Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 13/11/2014
O ambiente nos gabinetes dos ministros é o pior
possível, embora a presidente da República tenha sido reeleita e todos
tenham se empenhado pela sua vitória
A saída da senadora Marta
Suplicy (PT-SP) do Ministério da Cultura precipitou, no Palácio do
Planalto, a demissão dos demais ministros do governo atual, com a
presidente Dilma Rousseff ainda na Austrália, onde participa da reunião
do G-20. Os que vão permanecer no governo, embora não tenham mais
certeza disso, foram constrangidos pelo ministro-chefe da Casa Civil,
Aloizio Mercadante, a colocar os cargos à disposição e a continuar a
rotina de trabalho como se nada estivesse acontecendo. Vai ser difícil.
O
próprio Mercadante (Casa Civil) e Mauro Borges (Desenvolvimento,
Indústria e Comércio Exterior), Manoel Dias (Trabalho), Marcelo Néri
(Assuntos Estratégicos), Clélio Campolina (Ciência e Tecnologia),
Moreira Franco (Aviação Civil), Francisco Teixeira (Integração
Nacional), Luis Inácio Adams (Advocacia-Geral da União), José Henrique
Paim (Educação) e César Borges (Portos) colocaram os cargos à
disposição. Foram atropelados por Marta Suplicy, que pediu pessoalmente
ao presidente em exercício, Michel Temer, que assinasse sua demissão e
publicasse no Diário Oficial da União para que pudesse voltar logo ao
Senado.
O ambiente nos gabinetes dos ministros é o pior
possível, embora a presidente da República tenha sido reeleita e todos
tenham se empenhado pela sua vitória, mais ou menos como aquela história
do garçom que serve café frio e nem cumprimenta direito o chefe, porque
sabe que faz parte da mobília e ministro está caindo, com toda a sua
entourage junto. Na verdade, o governo está parado há pelo menos três
meses, quando caiu a ficha dos petistas e aliados de que o risco de
derrota era grande e a turma voltou para os estados para pôr o bloco na
rua. Não foi à toa que os gastos secretos com cartões corporativos
pararam na Lua.
Em Doha, no Qatar, Dilma minimizou as críticas de
Marta à política econômica, tratou com naturalidade sua demissão e fez
críticas veladas a Mercadante por orientar os colegas a colocarem os
cargos à disposição. Na conversa que teve com a presidente da República,
dois dias após as eleições, a senadora havia explicitado as queixas e as
divergências, e a carta de demissão estava mais ou menos no script. A
petista deixou claro que teria uma atuação independente no Senado,
voltada para os eleitores paulistas. Marta se prepara para disputar a
Prefeitura de São Paulo. O que acontecer daqui por diante será
consequência disso.
Filme queimado
Dilma
promete reestruturar seu governo a partir da volta da reunião do G-20,
na Austrália, quando anunciará o novo ministro da Fazenda. Essa escolha
está sendo a maior dificuldade. Na conversa de seis horas que teve com o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu padrinho político, ele
deixou muito claro que o nome de sua preferência era o do ex-presidente
do Banco Central Henrique Meirelles. Dilma, porém, resistiu à indicação.
O que pesa contra Meirelles é sua relação com a JBS, a maior
financiadora da campanha eleitoral de Dilma e, também, a maior
beneficiária da generosa política de financiamentos do BNDES para a
formação de grandes grupos monopolistas nacionais. O governo concedeu R$
5 bilhões de empréstimos à empresa de Joesley Mendonça Batista e passou
a ser o maior acionista minoritário do grupo, com 30,4% das ações.
Por
causa das relações heterodoxas com o grupo, um inquérito para
investigar o possível favorecimento por parte do BNDES em uma operação
de emissão de títulos chegou a ser aberto pelo Ministério Público
Federal do Rio de Janeiro em fevereiro do ano passado. Meirelles foi
contratado como consultor da JBS para gerenciar uma dívida de R$ 10
bilhões. Dilma disse a Lula que a nomeação de Meirelles a deixaria numa
saia justa. Rola até a piada nas redes sociais de que Dilma já implantou
o financiamento público: libera o empréstimo do BNDES e recebe uma
parte como doação de campanha.
Os demais cargos da Esplanada
serão anunciados gradativamente, ao que tudo indica, em sincronia com a
reestruturação da base do governo na Câmara. Caso o critério seja
adotado para valer, a mudança somente será completada depois da eleição
do presidente da Câmara dos Deputados. O Palácio do Planalto ainda tenta
impedir a escolha do líder do PMDB, Eduardo Cunha, para a chefia da
Casa. É uma estratégia que tem todas as chances de dar errado. Será mais
fácil o desafeto ganhar a guerra e, depois, ainda emplacar um novo ministro na Esplanada do que o PT
derrotá-lo.
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