Lula acredita que a doença não atrabalhará a ministra-xchefe da casa Civil, cuja candidatura pode até se beneficiar da forma corajosa como ela enfrenta a situação
Por Luiz Carlos Azedo
Há mais coisas entre o céu e a terra do que os aviões
de carreira, diria o mais gozador dos gaúchos,
Apparício Torelly, o Barão de Itararé (parafraseando
o genial dramaturgo inglês William Shakespeare).
Enquanto o Congresso chafurda nas mordomias e tropeça
nas próprias pernas, o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva constrói o que considera o cenário ideal para a sucessão
presidencial de 2010. Em sua estratégia eleitoral, o adversário
ideal é aquele que hoje aparece como favorito na
disputa, o governador paulista José Serra (PSDB). A ministra
Dilma Rousseff (PT) seria candidata única da base governista,
com o apoio do PMDB, do bloco de esquerda
(PSB, PDT e PCdoB) e dos partidos do “centrinho” (PTB,
PR, PP e PSC). Para quem quiser ouvir, Lula aposta o outro
mindinho que Dilma derrotará o tucano se essa for a polarização
da disputa. Para o presidente da República, Serra
seria um freguês de carteirinha.
Por gravidade
O PMDB saiu das urnas com vontade de comer caviar no segundo
mandato de Lula, mas corre o risco de terminar o
banquete arrotando mortadela. A cúpula da legenda conquistou
com grande habilidade as presidências do Senado e
da Câmara e parecia disposta a tutelar o governo. Mas, desde
que assumiram o comando das duas Casas, o senador José
Sarney (PMDB-AP) e o deputado Michel Temer (PMDB-SP)
foram levados às cordas. Porta voz da opinião pública, toda a
mídia nacional, inclusive o Correio, cobra a renovação dos
costumes parlamentares. Há que se destacar que o site Congresso
em Foco, que há anos acompanha diariamente sessões
plenárias, comissões e bastidores da Câmara e do Senado,
repetiu o feito de seu congênere Contas Abertas em relação
ao Executivo e devassou, de forma avassaladora,
os gastos comviagens ao exterior de deputados federais, parentes
e agregados.
No turbilhão da crise,a potencial candidaturade Temer a vicepresidente
da República,na chapa de Dilma,está sendo volatilizada.
Lula assiste de camaroteo naufrágio peemedebista
e se prepara pararecolher os sobreviventes. Devido ao rumo
dos acontecimentos, acredita que o apoio da legenda à candidatura
de Dilma virá por gravidade. Essa é a propensão natural de
governadores e prefeitos da legenda. A única alternativa para
o PMDB recuperar a iniciativa na sucessão seria a candidatura
própria, mas o partido perdeu o rumo, não tem projeto
próprio nem unidade para atrair o governador de Minas,
Aécio Neves para a legenda. Se o PMDB indicar o vice de
Dilma, será aquele que Lula escolher. Mesmo assim, antes
terá que disputar a vaga com o bloquinho de esquerda.
O imprevisto
O ex-ministro da Integração Nacional e cacique político cearense
Ciro Gomes, candidato do bloquinho, é um fio desencapado
no jogo sucessório. Na avaliação do Palácio do Planalto,
o destempero verbal já vitimou Ciro em duas eleições
presidenciais e está se encarregando de jogar por terra a tese
que tanto defende: duas candidaturas da base do governo na
sucessão de 2010. Lula nunca descartou a possibilidade de
Ciro ser vice de Dilma, contentando o PMDB com o apoio do
PT à reeleição de seus governadores, mas essa alternativa
começa a ser vista como um risco na campanha eleitoral por
causa do temperamento explosivo de Ciro. Ele é uma espécie
de terceiro vértice no triângulo de fogo de uma campanha
eleitoral (oxigênio, combustível e temperatura de ignição).
O mesmo raciocínio começa a ganhar corpo na cúpula
do PSB, partido de Ciro, que prefere reeleger o governador
Eduardo Campos em Pernambuco, com apoio do PT. Ou seja,
a candidatura de Ciro está morrendo na praia.
Curiosamente, Lula aposta que Aécio será o vice de José
Serra no PSDB, contra todas as declarações em contrário. Esse
é o sonho do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, mas,
mesmo assim, Lula seca a candidatura do governador mineiro
a presidente da República, sufocando-a como pode, num
jogo tacitamente combinado com o governador paulista José
Serra. Essa estranha dialética de unidade dos contrários, porém,
enfrenta um grave imprevisto: o linfoma de Dilma, que
começou delicada quimioterapia. Lula acredita que a doença
não atrapalhará a ministra-chefe da Casa Civil, cuja candidatura
até pode se beneficiar da forma corajosa como ela enfrenta
a situação. O câncer foi diagnosticado em estágio inicial
e, segundo seus médicos, tem cura.
Publicado na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense de 26/04/2009
quinta-feira, 30 de abril de 2009
A "transa" dos políticos
A velha tensão entre o bem comum e os negócios divide
os políticos, assim como a dualidade da
"ética das convicções" e da "ética da responsabilidade"
Por Luiz Carlos Azedo
A Mesa da Câmara dos Deputados decidiu pôr um
ponto final na chamada farra das passagens aéreas,
com regras rígidas para seu uso por parlamentares e
assessores, inclusive os líderes de bancada. Espera,
com isso, reencontrar seu rumo. Não será fácil. Os desgastes
do Congresso — o que inclui o Senado —, catalisados por denúncias
de corrupção na máquina administrativa, de abusos
de mordomias e outras mazelas, não serão revertidos nesta
legislatura. Somente a eleição de 2010 purgará esses males,
renovando as duas Casas, mesmo que antes algumas cabeças
sejam cortadas por seus pares, como é de praxe.
Política miúda
A correlação entre a atividade legislativa e a eleição dos parlamentares
se tornou um grande mistério. Hoje, se depender
de um projeto de lei de sua autoria aprovado no Congresso,
um parlamentar em primeiro mandato jamais será reeleito.
Às vezes, uma boa lei leva décadas para ser votada em plenário,
com seu autor já fora da Casa. A reeleição depende de “estruturas”
de campanha e da “transa” política.
O governo é o primeiro a usurpar, com suas medidas provisórias,
o poder de legislar dos parlamentares e afastá-los da
grande política. O padrão estabelecido pelo falecido senador
Nelson Carneiro (PMDB-RJ), que aprovou a lei do divórcio e tinha
um portfólio de dezenas de leis trabalhistas aprovadas, é
coisa do passado no Senado. O mesmo vale para os colegas do
falecido deputado Dante de Oliveira (PMDB-SP), autor da
emenda que motivou a campanha das Diretas Já. Honrosas exceções,
como a deputada federal Rita Camata (PMDB-ES), autora
do Estatuto da Criança e do Adolescente e de outras leis
correlatas, correm o risco de serem tragadas pela crise ética
que atravessa o Congresso. Rita é uma dos parlamentares criticados
por utilizar o auxílio-moradia da Câmara. Como outros
deputados da chamada “banda ética” da Casa, teve a imagem
arranhada por causa das “mordomias” existentes no Congresso.
O mesmo vale até para quem prefere o papel fiscalizador ao
de legislador. O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), por
exemplo, falhou. Mas denunciou o próprio erro: beneficiar a filha
com uma passagem para o exterior.
A crise ética é um produto da política miúda que predomina
no Congresso. A grande política, quando reaparece,
assume formas estranhas, como a tese do terceiro
mandato para o presidente Lula do deputado Devanir
Ribeiro (PT-SP) ou o desabafo do senador Cristovam
Buarque (PDT-DF), que sugeriu um plebiscito para o
povo decidir se deve fechar ou não o Congresso por uns
tempos. Com a atividade legislativa amesquinhada,
o que predomina no Congresso é a “transa”. Ou seja,
os pequenos acordos, arranjos, favores, apadrinhamentos,
privilégios, lobbies escusos e tudo o mais que a
opinião pública condena. Funcionam como mecanismos
de reprodução dos mandatos.
Grandes negócios
Quando um novato assume o mandato, é orientado pelos colegas
a usufruir de tradicionais prerrogativas: o broche de parlamentar,
o apartamento funcional ou auxílio-moradia, a cota
de passagens aérea, a verba indenizatória, os cargos que deve
preencher por livre nomeação, a verba de gabinete para contratar
funcionários. Tudo isso, até agora, fazia parte do mandato,
como um salário indireto, meio na moita. Com os abusos
flagrados, receberam um xeque-mate da opinião pública.
Porém, há muito mais a fragilizar o Congresso e desmoralizar
deputados e senadores. O lobby empresarial, por exemplo,
descobriu o caminho das pedras e se soma ao Executivo
para esvaziar a atividade legislativa e o debate da grande política.
Por baixo dos panos, junto a assessorias dos ministérios
ou relatores das medidas provisórias, faz contrabando
de privilégios e maracutaias em matérias aprovadas de cambulhada.
Ou, então, em projetos de lei que tramitam em caráter
terminativo nas comissões do Senado e da Câmara. As
mordomias dos parlamentares são um café pequeno diante
dos “gatos” incluídos na legislação, concedendo isenções ou
privilégios tributários, normas onerosas para o poder público
ou os cidadãos, em favor de empreiteiras, bancos, seguradoras,
empresas de comércio exterior, grandes sonegadores,
o agronegócio e por aí vai. Quem paga a conta é povão.
Sem projetos de Nação, longe da grande política, das
soluções para a crise econômica e das candidaturas à sucessão
presidencial de 2010, mas de olho na renovação de
seus mandatos , os políticos agora descobrem os riscos
das miudezas da política da “transa”. Pequenas vantagens
patrimonialistas e fisiológicas viram grandes infortúnios
eleitorais. É a velha tensão entre o bem comum e os negócios,
que sempre separa os políticos. A dualidade da “ética
das convicções” e da “ética da responsabilidade”, de que
nos falava Max Weber em A política como vocação, pauta a
mídia e a sociedade.
Publicado na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense em 30/04/2009
os políticos, assim como a dualidade da
"ética das convicções" e da "ética da responsabilidade"
Por Luiz Carlos Azedo
A Mesa da Câmara dos Deputados decidiu pôr um
ponto final na chamada farra das passagens aéreas,
com regras rígidas para seu uso por parlamentares e
assessores, inclusive os líderes de bancada. Espera,
com isso, reencontrar seu rumo. Não será fácil. Os desgastes
do Congresso — o que inclui o Senado —, catalisados por denúncias
de corrupção na máquina administrativa, de abusos
de mordomias e outras mazelas, não serão revertidos nesta
legislatura. Somente a eleição de 2010 purgará esses males,
renovando as duas Casas, mesmo que antes algumas cabeças
sejam cortadas por seus pares, como é de praxe.
Política miúda
A correlação entre a atividade legislativa e a eleição dos parlamentares
se tornou um grande mistério. Hoje, se depender
de um projeto de lei de sua autoria aprovado no Congresso,
um parlamentar em primeiro mandato jamais será reeleito.
Às vezes, uma boa lei leva décadas para ser votada em plenário,
com seu autor já fora da Casa. A reeleição depende de “estruturas”
de campanha e da “transa” política.
O governo é o primeiro a usurpar, com suas medidas provisórias,
o poder de legislar dos parlamentares e afastá-los da
grande política. O padrão estabelecido pelo falecido senador
Nelson Carneiro (PMDB-RJ), que aprovou a lei do divórcio e tinha
um portfólio de dezenas de leis trabalhistas aprovadas, é
coisa do passado no Senado. O mesmo vale para os colegas do
falecido deputado Dante de Oliveira (PMDB-SP), autor da
emenda que motivou a campanha das Diretas Já. Honrosas exceções,
como a deputada federal Rita Camata (PMDB-ES), autora
do Estatuto da Criança e do Adolescente e de outras leis
correlatas, correm o risco de serem tragadas pela crise ética
que atravessa o Congresso. Rita é uma dos parlamentares criticados
por utilizar o auxílio-moradia da Câmara. Como outros
deputados da chamada “banda ética” da Casa, teve a imagem
arranhada por causa das “mordomias” existentes no Congresso.
O mesmo vale até para quem prefere o papel fiscalizador ao
de legislador. O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), por
exemplo, falhou. Mas denunciou o próprio erro: beneficiar a filha
com uma passagem para o exterior.
A crise ética é um produto da política miúda que predomina
no Congresso. A grande política, quando reaparece,
assume formas estranhas, como a tese do terceiro
mandato para o presidente Lula do deputado Devanir
Ribeiro (PT-SP) ou o desabafo do senador Cristovam
Buarque (PDT-DF), que sugeriu um plebiscito para o
povo decidir se deve fechar ou não o Congresso por uns
tempos. Com a atividade legislativa amesquinhada,
o que predomina no Congresso é a “transa”. Ou seja,
os pequenos acordos, arranjos, favores, apadrinhamentos,
privilégios, lobbies escusos e tudo o mais que a
opinião pública condena. Funcionam como mecanismos
de reprodução dos mandatos.
Grandes negócios
Quando um novato assume o mandato, é orientado pelos colegas
a usufruir de tradicionais prerrogativas: o broche de parlamentar,
o apartamento funcional ou auxílio-moradia, a cota
de passagens aérea, a verba indenizatória, os cargos que deve
preencher por livre nomeação, a verba de gabinete para contratar
funcionários. Tudo isso, até agora, fazia parte do mandato,
como um salário indireto, meio na moita. Com os abusos
flagrados, receberam um xeque-mate da opinião pública.
Porém, há muito mais a fragilizar o Congresso e desmoralizar
deputados e senadores. O lobby empresarial, por exemplo,
descobriu o caminho das pedras e se soma ao Executivo
para esvaziar a atividade legislativa e o debate da grande política.
Por baixo dos panos, junto a assessorias dos ministérios
ou relatores das medidas provisórias, faz contrabando
de privilégios e maracutaias em matérias aprovadas de cambulhada.
Ou, então, em projetos de lei que tramitam em caráter
terminativo nas comissões do Senado e da Câmara. As
mordomias dos parlamentares são um café pequeno diante
dos “gatos” incluídos na legislação, concedendo isenções ou
privilégios tributários, normas onerosas para o poder público
ou os cidadãos, em favor de empreiteiras, bancos, seguradoras,
empresas de comércio exterior, grandes sonegadores,
o agronegócio e por aí vai. Quem paga a conta é povão.
Sem projetos de Nação, longe da grande política, das
soluções para a crise econômica e das candidaturas à sucessão
presidencial de 2010, mas de olho na renovação de
seus mandatos , os políticos agora descobrem os riscos
das miudezas da política da “transa”. Pequenas vantagens
patrimonialistas e fisiológicas viram grandes infortúnios
eleitorais. É a velha tensão entre o bem comum e os negócios,
que sempre separa os políticos. A dualidade da “ética
das convicções” e da “ética da responsabilidade”, de que
nos falava Max Weber em A política como vocação, pauta a
mídia e a sociedade.
Publicado na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense em 30/04/2009
quarta-feira, 8 de abril de 2009
O erro e o golpe
Nada justifica a deposição de um governo eleito como o de João Goulart, muito menos a violenta repressão que se seguiu, mas isso não significa que os militares sejam os únicos responsáveis
Por Luiz Carlos Azedo
O ex-ministro Jarbas Passarinho, um dos signatários do Ato Institucional nº5, que escancarou a ditadura militar no Brasil, caracteriza a deposição do presidente João Goulart (PTB), há 45 anos, como um “golpe preventivo”. Os militares tomaram o poder em razão da opinião pública e da articulação dos políticos de oposição, liderados por Carlos Lacerda e Magalhães Pinto. Além disso, Jango cometera o desatino de instigar a indisciplina de soldados, cabos e sargentos contra seus oficiais. “Jango detonou a contrarrevolução, apoiada maciçamente pelo povo. Não houve um só tiro disparado”, resumiu, em seu artigo semanal, ontem, aqui no Correio.
A crise
Segundo Passarinho, o comunismo era uma força em expansão no mundo, desde o fim da II Guerra Mundial. O capitalismo adotava uma posição defensiva, o que tornou inevitável o desfecho da crise política de 1964. A revolução cubana havia levado esse avanço às portas dos Estados Unidos. Mikhail Suslov, ideólogo comunista, ao defender a invasão da Tchecoslováquia, de fato já havia explicitado a doutrina soviética: a preservação da paridade estratégico-militar entre a União Soviética e os Estados Unidos abria caminho para a chegada ao poder dos movimentos de libertação nacional e para as revoluções nacionalistas na Ásia, na África e na América Latina. Pietro Ingrao, ex-diretor do L’Únitá, num artigo intitulado “O Erro”, recentemente reconheceu que o maior equívoco dos comunistas foi apoiar a invasão da Hungria pelos soviéticos em 1956. Ali teria começado a guerra fria e a derrocada histórica dos comunistas.
No seu livro recentemente lançado no Brasil pelo Instituto Astrojildo Pereira, intitulado Por um novo reformismo (Editora Contraponto), Giuseppe Vacca, outro ex-dirigente do Partido Comunista Italiano, mostra, ironicamente, que a Alemanha e o Japão, no Ocidente, foram os que mais se beneficiaram da Guerra Fria. Até que os EUA resolveram ultrapassar o “fordismo” e partir para a “economia da informação”. Com isso, desestruturaram o “New Deal” europeu, reorientaram o mercado mundial para o Pacífico e conseguiram implodir o bloco soviético. Agora, os EUA provam do próprio veneno.
A derrota
De volta ao golpe de 1964. Nada justifica a deposição de um governo eleito democraticamente como o de João Goulart, muito menos a violenta repressão que se seguiu, mas isso não significa que os militares sejam os únicos responsáveis. Havia uma crise econômica no país, com inflação ascendente. O processo de substituição das importações, responsável pelo surgimento de um novo proletariado, e o avanço das relações capitalistas no campo, com o surgimento do agronegócio, exacerbaram contradições sociais. O Brasil se urbanizava rapidamente. A principal tese da esquerda brasileira, de que o país não poderia se desenvolver com latifúndio e domínio do capital estrangeiro, era falsa.
Jango apostava num suposto “dispositivo militar” que lhe garantiria “cortar a cabeça dos gorilas”, como avaliava Prestes, caso os militares tentassem um golpe de estado. “A resistência armada ao golpe seria um banho de sangue inútil, politicamente já estávamos derrotados”, disse-me Salomão Malina, herói da FEB condecorado com a Cruz de Combate de 1ª Classe, que sucedeu Giocondo Dias na secretaria-geral do PCB. Ele e outros ex-militares do Comitê Central do PCB, a maioria remanescente da chamada Intentona de 35 (Giocondo, Dinarco Reis, Teodoro Melo, Almir Matos, Ivan Ribeiro e Agliberto Azevedo), apoiaram a decisão do brigadeiro Francisco Teixeira, comandante da 3ª Zona Aérea, de não bombardear as tropas de Mourão Filho que desciam de Juiz de Fora. Teixeira era ligado ao “Setor Mil” do PCB.
O informe de balanço do Comitê Central ao 6º Congresso, realizado em 1967, na clandestinidade, explica as divergências sobre as razões do golpe de 1964 da cúpula do Partidão com Carlos Marighella e outros dirigentes que optaram pela luta armada. No plano eleitoral, havia duas opções antes do golpe: manter a aliança com o PSD e apoiar Juscelino em 1966; ou romper e fazer de Leonel Bizola (PTB) o sucessor de Jango. A esquerda considerava Juscelino pró-imperialista e preferiu lançar a candidatura de Brizola, com a bandeira das reformas de base “na lei ou na marra”. Foi derrotada.
Em tempo: Passarinho é protagonista de um debate imperdível com o ex-deputado cassado Marco Antônio Tavares Coelho, ex-membro da Executiva do PCB preso em 1975, e Ivo Herzog, filho do jornalista Vladimir Herzog e Clarice, no programa 3 a 1, da TV Brasil, hoje, às 22h.
Publicado na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense em 1º de abril de 2009
Por Luiz Carlos Azedo
O ex-ministro Jarbas Passarinho, um dos signatários do Ato Institucional nº5, que escancarou a ditadura militar no Brasil, caracteriza a deposição do presidente João Goulart (PTB), há 45 anos, como um “golpe preventivo”. Os militares tomaram o poder em razão da opinião pública e da articulação dos políticos de oposição, liderados por Carlos Lacerda e Magalhães Pinto. Além disso, Jango cometera o desatino de instigar a indisciplina de soldados, cabos e sargentos contra seus oficiais. “Jango detonou a contrarrevolução, apoiada maciçamente pelo povo. Não houve um só tiro disparado”, resumiu, em seu artigo semanal, ontem, aqui no Correio.
A crise
Segundo Passarinho, o comunismo era uma força em expansão no mundo, desde o fim da II Guerra Mundial. O capitalismo adotava uma posição defensiva, o que tornou inevitável o desfecho da crise política de 1964. A revolução cubana havia levado esse avanço às portas dos Estados Unidos. Mikhail Suslov, ideólogo comunista, ao defender a invasão da Tchecoslováquia, de fato já havia explicitado a doutrina soviética: a preservação da paridade estratégico-militar entre a União Soviética e os Estados Unidos abria caminho para a chegada ao poder dos movimentos de libertação nacional e para as revoluções nacionalistas na Ásia, na África e na América Latina. Pietro Ingrao, ex-diretor do L’Únitá, num artigo intitulado “O Erro”, recentemente reconheceu que o maior equívoco dos comunistas foi apoiar a invasão da Hungria pelos soviéticos em 1956. Ali teria começado a guerra fria e a derrocada histórica dos comunistas.
No seu livro recentemente lançado no Brasil pelo Instituto Astrojildo Pereira, intitulado Por um novo reformismo (Editora Contraponto), Giuseppe Vacca, outro ex-dirigente do Partido Comunista Italiano, mostra, ironicamente, que a Alemanha e o Japão, no Ocidente, foram os que mais se beneficiaram da Guerra Fria. Até que os EUA resolveram ultrapassar o “fordismo” e partir para a “economia da informação”. Com isso, desestruturaram o “New Deal” europeu, reorientaram o mercado mundial para o Pacífico e conseguiram implodir o bloco soviético. Agora, os EUA provam do próprio veneno.
A derrota
De volta ao golpe de 1964. Nada justifica a deposição de um governo eleito democraticamente como o de João Goulart, muito menos a violenta repressão que se seguiu, mas isso não significa que os militares sejam os únicos responsáveis. Havia uma crise econômica no país, com inflação ascendente. O processo de substituição das importações, responsável pelo surgimento de um novo proletariado, e o avanço das relações capitalistas no campo, com o surgimento do agronegócio, exacerbaram contradições sociais. O Brasil se urbanizava rapidamente. A principal tese da esquerda brasileira, de que o país não poderia se desenvolver com latifúndio e domínio do capital estrangeiro, era falsa.
Jango apostava num suposto “dispositivo militar” que lhe garantiria “cortar a cabeça dos gorilas”, como avaliava Prestes, caso os militares tentassem um golpe de estado. “A resistência armada ao golpe seria um banho de sangue inútil, politicamente já estávamos derrotados”, disse-me Salomão Malina, herói da FEB condecorado com a Cruz de Combate de 1ª Classe, que sucedeu Giocondo Dias na secretaria-geral do PCB. Ele e outros ex-militares do Comitê Central do PCB, a maioria remanescente da chamada Intentona de 35 (Giocondo, Dinarco Reis, Teodoro Melo, Almir Matos, Ivan Ribeiro e Agliberto Azevedo), apoiaram a decisão do brigadeiro Francisco Teixeira, comandante da 3ª Zona Aérea, de não bombardear as tropas de Mourão Filho que desciam de Juiz de Fora. Teixeira era ligado ao “Setor Mil” do PCB.
O informe de balanço do Comitê Central ao 6º Congresso, realizado em 1967, na clandestinidade, explica as divergências sobre as razões do golpe de 1964 da cúpula do Partidão com Carlos Marighella e outros dirigentes que optaram pela luta armada. No plano eleitoral, havia duas opções antes do golpe: manter a aliança com o PSD e apoiar Juscelino em 1966; ou romper e fazer de Leonel Bizola (PTB) o sucessor de Jango. A esquerda considerava Juscelino pró-imperialista e preferiu lançar a candidatura de Brizola, com a bandeira das reformas de base “na lei ou na marra”. Foi derrotada.
Em tempo: Passarinho é protagonista de um debate imperdível com o ex-deputado cassado Marco Antônio Tavares Coelho, ex-membro da Executiva do PCB preso em 1975, e Ivo Herzog, filho do jornalista Vladimir Herzog e Clarice, no programa 3 a 1, da TV Brasil, hoje, às 22h.
Publicado na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense em 1º de abril de 2009