Nas Entreinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 04/08/2014
O PT nunca aceitou a condenação de José Dirceu no processo do mensalão, cuja legitimidade até hoje é questionada pela legenda e pelos advogados que atuaram no caso
Delírios persecutórios se caracterizam pela crença de ser vítima de perseguição ou conspiração. Quem sofre do distúrbio acredita — e possui explicações coerentes para o fato — que alguém conspira e deseja o seu mal. Na definição clínica, o sujeito acredita que é objeto de uma conspiração, podendo estar relacionada com fraude, espionagem, perseguição, envenenamento, calúnia, assédio ou obstrução nos seus objetivos a longo prazo.
Para sustentar o delírio, exageram-se pequenos acontecimentos. Uma injustiça, por vezes, demanda uma ação judicial. É a chamada “paranoia querelante”, muito comum nos tribunais e órgãos públicos, nos quais a pessoa afetada envolve-se em repetidas tentativas de obter, respectivamente, sentenças ou decisões favoráveis. Delírios persecutórios também podem se manifestar por meio de ressentimento e raiva, às vezes recorrendo a violência.
Na abordagem freudiana, a contradição do delírio persecutório se manifesta no “eu amo” que se transforma em “eu odeio”, e gera uma espécie de bateu, levou: “Ele me odeia e me persegue, o que me dá o direito de odiá-lo”. A partir daí, vem a projeção: os sentimentos são percebidos externamente de maneira oposta, e o sujeito acha que o outro o odeia. Freud associa esse ódio exterior ao afeto ou amor interior, mas aí já é outra prosa mais complicada: entra na roda a discussão sobre desejos reprimidos.
A nova prisão de José Dirceu na 17ª fase da Operação Lava-Jato, batizada de Pixuleco pela Polícia Federal, por suspeita de envolvimento no escândalo da Petrobras, desperta nos militantes petistas um sentimento de frustração e de revolta. No segundo caso, a maioria acredita que está sendo vítima de uma grande conspiração de direita, quiçá, dos Estados Unidos de Barack Obama. Os argumentos dos advogados dos réus e a narrativa da cúpula petista estimulam essa reação, que não deixa de ser uma maneira de mobilizar os quadros do PT para a luta política, cada vez mais dura.
O PT nunca aceitou a condenação de José Dirceu no processo do mensalão, cuja legitimidade até hoje é questionada pela legenda e pelos advogados que atuaram no caso. O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa, relator do processo, que depois presidiu o STF e comandou o julgamento, sofreu ataques diretos dos petistas devido à atuação no caso. Agora, o mesmo ocorre com o juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba, que é tratado como um “ferrabrás” que exorbita das funções no caso Lava-Jato, ao pôr na cadeia, preventivamente, os principais acusados.
O procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, em entrevista em Curitiba, disse que o escândalo da Petrobras e o mensalão têm a mesma genealogia: “Nós temos o DNA, realmente, de compra de apoio parlamentar — pelo Banco do Brasil, no caso do mensalão, como na Petrobras, no caso da Lava-Jato”. Segundo ele, “José Dirceu recebia valores nesse esquema criminoso enquanto investigado no mensalão e enquanto foi preso. Seu irmão fazia o papel de ir até as empresas para pedir esses valores”.
Esse foi um dos fatos, segundo o procurador, que motivaram o novo pedido de prisão para Dirceu, que já cumpria pena em prisão domiciliar por condenação no mensalão. Para o advogado dele, a cúpula petista e os amigos do ex-ministro da Casa Civil do governo Lula, a prisão foi arbitrária e desnecessária: ele poderia perfeitamente responder às acusações até que transitasse em julgado o processo da Lava-Jato, cumprindo, em casa, a pena pela qual já foi condenado.
Conspiração
A polêmica sobre Dirceu é uma amostra grátis do que pode ocorrer no país caso as investigações avancem na direção de petistas mais ilustres. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já se articula e mobiliza forças para salvar o PT de uma catástrofe eleitoral irreversível, que inviabilize a candidatura dele em 2018. A volta ao poder de Lula é cada vez mais difícil, por causa do fracasso do governo Dilma Rousseff e do escândalo da Lava-Jato, que desgasta a imagem dele como líder político.
Lula é um craque da comunicação política, sabe utilizar com maestria a emoção dos militantes petistas e dos eleitores cujas vidas melhoraram durante o seu governo. No programa do PT que vai ao ar na quinta-feira, dirá que a legenda sofre uma perseguição odienta.
Vaias à presidente Dilma Rousseff, hostilidades quase físicas a políticos petistas em aviões de carreira e em restaurantes, além de uma bomba caseira lançada contra o Instituto Lula, em São Paulo — um ato tipicamente fascista — servem para corroborar o discurso. O clima pesado nas redes sociais é um exemplo da radicalização que vem por aí, já que grande manifestação contra o governo Dilma e o PT está programada para o próximo dia 16.
As investigações da Operação Lava-Jato contra o PT não são um fato banal, muito menos um delírio. A cúpula petista está à beira de ser tragada pelo escândalo. Rui Falcão, presidente nacional do PT, nega as denúncias: “O Partido dos Trabalhadores refuta as acusações de que teria realizado operações financeiras ilegais ou participado de qualquer esquema de corrupção”, diz.
A nota assinada por Falcão renova a fé dos militantes petistas que não acreditam nas denúncias e imaginam que tudo não passa de perseguição e conspiração golpista, ou seja, uma espécie de delírio persecutório coletivo.
Não sou psicólogo, mas até onde consigo entender, quem tem delírio persecutório são pessoas que não tem culpa, não fizeram nada e sentem essa perseguição. Não é o caso do Dirceu. Ele fez, sabe que fez e usa o argumento de vítima para tentar se safar. é um picareta mesmo e não um doente.
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