sexta-feira, 15 de agosto de 2014
Análise da notícia: Ser ou não ser, eis a questão
Enquanto a ex-senadora acriana se fecha em luto e evita qualquer entendimento político sobre o que fazer diante da nova situação, a cúpula do PSB está em dúvida sobre dar prosseguimento ao projeto oposicionista de Campos ou fazer um acordo com o PT para voltar ao poder
Por Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense-15/08/2014
Os versos do maior dramaturgo inglês, William Shakespeare, na tragédia de Hamlet, relatam a dor e o sofrimento do príncipe da Dinamarca quando descobre as traições do próprio tio para lhe tomar o poder. O contexto é diferente, mas vem a calhar no caso de Marina Silva, no dia seguinte à tragédia que tirou a vida do candidato do PSB a presidente da República, Eduardo Campos.
Enquanto a ex-senadora acriana se fecha em luto e evita qualquer entendimento político sobre o que fazer diante da nova situação, a cúpula do PSB está em dúvida sobre dar prosseguimento ao projeto oposicionista de Campos ou fazer um acordo com o PT para voltar ao poder, na suposição de que isso garantiria a vitória de Dilma Rousseff já no primeiro turno. A nota enigmática do PSB divulgada ontem reflete essa contradição. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assedia, nos bastidores, os líderes da legenda mais próximos a ele.
A candidatura de Eduardo Campos nunca foi pacífica no PSB. Sempre houve setores do partido ligados ao vice-presidente da legenda, Roberto Amaral, que defenderam a preservação da aliança com o ex-presidente Lula. Somente não foram bem-sucedidos porque Campos usou o próprio carisma e controle sobre a máquina partidária para consolidar a própria candidatura, que enfrentou resistências também de alguns governadores. Amaral agora assumiu o comando da legenda.
Campos só manteve sua candidatura porque recebeu apoios inimagináveis até então, como a surpreendente filiação de Marina Silva ao PSB, depois que a Rede Sustentabilidade ficou sem legenda, oferecendo-se inclusive para compor a chapa na vice. Outra adesão importante foi a do PPS, cujo líder, deputado Roberto Freire (SP), também enfrentou dissidências para consumar a coligação, em vez de manter a aliança tradicional com o PSDB. Com isso, o ex-governador de Pernambuco viabilizou mais tempo de televisão e quebrou as resistências internas.
A aliança programática de Marina com o PSB, entretanto, nunca foi fácil. Em muitos estados a Rede tem atuação independente e apoia candidatos que estão fora das coligações do PSB, como é o caso de São Paulo, onde a legenda indicou o deputado Márcio França para vice do tucano Geraldo Alckmin, candidato à reeleição. A vice não viajou para Santos com Campos porque a agenda era com o governador paulista. Supõe-se que a candidatura a presidente de Marina muda o eixo da aliança, que passaria a ser a Rede, o que deslocaria do centro da campanha quadros importantes do PSB, como o secretário-geral Carlos Siqueira.
Marina Silva seria a candidata natural ao lugar de Campos se os demais líderes da legenda não vivessem às turras com os integrantes da Rede. O que manteve a aliança apesar disso foi o bom relacionamento com o ex-governador de Pernambuco, mas, em muitos estados, a vice fechou acordos regionais que contrariavam seu companheiro de chapa. Marina precisa honrar as alianças e os compromissos assumidos pelo candidato morto para manter a candidatura. Nada impede, porém, que desista de ser candidata — como fez ao recusar o convite de Roberto Freire para se filiar ao PPS — se achar que as condições para isso não valem a pena. A propósito, o excesso de exigências da cúpula do PSB pode ter exatamente esse objetivo.
Vamos aguardar o enterro do ex-governador de Pernambuco...
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