terça-feira, 16 de setembro de 2014

Mergulho em águas profundas

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 16/09/2014


O furor nacionalista de Lula e Dilma contra Aécio e Marina tem por objetivo lançar uma cortina de fumaça em relação aos descalabros ocorridos na Petrobras, cujas ações nunca estiveram tão desvalorizadas


O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva comandou ontem uma manifestação de sindicatos, organizações estudantis e do MST em defesa da exploração da camada pré-sal e da Petrobras, na mítica Cinelândia, palco de protestos dos cariocas. Desde a histórica campanha “O petróleo é nosso”, desencadeada por militares nacionalistas e militantes comunistas na década de 1950, mas que acabou tendo o apoio da UDN, a Petrobras é um símbolo do patriotismo dos brasileiros.

Já na semana passada, Lula assacara contra os adversários acusações de que são contra a Petrobras e o pré-sal. No caso do senador Aécio Neves, candidato do PSDB, o PT exuma a falsa acusação de que os tucanos sempre pretenderam privatizar a empresa, o que serviu para derrotar Geraldo Alckmin em 2006. No caso de Marina Silva, Lula acusa a candidata do PSB de pretender abandonar a exploração do pré-sal por ser a favor de fontes de energia limpa. Empolgado, Lula chegou a dizer que mergulharia no fundo do mar para explorar o pré-sal.

A manifestação de ontem, que começou na porta da empresa, porém, nem de longe lembra as da campanha nacionalista que levou o presidente Getúlio Vargas, pouco antes de seu suicídio, a criar a empresa. Com militantes mobilizados por sindicatos de petroleiros e de metalúrgicos filiados à Central Única dos Trabalhadores (CUT), pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e estudantes arregimentados pela União Nacional dos Estudantes (UNE), que teriam recebido R$ 100 de ajuda de custo e foram levados em ônibus fretados, foi um ato cenográfico. Sob medida para ser exibido no programa eleitoral de Dilma Rousseff, como se o povo estivesse nas ruas defendendo o pré-sal.

Se isso fosse realmente necessário, em circunstâncias normais, não seria preciso mobilizar ativistas da Baixada Santista e do ABC para engrossar a manifestação. Cariocas e fluminenses lotariam a Avenida Rio Branco, da Candelária à Cinelândcia, para defender a Petrobras. O esforço de logística ocorreu porque o Rio de Janeiro não é o melhor lugar para o ex-presidente Lula e a presidente Dilma falarem do pré-sal. Simplesmente porque o estado foi tungado pela União nos royalties de petróleo, durante o governo Lula, com a participação entusiasmada de Dilma.

Cortina de fumaça
A mudança do regime de concessão para o de partilha, responsável pela redistribuição dos royalties de petróleo, foi o maior responsável pelo atraso na exploração do pré-sal em camadas profundas. Os poços do pré-sal em exploração atualmente estão a profundidades mais ou menos equivalentes aos poços do pós-sal. Não exigiram um esforço extraordinário de investimento e tecnológico da Petrobras.

O único leilão realizado para explorar petróleo do pré-sal em águas profundas ocorreu no ano passado, e por pouco não foi um fracasso. Patrocinado pela presidente Dilma, sob protestos do Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro, o certame foi realizado na Barra da Tijuca, bem longe da Cinelândia, sob forte esquema de segurança, que mobilizou tropas do Exército, embarcações e helicópteros da Marinha para conter os protestos dos funcionários da empresa.

O leilão do Campo de Libra correu sério risco de virar o maior fracasso. Foi um jogo de cartas marcadas. O consórcio vencedor, formado pela Petrobras (que ficou com 40% do negócio) e sócios chineses, holandeses, franceses e ingleses, foi articulado pelo Palácio do Planalto. Sem a presença dos chineses, com duas estatais, seria um mergulho sem volta nas profundezas do Atlântico. Tanto assim que nenhum outro leilão foi realizado até agora, embora ontem, coincidentemente, a Agência Nacional de Petróleo (ANP) tenha anunciado que um novo leilão será realizado em 2015. Não dá para a pôr a culpa na oposição pelo atraso da exploração do pré-sal.

O furor nacionalista de Lula e Dilma contra Aécio e Marina tem por objetivo lançar uma cortina de fumaça em relação aos descalabros ocorridos na Petrobras, cujas ações nunca estiveram tão desvalorizadas, a ponto de estarem muito abaixo do valor do patrimônio da empresa. É que o “petroduto” da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, assombra o PT, seja por causa da compra de Pasadena, no Texas, seja devido às obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, ambas superfaturadas, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU).

Ainda mais agora, que a Justiça Federal liberou para depor na CPI Mista da Petrobras o ex-diretor da estatal Paulo Roberto da Costa, o homem-bomba que pode fazer um strike na política nacional por causa do envolvimento de muitos políticos com ele e o doleiro Alberto Youssef, que estão presos em Curitiba.


Um comentário:

  1. Ocorreu-me, a propósito das mais recentes ações “cenográficas” do lulismo, no dizer graúdo do colunista, velha passagem do jornalista Aparício Torelli((1895/1971), o Barão de Itararé, no antigo Congresso Nacional, no Rio. Justamente num dia em que Getúlio Vargas, a quem o repórter fustigava diariamente no jornal, visitava a Casa.

    Getúlio passa reto pela bancada de imprensa, onde está o Barão, faz de onde que não o vê, volta-se de repente, falsamente surpreso, e dispara:

    -És tu, Barão?

    A que o genial jornalista e frasista responde, com seu habitual destemor diante do arbítrio, sem sequer tirar os olhos de seu bloco de repórter:

    -”Ex-tubarão é V. Exa”.

    Claro que o colunista conhece a história, de sobra, mas, diante das estrepolias do neotubaronato lulista, vale até “exumar” (de novo repetindo o texto da coluna), célebre e inquietante questão do Barão de Itararé:

    -“Há algo no ar, além dos aviões de carreira”?

    Tavares Dias – Mairiporã, SP

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