quarta-feira, 23 de setembro de 2015

A crise não viaja com Dilma

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 23/09/2015 
 
A prioridade da presidente da República não é melhorar o desempenho do governo, é assegurar votos suficientes para barrar qualquer tentativa de impeachment.


A presidente Dilma Rousseff viajará para os Estados Unidos na próxima quinta-feira, onde participará da Assembleia-geral da ONU na segunda-feira, mas a crise não viajará com ela – ao contrário do que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) costumava dizer, provocativamente, em relação ao então presidente José Sarney (PMDB) quando ele deixava o país em missão de estado.

A crise continuará instalada aqui, quando nada porque o dólar está completamente fora de controle. Ontem, ultrapassou a máxima histórica de R$ 4, depois de mais uma tentativa frustrada do Banco Central (BC) no sentido de conter a alta, na qual torrou R$ 3 bilhões na segunda-feira.

A cotação do fechamento de ontem foi a mais alta já registrada desde a criação do real. Superou a de 10 de outubro de 2002, quando o dólar chegou a ser vendido a R$ 4 durante o pregão, mas fechou a R$ 3,98. A alta reflete as preocupações do mercado com a aprovação do ajuste fiscal pelo Congresso. E também o temor de que o Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos, eleve os juros este ano.

Em 2002, a moeda norte-americana foi impulsionada pelas perspectivas de que o então candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva (PT) seria eleito, algo que não agradava o mercado financeiro. Mas o petista lançou a “Carta aos Brasileiros” e acalmou o mercado, ao adotar o tripé superavit fiscal, meta de inflação e câmbio flutuante, que foi abandonado por Dilma.

Hoje a presidente da República deve anunciar o acordo com os líderes do PMDB no Senado, Eunício de Oliveira (CE), e na Câmara, Jorge Picciani (RJ), para indicação de cinco ministros. Os senadores indicariam dois nomes e os deputados, outros dois. O quinto ministro seria escolhido de comum acordo entre as bancadas. A troca do ministro da Saúde, Arthur Chioro, ex-secretário de Saúde de São Bernardo, pelo deputado Marcelo castro (PMDB-PI) ou Manoel Junior (PMDB-PB), dá bem uma ideia da fragilidade do toma lá da cá para garantir o apoio da legenda.

A Saúde era uma das joias da coroa petista. A prioridade da presidente da República não é melhorar o desempenho do governo, é assegurar votos suficientes para barrar qualquer tentativa de impeachment. Repete a mesma tentativa do ex-presidente Collor de Melo, que em março de 1992 fez uma reforma ministerial. Chegou a reunir em seu governo nomes importantes da política nacional, mas não conseguiu manter-se no poder. A reforma de Dilma pode ser ainda mais chinfrim.

Assombrações
Dilma não tem apoio formal do vice-presidente Michel Temer e dos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mas negocia com eles nos bastidores. É um sinal de que o arranjo parlamentar que está tecendo é muito vulnerável. Além disso, quanto mais reza o catecismo do fisiologismo e do patrimonialismo, mais assombrações aparecem.

A Executiva do PSB reuniu governadores, deputados e senadores ontem para discutir o que fazer em relação ao governo. O partido vinha mantendo uma posição de independência, sem fazer oposição aberta. Decidiu, porém, negar apoio ao ajuste fiscal, votar contra a recriação da CPMF e, se for o caso de entrar em pauta no Congresso, apoiar o impeachment da presidente Dilma.

A passagem do PSB à oposição é uma derrota dos esforços do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no sentido de reagrupar seus velhos aliados em defesa de Dilma Rousseff. Essa frente está cada vez mais difícil de ser articulada. Seria a alternativa para a legenda nadar contra a maré nas eleições de 2016 e chegar com chances de vitória em 2018, evitando uma debandada de prefeitos e parlamentares, que já começou.

Enquanto Dilma viaja, a Operação Lava-Jato passa o rodo. Ontem, o ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello aceitou o pedido de investigações do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sobre o suposto recebimento de propina pelo ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e pelo senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), o que ambos negam. O petista e o tucano alegam que receberam doações eleitorais de caráter legal.

Noutra frente, o ex-deputado André Vargas (SC), que foi vice-presidente da Câmara e ganhou notoriedade ao posar de punho fechado ao lado do então presidente do STF Joaquim Barbosa, foi condenado a 14 anos de prisão pelo juiz federal Sergio Moro, de Curitiba. Mas a novidade foi a “delação premiada” do lobista Fernando de Moura, amigo do ex-ministro José Dirceu. Ele sabe demais sobre o envolvimento de petistas com o escândalo da Petrobras.

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