domingo, 31 de agosto de 2014

As elites e Marina

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 31/08/2014

O quadro de estagnação da economia, os desgastes do PT no poder, as dificuldades da presidente Dilma Rousseff no trato com os aliados e com o mundo empresarial… São diversas as dificuldades para o continuísmo.


Devem-se ao alemão Robert Michel, ao lado de Gaetano Mosca e Vilfredo Pareto, pais da sociologia política, os primeiros estudos sobre o comportamento dos partidos políticos e suas elites intelectuais. Radicado na Itália, ensinou economia, ciência política e sociologia nas universidades de Turim, Basileia e Perugia.

Desencantado com o Partido Social-democrata Alemão, Michel estudou a burocratizarão dos partidos operários e dos sindicatos de trabalhadores. Aplicou ao fenômeno o conceito de oligarquia que havia sido desenvolvido por Mosca, para quem essa era a principal característica da classe política da época, e Pareto, que via a “circulação das elites” de forma equivalente ao conceito marxista de classe dominante.

Havia certo consenso político sobre o conceito. Na década de 1960, porém, o pau quebrou na academia por causa de uma polêmica entre os sociólogos Wrigth Mills e Robert Alan Dahl sobre a política dos Estados Unidos, cujo governo, na opinião do primeiro, seria controlado por uma elite unitária e restrita.

Mills foi contestado por Dahl, para quem haveria muitas elites capazes de operar tanto em situações de conflito quanto de compromisso, uma vez que os governos eram formados em contextos competitivos e inclusivos, ou seja, por meio de escolhas eleitorais.

Desde então, na sociologia, elite passou a ter uma dominação ampla, designando grupos de indivíduos em posições estratégicas — de partidos, instituições e entidades — e com poder de decisão. É mais ou menos esse o sentido dado ao conceito por Marina Silva ao afirmar que Chico Mendes, o seringueiros assassinado no Acre, que foi seu parceiro de lutas, também fazia parte das elites do país.

Divisor de águas 

A candidata do PSB fez essa afirmação ao ser questionada durante uma entrevista de televisão sobre as dificuldades que teria para governar o país, se eleita, por pertencer a uma pequena coligação e defender novos paradigmas para a governabilidade e a sustentabilidade econômica.

Abriu, porém, uma grande polêmica na campanha eleitoral sobre a natureza das elites brasileiras e seu papel na vida nacional, que não é nova, mas estava sendo tratada de forma muito maniqueísta.

Supostamente, o governo Dilma representaria o povo, e a oposição, encabeçada por Aécio Neves (PSDB), as elites do país. Essa era a lógica perversa do “nós contra eles” que acabou ultrapassada pelos fatos.

Quem vai governar?

Marina se vê diante de uma situação na qual as principais elites do país estaria aliadas ao PT ou ao PSDB.

A discussão sobre quem reúne melhores condições do governar o país, num regime presidencialista como o nosso, eleitoralmente, passa pelo confronto de propostas e de imagens dos candidatos. E pela correlação entre tudo isso e a realidade social em que vivemos.

Mas, do ponto de vista institucional, exige um complexo amplo de relações entre as diversas elites do país, quando nada com a parlamentar, a magistratura, a diplomacia e os militares, que fazem parte do chamado “poder instalado” .

Além disso, na esfera da sociedade, empresários, lideranças sindicais, intelectuais, cientistas e artistas também são protagonistas do que seria uma nova política, cada qual com suas próprias elites. Como esses atores estão se posicionando diante desse novo e complexo cenário?

Há quatro semanas do dia de votação, a eleição aponta para a alternância de poder, o que parecia inimaginável um ano atrás. O quadro de estagnação da economia, os desgastes do PT no poder, as dificuldades da presidente Dilma Rousseff no trato com os aliados e com o mundo empresarial… São diversas as dificuldades para o continuísmo.

A grande incógnita da mudança, porém, não é a nova política — que pode ser apregoada por Marina Silva por meio de gestos e de palavras —, mas se uma nova elite seria capaz de governar o país em caso de vitória da oposição. Trata-se de um conceito em busca de lideranças de carne e osso.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

O fim do túnel

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 28/08/2014

Na medida em que se revelou forte candidata à Presidência, Marina passou a ser um alvo fixo para os adversários, que apontam os seus pontos fracos

 O candidato do PSDB à Presidência da República, Aécio Neves, aproveitou o debate da TV Bandeirantes para acenar aos agentes econômicos com uma luz no fim do túnel em relação ao cenário de estagflação da economia: o anúncio do nome de Armínio Fraga para o Ministério da Fazenda.

O tucano tenta uma manobra de flanco com dois objetivos: primeiro, pôr em xeque a presidente Dilma Rousseff (PT), que se recusa a fazer uma autocrítica em relação à política econômica, cujo fracasso é apontado, pelos agentes econômicos, como de responsabilidade dela; segundo, obrigar a candidata do PSB, Marina Silva, a ir além da proposta de adoção do famoso tripé de estabilização da economia (superavit fiscal, câmbio flutuante e centro da meta de inflação).

“Quando eu anuncio que, se vencer as eleições, o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga será o meu ministro da Fazenda, estou sinalizando de forma muito clara que temos quadros qualificados e que a nossa proposta não é improvisada. Ela é consistente e é a partir da boa condução da economia que nós, brasileiros, vamos ver o Brasil voltar a crescer de forma sustentável e gerando mais bem-estar para todos”, diz Aécio.

Transparência fiscal, previsibilidade e respeito aos contratos, na avaliação dos tucanos, são temas que unificam o mundo da produção nas críticas ao governo Dilma. Mas Aécio também dispara contra Marina: “O Brasil não é para amadores. A complexidade dos problemas que nós temos pela frente demanda experiência e quadros”.

“Desconstrução”


A entrada da ex-senadora acriana na disputa mudou radicalmente o cenário eleitoral. Na medida em que se revelou forte candidata à Presidência, Marina passou a ser um alvo fixo para os adversários, que apontam os seus pontos fracos. Apoiada por uma coligação de pequenos partidos, Marina é acusada de inexperiência administrativa.

A candidata do PSB desbancou a presidente Dilma Rousseff como franca favorita na disputa presidencial, mas seu projeto de poder ainda é ambíguo e frágil, quando nada porque está sendo elaborado em pleno voo. Os adversários a acusam de querer governar o país com um time de “sonháticos”.

São notórias as contradições de Marina e sua Rede com os demais integrantes da coligação que a apoia, inclusive o PSB, que se considera um mero “partido hospedeiro”. A presidente Dilma Rousseff e o tucano Aécio Neves tentam desconstruir a imagem de Marina a partir daí.

Os adversários ainda não sabem muito bem como farão isso, pois foram surpreendidos por uma candidata que surgiu de última hora devido a uma fatalidade. Até a morte trágica do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, a disputa eleitoral estava polarizada entre petistas e tucanos. O fenômeno se repete há cinco eleições, desde 1994.

Ao contrário de Dilma e de Aécio, que se digladiavam diariamente há mais de um ano, a candidata do PSB combatia à sombra, como mera coadjuvante na disputa presidencial, sem a imprensa em seu encalço, desde quando o registro da Rede foi negado. Agora, tudo mudou: terá a vida virada pelo avesso, com o passado vasculhado pelos adversários e os velhos desafetos regionais protagonizando ataques à retaguarda.

O debate


Um amigo fez uma pesquisa no local de trabalho com 10 colegas sobre o debate entre os candidatos a presidente da República: nenhum deles o havia assistido. Tem sentido: a Band registrou cinco pontos, o que daria meio colega de firma. No mesmo horário, a Globo registrou 13 pontos; o SBT, seis; e a Record, cinco.

Entre os formadores de opinião, porém, o evento foi um sucesso total. Varou a madrugada a polêmica sobre a atuação dos candidatos no Twitter (121 mil tuitadas) e no Facebook (5,1 milhões de curtidas, comentários e postagens). Petistas, tucanos e marineiros foram à luta nas redes, cada qual com uma avaliação mais favorável ao desempenho de seus candidatos. Entraram também em campo as equipes que operam a campanha na internet, profissionalmente, com ampla vantagem para o esquema petista. Dilma ganhou de goleada.

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

A "desconstrução" de Marina

Favorita nas pesquisas de segundo turno para a Presidência da República, com larga vantagem, Marina Silva (PSB) vai passar por um corredor polonês até outubro.
Ontem, foi para o pelourinho no Jornal Nacional da TV Globo, tendo que responder pelas trapalhadas dos donos do jatinho usado pela campanha de Eduardo Campos, que caiu em Santos e matou o ex-governador de Pernambuco.
Enfrentou o suplício com galhardia, embora seja forçar muito a barra responsabilizá-la pelo caso. O fato de ter perdido as eleições de 2010 no Acre também foi lembrado na entrevista.
Saiu-se bem bem mais uma vez. A frase "ninguém é profeta na sua própria terra", porém, não foi das mais felizes. Não será fácil a vida de Marina daqui por diante.

Mudança, que mudança?


Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 27/08/2014

 Nada justifica, num campo de batalha, atirar para o lado errado. Ao centrar o fogo no tucano Aécio Neves nas primeiras semanas do horário eleitoral, talvez a campanha de Dilma tenha catapultado Marina Silva, que tem menos tempo de televisão


A grande charada da eleição para a Presidência da República é acertar o conceito de mudança desejada pela maioria da sociedade. Desde junho do ano passado, esse sentimento gravita em torno da casa dos 70% dos eleitores. Os jovens que foram às ruas naquela ocasião expressaram esse desejo, que foi sufocado em razão da violência de grupos radicais de manifestantes e da repressão policial.
Estava adormecido, principalmente após a Copa do Mundo, até ser catalisado nas eleições pelo trágico acidente que afastou da disputa sucessória o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos. Marina Silva (PSB), por gravidade, absorveu 29% desses votos; mesmo que já estejam consolidados, outros 41% desses eleitores estão em disputa.

A presidente Dilma Rousseff (PT), que pleiteia a reeleição, persegue esses votos e faz malabarismos para convencer os eleitores de que um novo mandato seria de mudanças. Aécio Neves (PSDB) responsabiliza o governo pela estagnação do país e garante ter equipe de governo e apoio político para viabilizar as mudanças, ao contrário de Marina Silva e sua Rede. 

Nós contra eles

Como mudar sem jogar a criança fora com a água da bacia? É mais ou menos disso que se trata, para o eleitor comum. O bom senso, porém, não tem favorecido os governistas. Dilma era favorita, mas não conseguiu convencer a maioria dos eleitores de que é possível mudar o seu próprio governo. De certa forma, o oba-oba petista sinaliza o contrário. 

Talvez o grande equívoco da campanha de Dilma Rousseff tenha sido apostar no confronto de indicadores dos governos Lula (PT) e Fernando Henrique (PSB), uma polarização que remete ao passado e não ao futuro. Ou seja, que obedece a uma lógica conservadora. É uma polarização que existe na cabeça dos militantes, mas não na memória da maioria dos eleitores. 

O PT errou de candidato, diria a turma do “Volta, Lula!”. Agora, isso não importa; nada justifica, num campo de batalha, atirar para o lado errado. Ao centrar o fogo no tucano Aécio Neves nas primeiras semanas do horário eleitoral, talvez a campanha de Dilma tenha catapultado Marina Silva, que tem menos tempo de televisão. 

Dois Brasis

O país que a presidente Dilma Rousseff mostrou na propaganda de tevê também não é o da conjuntura. A economia passou por uma recessão técnica no primeiro semestre. O PIB recuou 0,45% no segundo trimestre deste ano, após ter diminuído 0,12% nos primeiros três meses, sempre em relação ao trimestre imediatamente anterior, de acordo com o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

A última vez que a economia brasileira passou por uma recessão técnica foi no início de 2009, no auge da crise financeira mundial. Resultado: a projeção para o crescimento do PIB para este ano é de 0,7%, segundo o boletim Focus divulgado pelo Banco Central na segunda-feira.

Além disso, frustrou-se a previsão de que a taxa de juros (Selic) encerraria 2015 em 11,75% ao ano. Agora, a previsão voltou a ser de 12% ao ano. A expectativa para o IPCA deste ano também passou de 6,25% para 6,27%. A projeção para o ano que vem aumentou de 6,25% para 6,28%. 

Outra bandeira de Dilma na eleição está ameaçada: o emprego. A Volkswagen deu férias coletivas de 10 dias para funcionários da unidade de Taubaté, que emprega cerca de 4.500 trabalhadores. A General Motors do Brasil pode suspender temporariamente o contrato de cerca de 900 funcionários.

Com 1,2 mil trabalhadores em lay-off (suspensão de contratos de trabalho) desde julho, a Mercedes-Benz negocia com o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC medidas para reduzir a tabela de salários e o quadro de pessoal na fábrica de São Bernardo do Campo. A fábrica de caminhões e ônibus emprega 10,5 mil funcionários. Ou seja, a palavra de ordem no bastião do PT é “apertar o cinto”.

terça-feira, 26 de agosto de 2014

Marx e Engels para marqueteiros (rsrs)


"São os homens que desenvolvem a sua produção material e o seu intercâmbio material que, ao mudarem essa sua realidade, mudam também o seu pensamento e os produtos do seu pensamento. Não é a consciência  que determina a vida, é a vida que determina a consciência."

MARX, ENGELS, 1993

 "Os homens fazem sua própria História, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstância de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como pesadelo o cérebro dos vivos."

MARX, 1997

Perdida no espaço

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 26/08/2014

 Dilma Rousseff passa recibo de que Marina Silva a incomoda, e muito, embora o programa eleitoral da petista na tevê tenha sido destinado a atacar o tucano Aécio Neves e o governo de Fernando Henrique Cardoso

Desde a morte trágica do ex-governador Eduardo Campos (PSB) e sua substituição pela ex-senadora Marina Silva (PSB), a presidente Dilma Rousseff (PT), candidata à reeleição, está em órbita. Precisa pôr os pés no chão, rapidamente, mas corre o risco de ficar perdida no espaço. É na volta à atmosfera terrestre que mora o perigo.

Nos voos espaciais, uma nave gira ao redor da Terra a 26 mil km/h. Na hora da reentrada, freia para mudar a trajetória em relação à órbita e cair devagar. O sucesso da manobra depende da altitude, da posição e, principalmente, do ângulo em relação à Terra. É uma situação de vida ou morte: se for maior que 3 graus, a espaçonave cai em alta velocidade e pega fogo.

 A maioria das espaçonaves entra com o bico para a frente, mas a candidatura de Dilma Rousseff, com a coalizão de partidos governistas, é semelhante a um ônibus especial: tem que entrar de barriga, para aumentar a força de atrito e diminuir a velocidade. É uma operação que faz subir a temperatura e necessita de revestimento especial para a tripulação não ser carbonizada. As condições climáticas são outro problema: qualquer borrasca pode ser fatal.

A campanha à reeleição de Dilma foi minuciosamente planejada para operar num cenário idealizado, no qual a relação entre tempo político — o passado versus o presente — e espaço social — os pobres contra os ricos — obedecia a lógica fácil do “nós contra eles”. Deu tudo errado: a vida real já não permite essa simplificação maniqueísta.


É por isso que o ônibus espacial governista corre risco de ficar perdido na volta à terra firme, ricocheteando na atmosfera, como uma pedra chata que foi atirada ao lago. Como a água, a atmosfera é um fluido gasoso, tal qual o ambiente político que emergiu após o desastre aéreo que tirou Eduardo Campos da disputa.

O debate

 
Assim, o que parecia líquido e certo para os governistas se esvaneceu no ar. Pesquisas dirão nesta semana qual foi o impacto real da entrada em cena de Marina no processo eleitoral, considerando-se a primeira semana de horário eleitoral gratuito. A candidata do PSB passou por uma crise no partido, que ainda está digerindo a troca de candidatos. As eleições ganharam mais emoção e, também, uma discussão de conteúdo nova.

 Hoje teremos uma mostra da complexidade deste novo cenário, com a divulgação das primeiras pesquisas. Vamos ver também os potenciais de desconstrução de imagens e afirmação de identidades dos candidatos no debate da TV Bandeirantes, no qual, pela primeira vez, estarão frente a frente Dilma, Aécio, Marina e Pastor Everaldo (PSC).

Desde o domingo, Dilma Rousseff passa recibo de que Marina Silva a incomoda, e muito, embora o programa eleitoral da petista na tevê tenha sido destinado a atacar o tucano Aécio Neves e o governo de Fernando Henrique Cardoso. Sem muito o que mostrar diante da estagnação da economia, essa era a muleta para Dilma alavancar a candidatura nos indicadores do governo Lula. A estratégia vinha dando resultados enquanto a eleição estava polarizada. Agora, foi para o espaço. 

A equipe de campanha governista está como os tripulantes de uma espaçonave que tentam contato com o centro de controle de voo para saber como e quando proceder para voltar à Terra. Tanto Marina Silva quanto Aécio Neves focam os discursos nos maus resultados da administração de Dilma, cuja imagem de gerentona do PAC está sendo desconstruída e precisaria ser reforçada, mas não tem resultados econômicos e administrativos suficientes para isso.

Além disso, o sistema de alianças construído a partir do “presidencialismo de coalizão” neutraliza o discurso de mudança da presidente da República. É um sistema de forças essencialmente conservador, no qual o PT não tem força eleitoral suficiente para romper a inércia, quando nada por causa dos desgaste sofridos com o processo do mensalão e outros escândalos, o mais recente, envolvendo a Petrobras, um ícone nacional. Ou seja, a campanha de Dilma precisa fazer uma arriscada e dramática mudança de curso.

domingo, 24 de agosto de 2014

Aves não dão leite

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 24/08/2014

 A grande oposição unificou o discurso contra o voluntarismo e o intervencionismo do governo na economia. Há, porém, contradições profundas entre Aécio e Marina.

Velho professor da Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense, o economista pernambucano Aírton Albuquerque costumava ilustrar suas aulas para os calouros com uma provocação. Dizia que a economia era como as aves: poderiam cantar, falar, nadar, lutar e até voar, mas jamais dariam leite. Ou seja, haveria mais de uma maneira de resolver os problemas da sociedade, mas todas teriam que respeitar as limitações objetivas de sua base produtiva.
É mais ou menos essa a discussão que começa a se estabelecer como um divisor de águas entre a presidente Dilma Rousseff, que disputa a reeleição, e os candidatos de oposição, Aécio Neves (PSDB) e, agora, Marina Silva (PSB). O pano de fundo da discussão é o fracasso da estratégia econômica do governo para a retomada do crescimento.

Dilma esgrime o regime de pleno emprego e os programas de transferência de renda como trunfos de sua gestão, com o argumento de que preferiu não sacrificar o povo ao enfrentar a crise mundial. Insiste nas políticas de desoneração fiscal com chapéu alheio (quebrou estados e municípios) e nas medidas de estímulo ao crédito popular (endividou as famílias).

Isso, entretanto, reforça as preocupações de empresários e investidores com o caráter errático e a falta de consistência da atual política econômica. Para sustentar essa retórica, Dilma recorre a artifícios que minam a sua credibilidade com os agentes econômicos, como acontece com as contas do Tesouro.
No momento, o Ministério da Fazenda viola as regras do jogo do sistema financeiro, ao se socorrer de forma mascarada à Caixa Econômica Federal, para pagar o Bolsa Família, o seguro desemprego e os abonos salariais, e ao Banco do Brasil, para bancar os subsídios agrícolas, que estão sendo questionados até pelo Banco Central.

Blindagem

Essas práticas vêm sendo duramente criticadas pelo candidato do PSDB, senador Aécio Neves, desde as comemorações dos 20 anos do Plano Real. O posicionamento do tucano sobre a política econômica está mais em sintonia com os grandes grupos empresariais que apoiavam o governo e, agora, buscam uma alternativa à política econômica atual.

Houve também um reposicionamento da candidata do PSB, Marina Silva, em relação aos grandes temas econômicos. Defensora da chamada nova economia e líder ambientalista mundial, a ex-senadora sofre duros ataques dos governistas, que a acusam de ser contra o desenvolvimento, opinião compartilhada por setores do empresariado, principalmente do agronegócio.

Marina surpreendeu ao defender o famoso tripé da estabilização econômica — meta de inflação, câmbio flutuante e superavit fiscal —- e jogar a toalha quanto à blindagem da política monetária, ao admitir a autonomia formal do Banco Central (BC).

Com isso, a grande oposição unificou o discurso contra o voluntarismo e o intervencionismo do governo na economia. Há, porém, contradições profundas entre Aécio e Marina. Não bastam o saneamento das contas públicas e a blindagem da política monetária, na avaliação dos agentes econômicos. Uma política econômica exitosa, que enfrente os problemas de infraestrutura e da produtividade, pressupõe segurança jurídica e sustentação política.

É aí que rondam as suspeitas contra Marina Silva, que já é considerada uma alternativa de poder. Os agentes econômicos têm em relação à candidata do PSB mais desconfianças do que aquelas que haviam sinalizado em relação ao ex-governador Eduardo Campos, de quem ela era a vice, antes de ele ser afastado da disputa por sua morte trágica.

Lado a lado

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está convencido de que Dilma Rousseff corre sério risco de perder as eleições se for para o segundo turno, seja contra Aécio Neves, seja contra Marina Silva. Por isso, pôs o pé na estrada para gravar os programas eleitorais de Dilma ao lado da petista.



quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Marina dispara, apesar do barraco no PSB

A campanha de Marina Silva está paralisada por causa de suas divergências com o PSB, cuja cúpula parece se sentir desconfortável com a confirmação de sua candidatura. O secretário-geral do PSB, Carlos Siqueira, que era o todo-poderoso na campanha de Eduardo Campos, armou um barraco e deixou a campanha: "Marina não representa o legado de Eduardo Campos, se comportou muito mal comigo e não aceito isso", disparou.

Aliado de Roberto Amaral, presidente do PSB, Siqueira sintetizou o que pensa o grupo que controla a máquina partidária: "como hospedeira, que é o que ela é, tem que se respeitar a instituição e não querer mandar na instituição. Ela que vá mandar na Rede dela, não no PSB. No PSB, mandamos nós".

Pra aumentar a confusão, um dos partidos da coligação deixou a legenda porque não foi procurado por Marina.  "A gente não foi ouvido em nada", justificou Luciano Brivar, do nanico PSL.

Nada disso, porém, atrapalha a vida de Marina. As pesquisas por telefone do PT e do PSDB estão deixando petistas e tucanos à beira de um ataque de nervos. Marina disparou entre os dias 16 e 19 de agosto, na auge da comoção pela morte de Eduardo Campos; Aécio e Dilma caíram. A candidata do PSB é franca favorita nas simulações de segundo turno. 



A anticampanha

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 21/08/2014

Qualquer outro presidente da Petrobras já teria sido demitido do cargo para estancar a crise política na qual a empresa mergulhou, mas Dilma e Graça são parceiras de longa data, duronas e mandonas. 


Um dos problemas de qualquer candidato que pleiteia a reeleição é administrar a agenda negativa do próprio governo. Esse é o calcanhar de Aquiles que pode apeá-lo do poder. No maioria dos casos, trata-se de blindar os pontos fracos e trombetear as ações bem avaliadas nas pesquisas de intenção de voto. No caso da presidente Dilma Rousseff, há dois “issues” dos quais ela não consegue se desvencilhar: os petistas enrolados com malfeitos e os escândalos da Petrobras. Ontem, foi mais um dia em que ambos roubaram a cena.

Por unanimidade, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados aprovou o pedido de cassação do mandato do ex-petista André Vargas (sem partido-PR). O deputado Júlio Delgado (PSB-MG), relator do caso, recomendou a punição do parlamentar, que é investigado por manter relações com o doleiro Alberto Youssef. Ele suspeito de intermediar contratos com o Ministério da Saúde em favor do laboratório Labogen, de Youssef. O doleiro foi preso em março pela Polícia Federal, na Operação Lava-Jato, por participação em esquema de lavagem de dinheiro.

Vargas é um casca-grossa petista, ocupava a vice-presidência da Câmara quando o escândalo estourou. Muito influente na bancada do partido, era um dos líderes do movimento “Volta, Lula!”. Havia se notabilizado por afrontar o então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro aposentado Joaquim Barbosa, durante solenidade na Câmara, na qual posou de punho cerrado ao lado do magistrado, em solidariedade aos petistas condenados no processo do mensalão.

Ao contrário de outros parlamentares alvejados por denúncias, que preferiram renunciar ao mandato, Vargas manobra nos bastidores da Câmara para evitar uma cassação. Não renuncia porque teme ter a prisão decretada. Considera-se abandonado pela cúpula do PT, que o obrigou a se desfiliar da legenda.

Cada vez que Vargas põe os pés na Câmara, joga mais lama na imagem do PT, cujo desgaste já foi grande no caso do julgamento do mensalão, o que acaba na conta da presidente Dilma. Com a decisão de ontem, o parlamentar pode recorrer à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), com efeitos suspensivos. O ex-deputado alega que não quebrou o decoro e denuncia a Comissão de Ética. Segundo ele, o processo foi conduzido com açodamento e politização excessiva. Ou seja, Vargas continuará produzindo notícias negativas.

Petrobras
Apesar da maciça propaganda nos meios de comunicação, a Petrobras é outro problema para Dilma Rousseff, que pretende transformar a exploração do pré-sal numa das bandeira de seu novo mandato. A compra superfaturada da refinaria de Pasadena, no Texas (EUA), aprovada quando Dilma era presidente do Conselho de Administração da empresa, porém, continua sendo uma dor de cabeça para a campanha da presidente da República.

O Tribunal de Contas da União (TCU) adiou novamente a análise sobre o bloqueio dos bens da presidente da Petrobras, Graça Foster, amiga do peito de Dilma. O ministro José Jorge, entretanto, decidiu manter o voto que pede a indisponibilidade dos bens de Graça Foster. Retirou o processo da pauta porque, segundo o site do jornal O Globo, ela e o ex-diretor da Área Internacional da empresa Nestor Cerveró doaram imóveis a parentes após o escândalo sobre a compra da refinaria de Pasadena, no Texas (EUA), para evitar o bloqueio judicial desses bens. No mês passado, o TCU determinou a devolução de US$ 792,3 milhões aos cofres da Petrobras pelos prejuízos causados ao patrimônio da empresa.

Para José Jorge, o fato somente confirma a necessidade de aprovar a indisponibilidade dos bens. “Se isso for verdade, e dependendo da sua extensão, configura uma burla ao processo de apuração da irregularidade. É gravíssimo”, disse. Qualquer outro presidente da Petrobras já teria sido demitido do cargo para estancar a crise política na qual a empresa mergulhou. Ao contrário, em situação inédita, o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, foi encarregado pela Presidência da República de defendê-la pessoalmente. Dilma e Graça são parceiras de longa data e têm personalidades semelhantes: são duronas e mandonas.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

A herança em disputa


Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 20/08/2014

O deputado Beto Albuquerque (RS) será o vice, depois de complicadas negociações no Recife. O político gaúcho enfrentou uma queda de braço com um mineiro e três pernambucano para entrar na chapa

Marina Silva tem luz própria. A rigor, precisa mais da legenda do PSB do que dos votos de Eduardo Campos, que herdou por gravidade, para se projetar como alternativa de poder. As pesquisas mostram isso. O problema é que o ex-governador de Pernambuco não tem um herdeiro político — vários caciques do PSB disputam a liderança da legenda e se digladiam. Isso ameaça travar a campanha de Marina na largada.

Ontem, no horário eleitoral, o que se viu foram os adversários de Marina se posicionando, cada qual a seu modo, para minimizar os estragos que a comoção causada pela morte precoce do líder pernambucano poderia provocar nas respectivas candidaturas. As homenagens a Eduardo Campos deram o tom dos programas. O tempo de Marina Silva, protagonizado por Eduardo Campos, porém, serviu para cacifar o PSB nas negociações com a aliada. A candidata pegou apenas uma carona.

Ponto para o candidato do PSDB, Aécio Neves, com 4 minutos e 35 segundos de tempo de televisão, que usou parte do programa da coligação Muda Brasil para lembrar Eduardo Campos. Ambos se conheceram na campanha das “Diretas Já!”, em companhia dos avós Tancredo Neves e Miguel Arraes, que governaram Minas Gerais e Pernambuco, respectivamente. O tucano destacou a convergência de propósitos entre ambos.

Com 11 minutos e 24 segundos, Dilma fez a mesma coisa, além de ressaltar a queda na taxa de desemprego e os resultados de programas sociais. A estrela de seu programa foi o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que homenageou Eduardo Campos. Além de falar que tinha uma relação de “pai e filho” com o ex-governador de Pernambuco, Lula pongou uma de suas últimas frases de efeito: “Não podemos desistir do Brasil”.

Marina Silva, até ontem, não tinha um companheiro de chapa nem fora oficializada como candidata a presidente da República porque a cúpula do PSB não se entendia, o que só deve ocorrer hoje. O deputado Beto Albuquerque (RS) será o vice, depois de complicadas negociações no Recife. O político gaúcho enfrentou uma queda de braço com o mineiro Júlio Delgado, outro nome que era aventado para a chapa. 

Em Pernambuco, o deputado federal Danilo Cabral, o ex-deputado Maurício Rands e o ex-ministro Fernando Bezerra Coelho, candidato ao Senado, também disputavam a vice. No fim da tarde, o prefeito do Recife, Geraldo Julio, o candidato Paulo Câmara e a viúva Renata Campos, reunidos com Roberto Amaral e o secretário-geral Carlos Siqueira, bateram o martelo a favor de Albuquerque. 

O impasse em Pernambuco motivou o cancelamento da reunião da cúpula do partido que estava marcada para ontem, em Brasília. A confusão no PSB preocupa os aliados. O presidente em exercício da legenda, Roberto Amaral, se digladia internamente com o deputado Márcio França, vice na chapa do governador Geraldo Alckmin (PSDB), palanque no qual, segundo o ex-deputado Walter Feldman, porta-voz da Rede nas articulações políticas, Marina não pretende subir. 

Se está assim em São Paulo, onde o tucano é franco-favorito a vencer as eleições no primeiro turno, o que acontece entre o PSB e a Rede nos demais estados onde têm palanques separados pode ser ainda pior. Como no Rio de Janeiro, onde Marina também rejeita o palanque de Lindbergh Farias (PT) com Romário (PSB). Uma das exigências da cúpula do PSB é de que os acordos regionais fechados por Eduardo Campos sejam respeitados. É pouco provável. 

Saúde vai mal
Apesar do entusiasmo da presidente Dilma Rousseff com o programa Mais Médicos, pesquisa do Instituto Datafolha feita a pedido do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Associação Paulista de Medicina (APM) mostra resultados muitos negativos para o governo. Filas de espera, falta de acesso aos serviços públicos e má gestão de recursos são os principais problemas apontados. A saúde é apontada como a área de maior importância para 87% dos brasileiros; 57% consideram uma prioridade para o governo federal. 

Mais da metade dos entrevistados relataram ser difícil ou muito difícil cirurgias, atendimento domiciliar e procedimentos específicos, como hemodiálise e quimioterapia. Em relação à qualidade dos serviços, 70% dos que buscaram o SUS disseram estar insatisfeitos e atribuíram avaliações que variam de regular a péssimo. Urgências, emergências e pronto-socorros são amplamente reprovados.

terça-feira, 19 de agosto de 2014

O novo cenário

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 19/08/2014

 O realinhamento de forças políticas no processo eleitoral sempre tende a ser mais acentuado quando o candidato favorito é ultrapassado por um dos concorrentes

O dado mais importante da pesquisa Datafolha divulgada ontem não foi o empate técnico entre Marina Silva (PSB) e Aécio Neves (PSDB), com ligeira vantagem de um ponto para a primeira, mas a perda de favoritismo da presidente Dilma Rousseff, que ficou atrás da ex-vice de Eduardo Campos na simulação de segundo turno por uma diferença de quatro pontos, ou seja, no limite da margem de erro.

Em tese, esse resultado pode desencadear um novo alinhamento de forças já no primeiro turno. A ameaça de “cristianização” de Dilma Rousseff sempre existiu entre os aliados e partidários do próprio PT, por diversos motivos. Os principais são o péssimo relacionamento com os aliados, o alijamento de lideranças importantes do PT do governo e o excessivo intervencionismo econômico.

O movimento “Volta, Lula!” era uma expressão dessas insatisfações, mas foi contido pelo próprio ex-presidente da República, que rechaçou a possibilidade de concorrer ao Palácio do Planalto no lugar de Dilma. Ainda mais porque a criatura ganhou vida própria e bateu o pé contra o retorno do criador ao poder.

Toda vez que a possibilidade de segundo turno aparece nas pesquisas, a expectativa de um novo mandato de Dilma no Palácio do Planalto, ao contrário do que seria natural, funciona como elemento desagregador de setores da própria base. Agora, a situação é mais delicada porque o Datafolha revelou a possibilidade de Dilma perder a eleição.

Voto útil
Eduardo Campos sempre apostou na “cristianização” de Dilma, pois há setores da base do governo e até mesmo do PT que prefeririam a eleição do socialista, e não a permanência da presidente da República no poder por mais quatro anos. Acreditava que, para chegar ao segundo turno, faria uma arrancada avassaladora, que implodiria a base governista.

O mesmo raciocínio vale para o tucano Aécio Neves, que também tem grande trânsito em setores da base do governo. Com a vantagem de Marina , o fenômeno pode ocorrer ainda no primeiro turno, a favor dele, acredita.

O realinhamento de forças políticas no processo eleitoral sempre tende a ser mais acentuado quando o candidato favorito é ultrapassado por um dos concorrentes, ainda mais a sete semanas da eleição. Antes mesmo do segundo turno, nesses casos, ocorre um fenômeno semelhante ao “voto útil”.

Pesquisas
Esses cenários, porém, merecem o devido desconto em razão de a pesquisa Datafolha ter sido realizada no calor dos acontecimentos trágicos que afastaram da disputa o ex-governador de Pernambuco. Muitos analistas relativizam os resultados da pesquisa do Datafolha nos últimos dias 14 e 15.

Houve a superexposição de Marina na mídia, beneficiada pela forte comoção causada pela morte de Eduardo Campos. Dilma, principalmente, e Aécio terão mais tempo no horário eleitoral, o que deixa a candidata do PSB em desvantagem. Também farão diferença as estruturas de poder e os recursos mobilizados por cada candidato.

O PT, porém, sentiu o golpe. Lula ainda tentou remover a candidatura de Marina Silva, mas o tiro saiu pela culatra, principalmente por causa da forte reação de Ana Arraes, Renata Campos e Antônio Campos, mãe, esposa e irmão do ex-governador pernambucano, respectivamente.

A reação de Aécio Neves foi mais cautelosa. A entrada de Marina Silva foi vista pelo candidato do PSDB como um fato positivo porque garante o segundo turno da eleição. O novo cenário eleitoral, porém, ainda está sendo avaliado. Talvez os tucanos tenham que mudar de estratégia para garantir a presença do ex-governador de Minas no segundo turno. 

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Dilma enrola o Bonner

Na entrevista ao Jornal Nacional, a presidente Dilma Rousseff enrolou o apresentador Willian Bonner, ao espichar as respostas sobre corrupção no governo e o envolvimento do PT com o mensalão. Fez um oba-oba com o programa Mais Médicos e defendeu-se das críticas à economia falando da geração de emprego e do controle da inflação. Impôs a autoridade do cargo e se deu bem.

Marina passa Aécio no primeiro turno e vence Dilma no segundo

Pesquisa Datafolha publicada hoje mostra virada espetacular de Marina Silva na disputa presidencial. Ela tem 21% das intenções de votos, ultrapassando o senador Aécio Neves (PSDB), que tem 20% dos votos (pela margem de erro de dois pontos percentuais, é um empate técnico). A presidente Dilma mantém a liderança, com 30% de preferência.

Os demais candidatos, somados, têm 5%: Pastor Everaldo (PSC), 3%; Zé Maria (PSTU) e Eduardo Jorge (PV) 1% cada. Luciana Genro (PSOL), Rui Costa Pimenta (PCO), Eymael (PSDC), Levy Fidelis (PRTB) e Mauro Iasi (PCB) não pontuaram.

A eleição será decidida no segundo turno. Na simulação contra Dilma, Marina tem 47% dos votos, contra 43% da presidente (no limite do empate técnico). Na disputa entre Dilma e Aécio, a petista venceria o tucano por 47% a 39%. No levantamento de julho, a presidente teria 44%, e o senador 40% (empate técnico). Sem Marina na disputa, a presidente seria reeleita no primeiro turno.
Dilma tem 34% de rejeição; Aécio Neves, 18%; e Marina, 11%. 

De acordo com o Datafolha, a avaliação do governo Dilma melhorou em relação à pesquisa de um mês atrás. O índice de ótimo/bom da administração passou de 32% para 38%, enquanto o de ruim/péssimo recuou de 29% para 23%. O Datafolha ouviu 2843 pessoas, em 176 municípios, nos dias 14 e 15 de agosto.

domingo, 17 de agosto de 2014

Nasce o mito

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 17/08/2014
Não está dado a priori que Marina Silva será herdeira de toda a comoção gerada pela morte de Eduardo Campos, embora se beneficie por ser a sua companheira de chapa


É imprevisível o impacto da morte trágica de Eduardo Campos (PSB) na política nacional. Seu corpo será enterrado hoje à tarde, no Recife, em cerimônia para a qual estão sendo esperadas as principais lideranças políticas do país, entre elas a presidente Dilma Rousseff (PT), candidata à reeleição, e o senador Aécio Neves (PSDB), principal candidato de oposição, contra quem o ex-governador pernambucano concorria. Marina Silva assumirá o lugar de Campos como candidata do PSB em circunstância de grande comoção nacional.

 O ex-governador de Pernambuco será sepultado com o caixão fechado, pois seus restos mortais foram carbonizados. O povo não verá o seu corpo. As últimas imagens do líder político pernambucano para a opinião pública serão aquelas gravadas durante a entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo. Campos era desconhecido para 42% dos eleitores; depois de morto, tornou-se símbolo da necessidade de renovação política do país.

Sebastianismo

Se depender da nossa tradição ibérica, por causa do velho “sebastianismo”, sua herança política não pode ser desprezada. D. Sebastião nasceu em Lisboa a 20 de janeiro de 1554 e era filho do príncipe D. João e de D. Joana de Áustria. Faleceu a 4 de agosto de 1578 na batalha de Alcácer Quibir, no norte de África. Mas seu corpo nunca foi encontrado.

Com sua morte, Portugal foi anexado pela Espanha entre  1580 e 1640, juntamente com o Brasil, passando por período muito difícil. Nasceu então uma versão particular de messianismo, de influência judaica: toda opressão, todo sofrimento, toda miséria, toda crise será vencida com o reaparecimento de D. Sebastião.

A concepção religiosa do messianismo acredita na vinda ou no retorno de um enviado divino, o messias; um redentor, com capacidade para mudar a ordem das coisas e trazer paz, justiça e felicidade. É um movimento que traduz inconformidade com a situação política vigente e uma expectativa de salvação, ainda que miraculosa, através da ressurreição de um morto ilustre.

O mito no Brasil surgiu na narrativa da batalha que expulsou os franceses na fundação do Rio de Janeiro, em 20 de janeiro de 1567, e reapareceu na Guerra de Canudos (1896-1897), no sertão da Bahia, entre os fanáticos de Antônio Conselheiro.

Dois movimentos sebastianistas trágicos ocorreram também em Pernambuco: o da Serra do Rodeador, no município de Bonito, em 1819-1820, e o da Serra Formosa, em São José do Belmonte, no período de 1836 a 1838. Foram violentos, com líderes fanáticos. No folclore nordestino, ainda hoje, D. Sebastião reaparece como touro encantado nas festas de bumba-meu-boi, nos meses de junho, julho e agosto.

Os votos
Mitos e lendas à parte, não está dado a priori que Marina Silva será herdeira de toda a comoção gerada pela morte de Eduardo Campos, embora se beneficie por ter sido a sua companheira de chapa. O mais provável é que recupere os próprios votos, que até agora não havia conseguido transferir para Eduardo Campos. Em fevereiro passado, Marina tinha cerca de 20% dos votos, mas vinha numa trajetória descendente.

Já a última pesquisa Datafolha, de 15 e 16 de julho, mostrou que, entre os 8% de eleitores com intenção de voto em Eduardo Campos (PSB) no primeiro turno, 55% votariam em Aécio Neves (PSDB) e 26% em Dilma Rousseff (PT), num eventual segundo turno entre o tucano e a petista.

Outros 15% votariam em branco, nulo ou em nenhum dos dois e 4% não souberam responder à pergunta. Ontem, a cúpula do PSB vazou informações de que uma pesquisa feita por telefone, após a morte de Campos, teria registrado crescimento espetacular de Marina. A conferir nas próximas pesquisas.

A única certeza é de que há um quadro eleitoral novo, no qual se consolida a realização de segundo turno para decidir quem será o próximo presidente da República. Por hora, há dois projetos de poder claramente delineados: a continuidade do governo Dilma, de um lado; e a volta dos tucanos ao Palácio do Planalto, com Aécio Neves, do outro.

A chamada “terceira via”, com a morte de Eduardo Campos (PSB), ainda é uma incógnita como projeto de poder, não importam as pesquisas. Somente deixará de ser quando Marina Silva, que cultiva certo messianismo, disser o que pretende fazer para desenvolver o país e melhorar a vida do povo, caso seja eleita presidente da República.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Marina é candidata; PSB negocia a vice



A cúpula do PSB já decidiu que Marina será candidata no lugar de Eduardo Campos, mas não sabe ainda como comporá a chapa. Disputam a vice os deputados Beto Albuquerque (RS) e Júlio Delgado (MG). Supostamente, a viúva do ex-governador de Pernambuco, Renata Campos, seria o nome de preferência de Marina, mas essa solução é pouco provável.

A reunião da coligação PSB, PPS, PRB, PHS, PPL e PSL para recompor a chapa está marcada para quarta-feira, mas pode ser antecipada. Amanhã, no Recife, os principais líderes da coligação estarão reunidos no velório de Eduardo Campos. Pode ser que o nome do vice se consolide entre eles ainda neste fim de semana.

Análise da notícia: Ser ou não ser, eis a questão


Enquanto a ex-senadora acriana se fecha em luto e evita qualquer entendimento político sobre o que fazer diante da nova situação, a cúpula do PSB está em dúvida sobre dar prosseguimento ao projeto oposicionista de Campos ou fazer um acordo com o PT para voltar ao poder

Por Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense-15/08/2014

Os versos do maior dramaturgo inglês, William Shakespeare, na tragédia de Hamlet, relatam a dor e o sofrimento do príncipe da Dinamarca quando descobre as traições do próprio tio para lhe tomar o poder. O contexto é diferente, mas vem a calhar no caso de Marina Silva, no dia seguinte à tragédia que tirou a vida do candidato do PSB a presidente da República, Eduardo Campos.

Enquanto a ex-senadora acriana se fecha em luto e evita qualquer entendimento político sobre o que fazer diante da nova situação, a cúpula do PSB está em dúvida sobre dar prosseguimento ao projeto oposicionista de Campos ou fazer um acordo com o PT para voltar ao poder, na suposição de que isso garantiria a vitória de Dilma Rousseff já no primeiro turno. A nota enigmática do PSB divulgada ontem reflete essa contradição. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assedia, nos bastidores, os líderes da legenda mais próximos a ele.

A candidatura de Eduardo Campos nunca foi pacífica no PSB. Sempre houve setores do partido ligados ao vice-presidente da legenda, Roberto Amaral, que defenderam a preservação da aliança com o ex-presidente Lula. Somente não foram bem-sucedidos porque Campos usou o próprio carisma e controle sobre a máquina partidária para consolidar a própria candidatura, que enfrentou resistências também de alguns governadores. Amaral agora assumiu o comando da legenda.

Campos só manteve sua candidatura porque recebeu apoios inimagináveis até então, como a surpreendente filiação de Marina Silva ao PSB, depois que a Rede Sustentabilidade ficou sem legenda, oferecendo-se inclusive para compor a chapa na vice. Outra adesão importante foi a do PPS, cujo líder, deputado Roberto Freire (SP), também enfrentou dissidências para consumar a coligação, em vez de manter a aliança tradicional com o PSDB. Com isso, o ex-governador de Pernambuco viabilizou mais tempo de televisão e quebrou as resistências internas.

A aliança programática de Marina com o PSB, entretanto, nunca foi fácil. Em muitos estados a Rede tem atuação independente e apoia candidatos que estão fora das coligações do PSB, como é o caso de São Paulo, onde a legenda indicou o deputado Márcio França para vice do tucano Geraldo Alckmin, candidato à reeleição. A vice não viajou para Santos com Campos porque a agenda era com o governador paulista. Supõe-se que a candidatura a presidente de Marina muda o eixo da aliança, que passaria a ser a Rede, o que deslocaria do centro da campanha quadros importantes do PSB, como o secretário-geral Carlos Siqueira.

Marina Silva seria a candidata natural ao lugar de Campos se os demais líderes da legenda não vivessem às turras com os integrantes da Rede. O que manteve a aliança apesar disso foi o bom relacionamento com o ex-governador de Pernambuco, mas, em muitos estados, a vice fechou acordos regionais que contrariavam seu companheiro de chapa. Marina precisa honrar as alianças e os compromissos assumidos pelo candidato morto para manter a candidatura. Nada impede, porém, que desista de ser candidata — como fez ao recusar o convite de Roberto Freire para se filiar ao PPS — se achar que as condições para isso não valem a pena. A propósito, o excesso de exigências da cúpula do PSB pode ter exatamente esse objetivo.

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Que horror!

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 14/08/2014

Quando falava da campanha, Eduardo Campos revelava convicção de que venceria as eleições. Julgava-se um predestinado a ser presidente da República.


O Brasil perdeu um de seus políticos mais promissores, o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, candidato a presidente da República do PSB, que ocupava o terceiro lugar nas pesquisas e tentava construir, com Marina Silva na vice, uma espécie de “terceira via” na política brasileira. Morreu num desastre de aviação em Santos, depois de uma tentativa de pouso do jatinho que o transportava no aeroporto de Guarujá. Ele havia embarcado com alguns assessores no Rio de Janeiro. Foi um horror: todos morreram carbonizados.

“Jantei com ele na véspera e conversamos ontem de manhã por celular; ele desligou na hora em que o avião decolou do Santos Dumont”, conta o amigo e assessor de imprensa Alon Feurweker, que também embarcou do Santos Dumont, mas com destino a Brasília, e somente soube do desastre quando desembarcou. Amigos aflitos e colegas ligavam para o jornalista porque corria o boato de que também estaria no avião. 

Quando embarcou, Campos estava muito animado com o próprio desempenho na televisão, principalmente depois da entrevista de 15 minutos ao Jornal Nacional, da TV Globo. Acreditava que, intensificando as viagens pelo país e tendo um bom desempenho na tevê, empolgaria os eleitores, cresceria nas pesquisas, iria para o segundo turno. Quando falava da campanha, Eduardo Campos revelava convicção de que venceria as eleições. Julgava-se um predestinado a ser presidente da República.

O neto do ex-governador Miguel Arraes que por duas vez governou Pernambuco era mesmo uma liderança política ascendente. Pretendia ir bem mais longe que o avô e resgatar a liderança política de seu estado, perdida desde a Confederação do Equador, em 1824, que reuniu também Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba. A província acabou perdendo grande parte de seu território (a antiga comarca do Rio São Francisco) para a província da Bahia. 

Vários líderes da rebelião, como frei Caneca, foram enforcados ou fuzilados, enquanto outros, como Cipriano Barata, acabaram presos. Abolicionistas e republicanos, ambos, porém, são reverenciados até hoje pelo povo pernambucano. 

Deram origem a uma linhagem de políticos “exaltados”, marca registrada da esquerda pernambucana desde os liberais da Revolução Praieira. Mesmo não tendo caráter essencialmente socialista, esse grupo político era claramente influenciado por socialistas utópicos do século 19, como Pierre–Joseph Proudhon, Robert Owen e Charles Fourier. 

É o segundo político pernambucano dessa estirpe  que perde a vida num desastre de avião. O primeiro foi Marcos Freire, ministro da Reforma Agrária do governo Sarney, que faleceu em 8 de setembro de 1987, num desastre no Pará. Ele viajara para tratar de assuntos do ministério e, poucos minutos após a decolagem, o jatinho que o conduzia explodiu no ar.

Campos era considerado um hábil articulador e foi excelente administrador de seu estado, deixando o governo com elevados índices de aprovação popular. Era simpático, bem-humorado, gostava de contar histórias e fazer imitações, que às vezes beiravam a perfeição, como nos casos do ex-presidente Lula e do vice-presidente de seu partido, Roberto Amaral. 

Economista, Campos modernizou o estado de Pernambuco, cuja produção industrial hoje chega a 20% do PIB. Ex-ministro da Ciência e Tecnologia do governo Lula, rompeu com a presidente Dilma Rousseff, sem entretanto atacar o ex-aliado petista. Na sua última entrevista, foi duro com a adversária, que concorre à reeleição: “O governo Dilma vai entregar o país pior do que recebeu”.

Marina

O candidato do PSB conseguiu chegar a uma plataforma comum com a vice, Marina Silva, com cujo discurso, inicialmente, tinha muitas contradições. Também administrou com sucesso suas diferenças históricas com o presidente do PPS, deputado Roberto Freire (SP), seu conterrâneo. 

A vice se solidarizou com a família de Campos e dos assessores e disse que, durante 10 meses de convivência intensa, aprendeu “a respeitá-lo, admirá-lo e a confiar nas suas atitudes e em seus ideais de vida”. Estava em São Paulo hoje, mas cumpria agenda pessoal na capital paulista. 

Marina não falou sobre uma possível substituição da candidatura. Pela legislação, poderá ser mantida na mesma posição na disputa ou se tornar a candidata do partido à Presidência, “por decisão da maioria absoluta dos órgãos executivos de direção dos partidos coligados”. 

PSB, PPS, PRB, PHS, PPL e PSL, que formam a coligação, sofrerão um ataque especulativo dos demais candidatos, mas a maioria deve substituir Campos por Marina e, provavelmente, escolher um novo vice entre os quadros históricos do PSB.


quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Pessimismo chapa-branca

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 13/08/2014

A economia está devagar quase parando. Há um cheiro de estelionato eleitoral no ar. É uma situação irreversível a curto prazo

Pura ironia. O maior pessimista sobre os rumos do país é o Banco Central, cujo Boletim Focus, que ausculta os humores do mercado, prevê que o Brasil deve crescer abaixo da média da última década, com inflação superior à meta de 4,5% e juros acima de 10% nos próximos quatro anos. Detalhe: esse cenário vem acompanhado da previsão de que o novo governo promoverá um tarifaço médio de 7% nos preços controlados (combustíveis, passagens e contas de luz) e elevará ainda mais os juros, de 11% para 12%, para controlar a inflação.

Como refutar os agentes econômicos que fazem previsões desfavoráveis ao governo com números como esses? Como fazer uma campanha de reeleição prometendo mundos e fundos no próximo mandato nesse cenário? Essa é a pergunta que os marqueteiros da presidente Dilma Rousseff terão que responder nos 12 minutos de rádio e televisão do programa eleitoral do PT, a partir do próximo dia 19.

Essas previsões são a síntese das projeções para a economia de cerca de 100 analistas de instituições do setor público e privado. Têm credibilidade muito maior do que a do ministro da Fazenda, Guido Mantega, cujas projeções, nos últimos anos, foram sempre mirabolantes em matéria de crescimento econômico. Há cerca de 12 anos — ou seja, desde o governo Lula — o Banco Central traça esses cenários quadrienais.

Há uma grande contradição entre o que diz a presidente Dilma Rousseff e o que se fala nos bastidores da área econômica do governo, onde já se admite que a meta de contenção dos gastos públicos deste ano não será cumprida. O governo faz ginástica na boca do caixa para mascarar as contas do Tesouro, a chamada contabilidade criativa, o que gera ainda mais pessimismo dos agentes econômicos.

A economia está devagar quase parando. Há um cheiro de estelionato eleitoral no ar. É uma situação irreversível a curto prazo, segundo o Banco Central admite nas entrelinhas das análises. Há 11 meses, as previsões de crescimento sofrem amputações sucessivas. O PIB previsto no Orçamento da União no início do ano era de 2,5%, caiu para 1,6% em maio e deve chegar a dezembro em 0,81%. O consolo, em relação à baixa atividade econômica, é a inflação, que deve ficar abaixo o teto de 6,5%. A meta de 4,5% virou miragem.

 Nem tudo são espinhos. A sorte é que a oferta de alimentos melhorou e apresenta um cenário positivo até o fim do ano. Gerou uma deflação por três meses seguidos no IGP-DI e no IGP-M, ambos da Fundação Getulio Vargas, e um índice de inflação de apenas 0,01% no IPCA de julho, que surpreendeu o mercado. Da mesma forma, o índice de variação de cesta básica do Dieese apontou uma deflação, em julho, em todas as capitais pesquisadas. Em Brasília, em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte, por exemplo, a queda foi de, respectivamente, 7,16%, 2,60%, 3,85% e 3,59%. Esse cenário estancou a queda da presidente Dilma Rousseff nas pesquisas, mas não pôs fim ao mau humor, principalmente da classe média.


Campanha

Ontem, em Anápolis (GO), a presidente Dilma Rousseff fez veemente defesa do transporte ferroviário como forma de reduzir custos de logística e aumentar a competitividade dos produtos nacionais. Ao visitar trecho da Ferrovia Norte-Sul, disse que o empreendimento funcionará como um “espinha de peixe”, integrando vários modais de transporte em uma região central para o tráfego de mercadorias.

A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) recomendou à Valec Engenharia o início dos testes no trecho entre Porto Nacional e Gurupi, ambos no Tocantins, com a substituição de dormentes de madeira e a reposição de peças roubadas. Ou seja, houve sucateamento desse trecho já concluído.

 A Ferrovia Norte-Sul teve início há 27 anos, no governo Sarney. Segundo Dilma, só a partir do governo Lula as obras começaram a avançar. Doze anos depois, portanto, a ferrovia ainda não ficou pronta. Já não dá pra culpar a oposição.

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Erros fatais...

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 12/08/2014

 Enquanto Dilma Rousseff joga fora a vassoura que chegou a empunhar no começo do governo para a faxina na equipe que herdou de Lula, a oposição sacode o tapete que encobre os negócios da Petrobras

A presidente Dilma Rousseff quer pôr uma pá de cal sobre o caso Pasadena, escândalo que ameaça apear do cargo a presidente da Petrobras, sua amiga Graça Fortes, em razão de os diretores da empresa à época estarem sendo responsabilizados por prejuízos causados à estatal. No domingo, tentou interditar o debate sobre o tema nas eleições e blindar a cúpula da empresa. “Não se pode misturar eleição com a maior empresa de petróleo do país. Utilizar qualquer factoide político para comprometer uma grande empresa e sua direção é muito perigoso”, disse.

Vai ser difícil evitar o assunto na campanha. Curioso nessa história toda é que a própria presidente Dilma Rousseff tirou esse gênio da garrafa, ao denunciar que a aprovação da compra da refinaria de Pasadena, no Texas (EUA), por US$ 1,2 bilhão, foi feita sem que o Conselho de Administração da Petrobras, que à época presidia, tivesse conhecimento de cláusulas consideradas lesivas à estatal. Ao tirar o corpo fora, Dilma jogou o ex-diretor da empresa Nestor Cerveró e o ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli aos leões da oposição. 

Em fevereiro de 2006, o conselho aprovou a aquisição de 50% de Pasadena, por US$ 360 milhões. O valor é muito superior ao pago um ano antes pela belga Astra Oil pela compra da refinaria: US$ 42,5 milhões. Depois, a Petrobras foi obrigada, por decisão de uma corte de arbitragem, a comprar 100% da unidade, antes compartilhada com a empresa belga. Ao fim, aponta o TCU, o negócio custou à Petrobras US$ 1,2 bilhão. A suspeita de superfaturamento se tornou alvo de investigações da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal.

Há duas versões para o gesto de Dilma Rousseff, que transformou uma notícia de jornal — de que era presidente do conselho da estatal à época — na maior crise política já enfrentada pela empresa. São faces da mesma moeda. A primeira é de que Dilma já saberia que as investigações sobre a operação poderiam resultar também na incriminação dos antigos membros do conselho e, por isso, teria chutado o pau da barraca para salvar a própria pele. O Palácio do Planalto trabalhou muito para evitar que o TCU responsabilizasse os membros do conselho na semana passada.

Vassouradas
A outra versão é de que o gesto foi um recado aos militantes do PT que articulavam o movimento “Volta, Lula”, alguns dos quais envolvidos na Operação Lava-Jato, outro escândalo que ronda a empresa, como o deputado André Vargas, ex-vice-presidente da Câmara. Esse caso acaba de ser turbinado pelo depoimento de Meire Poza, ex-contadora do doleiro Alberto Youssef, à revista Veja. Ela resolveu colaborar com as investigações. Um dos principais envolvidos no escândalo de lavagem de dinheiro, recebimento de propina e superfaturamento de contratos da estatal é o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, que ameaça virar um “homem-bomba”. 

Hoje, a presidente Dilma faz o que pode e o que não pode para salvar Graça Fortes de um pedido de demissão, já que a presidente da Petrobras está sendo engolida pela crise. A pedido do Ministério Público Federal no Distrito Federal, a Polícia Federal até já abriu inquérito para investigar se a presidente da Petrobras omitiu informações durante depoimentos prestados ao Congresso sobre a compra da refinaria de Pasadena e a existência de contratos entre a estatal e uma empresa do marido dela.

 Em depoimento à CPI do Senado em abril, Graça negou que Colin Foster tenha negócios com a Petrobras. Ela esteve no Congresso para responder a questionamentos sobre a compra da planta de Pasadena. Soube-se agora que os depoimentos de Graça, de Gabrielli e de Cerveró foram facilitados por integrantes da CPI, que teriam fornecido com antecedência aos três depoentes as perguntas que fariam, supostamente com as respectivas respostas.

 Enquanto Dilma Rousseff joga fora a vassoura que chegou a empunhar no começo do governo para a surpreendente faxina na equipe que herdou do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a oposição sacode o tapete que encobre os negócios da Petrobras. O candidato do PSDB, Aécio Neves, cobra apuração sobre o esquema de propina montado por Alberto Youssef: “Vamos aguardar que as investigações ocorram e que, se as denúncias forem comprovadas, haja punição exemplar”. Eduardo Campos defende a criação de uma “força-tarefa para (…)que instituições, como a Polícia Federal, a Justiça e o Ministério Público, investiguem tudo para esclarecer o que vem acontecendo na Petrobras”.

domingo, 10 de agosto de 2014

Razão para votar

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 10/08/2014

 O senso comum é de que o pleito será decidido em razão do tempo de televisão e do volume de recursos financeiros de cada candidato, não em consequência do debate sobre os reais problemas da sociedade


As ideias da filósofa judia alemã Hannah Arendt, autora de Raízes do Totalitarismo e A Condição Humana, falecida em dezembro de 1975, permanecem atuais, embora pouco conhecidas do grande público. Hannah era uma democrata radical, com muitos adversários à direita e à esquerda, que provocou grande celeuma nos círculos intelectuais de Nova York, onde havia se radicado após fugir do nazismo, devido a um ensaio político — meio jornalístico, meio filosófico —, no qual narra o julgamento do criminoso nazista Adolf Eichmann.

Série de cinco artigos publicados na revista The New Yorker, Eichmann em Jerusalém, como se intitula a obra, é a base do roteiro do filme Hannah Arendt, que muitos tiveram a oportunidade de assistir no Brasil. Dirigido por Margarethe Von Trotta, com Barbara Sukowa no papel principal, a produção alemã de 2012 narra o julgamento midiático do criminoso nazista, que fora sequestrado por um comando israelense em Buenos Aires e levado para Israel.

Em vez de um monstro sanguinário, como todos esperavam, Eichmann era um funcionário como outro qualquer, um burocrata cumpridor do seu dever. Por meio desse personagem, a filosofa descreve a “banalidade do mal”, ou seja, o poder do Estado de igualar o exercício da violência homicida ao mero cumprimento da atividade burocrática. Além de mostrar como a burocratização do serviço público pode se traduzir na capacidade destrutiva do Estado, Hannah causou polêmica porque pôs o dedo na ferida da colaboração de líderes judeus com o nazismo, o que revoltou a comunidade judaica, principalmente nos Estados Unidos.

Pensar e agir
Parece uma digressão sobre o que se passa na Faixa de Gaza e em Jerusalém, mas não é esse o caso. A memória de Hannah Arendt vem a calhar por causa da política no Brasil. Uma grande apatia tomou conta do povo em relação às eleições, em razão da ojeriza à política e aos políticos. Talvez essa dicotomia entre o pensar a política e o agir politicamente seja um dos assuntos preferidos da filósofa, que se diferenciou de outros colegas por considerar a atividade política uma ação inerente à condição humana e não vê-la com hostilidade.

Essa tensão entre a filosofia — pensar é o diálogo do eu consigo mesmo — e a política existe desde a parábola da caverna da República de Platão: o homem se liberta dos grilhões que o prendiam à escuridão e decide sair à luz do dia, que ainda o cega. Já não enxerga na escuridão. Esse é um ato isolado, solitário; nesse momento, ninguém o acompanha.

Para Hannah, a condição humana não vem da existência biológica (“labor”) ou do trabalho (“homo faber”), mas do pensar e agir politicamente. Essa é a única atividade humana que se exerce diretamente, sem a mediação das coisas. É a oportunidade de começar algo novo e afirmar a própria identidade, sem a qual a maioria, em qualquer sociedade, cede terreno à tirania.

Apatia e voto
A menos de dois meses das eleições, a campanha eleitoral está gelada nas ruas, ao contrário do que acontece nas redes sociais, onde o ativismo militante não tem limites, apesar de minoritário. É um vale tudo que assusta qualquer cidadão não-alinhado aos partidos políticos que protagonizam a disputa e que parecem estimular a abulia coletiva.

O senso comum é de que o pleito será decidido em razão do tempo de televisão e do volume de recursos financeiros de cada candidato, não em consequência do debate sobre os reais problemas da sociedade, como recomenda a prática democrática. Parece que a política voltou a ser um monopólio de quem exerce o poder e dos partidos políticos.

Pelo raciocínio, a presidente Dilma Rousseff seria reeleita já no primeiro turno, pois teria a oportunidade de mostrar as realizações de sua administração — como se isso não tivesse sido feito por meio da maciça propaganda governamental, antes e durante a Copa do Mundo. Assim, a alienação e o desconhecimento seriam as razões da desaprovação de seu governo e da grande rejeição à própria presidente da República, que concorre à reeleição.

Esse ponto de vista se baseia na guerra midiática de versões, não no que de fato acontece na vida social. As pesquisas apontam um gradativo avanço da oposição, que deverá levar a eleição presidencial para o segundo turno, provavelmente entre Dilma e Aécio Neves (PSDB) ou, eventualmente, Eduardo Campos (PSB).

Tudo indica que teremos uma disputa dramática. Há 25 anos, a cada dois anos, o brasileiro escolheu seus governantes segundo suas reais prioridades. O voto secreto e direto é uma nobre forma de agir politicamente; geralmente, é antecedido de muita discussão e reflexões sobre a vida real, principalmente em âmbito familiar. Na eleição, os cidadãos podem pensar e agir para enfrentar seus problemas e, dessa forma, exercer plenamente a sua condição humana, como diria a filósofa Hannah Arendt.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

À flor da pele

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense: 07/08/2014

A tensão é grande por causa do bloqueio dos bens dos diretores da Petrobras, que ameaça atingir inclusive a presidente de empresa, Maria das Graças Foster

 Por mais que se pretenda manter o Palácio do Planalto à distância da trapalhada, os nervos andam à flor da pele na Presidência da República por causa dos escândalos envolvendo a compra da refinaria de Pasadena, no Texas (EUA), e as obras de construção da refinaria Abreu Lima, em Pernambuco, fruto deserdado de uma parceria do falecido presidente Hugo Chávez, da Venezuela, com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ontem, no debate na Confederação Nacional da Agricultura (CNA), indagada sobre a eventual participação do Palácio da Planalto na elaboração de perguntas para subsidiar o depoimento de diretores da empresa na CPI da Petrobras, a presidente Dilma Rousseff por muito pouco não saiu do sério.

“O Palácio do Planalto não é expert em petróleo e gás. O expert em petróleo e gás é a Petrobras. Queria que você me dissesse quem elabora perguntas de petróleo e gás para a oposição. Perguntas sobre petróleo e gás, só um lugar ou em vários lugares no Brasil: na Petrobras e em todas as empresas de petróleo e gás. Eu acho estarrecedor que seja necessário alguém de fora da Petrobras formular perguntas para eles”, disse a candidata, referindo-se aos depoimentos de diretores da empresa sob investigação, durante a entrevista coletiva após a sabatina organizada pela CNA. 

A tensão é grande por causa do bloqueio dos bens dos diretores da Petrobras, que ameaça atingir inclusive a presidente de empresa, Maria das Graças Foster. Por muito pouco, eles não ficaram indisponíveis ontem por decisão do Tribunal de Contas da União (TCU). O processo foi retirado da pauta de votação do plenário da Corte a pedido do relator, ministro José Jorge, que atendeu um pleito do advogado-geral da União, Luís Adams. Foi a primeira vez que ele esteve no TCU para defender um integrante do governo em plenário. Alegou que a decisão traria consequências desastrosas para a Petrobras nas bolsas de todo o mundo.

 Graça Foster e Jorge Luiz Zelada foram incluídos no processo que investiga o caso Pasadena em substituição a Ildo Luís Sauer e Nestor Cerveró, que não faziam mais parte da Diretoria Executiva da Petrobras. A ação sugeria o bloqueio dos bens dos responsáveis pelos prejuízos atribuídos à estatal na compra da refinaria norte-americana. Quadros de carreira da empresa, com grande liderança na corporação, como os diretores Guilherme Estrela e Almir Barbassa, também estão com os bens bloqueados. A ameaça ao patrimônio pessoal de diretores não envolvidos diretamente nas irregularidades quebra a cadeia de solidariedade na direção da empresa, fundamental para o governo manter o controle da situação e abafar o caso.

Debate
A propósito da sabatina promovida pelos produtores do agronegócio, mais uma vez a presidente Dilma Rousseff não empolgou os presentes, por causa dos erros do governo na condução da economia, muito embora o setor hoje seja responsável por sete dos 10 principais produtos de exportação do Brasil, entre os quais estão a soja, o milho, o café, o açúcar, o frango, a carne bovina e a carne suína. Entre as queixas de sempre — estradas, portos, armazéns, fertilizantes, crédito —, destaque para a situação do setor sucro-alcooleiro, por causa da crise do etanol. 

Dilma aproveitou a entrevista coletiva para anunciar a possibilidade de aumento no percentual de etanol misturado à gasolina, dos atuais 25% para 27,5%, como forma de melhorar a situação do setor. “O etanol de cana terá que ser competitivo com o etanol de milho”, que é produzido pelos Estados Unidos. Há duas semanas, num encontro de produtores paulistas com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a presidente da República foi muito criticada pelo ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues devido a essa defasagem. Lula ouviu e não disse nada.

O candidato à Presidência da República pelo PSDB, Aécio Neves, no encontro com os líderes do agronegócio, anunciou a criação de um superministério da Agricultura, incorporando novamente à pasta o Ministério da Pesca e Aquicultura, e equiparando-o aos ministérios da Fazenda e do Planejamento em poder decisório. Aproveitou para criticar o desempenho de Dilma na questão da reforma agrária: “Foi o governo atual o que menos fez pela reforma agrária”.

Eduardo Campos, candidato do PSB, acompanhado da vice Marina Silva, prometeu, se eleito, comandar pessoalmente as políticas voltadas para o campo e fortalecer o Ministério da Agricultura. Ciente de que as questões ambiental e indígena são muito conflituosas para o setor, insistiu na necessidade de diálogo entre as partes envolvidas e o futuro governo.


quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Gatos escaldados

 Casos como o da CPI da Petrobras, às vezes, têm surpreendentes desfechos, como aconteceu na CPI do Judiciário, que resultou na cassação de um senador e na renúncia de mais três

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), anunciou ontem a abertura de uma comissão de sindicância para apurar denúncias de suposta fraude na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado que investiga contratos da Petrobras. A presidente da estatal, Graça Foster, o ex-presidente José Sérgio Gabrielli e o ex-diretor da área internacional Nestor Cerveró tiveram acesso às perguntas dos parlamentares antes dos depoimentos que prestaram ao colegiado. Uma reunião na sede da Petrobras que tratou do assunto foi gravada por um dos participantes, que vazou o registro para a revista Veja.

 Como diria Raymund Chandler (1888-1959), no ensaio literário A Simples Arte de Matar, todo crime deixa um rastro e tem uma motivação. Natural de Chicago, o escritor americano passou a juventude em Dublin, na Irlanda, e começou a escrever em Londres, onde trabalhou como jornalista freelancer. De volta aos Estados Unidos, alistou-se no exército canadense e foi lutar na França, na I Guerra Mundial. De volta à vida civil, teve a promissora carreira de executivo de um empresa de petróleo encerrada pela Grande Depressão e o alcoolismo.

 A literatura, porém, ganhou um escritor que ajudou a criar o novo gênero literário da época, as histórias policiais noir norte-americanas, escritas por Chandler, Dashiell Hammet e outros roteiristas “malditos”, que haviam sido expulsos de Hollywood pelo macartismo, mas fizeram a crítica dos maus costumes políticos nos jornais tabloides policiais. É de Chandler o detetive durão Philip Marlowe, herói de Adeus Minha Adorada, Janela para a Morte, A Dama do Lago, A Irmãzinha, O Longo Adeus e Playback, personagem interpretado no cinema por Humphrey Bogart.


Decoro
Os escândalos da Petrobras podem até não dar em nada, mas já compõem uma trama digna da melhor literatura noir. O vazamento do vídeo comprometedor é um efeito colateral do fato de 11 diretores da estatal — além da presidente Maria das Graças Foster — terem sido responsabilizados pelos prejuízos causados à empresa petrolífera por causa do negócio, que chegam a US$ 792,3 milhões. A operação foi aprovada pelo Conselho de Administração da empresa, à época presidido pela então chefe da Casa Civil do governo Lula, Dilma Rousseff.

 Entre os diretores envolvidos estão Gabrielli, Cerveró e o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa, preso pela Polícia Federal na Operação Lava-Jato e acusado de integrar um esquema de lavagem de dinheiro chefiado pelo doleiro Alberto Youssef. Todos estão sendo investigados pela CPI aberta no Senado, em maio, para apurar suspeitas de superfaturamento na compra da refinaria de Pasadena, no Texas (EUA), em 2006, ao custo de US$ 1,3 bilhão, e de desvio de recursos na construção da refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, ambas da Petrobras.

Sindicância
Renan Calheiros (PMDB-AL) determinou a sindicância porque é sua obrigação como presidente do Senado. Gato escaldado em matéria de processos por quebra de decoro parlamentar, já escapou de dois pedidos de cassação em plenário; num deles, teve de renunciar ao comando do Senado. Mas pode sobrar para os senadores José Pimental (PT-CE) e Delcídio Amaral (PT-MS), por quebra de decoro parlamentar, caso se confirme que ambos faltaram com a ética ao proteger os investigados.

 O presidente do Senado sabe que esses casos, às vezes, têm surpreendentes desfechos, como aconteceu com a comissão de inquérito que investigou o Judiciário, em 1999, e trouxe à tona o caso do juiz Lalau, Nicolau dos Santos Neves, ex-presidente do TRT paulista. Sobrou para o então senador Luiz Estevão (PMDB-DF), ainda no primeiro ano de mandato; dono do grupo OK, era o responsável pela construção do fórum. Descobriu-se que, dos R$ 223 milhões repassados para a obra, de 1994 a 1998, R$ 169,5 milhões foram desviados. Estevão foi cassado e até hoje está enrolado com o caso, pelo qual foi condenado.

Três caciques do Senado acabaram renunciando aos mandatos por causa da disputa política que se estabeleceu a partir do episódio: o falecido senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), que presidia Casa, e o então líder do governo, José Roberto Arruda (ex-PSDB), que quebraram o sigilo da votação que cassou Luiz Estevão; e o senador Jader Barbalho (PA), que no ano seguinte assumira o comando do Senado, mas foi obrigado a renunciar ao mandato para evitar um pedido de cassação provocado por denúncias de Antônio Carlos Magalhães, que havia voltado à Casa, eleito com 2,9 milhões de votos, e fez um ajuste de contas com quem considerava o principal responsável por sua renúncia.