quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Acabou a blindagem

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 15/01/2015

Teme-se que, na prisão, Cerveró recorra à delação premiada, como o ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef

A prisão preventiva do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, por ordem do juiz federal Marcos Josegrei, que determinou a abertura de inquérito na Polícia Federal para investigar atos de lavagem de dinheiro e de ocultação patrimonial, rompeu a blindagem que, até agora, protegia o executivo e inviabilizou a eventual fuga dele para a Espanha, onde também é cidadão. Cerveró foi diretor da Área Internacional da Petrobras de 2003 a 2008; e era o diretor financeiro da BR Distribuidora até ser demitido do cargo, em março de 2014.

O executivo passou o natal e o ano-novo em Londres, mas foi preso tão logo chegou ao Brasil, na madrugada de ontem. Apontado como responsável pela compra superfaturada da Refinaria Pasadena, no Texas (EUA), Cerveró é um homem-bomba: se resolver falar tudo o que sabe, a rede de corrupção montada a partir das operações da Petrobras no exterior poderá ser desvendada pela Operação Lava-Jato.

Logo após eclodir o escândalo de Pasadena, a partir de um relatório dos auditores do Tribunal de Contas da União (TCU), Cerveró foi acusado, pela presidente Dilma Rousseff, de ter omitido informações importantes sobre o contrato quando a decisão foi autorizada. Na ocasião, a opinião pública não sabia ainda das conexões do escândalo com a Operação Lava-Jato, mas, mesmo assim, foi montada uma grande ação para abafar o caso e proteger Cerveró.

A compra de Pasadena foi aprovada pelo Conselho de Administração da Petrobras em 2006. À época, presidido por Dilma, que se defendeu com o argumento de que o resumo executivo produzido por Cerveró para orientar o colegiado era falho. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não gostou da nota divulgada por Dilma sobre o caso, o ex-presidente da Petrobras Sérgio Gabrielli esperneou muito, e a atual presente da empresa, Maria das Graças Foster, depois de confirmar o que Dilma tinha dito, mitigou as próprias declarações ao depor na CPI criada pelos governistas no Senado para uma investigação de mentirinha.

Quando depôs na CPI Mista do Congresso, Cerveró chegou a cantar de galo, devidamente blindado pelos governistas. Mesmo na acareação com Paulo Roberto Costa, que protagonizou uma verdadeira catarse numa de suas últimas sessões, Cerveró manteve-se, olimpicamente, a salvo. O TCU, porém, responsabilizou Cerveró e outros nove diretores e ex-dirigentes da Petrobras, entre eles Gabrielli, pelos prejuízos de US$ 790 milhões na compra da refinaria.

Propina

Cerveró foi traído pelo excesso de confiança. Segundo o despacho do juiz que determinou a prisão, “parece mesmo não enxergar limites éticos e jurídicos para garantir que não sofra as consequências penais de seu agir, o que pode, no limite, transbordar para fuga pessoal caso perceba a prisão como possibilidade real e iminente”.

O ex-diretor tentou transferir para a filha R$ 500 mil — mesmo considerando que, com tal operação haveria uma perda significativa de R$ 200 mil da aplicação financeira. Segundo o MPF, também teria transferido recentemente três apartamentos adquiridos com recursos de origem duvidosa, em valores menores do que eles valeriam: de R$ 7 milhões por R$ 560 mil.

Na condição de diretor Internacional da Petrobras, Cerveró teria “dado causa ao oferecimento de propina no valor de US$ 53 milhões”, cuja entrega fora intermediada por Fernando Antonio Falcão Soares, o Fernando Baiano, preso na Operação Lava-Jato. Em duas operações envolvendo a Petrobras, teria sido diretamente beneficiado, com Fernando Baiano, pelo recebimento de vantagem indevida no total de US$ 40 milhões, segundo o juiz federal.

A prisão do executivo criou mais expectativas negativas no Palácio do Planalto e no Congresso em relação aos desdobramentos da Lava-Jato. Teme-se que, na prisão, Cerveró recorra à delação premiada, como o ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef, além de executivos presos. PT e PMDB, os partidos envolvidos, mesmo assim, digladiam-se pelo comando da Câmara e do Senado.

Ontem, o advogado de Cerveró, Edson Ribeiro, ao protestar contra a prisão do cliente, acusou a Justiça de adotar dois pesos e duas medidas no caso, com o argumento de que Graça Foster, mantida no cargo por Dilma, teria adotado os mesmos procedimentos em relação aos próprios bens: “A Graça Foster também movimentou seus imóveis”. Não deixa de ser um recado do que pode vir pela frente.

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