terça-feira, 12 de maio de 2015

O dispositivo de Temer

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 12/05/2015

O rito de articulações de Temer, porém, é o tradicional: mapeamento dos descontentes, identificação de pleitos e distribuição de cargos. A troca de cargos por votos desgasta o governo e os partidos da base

 Há uma correlação direta entre o apoio parlamentar ao ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e a capacidade de articulação política do vice-presidente Michel Temer. São duas faces da mesma moeda, como ficou muito claro na aprovação das medidas econômicas na semana passada. Isso significa que os problemas da presidente Dilma Rousseff com o Congresso estejam sob controle? Nem de longe, tanto na Câmara quanto no Senado, a agenda do governo está recheada de perigos.

Dilma ainda enfrenta um ambiente hostil no Congresso, a avaliação de seu governo é negativa e as expectativas quanto ao seu relacionamento com o mundo político continuam péssimas. O que mudou é o posicionamento dos parlamentares em relação ao ajuste fiscal, cada vez mais favorável diante dos sintomas de que a crise é mesmo profunda e que apostar no “quanto pior, melhor” pode ser mau negócio.

Foi esse tipo de raciocínio, por exemplo, que garantiu aos votos do DEM, partido de oposição, às medidas do ajuste na semana passada, aprovadas por uma estreita margem de 25 votos.
O empenho pessoal do ministro Joaquim Levy nas negociações com a base aliada ajudaram a desanuviar o clima das negociações e abriram caminho para as articulações do vice-presidente Michel Temer, que conhece como ninguém a Casa que comandou — tanto no governo Fernando Henrique Cardoso quanto no governo Lula.

O rito de articulações de Temer, porém, é o tradicional: mapeamento dos descontentes, identificação de pleitos e distribuição de cargos. A troca de cargos por votos desgasta o governo e os partidos da base. É assim que o Palácio do Planalto espera garantir a governabilidade, mas isso não favorece a recuperação da popularidade da presidente Dilma Rousseff, que continua muito enfraquecida.

 A “terceirização” da condução da economia e, agora, da articulação política, não resolve os problemas da presidente da República como liderança política: já não pode sair às ruas, fazer pronunciamentos de rádio e tevê, nem mesmo ser madrinha de casamento, sem correr o risco de levar uma bruta vaia.

Na cozinha do Palácio do Planalto, os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil), Miguel Rosseto (Secretaria-Geral da Presidência) e Edinho Silva (Comunição Social) são um espectro do poder do PT no atual governo, cujo eixo de gravidade se mudou para o anexo onde funciona o gabinete do vice-presidente. O ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, para os políticos, estaria mandando mais do que os três juntos, pois Michel Temer delegou a ele a negociação dos cargos de segundo e de terceiro escalões.

Os perigos
Mas os perigos também rondam Levy e Temer na pauta do Congresso. A Comissão de Constituição e Justiça do Senado sabatina hoje o jurista Luiz Edson Fachin, indicado pela presidente Dilma Rousseff para o Supremo Tribunal Federal. O jurista passará por constrangimentos pelo fato de ter exercido o cargo de procurador do governo do Paraná e advogar ao mesmo tempo, segundo parecer jurídico do próprio Senado divulgado pelo senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES). Tem, porém, o apoio da bancada do Paraná, liderada pelo setor tucano Alvaro Dias, que tratou de arranjar outro parecer da consultoria jurídica da Casa dizendo que isso não é problema.

Pode ser que seja. Segundo reportagem do repórter especial João Valadares, publicada no sábado passado pelo Correio, Fachin recebeu como advogado privado da Companhia Paranaense de Energia (Copel) para defender a empresa e emitir pareceres técnicos, cujo sócio majoritário é o Estado do Paraná. Em 2004, Fachin era procurador do Estado e já recebia salário justamente para isso. O governo do Paraná pagou US$ 190 milhões num acordo internacional arbitrado em Paris.

Na Câmara, deverão ser apreciadas duas medidas do ajuste fiscal: a MP nº 664/15, que trata da pensão por morte e auxílio-doença, e a MP nº 668/15, que versa sobre o PIS/Cofins sobre importações. A mais complicada é a que trata da agenda trabalhista, que estressa o PT e o PDT. Na votação da MP nº 665/15, foram 10 os petistas rebeldes, apesar das fortes pressões do Palácio do Planalto. O PDT votou contra, como se fosse um partido de oposição, e deixou pendurado no pincel o seu ministro no governo, Manoel Dias, do Trabalho.

A maior casca de banana, porém, é o projeto de lei projeto que muda o cálculo de correção do FGTS (PL nº 1.358/15), de autoria do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que passariam a ter o mesmo índice de reajuste da caderneta de poupança. É uma jogada combinada com o deputado Paulinho da Força, do Solidariedade, que porá outra saia justa no PT e no PDT e deverá contar com o apoio maciço da oposição e da própria bancada do PMDB. A intenção de Cunha é conceder urgência à proposta e iniciar a discussão.

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