quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Casuísmo eleitoral

A reforma política não passa no Congresso, só os casuísmos,
como a janela para o troca-troca partidário


Por Luiz Carlos Azedo


Não estou entre aqueles que consideram o nosso
sistema eleitoral a matriz de todos os males da política
brasileira. Temos a maior democracia de
massas do mundo, com eleições limpas, voto direto,
secreto e universal. A crise de representatividade dos
partidos é um problema mais profundo, que independe
do sistema eleitoral. Desconfio de reformas políticas aprovadas
a toque de caixa, às vésperas das eleições. É um cacoete
herdado do regime militar, que recorria aos casuísmos
eleitorais para favorecer o status quo.
Por isso mesmo, a proposta de reforma política enviada
ao Congresso pelo governo Lula, por mais bemintencionada
que seja, acabará virando mais um casuísmo
eleitoral. Se a reforma política fosse mesmo fundamental
para o governo, teria sido feita no primeiro
mandato do presidente Lula ou logo nos primeiros meses
do segundo. Ou seja, estamos diante de mais uma
mudança nas regras do jogo às vésperas da eleição, o
que não é novidade. Eis a reforma:

Lista partidária fechada
Os eleitores não votarão em candidatos a vereador, deputado
estadual e federal, mas nos partidos, que concorrerão
com listas fechadas de nomes. A cédula eleitoral terá espaço
apenas para que o eleitor indique a sigla ou o número
do partido em cuja lista pretende votar.
Comentário: a proposta
dá poderes ilimitados aos "donos" dos partidos.


Financiamento de campanhas
O Orçamento da União incluirá dotação destinada ao financiamento
público exclusivo de campanhas. O TSE
distribuirá os recursos da seguinte forma: 1% dividido
igualmente entre os partidos registrados; 19% divididos
igualmente entre os partidos com representação na Câmara;
e 80% divididos entre os partidos proporcionalmente
ao número de eleitos na última eleição para a Câmara.
Comentário: só beneficia os grandes partidos.

Fidelidade partidária
Os parlamentares que mudarem ou forem expulsos de
partido perderão os mandatos para os respectivos suplentes.
Será permitida a desfiliação em caso de perseguição
política ou mudança de programa partidário, desde que
aprovada pela Justiça. Será possível mudar de partido para
disputar a eleição subsequente.
Comentário: abre-se uma
janela para o trocatroca partidário.


Inelegibilidade

São inelegíveis candidatos
condenadosem segunda instância,seja por crime
eleitoral ou por um rol de delitos, que inclui
abuso do poder econômico ou político,crime contra a
economia popular,contra a administração
pública ou por tráfico de entorpecentes. A inelegibilidade
valerá para a eleição à qual o candidato concorre
ou foi eleito e para as que se realizarem no três
anos seguintes.
Comentário: contraria decisão do STF de
que ninguém pode ser impedido de concorrer à eleição
antes do processo ser concluído na última instância.


Coligações
Fim das coligações para eleições proporcionais (para
deputado federal, estadual e vereador). A coligação das
eleições majoritárias (para presidente, governador, prefeito
e senador) disporá do tempo de rádio e televisão
destinado ao partido com o maior número de representantes
na Câmara.
Comentário: liquida os pequenos
partidos e redistribui os tempos de televisão dos partidos
que não lançarem candidaturas próprias.


Cláusula de barreira
O mandato de deputado (federal, estadual ou distrital)
só poderá ser exercido pelo candidato eleito cujo
partido alcançar pelo menos 1% dos votos válidos, excluídos
os brancos e os nulos, em eleição para a Câmara,
e distribuídos em pelo menos um terço dos estados,
com o mínimo de 0,5% dos votos em cada estado.
Comentário: a representação dos pequenos partidos
será cassada.


A reforma política não passa no Congresso, só os casuísmos,
como a janela para o troca-troca partidário,
sem a qual o fim das coligações e a clausula de barreira
dificilmente serão aprovadas. O voto em lista tem apoio
no Senado, mas não na Câmara. Eleitos pelo voto proporcional
uninominal, os deputados não entregarão a
própria reeleição à burocracia partidária. O financiamento
público enfrenta resistência pelo mesmo motivo.
Quanto à inelegibilidade, é como falar de corda em
casa de enforcado.

Publicado na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense em 11 de janeiro de 2009

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