Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 27/07/2014
O Palácio do Planalto jogou mais para a arquibancada do que em direção
ao gol. Assim, abriu espaço para que a belicosa chancelaria israelense
classificasse o Brasil como um “anão diplomático”, o que não é caso,
historicamente, em se tratando do Oriente Médio.
Quem já foi ao Saara, no Rio de Janeiro, como são conhecidas as ruas de
comércio popular da capital fluminense, sabe que a convivência entre
árabes e judeus poderia ser muito melhor. Ali, concorrem entre si no
plano comercial, mas vivem em harmonia social e são capazes de se unir
em prol dos interesses comuns. Entretanto, quando a situação se agrava
no Oriente Médio, como na Guerra dos Seis Dias, em 1967, ou na invasão
do Líbano por Israel, em 1982, um clima de baixo astral toma conta das
duas comunidades.
São os ecos da guerra longínqua na terra ancestral, que, para eles, está
muito mais perto do que se imagina, devido aos laços familiares. As
duas antigas tribos semitas, segundo o Gênesis, descendem de Sem, filho de
Nóe. O mesmo sentimento de dor e frustração ocorre em outras regiões
país. É o caldo de cultura para o fanatismo religioso e o chauvinismo
nacionalista, que podem ser tornar um problema para todos nós, se
entrarmos no clima de radicalização política que predomina em Israel e
na Palestina.
Desde a criação do Estado de Israel, com o decisivo apoio do Brasil na
ONU, o Itamaraty sempre atuou como uma força moderadora nos conflitos do
Oriente Médio, sem que isso significasse abdicar de tomar posições
afirmativas nos fóruns internacionais a favor da Autoridade Palestina,
como o seu reconhecimento diplomático.
Forças de paz
Atualmente, a Marinha do Brasil
integra uma força-tarefa marítima da Força Interina das Nações Unidas do
Líbano (Unifil), com um navio operando na parte oriental do Mar
Mediterrâneo. A fragata Liberal tem uma tripulação composta por 263
militares, com um destacamento aéreo embarcado, fuzileiros navais, corpo
de saúde e mais 13 oficiais de estado-maior.
Composta ainda por
mais oito navios da Alemanha, Turquia, Grécia, Indonésia e Bangladesh,
desde fevereiro de 2011 a força-tarefa está sob comando de um
contra-almirante brasileiro. Monitora o tráfego na costa libanesa, para
impedir o contrabando de armas para os xiitas do Hizbollah e treinar os
quadros da Marinha de Guerra libanesa.
É a primeira vez que o comando da Unifil está sob responsabilidade de um
país não membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). A
fragata Constituição recentemente partiu do Rio de Janeiro para
substituir a fragata Liberal, e permanecerá na área até abril de 2015.
Guerra Fria
Não
é a primeira vez que o Brasil manda militares para o Oriente Médio. De
1957 a 1967, no calor escaldante do deserto, 6 mil soldados brasileiros —
a maioria do Rio — patrulharam o Canal de Suez e as fronteiras do
Egito, entre tempestades de areia e minas terrestres. O Batalhão Suez
ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1988, ao lado das Forças de Paz da ONU.
Além de Israel e Egito — os dois países envolvidos diretamente na guerra
—, grandes potências mundiais, como Inglaterra, França, Estados Unidos e
União Soviética, tinham interesses em jogo na região. Um dos motivos do
conflito foi a nacionalização do Canal de Suez pelo presidente egípcio
Gamal Abdel Nasser, em 1956.
O local é um ponto estratégico para
a economia mundial, fazendo a ligação marítima mais curta entre vários
países da Ásia, da África e da Europa. Em retaliação, França e
Inglaterra formaram uma espécie de coalizão com Israel e atacaram o
Egito. Era o período da Guerra Fria, a disputa entre a antiga União
Soviética e os Estados Unidos pela liderança política e econômica
mundial.
A ONU agiu prontamente e enviou tropas de paz para a região. O Brasil
foi um dos 10 países convidados a participar da missão, com Canadá,
Noruega, Finlândia, Índia, Colômbia, Dinamarca, Indochina, Suécia e
Iugoslávia. Isso não impediu, porém, a Guerra dos Seis Dias, em 1967, na
qual Israel derrotou o Egito, a Síria e a Jordânia e ocupou territórios
árabes.
Talvez tenha havido um exagero no posicionamento do
governo brasileiro — que classificou de desproporcional os ataques de
Israel às comunidades palestinas na Faixa de Gaza, o que é verdade, sem
criticar duramente os ataques do Hamas ao território israelense —, ao
convocar o nosso embaixador em Israel.
O Palácio do Planalto jogou mais para a arquibancada do que em direção
ao gol. Assim, abriu espaço para que a belicosa chancelaria israelense
classificasse o Brasil como um “anão diplomático”, o que não é caso,
historicamente, em se tratando do Oriente Médio. Do ponto da nossa
tradição diplomática, a capacidade de diálogo do Itamaraty sempre teve
papel positivo para a paz na região, mas pode ter se perdido nesse
episódio.
Dos petralhas não se poderia esperar outra coisa. Mais ainda quando tendo um Ministro das Relações Exteriores, quem quase sempre fala pela nossa diplomacia é uma figura obscura chamada de secretário das relaçoes internacionais.
ResponderExcluirQuanta informação sobre política internacional nos faltam. Vivemos em uma ilha intelectual murada por chavões que pouco nos informam sobre o porque das decisões lá em cima.
ResponderExcluirExcelente artigo que ajuda a esclarecer mais um pouco o emaranhado político internacional que o Brasil vive.