quinta-feira, 10 de julho de 2014

O colapso da seleção

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 10/07/2014

Faltou combinar com Müller, Klose (2), Kroos, Khedira e Schürrle (2), como diria Mané Garrincha. Felipão ficou perplexo diante da ofensiva alemã, sem entender o que estava acontecendo. 

Ninguém imaginava o que aconteceu no Mineirão, nem há explicação satisfatória para o vexame da Seleção Brasileira na semifinal contra a Alemanha. A derrota deprimente por 7 x 1 será estudada nos mínimos detalhes por técnicos de futebol pelos próximos 50 anos, pelo menos aqui no Brasil, como já aconteceu com a derrota na Copa de 1950, para o Uruguai. A diferença é que não dependeu de uma jogada fortuita, como a de Ghiggia no Maracanazo, que virou o placar para 2 x 1 contra nós. Foi uma goleada definida em seis minutos mágicos de futebol, nos quais foram marcados quatro dos cinco gols alemães do primeiro tempo. O de honra do Brasil só saiu nos minutos finais, quando o placar já estava praticamente definido por mais dois gols alemães, num lampejo individual e isolado de Oscar.

O jogo ainda não havia terminado, porém, já circulava na internet uma piada infame: um gaiato dizia que nem na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) um povo sofrera tanto como os brasileiros, o que é uma rematada tolice, diante do morticínio que houve. Basta lembrar apenas os 6 milhões de judeus mortos no Holocausto, 10% do total. Mas essa comparação sem sentido vem a calhar porque o esquema tático armado pelo técnico Luiz Felipe Scolari — para substituir Neymar e Thiago Silva — parecia uma espécie de Linha Maginot, o sistema de fortificações construído pelos franceses para barrar a invasão alemã.

André Maginot, um ex-combatente da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), era o ministro da Guerra em 1927 e tinha certeza de que a Alemanha e a Itália, por causa do Tratado de Versalhes, entrariam em confronto com a França. Ele morreu de uma overdose de ostras estragadas, em 1932, sem ver seu plano executado. Ao preço de 5 bilhões de francos, porém, foi construída uma espécie de muralha da China subterrânea, entre 1930 e 1936, com 100km de extensão, paralela à fronteira franco-germânica. Com suprimentos próprios de energia, munição e alimentos, tinha 108 edificações principais (fortes), a 15km de distância umas das outras, mais construções menores e casamatas interligadas por ferrovia.

Virou um case militar de erro de conceito: os franceses se prepararam para uma “guerra de posições”, nas quais a infantaria e a artilharia combateriam entrincheiradas, como na Primeira Guerra Mundial. Mas a invasão alemã, em 1940, apesar de previsível, surpreendeu o Exército francês porque as divisões blindadas contornaram as fortificações pela extremidade oeste, na fronteira com a Bélgica, que declarara neutralidade, e na região de Sedan, próxima a Luxemburgo, onde as fortificações não foram concluídas por falta de recursos. O Exército francês foi cortado ao meio e se rendeu. O mundo assistiu com espanto à queda de Paris e à dramática retirada de ingleses, belgas e franceses encurralados nas praias de Dunquerque.

Ataques-relâmpago

A comparação com o que aconteceu no Mineirão, porém, faz mais sentido por causa dos mortíferos ataques alemães no primeiro tempo, uma blitzkrieg na grande área brasileira, executada aos 10, aos 22, aos 23, aos 24 e aos 29 minutos de jogo. No conceito de “guerra de movimento”, a palavra alemã significa guerra relâmpago, para evitar que as forças inimigas tenham tempo de organizar a defesa. Os elementos essenciais são o efeito surpresa, a rapidez das manobras e a brutalidade do ataque, com objetivo de desmoralizar o inimigo e desorganizar suas forças, paralisando os centros de controle. O criador dessa tática militar foi o marechal alemão Eric von Manstein, que foi condenado em Nuremberg por crimes de guerra, mas teve a pena reduzida durante a Guerra Fria e ajudou a Alemanha Ocidental a reorganizar o seu Exército.

Parece que Luiz Felipe Scolari adotou a tática da “guerra de posições”, como os franceses. Escalou o time e disse onde cada jogador deveria jogar contra a seleção alemã, como se fosse possível, num jogo de Copa do Mundo, decidir na prancheta como impor o medíocre padrão de jogo da nossa Seleção. Faltou combinar com Müller, Klose (2), Kroos, Khedira e Schürrle (2), como diria Mané Garrincha. Felipão ficou perplexo diante da ofensiva alemã, sem entender o que estava acontecendo. A defesa brasileira, desorientada, perdeu qualquer capacidade de reação. Era o ponto forte do Brasil até a saída de Thiago Silva. O ataque brasileiro, que já era fraco, simplesmente havia deixado de existir, antes mesmo do jogo começar, com a saída de Neymar.

Ao explicar o que aconteceu, Luiz Felipe Scolari preferiu dar destaque ao fato de a Seleção ter chegado a uma semifinal de Mundial pela primeira vez desde 2002. Em 2006 e em 2010, fomos eliminados pela França e, depois, pela Holanda, respectivamente, nas quartas de final. Minimizou a derrota: “O normal era vitória nossa ou deles. São duas grandes equipes. Pelo resultado ser por esse número de gols, ficará para a história”, disse. “Tivemos seis minutos em que deu pane geral. Isso não é o que imaginávamos. Vamos trabalhar para montar o time do jogo de sábado, que passa a ser importante e um outro sonho.” Que venha a seleção da Holanda!

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