Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo Correio Braziliense - 13/01/2014 |
Às vésperas de sua campanha de reeleição, a política de alianças do governo está sendo posta à prova pelos confrontos entre o PT e o PMDB nos estados Quando questionado sobre sua aliança com o falecido senador Antônio Carlos Magalhães (antigo DEM), que por três vezes governou a Bahia, o presidente Fernando Henrique Cardozo costumava pedir aos seus ministros, como o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Nelson Jobim, então à frente do Ministério da Justiça, que lesse Um estadista no Império (Editora Top Books), de Joaquim Nabuco. A maioria não leu, mas quem o fez entendeu a necessidade de conciliar a modernização do Estado brasileiro, que então passava por uma reforma patrimonial e financeira, com as alianças políticas que garantiam a sustentação de seu governo. Foi com apoio de forças liberais e conservadoras que FHC conseguiu estabilizar a moeda, restabelecer o equilíbrio fiscal e manter de pé o Plano Real. Joaquim Nabuco ocupa um lugar de honra no altar dos chamados “intérpretes do Brasil”, com três livros: Um estadista no Império, O abolicionismo e Minha formação. Deputado, diplomata e historiador, era reformista e abolicionista convicto, mas a favor da monarquia, que defendeu com paixão e sem sucesso. Como se sabe, quando o Parlamento resolveu acabar com a escravidão, levou de roldão D. Pedro II e sua Corte. Nabuco, em sua obra, destaca a política de conciliação entre liberais e conservadores no Império, consagrada em 1853 pelo gabinete do Marquês de Paraná, Honório Hermeto Carneiro Leão, chefe do Partido Conservador, que fora interventor em Pernambuco após a Revolução Praieira e perdera a eleição na província logo a seguir. O pai de Joaquim Nabuco, o conselheiro Nabuco de Araújo, após a derrota eleitoral, fez um famoso discurso no Senado, intitulado “A ponte de ouro”, no qual se declara em oposição aos liberais que haviam vencido as eleições na província, mas anuncia seu apoio ao gabinete no qual eles teriam assento, embora se mantivesse em oposição a eles em Pernambuco. Nasceu ali um tipo de pacto que se manteve ao longo da história do Brasil, até os dias atuais. Deve-se à política de conciliação do Império a preservação da integridade territorial do Brasil e a consolidação de nosso Estado nacional, dotado de castas militar, diplomática e judiciária fortes. Vêm daí também o patrimonialismo, o compadrio e o fisiologismo das elites políticas, bem como a sobrevivência das oligarquias regionais, principalmente do Norte e Nordeste, que secularmente atrasam ou impedem reformas políticas , econômicas e sociais. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sem beber da mesma fonte, utilizou-se do mesmo estratagema para garantir sustentação política e evitar uma crise cambial logo ao assumir o seu governo, em 2003. Mas jogou ao mar, no primeiro mandato, uma parcela do PMDB que havia apoiado o ex-governador paulista José Serra. Foi daí que nasceu a crise do chamado “mensalão”. Desde a campanha eleitoral, porém, já havia incorporado ao seu campo de alianças o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP), cujo clã controla o governo do Maranhão há 50 anos. Naquele momento, parecia que a política brasileira daria uma guinada para esquerda. E retomaria à confrontação esquerda versus direita que resultou no golpe de 1964. Lula manteve na oposição o PSDB e outras forças que havia derrotado, mas trouxe para o governo setores conservadores e liberais que FHC havia desprezado, por considerá-los o “atraso do atraso”, ou que mudaram de lado por puro adesismo. No exercício do poder, Lula não só consolidou como ampliou essas alianças, o que lhe permitiu a reeleição e também fazer a própria sucessão. Apesar de beneficiada, a presidente Dilma Rousseff tem dificuldades de lidar com esses aliados, embora tenha como vice-presidente Michel Temer, que comanda o PMDB e é um conciliador nato. Chegou, inclusive, a ensaiar uma “ruptura com o atraso” no começo do governo, com a chamada faxina ética, mas recuou. Às vésperas de sua campanha de reeleição, novamente tal política de alianças está sendo posta à prova, principalmente por confrontos entre o PT e o PMDB nos estados, como Bahia, Ceará, Minas, Paraíba, Pernambuco, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Em tese, tudo pode se recompor depois das eleições, mas primeiro é preciso ganhá-la. É aí que a relação de Dilma Rousseff com o clã Sarney, em meio à crise do sistema presidiário do Maranhão, simboliza aos aliados continuidade ou não da velha política de conciliação de Nabuco de Araújo, que está vivíssima. |
nota 10
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