quarta-feira, 15 de abril de 2015

Não há teflon que dê jeito

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 15/04/2015


A imagem dos políticos é produto de um confronto de informações. Seu maior ativo político, digamos assim, resulta de inevitável guerra de versões sobre a sua atuação diante de fatos reais
 
Politetrafluoretileno é o nome técnico do produto. Foi descoberto pelo químico norte-americano Roy J. Plunkett por acaso. Ao coletar em um recipiente o tetrafluoretileno congelado que seria usado na produção de um gás refrigerante, em 6 de abril de 1938, no laboratório da DuPont, nada conseguiu retirar. Foi verificar o por quê e descobriu que havia-se formado um pó branco que não aderiu ao recipiente.

 Assim surgiu o teflon, um revestimento sólido resistente à corrosão, de baixa fricção e alta resistência ao calor. Mas o teflon somente foi lançado comercialmente em 1946, quando acabou a guerra. Deixara de ser segredo militar para facilitar a vida doméstica nas cozinhas norte-americanas. No Brasil, os políticos adotaram a expressão para falar dos colegas que conseguem manter a imagem de homem probo, no qual nenhuma denúncia cola.

Era o que se dizia de Luiz Inácio Lula da Silva, que passou incólume pela crise do mensalão, no meio do primeiro mandato, e conseguiu se reeleger em 2006. E também ainda se diz da presidente Dilma Rousseff, que, até agora, não foi acusada de envolvimento direto no escândalo da Petrobras.

Quando o PT vai para a televisão e o rádio falar que nunca se combateu tanto a corrupção como nos últimos 12 anos, que o seu governo é que está investigando os escândalos, que na época dos tucanos no poder tudo era engavetado — como, aliás, ocorreu na campanha eleitoral —, os petistas tentam blindar com teflon a própria imagem.

Esse discurso político, porém, parece ter se esgotado. Mas essa é uma visão, digamos, do ponto de vista do marketing. Essa catilinária continua sendo necessária em razão das acusações de que a legenda teria recebido propina das empreiteiras investigadas na Operação Lava-Jato para as campanhas eleitorais. É uma retórica da qual não se poderia abrir mão nessa situação.

Metástase
O discurso, entretanto, não blindou a legenda nem a presidente Dilma perante a opinião pública. Não é para menos: todo dia surge mais uma informação negativa sobre o escândalo da Petrobras que acaba envolvendo o PT. Agora, com a prisão do ex-vice-presidente da Câmara André Vargas — aquele que posou de punho fechado ao lado do então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa para constrangê-lo — , o caso apresenta sinais de metástase, com o suposto envolvimento da Caixa Econômica Federal (CEF) e do Ministério da Saúde, além de já rondar a Petros, a Eletrobras e o BNDES.

Dilma não é investigada pela Operação Lava-Jato, que descobriu a existência de um vasto esquema de corrupção na Petrobras, mas o Ministério Público Federal afirma que parte da propina paga pelas empresas que participaram do esquema foi repassada na forma de doações ao PT. Essa questão é o centro da disputa com a oposição na CPI da Petrobras instalada na Câmara.

Será objeto de uma grande batalha judicial, pois a cúpula do PT repudia essa acusação e as denúncias contra seu tesoureiro, João Vaccari Neto, que é investigado. Aparentemente, as acusações ainda não são robustas o suficiente para levá-lo à prisão.

Mesmo assim, o teflon não funcionou. Para 57% da população, segundo o Datafolha divulgado no fim de semana, Dilma sabia da corrupção na estatal e deixou ocorrer. Outros 26% opinam que ela sabia, mas nada poderia fazer para impedir. ou seja, a Lava-Jato alterou a percepção dos brasileiros a respeito dos problemas do país. Pela primeira vez, o tema corrupção aparece quase empatado com saúde na liderança do ranking de maiores preocupações: para 23%, o maior problema é a saúde; para 22%, a corrupção.

A imagem dos políticos é sempre o produto de um confronto de informações. É o seu maior ativo político, digamos assim, mas resulta de inevitável guerra de versões sobre a sua atuação, uma batalha ditada por fatos reais. Em algum lugar entre a realidade e o contraditório forma-se a opinião pública. No caso da presidente Dilma Rousseff — que está a salvo de qualquer investigação, segundo o entendimento do ministro-relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki —, o xis da questão é a responsabilidade dela em relação à Petrobras.

Não foi à toa que a presidente República voltou a citar a empresa nos discursos, anunciando que a estatal já estava “limpa”. Quase simultaneamente, a empresa anunciou um empréstimo bilionário da China e a venda de sua participação na Brasken, uma empresa associada à Odebrecht, a única grande empreiteira do país que não foi implodida pela Lava-Jato.

A Petrobras privatiza 40% de seus ativos, ou seja, quase a metade da empresa, sob o eufemismo de “desinvestimento”. São poços de petróleo, refinarias, ações em subsidiárias etc., tudo à venda na bacia das almas, para sair do vermelho. O resultado dessa reestruturação selvagem é a recente alta de 50% de suas ações na Bolsa de São Paulo, que ontem fecharam o pregão valendo R$ 12,42 , o que, supostamente, corrobora o discurso de Dilma. Com uma ajuda da desvalorização do real, as ações estão muito baratas.

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