi com a escravatura que se sustentou durante o Império. Com a América espanhola esquartejada pelo manto libertador em repúblicas instáveis, dominadas por suas elites “crioulas”, nenhum país da América do Sul foi páreo para o Brasil, nem mesmo a aristocrática Argentina. O Paraguai bem que tentou, com Solano Lopes, ao ensaiar uma revolução industrial. Mas ameaçou interesses da Inglaterra e foi massacrada pela Tríplice Aliança (Argentina, Brasil e Uruguai). A consolidação de nossas fronteiras por Rio Branco pode ser considerada juridicamente perfeita, porém, deixou ressentimentos. Que o digam o Paraguai, a Bolívia e, agora, para nosso espanto, o Equador, com o qual não temos fronteiras.
Somos um país de mestiços, apesar de “embranquiçado” por D. Pedro II na segunda metade do século 19. A imigração européia sedimentou uma divisão geopolítica que às vezes opõe o Brasil meridional ao setentrional. É mais fácil a política oficial de cotas raciais — com a qual não concordo, apesar de ser pardo – agravar essa divisão do que acabar com a discriminação. Ainda mais porque não vai ao fundo da questão: a desigualdade social. Restringe-se às decadentes universidades públicas, dominadas pela classe média, enquanto a “elite branca” manda os filhos estudarem nas melhores universidades norte-americanas e européias. Nos Estados Unidos, a integração racial começou para valer com a doutrina Sullivan, que obrigou as empresas norte-americanas a ter um diretor negro na África do Sul e implodiu o apartheid. O resto foi conseqüência. Hoje, Obama é o presidente eleito e a política de cotas nas escolas norte-americanas está sendo revista pela Suprema Corte.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense.
sexta-feira, 21 de novembro de 2008
Fernando Henrique na TV Brasil
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso grava hoje uma entrevista exclusiva para o programa 3 a 1 da TV Brasil. Será entrevistado pelos jornalistas Mônica Bérgamo, Tereza Cruvinel e Luiz Carlos Azedo. O programa irá ao ar na próxima quarta-feira, às 22h.
quinta-feira, 20 de novembro de 2008
O tempo de cada um
As chances de Serra e Aécio estão numa espécie de meio-termo: um cenário de crise que impeça a alavancagem de Dilma, sem ao mesmo tempo arrasar São Paulo e Minas
Por Luiz Carlos Azedo
Mudou o paradigma da política brasileira. A crise mundial, com seus reflexos no Brasil, condiciona a sucessão presidencial de 2010. Ainda não levou de roldão as candidaturas já existentes nem possibilitou o surgimento de um salvador da pátria, mas já aparecem interessados em desempenhar esse papel, como o delegado federal Protógenes Queiroz, que conversa com o PSol.
Queda-de-braço
Há uma corrida contra o relógio. O governo pisa no acelerador para executar seus programas, tenta segurar o dólar e garantir o crédito para amortecer os impactos da crise na vida do cidadão. A oposição administra o discurso contra o governo Lula e endossa as medidas anticíclicas. Está com um olho no emprego, outro na inflação. A grande incógnita é saber até onde irá a redução da atividade econômica. Essa variável determinará se a equação gastos públicos versus arrecadação tributária será resolvida antes ou depois das eleições de 2010.
O xis da questão é a taxa de juros. Para muitos, chegou a hora de eliminar uma taxa de juros excessivamente elevada. A crise de liquidez fortaleceu o grupo do ministro da Fazenda, Guido Mantega, na sua queda-de-braço com o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Depois de capitalizar a operação de salvamento do setor financeiro, Meirelles começa a sofrer o desgaste provocado pela redução da atividade econômica.
Para a cozinha do Palácio do Planalto, há espaço para redução da taxa de juros. Seria a maneira de evitar uma recessão mais grave e a alta da inflação. Meirelles resiste. Argumenta que para isso é necessário austeridade fiscal, o que não está acontecendo. Ou seja, se o governo continua gastando, é preciso manter uma taxa de juros que torne os títulos públicos atrativos para os investidores estrangeiros; para reduzir os juros, seria indispensável reduzir os gastos públicos na proporção igual ou superior à queda da arrecadação. É uma escolha de Sofia, que o presidente Lula está empurrando com a barriga. Baixas taxas de juros, câmbio estável e competitivo e inflação sob absoluto controle são tarefas para o futuro governo.
Sucessão à vista
Lula mira na própria sucessão. Administra a crise de maneira a viabilizar a candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Nada de cortes nos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que a ministra comanda. Nada de redução dos gastos sociais do governo com as parcelas mais pobres da população. A palavra de ordem é poupança zero, consumir para preservar empregos e salários. Se o governo surfar a crise dessa forma, a sucessão de 2010 estará no papo. O problema dessa estratégia é o tempo. Com forte viés eleitoral, não pode ser mantida a longo prazo. Seu sucesso depende da velocidade do impacto da crise mundial na economia brasileira.
Na crise, a oposição se finge de morta. Onde tem o poder regional, está no mesmo barco do governo Lula. Os governadores de São Paulo, José Serra, e de Minas, Aécio Neves, os dois presidenciáveis do PSDB, procuram ganhar tempo. Os dois estados serão os mais atingidos pela crise. Seus governos terão problemas se a situação sair do controle e a recessão for para valer. As chances de Serra e Aécio estão numa espécie de meio-termo: um cenário de crise que impeça a alavancagem de Dilma, sem ao mesmo tempo arrasar São Paulo e Minas. Eis uma situação clássica da política, já descrita por Maquiavel, na qual a fortuna escolhe a virtude que mais lhe interessa.
Publicado na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense (19/11/2008)
terça-feira, 18 de novembro de 2008
Brasil no Correio
Saúde - Câncer de próstata mata cerca de 20 mil brasileiros todo ano
Azar - Organizador de bolão da Mega-Sena premiado foi assassinado durante assalto
Violência - Menina encontrada morta com sinais de violência sexual foi sepultada ontem
Celebridades - Dado Dolabella é processado por agressão à ex-namorada Luana Piovani
Desastre - Polícia de São Paulo indiciará responsáveis pela queda do Airbus A320 da TAM
Seqüestro - Adolescente mantida refém por ex-padrasto foi libertada
Azar - Organizador de bolão da Mega-Sena premiado foi assassinado durante assalto
Violência - Menina encontrada morta com sinais de violência sexual foi sepultada ontem
Celebridades - Dado Dolabella é processado por agressão à ex-namorada Luana Piovani
Desastre - Polícia de São Paulo indiciará responsáveis pela queda do Airbus A320 da TAM
Seqüestro - Adolescente mantida refém por ex-padrasto foi libertada
Política no Correio
Nepotismo - Candidatos à Presidência da Câmara querem evitar “injustiças” nos gabinetes
Satiagraha - TRF nega afastamento de juiz; policiais culpam crime organizado por crise na PF
Mordomia - MP quer tirar taifeiros de residências oficiais dos generais
Perdidos - Seis partidos de esquerda não têm propostas de combate à crise econômica
Sucessão - Base ainda não assumiu ministra Dilma Rousseff (PT) como presidenciável
Câmara - Apoio da oposição à candidatura de Michel Temer subiu no muro
Entrevista - Cristovão Buarque (PDT-DF) não desiste da Presidência da República
Verbas - PSB ajudará Arruda na busca de recursos do Orçamento para obras do GDF
Nas Entrelinhas - Gustavo Grieger comenta a disputa pelo comando do Senado
Satiagraha - TRF nega afastamento de juiz; policiais culpam crime organizado por crise na PF
Mordomia - MP quer tirar taifeiros de residências oficiais dos generais
Perdidos - Seis partidos de esquerda não têm propostas de combate à crise econômica
Sucessão - Base ainda não assumiu ministra Dilma Rousseff (PT) como presidenciável
Câmara - Apoio da oposição à candidatura de Michel Temer subiu no muro
Entrevista - Cristovão Buarque (PDT-DF) não desiste da Presidência da República
Verbas - PSB ajudará Arruda na busca de recursos do Orçamento para obras do GDF
Nas Entrelinhas - Gustavo Grieger comenta a disputa pelo comando do Senado
Velocidade na Web
Tiago Falqueiro, do Correio Braziliense, analisou a a nova geração dos browsers Internet Explorer, Mozilla Firefox e Google Chrome, com novos aplicativos para navegar na chamada Web2.
You Tube, a Wikipedia, o Orkut e o Facebook provocaram uma revolução no mercado: aplicativos online foram criados e oferecidos de graça para os internautas, que ganharam em mobilidade e portabilidade. Agora, não se precisa mais de um disquete, ou mesmo de um pen drive. O esquema é criar um arquivo num editor de textos online e abri-lo em qualquer lugar. Grande nuvem
Os programas trocaram os diretórios do computadores e migraram para o que se pode chamar de “a grande nuvem”, onde funcionam em provedores e rodam nos navegadores de internet.
O Google foi o primeiro dos grandes atores da tecnologia a ver isso. Incorporou o editor de documentos de escritório Writerly e criou o Google Docs; adquiriu o YouTube em vez de investir em seu canal de vídeo; e turbinou, cada vez mais, sua rede social, o Orkut.
Lançou o Chrome. O mais rápido e prático navegador do momento. Com ele, nem parece que temos um programa entre o usuário e a internet. Não se vê uma barra no alto da tela com o ícone do aplicativo. São só as abas e o máximo de espaço disponível para as páginas.
Concorrência
Para enfrentar o Google Chrome, a Microsoft vem preparando o Internet Explorer 8; a Fundação Mozilla, o Firefox 3.1. E eles já incorporaram algumas das novidades trazidas pelo Chrome.
O novo Explorer já vem com a navegação privada (página especial do navegador que não armazena os dados do que se acessa por ela) e a divisão das abas em processo diferentes (o que não deixa o problema em uma delas afetar as outras).
A Mozilla quer turbinar o Firefox. A versão 3.1 do navegador de código aberto foi um primeiro passo com a perna direita. Mesmo ainda mais pesado em uso de memória que o aplicativo do Google, dá a impressão de estar colando na traseira do adversário.
You Tube, a Wikipedia, o Orkut e o Facebook provocaram uma revolução no mercado: aplicativos online foram criados e oferecidos de graça para os internautas, que ganharam em mobilidade e portabilidade. Agora, não se precisa mais de um disquete, ou mesmo de um pen drive. O esquema é criar um arquivo num editor de textos online e abri-lo em qualquer lugar. Grande nuvem
Os programas trocaram os diretórios do computadores e migraram para o que se pode chamar de “a grande nuvem”, onde funcionam em provedores e rodam nos navegadores de internet.
O Google foi o primeiro dos grandes atores da tecnologia a ver isso. Incorporou o editor de documentos de escritório Writerly e criou o Google Docs; adquiriu o YouTube em vez de investir em seu canal de vídeo; e turbinou, cada vez mais, sua rede social, o Orkut.
Lançou o Chrome. O mais rápido e prático navegador do momento. Com ele, nem parece que temos um programa entre o usuário e a internet. Não se vê uma barra no alto da tela com o ícone do aplicativo. São só as abas e o máximo de espaço disponível para as páginas.
Concorrência
Para enfrentar o Google Chrome, a Microsoft vem preparando o Internet Explorer 8; a Fundação Mozilla, o Firefox 3.1. E eles já incorporaram algumas das novidades trazidas pelo Chrome.
O novo Explorer já vem com a navegação privada (página especial do navegador que não armazena os dados do que se acessa por ela) e a divisão das abas em processo diferentes (o que não deixa o problema em uma delas afetar as outras).
A Mozilla quer turbinar o Firefox. A versão 3.1 do navegador de código aberto foi um primeiro passo com a perna direita. Mesmo ainda mais pesado em uso de memória que o aplicativo do Google, dá a impressão de estar colando na traseira do adversário.
Novos Navegadores
Veja os atributos da nova geração de navegadores:
MOZILLA FIREFOX 3.1 (Versão Beta 1) http://download.mozilla.org/?product=firefox-3.1b1&os=win&lang=pt-BR Tamanho: 7.2MB
A principal novidade é a busca por mais velocidade para processar os atributos da Web 2.0. E a diferença entre as duas versões é sensível. Abrir, tanto o programa em si quanto os sites, virou uma experiência mais rápida e confortável. Próxima, inclusive, da sensação do uso do Chrome. E a velocidade fica ainda maior se habilitarmos o novo motor do Firefox que processa recursos dinâmicos (Javascript), o Trace Monkey.
WINDOWS INTERNET EXPLORER 8 (Versão Beta 2) www.microsoft.com/brasil/ie8 Tamanho: 16MB
A principal navegador do mundo, pelo menos em audiência, com quase 80% do mercado, o Internet Explorer chega a edição 8. E ele vem mais ou menos da mesma forma quando veio como 7. Como uma seleção dos melhores recursos presentes na concorrência. Seu visual ficou muito parecido com o de seu principal concorrente, o Firefox, mais básico e quadradão. Com essa mudança, o usuário terá mais espaço para as páginas. Outro recurso que repete o concorrente é o Favoritos, que ganhou uma barra logo abaixo da barra de endereços.
GOOGLE CHROME (Versão Beta) www.google.com/chrome Tamanho: 7.33MB
O Chrome pode ser chamado de o invisível. Pelo menos é o que ele tenta ser. Com as abas lá no alto, mas preservando a barra inferior do Windows, o navegador oferece o maior espaço para os sites entre os concorrentes. E ele também é mais veloz. Abre mais rápido e acessa os sites com mais velocidade. E as inovações não param por aí. A barra de endereços do programa não pode mais levar esse nome. Está mais para caixa de busca e ganha a alcunha de Omnibox. Quando começamos a digitar o nome de um site, o Chrome vai oferecendo sugestões próprias ou baseadas no histórico do usuário.
MOZILLA FIREFOX 3.1 (Versão Beta 1) http://download.mozilla.org/?product=firefox-3.1b1&os=win&lang=pt-BR Tamanho: 7.2MB
A principal novidade é a busca por mais velocidade para processar os atributos da Web 2.0. E a diferença entre as duas versões é sensível. Abrir, tanto o programa em si quanto os sites, virou uma experiência mais rápida e confortável. Próxima, inclusive, da sensação do uso do Chrome. E a velocidade fica ainda maior se habilitarmos o novo motor do Firefox que processa recursos dinâmicos (Javascript), o Trace Monkey.
WINDOWS INTERNET EXPLORER 8 (Versão Beta 2) www.microsoft.com/brasil/ie8 Tamanho: 16MB
A principal navegador do mundo, pelo menos em audiência, com quase 80% do mercado, o Internet Explorer chega a edição 8. E ele vem mais ou menos da mesma forma quando veio como 7. Como uma seleção dos melhores recursos presentes na concorrência. Seu visual ficou muito parecido com o de seu principal concorrente, o Firefox, mais básico e quadradão. Com essa mudança, o usuário terá mais espaço para as páginas. Outro recurso que repete o concorrente é o Favoritos, que ganhou uma barra logo abaixo da barra de endereços.
GOOGLE CHROME (Versão Beta) www.google.com/chrome Tamanho: 7.33MB
O Chrome pode ser chamado de o invisível. Pelo menos é o que ele tenta ser. Com as abas lá no alto, mas preservando a barra inferior do Windows, o navegador oferece o maior espaço para os sites entre os concorrentes. E ele também é mais veloz. Abre mais rápido e acessa os sites com mais velocidade. E as inovações não param por aí. A barra de endereços do programa não pode mais levar esse nome. Está mais para caixa de busca e ganha a alcunha de Omnibox. Quando começamos a digitar o nome de um site, o Chrome vai oferecendo sugestões próprias ou baseadas no histórico do usuário.
Casa própria para servidores
Materia de Luciano Pires no Correio Braziliense, hoje, informa que servidores públicos federais, em todo o país já têm à disposição linhas especiais de financiamento para compra de imóveis novos ou usados.
O Banco do Brasil (BB) e a Caixa Econômica Federal vão libererar R$ 8 bilhões em crédito (R$ 4 bilhões cada um), com taxas e as condições de empréstimo mais favoráveis do que a média do mercado financeir0.
Aposentados
O governo espera manter aquecido o setor de construção civil. As previsões indicam que 1,3 milhão de servidores lotados em fundações, autarquias e na administração direta poderão tomar dinheiro emprestado para adquirir a casa própria. Aposentados e pensionistas também serão beneficiados.
Juros
A taxa de juros prevista no modelo é de 8,9% ao ano (a.a), mais Taxa Referencial (TR) — menos do que os 11% ou 12% (mais TR) praticadas pelas demais instituições financeiras. No caso da Caixa, na agência em que recebe salário, o servidor poderá até pagar menos: 8,4% a.a, mais TR. O imóvel a ser financiado pela Caixa e BB terá valor máximo de avaliação de até R$ 350 mil.
Prazos
Os prazos variam entre as duas instituições, mas são a perder de vista: 30 anos e 25 anos, respectivamente. O servidor que tiver um imóvel e quiser partir para o segundo não terá problemas.
Garantias
Pessoas incluídas em cadastros de inadimplência do comércio terão de limpar o nome na praça o quanto antes. O modelo de garantia adotado pelos dois bancos públicos é o de alienação fiduciária — padrão entre os bancos. Será permitida ainda a amortização de parcelas do empréstimo, podendo o cliente solicitar a redução da prestação ou do prazo.
Simulação
Pela internet, o servidor poderá fazer a simulação de seu empréstimo e adiantar a documentação necessária para a formalização da proposta. Nas agências, o pessoal de balcão está instruído a agilizar todo o processo. Gastos extras, como taxas, seguros e impostos, devem ser contabilizados pelo comprador.
Liberação
Antes de pleitear o empréstimo, o servidor também precisa ter em mente qual ou quais imóveis pretende adquirir. Na Caixa, se todas as exigências forem respeitadas, é possível conseguir a liberação do dinheiro em, no máximo, 30 dias.
O Banco do Brasil (BB) e a Caixa Econômica Federal vão libererar R$ 8 bilhões em crédito (R$ 4 bilhões cada um), com taxas e as condições de empréstimo mais favoráveis do que a média do mercado financeir0.
Aposentados
O governo espera manter aquecido o setor de construção civil. As previsões indicam que 1,3 milhão de servidores lotados em fundações, autarquias e na administração direta poderão tomar dinheiro emprestado para adquirir a casa própria. Aposentados e pensionistas também serão beneficiados.
Juros
A taxa de juros prevista no modelo é de 8,9% ao ano (a.a), mais Taxa Referencial (TR) — menos do que os 11% ou 12% (mais TR) praticadas pelas demais instituições financeiras. No caso da Caixa, na agência em que recebe salário, o servidor poderá até pagar menos: 8,4% a.a, mais TR. O imóvel a ser financiado pela Caixa e BB terá valor máximo de avaliação de até R$ 350 mil.
Prazos
Os prazos variam entre as duas instituições, mas são a perder de vista: 30 anos e 25 anos, respectivamente. O servidor que tiver um imóvel e quiser partir para o segundo não terá problemas.
Garantias
Pessoas incluídas em cadastros de inadimplência do comércio terão de limpar o nome na praça o quanto antes. O modelo de garantia adotado pelos dois bancos públicos é o de alienação fiduciária — padrão entre os bancos. Será permitida ainda a amortização de parcelas do empréstimo, podendo o cliente solicitar a redução da prestação ou do prazo.
Simulação
Pela internet, o servidor poderá fazer a simulação de seu empréstimo e adiantar a documentação necessária para a formalização da proposta. Nas agências, o pessoal de balcão está instruído a agilizar todo o processo. Gastos extras, como taxas, seguros e impostos, devem ser contabilizados pelo comprador.
Liberação
Antes de pleitear o empréstimo, o servidor também precisa ter em mente qual ou quais imóveis pretende adquirir. Na Caixa, se todas as exigências forem respeitadas, é possível conseguir a liberação do dinheiro em, no máximo, 30 dias.
domingo, 16 de novembro de 2008
A bagunça continua
Está em poder do deputado Raul Jungmann (PPS-PE) a íntegra do áudio da reunião realizada entre o delegado Protógenes Queiroz e a cúpula da Polícia Federal (PF) que teve trechos divulgados pelo Globo neste domingo, na qual o policial admite que grampeou gabinetes de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
Jungmann recebeu a gravação da Polícia Federal e vai encaminhá-la ao Supremo Tribunal Federal (STF). São duas horas e 55 minutos de conversa durante reunião da cúpula da instituição.
Jungmann recebeu a gravação da Polícia Federal e vai encaminhá-la ao Supremo Tribunal Federal (STF). São duas horas e 55 minutos de conversa durante reunião da cúpula da instituição.
Cenários para 2010
Como os grandes bancos na crise, os grandes partidos não querem apenas fazer alianças, querem engolir os pequenos. Com o poder central em disputa, o resto é conseqüência
Por Luiz Carlos Azedo
A crise mundial é uma “externalidade negativa” na linguagem dos economistas. Ou seja, uma variável fora de controle, para a qual é necessário adotar medidas capazes de neutralizar seus efeitos, já que é impossível evitá-los. A marolinha deixou de ser ameaça, virou agressão ao consumo, ao crédito, à produção e ao emprego no Brasil. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pôs as barbas de molho. A equipe econômica já não se entende sobre a taxa de juros. Em outras circunstâncias, a política econômica estaria “blindada” e interditada ao debate político. Mas são os políticos que comandam, neste final de semana, na reunião do G-20 em Washington, a operação de salvamento da economia mundial.
O governo
O presidente Lula edita uma medida provisória atrás da outra para neutralizar os efeitos da crise. Criou linhas de créditos para comprar carteiras de bancos, com imunidade judicial para os operadores dessas aquisições. Outra medida provisória permite ao Banco do Brasil e à Caixa Econômica salvar instituições financeiras, montadoras e construtoras. O Banco Central opera diariamente no mercado financeiro e na Bolsa para controlar a cotação do dólar e manter os investimentos estrangeiros. O crédito, porém, não chega aos médios e pequenos empresários na velocidade necessária; os consumidores estão retraídos, mais preocupados com a liquidação das dívidas; as empresas puxam o freio de mão dos investimentos e contratações.
Nesse ambiente, os políticos aliados do governo Lula e a oposição fazem planos para a sucessão presidencial em 2010. Há três cenários, todos contingenciados pela tal “externalidade negativa”. O mais otimista acredita num desfecho positivo das medidas adotadas pelos governos europeus, da China e de outros países asiáticos, mas, sobretudo, por ações do presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama, após a posse. Nesse cenário, o presidente Lula mataria a bola no peito e faria um gol de placa: a crise seria debelada no Brasil. A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, à frente do nosso “New Deal” (o vitorioso programa de investimentos públicos que tirou os Estados Unidos da Grande Depressão na década de 30), no caso o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), chegaria a 2010 como candidata favorita. Esse é o Plano A do governo Lula.
O cenário mais pessimista é imaginado pela turma do “quanto pior melhor”. A crise mundial seria uma nova depressão econômica, com os governos dos países desenvolvidos tentando transferir os prejuízos para a periferia, como sempre aconteceu. A crise chegaria ao Brasil com toda força: deterioração dos fluxos cambiais, com um rombo na conta corrente de comércio exterior devido à redução dos preços e das vendas de commodities; e déficit fiscal galopante, em razão da queda de arrecadação e despesas ascendentes com pessoal sugando os recursos para os investimentos do PAC. Nesse ambiente, Lula terminaria o governo como “pato manco”. Os governos de São Paulo e Minas também seriam engolidos pela crise. Estaria aberto o espaço para um candidato outsider descolado do establishment.
Os partidos
O terceiro cenário, diria o falecido João Saldanha, “é mais ou menos”: recessão controlada nos Estados Unidos, Europa e Ásia, com certo nível de atividade econômica nos países emergentes, alavancados pelo crescimento moderado da China. Nesse contexto, a sucessão de 2010 seria uma disputa aberta, na qual a situação da economia neutralizaria o peso da máquina pública e o prestígio pessoal de Lula. Uma disputa onde os partidos, seus políticos e a política propriamente dita teriam mais autonomia em relação ao governo federal.
Como o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou a cassação dos mandatos dos deputados que trocaram de partido, precipitou-se o reagrupamento de forças políticas para sucessão de 2010. Fala-se muito em reforma política, mas os grandes partidos estão interessados em duas coisas apenas: o fim das coligações nas eleições proporcionais e novo prazo para a troca de partidos. Como os grandes bancos na crise, os grandes partidos não querem apenas fazer alianças, querem engolir os pequenos. Com o poder central em disputa, o resto é conseqüência.
Um deputado para ser eleito, com raríssimas exceções, precisa dos votos de legenda para atingir o quociente eleitoral. Caso o Congresso aprove o fim das coligações, muitos ficarão em risco eleitoral. Isso cria um dilema: ou o parlamentar fica no partido, e corre risco de não ser eleito; ou migra para outro partido, onde pode se eleger. Por isso, há dois movimentos: um é dos políticos em risco eleitoral que buscam uma solução individual; o outro, dos partidos ameaçados de esvaziamento, que tentarão encontrar uma saída coletiva por meio de fusões e incorporações.
Publicado na coluna Nas Entrelinhas, hoje, no Correio Braziliense.
Por Luiz Carlos Azedo
A crise mundial é uma “externalidade negativa” na linguagem dos economistas. Ou seja, uma variável fora de controle, para a qual é necessário adotar medidas capazes de neutralizar seus efeitos, já que é impossível evitá-los. A marolinha deixou de ser ameaça, virou agressão ao consumo, ao crédito, à produção e ao emprego no Brasil. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pôs as barbas de molho. A equipe econômica já não se entende sobre a taxa de juros. Em outras circunstâncias, a política econômica estaria “blindada” e interditada ao debate político. Mas são os políticos que comandam, neste final de semana, na reunião do G-20 em Washington, a operação de salvamento da economia mundial.
O governo
O presidente Lula edita uma medida provisória atrás da outra para neutralizar os efeitos da crise. Criou linhas de créditos para comprar carteiras de bancos, com imunidade judicial para os operadores dessas aquisições. Outra medida provisória permite ao Banco do Brasil e à Caixa Econômica salvar instituições financeiras, montadoras e construtoras. O Banco Central opera diariamente no mercado financeiro e na Bolsa para controlar a cotação do dólar e manter os investimentos estrangeiros. O crédito, porém, não chega aos médios e pequenos empresários na velocidade necessária; os consumidores estão retraídos, mais preocupados com a liquidação das dívidas; as empresas puxam o freio de mão dos investimentos e contratações.
Nesse ambiente, os políticos aliados do governo Lula e a oposição fazem planos para a sucessão presidencial em 2010. Há três cenários, todos contingenciados pela tal “externalidade negativa”. O mais otimista acredita num desfecho positivo das medidas adotadas pelos governos europeus, da China e de outros países asiáticos, mas, sobretudo, por ações do presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama, após a posse. Nesse cenário, o presidente Lula mataria a bola no peito e faria um gol de placa: a crise seria debelada no Brasil. A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, à frente do nosso “New Deal” (o vitorioso programa de investimentos públicos que tirou os Estados Unidos da Grande Depressão na década de 30), no caso o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), chegaria a 2010 como candidata favorita. Esse é o Plano A do governo Lula.
O cenário mais pessimista é imaginado pela turma do “quanto pior melhor”. A crise mundial seria uma nova depressão econômica, com os governos dos países desenvolvidos tentando transferir os prejuízos para a periferia, como sempre aconteceu. A crise chegaria ao Brasil com toda força: deterioração dos fluxos cambiais, com um rombo na conta corrente de comércio exterior devido à redução dos preços e das vendas de commodities; e déficit fiscal galopante, em razão da queda de arrecadação e despesas ascendentes com pessoal sugando os recursos para os investimentos do PAC. Nesse ambiente, Lula terminaria o governo como “pato manco”. Os governos de São Paulo e Minas também seriam engolidos pela crise. Estaria aberto o espaço para um candidato outsider descolado do establishment.
Os partidos
O terceiro cenário, diria o falecido João Saldanha, “é mais ou menos”: recessão controlada nos Estados Unidos, Europa e Ásia, com certo nível de atividade econômica nos países emergentes, alavancados pelo crescimento moderado da China. Nesse contexto, a sucessão de 2010 seria uma disputa aberta, na qual a situação da economia neutralizaria o peso da máquina pública e o prestígio pessoal de Lula. Uma disputa onde os partidos, seus políticos e a política propriamente dita teriam mais autonomia em relação ao governo federal.
Como o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou a cassação dos mandatos dos deputados que trocaram de partido, precipitou-se o reagrupamento de forças políticas para sucessão de 2010. Fala-se muito em reforma política, mas os grandes partidos estão interessados em duas coisas apenas: o fim das coligações nas eleições proporcionais e novo prazo para a troca de partidos. Como os grandes bancos na crise, os grandes partidos não querem apenas fazer alianças, querem engolir os pequenos. Com o poder central em disputa, o resto é conseqüência.
Um deputado para ser eleito, com raríssimas exceções, precisa dos votos de legenda para atingir o quociente eleitoral. Caso o Congresso aprove o fim das coligações, muitos ficarão em risco eleitoral. Isso cria um dilema: ou o parlamentar fica no partido, e corre risco de não ser eleito; ou migra para outro partido, onde pode se eleger. Por isso, há dois movimentos: um é dos políticos em risco eleitoral que buscam uma solução individual; o outro, dos partidos ameaçados de esvaziamento, que tentarão encontrar uma saída coletiva por meio de fusões e incorporações.
Publicado na coluna Nas Entrelinhas, hoje, no Correio Braziliense.
sábado, 15 de novembro de 2008
Virou bagunça mesmo
O final de semana trás novas revelações sobre os grampos. A mais surpreendente é o fruto do trabalho do veterano jornalista José Casado, meu amigo desde os anos 70, quando trabalhamos juntos no jornal O Fluminense, de Niterói (RJ). Segundo matéria publicada hoje no Globo, o delegado federal Protógenes Queiroz, contou aos seus chefes em reunião quatro meses atrás, na tarde de uma quinta-feira 14 de agosto, em São Paulo, que estava realizando um trabalho de inteligência "no STF". Tudo foi gravado. Vejam o que diz a matéria de Casado:
"Nesse encontro, do qual sobreviveu um registro de três horas de gravação até agora inédito, fez-se uma revisão dos erros cometidos no inquérito que levou à prisão o banqueiro Daniel Dantas. A PF evitou repassar cópia integral da gravação até para o Ministério Público. Sob pressão da Presidência da República, na época, divulgou apenas um trecho, correspondente a 5% do total, onde o delegado pede para sair do inquérito por razões pessoais.
Na reunião, o delegado Protógenes Queiroz informou aos seus chefes sobre um "trabalho de inteligência", aparentemente em andamento naquele dia, no qual um dos alvos era o Supremo Tribunal Federal. Ou seja, que houve uma ação de espionagem em relação a um gabinete específico "no STF".
Contou, também, que recebera ordens do juiz Fausto De Sanctis para não informar nada, nem mesmo aos seus superiores na polícia, porque "era temerário" e havia risco "de não execução das prisões" - entre elas a do banqueiro Dantas, do ex-prefeito paulistano Celso Pitta e do empresário Naji Nahas.
- O doutor Fausto (De Sanctis, juiz federal responsável pelo caso) me repassou essa decisão, de que era temerário repassar (à cúpula policial) a decisão judicial (sobre prisões temporárias de suspeitos), haja vista que naquele momento nós sabíamos que tinha um outro "HC" (habeas corpus) que estava sendo preparado, sendo gestado, no gabinete do STF e em escritório de advocacia. Isso (veio) do trabalho de inteligência que nós fizemos.
Na conversa com seus chefes, o delegado deixa claro que o então diretor da Abin, Paulo Lacerda, ex-dirigente da PF e ex-chefe de Protógenes, teve participação direta e ativa na condução do inquérito até a etapa final, a fase de prisões de suspeitos. No dia das prisões, por exemplo, Lacerda trabalhou na sede paulista da PF. Ele orientou o delegado até em detalhes como não comparecer ao prédio da polícia na véspera das prisões, para evitar suspeitas e eventual vazamento de informações".
"Nesse encontro, do qual sobreviveu um registro de três horas de gravação até agora inédito, fez-se uma revisão dos erros cometidos no inquérito que levou à prisão o banqueiro Daniel Dantas. A PF evitou repassar cópia integral da gravação até para o Ministério Público. Sob pressão da Presidência da República, na época, divulgou apenas um trecho, correspondente a 5% do total, onde o delegado pede para sair do inquérito por razões pessoais.
Na reunião, o delegado Protógenes Queiroz informou aos seus chefes sobre um "trabalho de inteligência", aparentemente em andamento naquele dia, no qual um dos alvos era o Supremo Tribunal Federal. Ou seja, que houve uma ação de espionagem em relação a um gabinete específico "no STF".
Contou, também, que recebera ordens do juiz Fausto De Sanctis para não informar nada, nem mesmo aos seus superiores na polícia, porque "era temerário" e havia risco "de não execução das prisões" - entre elas a do banqueiro Dantas, do ex-prefeito paulistano Celso Pitta e do empresário Naji Nahas.
- O doutor Fausto (De Sanctis, juiz federal responsável pelo caso) me repassou essa decisão, de que era temerário repassar (à cúpula policial) a decisão judicial (sobre prisões temporárias de suspeitos), haja vista que naquele momento nós sabíamos que tinha um outro "HC" (habeas corpus) que estava sendo preparado, sendo gestado, no gabinete do STF e em escritório de advocacia. Isso (veio) do trabalho de inteligência que nós fizemos.
Na conversa com seus chefes, o delegado deixa claro que o então diretor da Abin, Paulo Lacerda, ex-dirigente da PF e ex-chefe de Protógenes, teve participação direta e ativa na condução do inquérito até a etapa final, a fase de prisões de suspeitos. No dia das prisões, por exemplo, Lacerda trabalhou na sede paulista da PF. Ele orientou o delegado até em detalhes como não comparecer ao prédio da polícia na véspera das prisões, para evitar suspeitas e eventual vazamento de informações".
sexta-feira, 14 de novembro de 2008
O caso das infidelidades
A decisão do Superior Tribunal Federal (STF) confirmando a cassação dos mandatos dos deputados que trocaram de partido, conforme acórdão anterior do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), pode precipitar uma reforma partidária no país.
Não somente por causa do projeto do deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), que abre a janela (30 dias) para os políticos trocarem de mandato um ano antes das eleições, mas porque há uma movimentação intensa dos grandes partidos para proibir as coligações eleitorais nas chapas proporcionais.
Como se sabe, para um deputado ser eleito, com raríssimas exceções, ele precisa dos votos de legenda para atingir o quociente eleitoral. Seus votos, apenas, não são suficientes para elegê-lo. Simplesmente porque o número de cadeiras de cada partido é proporcional às diferanças de votação entre eles. Dividido o número de cadeiras de acordo com a votação dos partidos, elas são preenchidas pelos candidatos mais votados de cada legenda.
Caso o Congresso aprove o fim das coligações, muitos parlamentares ficarão em risco eleitoral, pois seus partidos não são capazes de montar chapas proporcionais competitivas nos estados. Isso cria um dilema: ou o parlamentar fica no partido, e corre risco de não ser eleito, embora tenha grande votação; ou migra para outro partido, onde pode ser efetivamente eleito. É óbvio que pular a cerca passa a ser a opção da maioria.
Essa decisão precisa ser tomada com antecedência. Por isso, haverá dois movimentos simultâneos: um é dos políticos em risco eleitoral que buscam uma solução individual, no caso a troca de partido; outro, dos partidos ameaçados de esvaziamento, que tentarão encontrar uma saída coletiva por meio de fusões e incorporações.
Não somente por causa do projeto do deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), que abre a janela (30 dias) para os políticos trocarem de mandato um ano antes das eleições, mas porque há uma movimentação intensa dos grandes partidos para proibir as coligações eleitorais nas chapas proporcionais.
Como se sabe, para um deputado ser eleito, com raríssimas exceções, ele precisa dos votos de legenda para atingir o quociente eleitoral. Seus votos, apenas, não são suficientes para elegê-lo. Simplesmente porque o número de cadeiras de cada partido é proporcional às diferanças de votação entre eles. Dividido o número de cadeiras de acordo com a votação dos partidos, elas são preenchidas pelos candidatos mais votados de cada legenda.
Caso o Congresso aprove o fim das coligações, muitos parlamentares ficarão em risco eleitoral, pois seus partidos não são capazes de montar chapas proporcionais competitivas nos estados. Isso cria um dilema: ou o parlamentar fica no partido, e corre risco de não ser eleito, embora tenha grande votação; ou migra para outro partido, onde pode ser efetivamente eleito. É óbvio que pular a cerca passa a ser a opção da maioria.
Essa decisão precisa ser tomada com antecedência. Por isso, haverá dois movimentos simultâneos: um é dos políticos em risco eleitoral que buscam uma solução individual, no caso a troca de partido; outro, dos partidos ameaçados de esvaziamento, que tentarão encontrar uma saída coletiva por meio de fusões e incorporações.
quarta-feira, 12 de novembro de 2008
Brevíssima
O presidente Lula fez o seu primeiro contato com Barack Obama. Telefonou de Roma e o presidente eleito dos Estados Unidos retornou a ligação. Obama prometeu fazer uma visita ao Brasil após a posse, marcada para janeiro.
Logo depois da eleição, Obama havia ligado para nove chefes-de-Estado, mas Lula ficou de fora da lista de aliados preferidos. Com passar dos dias, o fato virou motivo de piadas por aqui. Porém, bastou Lula fazer uma ligação e Obama entrou em contato. A diplomacia depende muito de iniciativa.
Logo depois da eleição, Obama havia ligado para nove chefes-de-Estado, mas Lula ficou de fora da lista de aliados preferidos. Com passar dos dias, o fato virou motivo de piadas por aqui. Porém, bastou Lula fazer uma ligação e Obama entrou em contato. A diplomacia depende muito de iniciativa.
Pelo telefone
O surpreendente choque entre a Polícia Federal e a Abin, com operações que parecem sair dos romances policiais, revela que a cooperação ilegal entre os dois órgãos era maior do que se supunha
Por Luiz Carlos Azedo
luizazedo.df@diariosassociados.com.br
Primeiro grande sucesso do samba, Pelo telefone é um marco inaugural da canção carnavalesca e da crítica musical graças ao comportamento da polícia. Tudo nesse samba é motivo de polêmica, a começar pela autoria, atribuída a Donga (Ernesto Joaquim Maria dos Santos) e Mário de Almeida, que em 1916 assinaram a primeira gravação pela Odeon, em vinil, com 78 rotações, na voz de Baiano e acompanhamento da banda Odeon.
O samba
Segundo depoimento de Donga, Pelo telefone teria surgido de uma estrofe cantada por um sujeito conhecido como Didi da Gracinda. Modesto, Mário de Almeida, cronista carnavalesco cujo apelido era Peru dos Pés Frios, se dizia apenas o “arreglador” dos versos. Outros sambas foram gravados antes de Pelo telefone, mas a glória do registro na Biblioteca Nacional coube a Donga, que compõe a santíssima trindade da nossa música popular com Pixinguinha e João da Baiana. Todos freqüentaram a Casa da Tia Ciata, na Praça Onze. Ali havia uma famosa roda de samba, da qual participavam Sinhô, João da Mata, Mestre Germano e Caninha, que também reivindicaram a autoria de Pelo telefone numa polêmica que marcou época.
O samba recebeu diversas versões e se eternizou graças à bagunça na polícia, que parece um problema insolúvel. A versão mais famosa foi inspirada numa campanha do jornal A Noite, em 1913, quando o vespertino instalou uma roleta no Largo da Carioca, em frente à redação, iniciativa dos repórteres Castelar de Carvalho e Eustáquio Alves. É cantada até hoje: “O chefe da polícia / Pelo telefone / Manda me avisar / Que na Carioca / Tem uma roleta/ Para se jogar... / Ai, ai, ai / O chefe gosta da roleta, ó maninha / Ai, ai, ai”. E, depois, arremata: “O chefe da Folia / Pelo telefone manda me avisar / Que com alegria / Não se questione para se brincar / Ai, ai, ai / É deixar mágoas pra trás, ó rapaz / Ai, ai, ai / Fica triste se és capaz e verás”.
A bagunça
Pelo telefone me veio à cabeça por causa do furdúncio envolvendo a Polícia Federal e a Abin, mais grave do que o diversionismo da polêmica sobre a Lei da Anistia entre a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, que ameaça levar a confusão aos quartéis. Ministro da Justiça, Tarso Genro dita regra sobre todos os assuntos que envolve a sua pasta, mas nem sempre tem solução para os mesmos. Tenta apenas minimizar o que está acontecendo. Enquanto isso, a bagunça se generaliza. Ronda, inclusive, ao Judiciário, onde o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, e um magistrado de primeira instância da Justiça Federal, Fausto De Sanctis, se digladiam pela mídia.
Mestres do Direito e da Ciência Política ensinam que o governo é a forma mais concentrada de poder, mesmo quando há desgoverno. Afinal, o Estado exerce o papel de normatizar, arrecadar e coagir. Quando os governantes se omitem e relevam a hierarquia e a disciplina, sua inércia se encarrega de fazer com que a máquina estatal funcione sem direção, o que dá à burocracia características de “subgoverno”. Cada um faz o que quer, quando quer e como quer em sua alçada. Normatiza, arrecada ou coage, quando não junta uma coisa com a outra sob o manto da ilegalidade.
As disputas de poder na Polícia Federal já não se restringem aos interesses sindicais e corporativos. O surpreendente choque entre a Polícia Federal e a Abin, com operações que parecem sair dos romances policiais, revela que a cooperação ilegal entre os dois órgãos era maior do que se supunha. O jogo combinado entre delegados, promotores e juizes, no caso dos grampos e operações de busca e apreensão abusivos, também não começou com a Operação Satiagraha.
Na confusão, o diversionismo retórico do ministro Tarso Genro é preocupante. As trombadas do ministro da Justiça com as Forças Armadas, por mais que agradem a familiares de perseguidos pelo regime militar e movimentos de defesa dos direitos humanos, não são um bom caminho. De fato, há contradições que precisarão ser resolvidas, como é o caso da discussão sobre os arquivos dos órgãos de repressão do regime militar e a amplitude da Lei de Anistia para os agentes dos órgãos de segurança envolvidos com a tortura. A questão, porém, é saber se o governo Lula, às voltas com uma crise econômica mundial como há muito não se via, tem energia suficiente para administrar toda essa confusão e abrir novas frentes de batalhas. Duvido muito. É mais fácil a bagunça na PF e na Abin virar marchinha de carnaval.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas, do Correio Braziliense
Por Luiz Carlos Azedo
luizazedo.df@diariosassociados.com.br
Primeiro grande sucesso do samba, Pelo telefone é um marco inaugural da canção carnavalesca e da crítica musical graças ao comportamento da polícia. Tudo nesse samba é motivo de polêmica, a começar pela autoria, atribuída a Donga (Ernesto Joaquim Maria dos Santos) e Mário de Almeida, que em 1916 assinaram a primeira gravação pela Odeon, em vinil, com 78 rotações, na voz de Baiano e acompanhamento da banda Odeon.
O samba
Segundo depoimento de Donga, Pelo telefone teria surgido de uma estrofe cantada por um sujeito conhecido como Didi da Gracinda. Modesto, Mário de Almeida, cronista carnavalesco cujo apelido era Peru dos Pés Frios, se dizia apenas o “arreglador” dos versos. Outros sambas foram gravados antes de Pelo telefone, mas a glória do registro na Biblioteca Nacional coube a Donga, que compõe a santíssima trindade da nossa música popular com Pixinguinha e João da Baiana. Todos freqüentaram a Casa da Tia Ciata, na Praça Onze. Ali havia uma famosa roda de samba, da qual participavam Sinhô, João da Mata, Mestre Germano e Caninha, que também reivindicaram a autoria de Pelo telefone numa polêmica que marcou época.
O samba recebeu diversas versões e se eternizou graças à bagunça na polícia, que parece um problema insolúvel. A versão mais famosa foi inspirada numa campanha do jornal A Noite, em 1913, quando o vespertino instalou uma roleta no Largo da Carioca, em frente à redação, iniciativa dos repórteres Castelar de Carvalho e Eustáquio Alves. É cantada até hoje: “O chefe da polícia / Pelo telefone / Manda me avisar / Que na Carioca / Tem uma roleta/ Para se jogar... / Ai, ai, ai / O chefe gosta da roleta, ó maninha / Ai, ai, ai”. E, depois, arremata: “O chefe da Folia / Pelo telefone manda me avisar / Que com alegria / Não se questione para se brincar / Ai, ai, ai / É deixar mágoas pra trás, ó rapaz / Ai, ai, ai / Fica triste se és capaz e verás”.
A bagunça
Pelo telefone me veio à cabeça por causa do furdúncio envolvendo a Polícia Federal e a Abin, mais grave do que o diversionismo da polêmica sobre a Lei da Anistia entre a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, que ameaça levar a confusão aos quartéis. Ministro da Justiça, Tarso Genro dita regra sobre todos os assuntos que envolve a sua pasta, mas nem sempre tem solução para os mesmos. Tenta apenas minimizar o que está acontecendo. Enquanto isso, a bagunça se generaliza. Ronda, inclusive, ao Judiciário, onde o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, e um magistrado de primeira instância da Justiça Federal, Fausto De Sanctis, se digladiam pela mídia.
Mestres do Direito e da Ciência Política ensinam que o governo é a forma mais concentrada de poder, mesmo quando há desgoverno. Afinal, o Estado exerce o papel de normatizar, arrecadar e coagir. Quando os governantes se omitem e relevam a hierarquia e a disciplina, sua inércia se encarrega de fazer com que a máquina estatal funcione sem direção, o que dá à burocracia características de “subgoverno”. Cada um faz o que quer, quando quer e como quer em sua alçada. Normatiza, arrecada ou coage, quando não junta uma coisa com a outra sob o manto da ilegalidade.
As disputas de poder na Polícia Federal já não se restringem aos interesses sindicais e corporativos. O surpreendente choque entre a Polícia Federal e a Abin, com operações que parecem sair dos romances policiais, revela que a cooperação ilegal entre os dois órgãos era maior do que se supunha. O jogo combinado entre delegados, promotores e juizes, no caso dos grampos e operações de busca e apreensão abusivos, também não começou com a Operação Satiagraha.
Na confusão, o diversionismo retórico do ministro Tarso Genro é preocupante. As trombadas do ministro da Justiça com as Forças Armadas, por mais que agradem a familiares de perseguidos pelo regime militar e movimentos de defesa dos direitos humanos, não são um bom caminho. De fato, há contradições que precisarão ser resolvidas, como é o caso da discussão sobre os arquivos dos órgãos de repressão do regime militar e a amplitude da Lei de Anistia para os agentes dos órgãos de segurança envolvidos com a tortura. A questão, porém, é saber se o governo Lula, às voltas com uma crise econômica mundial como há muito não se via, tem energia suficiente para administrar toda essa confusão e abrir novas frentes de batalhas. Duvido muito. É mais fácil a bagunça na PF e na Abin virar marchinha de carnaval.
Publicado hoje na coluna Nas Entrelinhas, do Correio Braziliense
terça-feira, 11 de novembro de 2008
O encontro de Lula com Obama
Até agora o presidente Lula não falou com Barack Obama. Não faz parte da lista dos chefes de Estado que recebeu uma ligação do novo presidente dos Estados Unidos. Aposto, porém, que os dois terão um encontro protocolar, por ocasião da reunião do G20, em Washington (DC).
Seria muita deselegância de Obama não aceitar um encontro com Lula. A diplomacia brasileira deve estar se mexendo para isso. A crise mundial é muito grave, o Brasil é um parceiro importante dos Estados Unidos.
É bobagem a oposição ficar tirando casquinha do fato de os dois não terem conversado até agora. Assim como é uma bobagem o presidente Lula se achar mais importante do que é na arena internacional. Se cultivou ao longo dos anos uma amizade com Bush, Lula agora precisa fazer a mesma coisa com Obama para ter uma relação mais calorosa.
Seria muita deselegância de Obama não aceitar um encontro com Lula. A diplomacia brasileira deve estar se mexendo para isso. A crise mundial é muito grave, o Brasil é um parceiro importante dos Estados Unidos.
É bobagem a oposição ficar tirando casquinha do fato de os dois não terem conversado até agora. Assim como é uma bobagem o presidente Lula se achar mais importante do que é na arena internacional. Se cultivou ao longo dos anos uma amizade com Bush, Lula agora precisa fazer a mesma coisa com Obama para ter uma relação mais calorosa.
Este é o começo
Este é o meu primeiro post. Diariamente, na medida do possível, escreverei sobre política. Eventualmente, vocês também lerão comentários e notas sobre economia, cultura, esporte e gastronomia. O tempo é curto, os textos também serão.
Exceção: as minhas colunas no Correio Braziliense. Até o próximo post!
Exceção: as minhas colunas no Correio Braziliense. Até o próximo post!
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