domingo, 4 de janeiro de 2015

Predadores e inimigos externos

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 04/01/2015

Não foi à toa que a Petrobras ocupou boa parte do discurso de posse da presidente Dilma Rousseff. É preciso construir uma narrativa oficial para manter distância segura da Operação Lava-Jato

Uma das imagens mais emblemáticas do escândalo da Petrobras no fim do ano foi a saída dos familiares dos executivos presos na Operação Lava-Jato da carceragem da Polícia Federal em Curitiba, na antevéspera do ano-novo, depois da visita ser antecipada devido ao feriado. Eles não puderam entregar aos detidos as comidas e as bebidas típicas do réveillon, mesmo assim, vestiam camisetas na qual estava inscrita a palavra fé.

As esposas de alguns dos mais importantes dirigentes de empreiteiras do país perderam a esperança de que eles sejam soltos antes do fim do recesso do Judiciário. E, mais uma vez, pressionaram os advogados a mudarem de estratégia: querem que os maridos recorram à delação premiada, como os executivos de uma das grandes empreiteiras envolvidas que já estão falando tudo o que sabem por decisão das herdeiras do grupo.

Isso significa mais problemas para os outros envolvidos no escândalo, inclusive para os ainda em liberdade, cujas empresas foram arroladas na lista de fornecedores impedidos de fazer transações com a Petrobras pela diretoria da estatal em razão da Operação Lava-Jato.

À distância

Não foi à toa que a Petrobras ocupou boa parte do discurso de posse da presidente Dilma Rousseff. É preciso construir uma narrativa oficial para manter o Palácio do Planalto à distância segura da Operação Lava-Jato. A saída adotada foi defender a empresa “de predadores internos e de seus inimigos externos”.

“Devemos saber apurar sem enfraquecer a Petrobras”, disse Dilma, que opera numa faixa muito estreita para não jogar a responsabilidade política sobre o que aconteceu no colo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Foi o que já fez com o ex-presidente da estatal José Roberto Gabrielli, no caso da compra superfaturada da refinaria de Pasadena, no Texas (EUA).

Como diria o falecido Mané Garrincha, é preciso combinar com os beques para que a estratégia dê certo. Delegados da Polícia Federal e procuradores do Ministério Público Federal já têm provas suficientes para permitir ao juiz federal Sérgio Moro, que examina as denúncias, condenações muito mais duras do que a da ex-presidente do Banco Rural Kátia Rabelo, sentenciada a 16 anos e 8 meses de prisão.

Esse é o ponto fraco da estratégia de Dilma. O mensalão, descoberto a partir da CPI dos Correios, era apenas a ponta de um grande iceberg de financiamento ilegal dos partidos da base do governo. A diferença é que já não há petistas com disposição para “matar no peito” as acusações, estoicamente, como fizeram o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, o ex-presidente do PT José Genoino, e o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares, todos condenados pelo STF na Ação Penal 470.

Os supostos operadores do esquema de corrupção dentro da Petrobras, como Paulo Roberto Costa e Renato Duque; e fora da empresa, como o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da Sete Brasil Pedro Barusco, não têm os mesmos compromissos e lealdades políticas. Dos quatro, apenas Duque não aderiu à delação premiada.

Está solto, em razão de um habeas corpus concedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavaski, relator do processo, mas a delação premiada de Barusco — ex-subordinado de Costa na Petrobras, que topou devolver quase 100 milhões de dólares de propinas — pode mudar completamente a situação e criar mais dores de cabeça para o Palácio do Planalto.

E os inimigos externos? Não são as Sete Irmãs e os países árabes, porque essa concorrência é do jogo, não importa a retórica nacionalista da presidente Dilma e do PT. Nem os investidores e fundos de pensão que estão processando a Petrobras e exigem indenizações pela má gestão da empresa. São as investigações em curso nos Estados Unidos, na Holanda e na Suíça que podem levar às contas dos envolvidos no exterior e fechar o cerco aos caciques políticos envolvidos no escândalo.

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